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Zandinga

por henrique pereira dos santos, em 30.03.20

Quando comecei a sentir desconforto com a abordagem bélica à gestão da epidemia, cheia de alusões à necessidade de travar o vírus, derrotar o vírus e etc., dei conta desse desconforto: o que sabia de biologia da evolução levava-me a ter cautelas em relação a esta ideia de que é possível estancar um rio ou parar uma avalanche.

Acresce que o exemplo que me davam de que isso era possível era uma ditadura que já em tempos quis extinguir os pardais fazendo barulho com panelas, para aumentar a quantidade de arroz que sobrava para as pessoas, do que resultou uma fome terrível: a falta de aves (o barulho das panelas não distingue granívoras de insectívoras) resultou em perdas colossais de produção por ter dado livre curso às pragas cujos predadores tínhamos eliminado.

O que dizia era muitíssimo cauteloso, nunca na vida tinha estudado epidemiologia, não sabia (nem sei) nada do assunto, e a pouca informação que tinha vinha da área da conservação, em que as questões éticas relevantes não são as mesmas, por mais que o PAN e outros radicais da libertação animal achem que sim.

Cruzei-me, no espaço sideral, com André Dias, esse sim, com sólida preparação em epidemiologia (vindo do lado da informática e da estatística, não do lado da medicina ou da biologia), com quem tenho aprendido muito nestes últimos dias.

O que a partir de certa altura ficou claro para mim é que isto não era uma discussão sobre curvas logísticas, de gompertz e coisas que tais, sobre as quais percebo ainda menos que epidemiologia, nem sei o que é uma curva logística (não é que me orgulhe da minha ignorância e no fim disto prometo ir estudar o que é).

A discussão era ontológica (isto tinha a ideia do que era, mas fui confirmar agora à wikipedia) e logo me havia de calhar a mim, que nunca tive queda para a metafísica.

A discussão era entre os muitos que acham que uma epidemia é um inimigo externo que pode ser controlado a partir de acções humanas concertadas de elevado impacto, e que não pára se não for travado, e os poucos, como eu, que acham que uma epidemia é como um rio ou uma avalanche: pode-se fazer uma barragem, desde que se saiba que o o seu objectivo não é parar o rio, mas apenas gerir a água, respeitando a sua natureza, para obter o que se pretende.

Partindo do pressuposto de que assim é, e com todo o respeito que tenho pelos que na DGS dizem que o pico da epidemia será lá para o fim de Maio, queria só deixar aqui a minha previsão de que dentro de quinze dias a três semanas, em toda a Europa e Estados Unidos, estaremos essencialmente a discutir os pormenores de como fechar o assunto sem perder muito a face (independentemente de, nos hospitais, a luta por salvar vidas se prolongar mais um tempo, uma luta pela qual tenho o maior dos respeitos, tanto mais que aprendi que esta doença é muito mais complicada que a gripe, do ponto de vista clínico, para aqueles em que evolui para pneumonias agressivas).

Não me peçam evidências, modelos, fundamentação, não tenho mais que a minha livre e ignorante interpretação do que fui ouvindo de quem me parece que saberá mais do assunto.

Quem faz previsões normalmente passa muito tempo a explicar por que razão falharam (obrigado, Luís, por me lembrares disso), eu não o vou fazer, eu sei que as previsões estão sempre erradas, o futuro nunca é nada do que dizemos que irá ser.

É um post à Zandinga, nada mais que isso.


12 comentários

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De Luís Lavoura a 30.03.2020 às 11:50

Creio que concordo com o Henrique, dentro de 3 a 4 semanas isto parará em Portugal.
Porém, não parará ao mesmo tempo noutros países, pelo que, embora se vá poder reabrir Portugal, Portugal terá que permanecer fechado a pessoas vindas de outros países. O que ainda será muito custoso, porque boa parte dos trabalhadores portugueses dependem do turismo.
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De zazie a 30.03.2020 às 12:40

O que se devia pensar era em usar esses 15 dias de forma absolutamente radical.
Fechar, a sério, à chinesa. Não desta forma frouxa, que é apanágio tuga.


Lamentam-se a pensar no que está para vir mas nunca são capazes de assumir um caminho escolhido e fazê-lo de forma radical, em vez de ser às pinguinhas.


Parece que tudo tem a mania do poucochinho. Do choradinho pelo pior que pode ser se se fizer agora forte e feio. Como se fossemos feitos de matéria diferentes dos outros- dos italianos, para onde ninguém quer olhar, por medo.
Sempre a porcaria da utopia e dos "esquemas à Academia de Lagado". 
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De Luís Lavoura a 30.03.2020 às 16:14

Fechar a sério, à chinesa, é o quê? Fechar as fábricas?
Não se pode fechar a sério, à chinesa, a população em casa, porque Portugal não dispõe dos recursos tecnológicos nem humanos da China para vigiar os cidadãos, nem dispõe dos seus recursos repressivos (quem se porta mal é despachado para um campo de reeducação, sempre disponível).
Além de que fechar a sério dificilmente terá vantagens.
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De zazie a 30.03.2020 às 16:39

Não se trata de recursos mas de modo de ser de um povo.


Fechar a sério, entre portugueses pode ser isto:
1- Fechar fronteiras. Aguentar os nossos que estão cá dentro. Por 15 dias
2- Fechar todas as actividades que não sejam vitais. A sério. 
3- Fechar mesmo as pessoas em casa por 15 dias, com as mínimas excepções de trabalho mas sem transportes públicos a funcionar.
4- Isolar as terras (vilas, aldeias) que ainda estão limpas, em vez de cidades contaminadas para depois irem contaminar essas.


Agora- dia 2- a sério.
Se for agora com a treta da ideia frouxa que é para salvar a economia, rebenta a economia daqui a pouco mais à frente porque nessa altura, é que irão lembrar-se de fechar à séria e já vai ser tarde.
E teremos uma Itália ou pior, porque somos mais pobres. 
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De zazie a 30.03.2020 às 16:49

E fechar a brincar, tem vantagens para o voto?


V. é de ciências mais tem mais cabecinha de mulher de letras que eu. É da ideologia- vai tudo para aí e nem sobra para mais nada.
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De Anónimo a 30.03.2020 às 13:23

Fechar tudo? Tipo fechar os lares ( que me parece estar a ser a principal fonte de contágio)?
Vamos proibir ainda mais a movimentação das pessoas e deixar ir ao supermercado e à farmácia? Vamos deixar de trabalhar em atividades não essenciais?
Acho que a ideia (espero enganar-me) do Governo será medidas mais restritivas, ou seja disparar em todas as direções sem saber exatamente quais os modos de contágio, pondo malha fina onde, atualmente, não é preciso e deixando buracões por onde se propaga o vírus.
O que andarão a fazer quem estuda os inquéritos que se fazem aos infetados? Andam às aranhas ou o questionário terá malha larga?
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De zazie a 30.03.2020 às 16:43

Não seja burro!"


Acha que os lares são fonte de contágio com os desgraçados lá dentro sem saírem para nada?


Os lares são como eu tive em minha casa a minha familiar a ser contaminada pelas funcionárias que vinham fazer higiene e vinham sem luvas, nem máscaras e com pneumonias no lombo a espirrar por todo o lado!


Os velhos não pegam. Os velhos apanham com os contaminados que até podem nem ter sintomas e são mais novos.


É ver as estatísticas de Singapura onde está tudo traçado e documentado. Quem, como, com que idade, como foi passando.


Os velhos foram muitos deles atirados para lares porque a família não estava para trabalhos. Uma minoria está por não ter mesmo família.


Os que têm família deviam ser levados para casa dos familiares próximos que deviam cuidar deles.


Foi assim que sempre se fez na minha família e sei o que vivi sem me queixar.
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De zazie a 30.03.2020 às 16:48

Sim. Não precisa de andar todos os dias enfiado no supermercado nem na farmácia.
Isso é tara.
Se é para andar na rua que se ande, enquanto se pode, a marcha rápida e por necessidade de saúde que é o que faço.


Se precisa de compras de ambas devia ter comprado tudo de uma vez. 
Ao contrário do que se disse, inteligentes foram os açambarcadores.


Mas até nisso somos frouxos, sempre tudo às pinguinhas. Sempre tudo com indecisões e deixa andar.
Há estafetas e deveriam ficar apenas estafetas para casos absolutamente urgentes.


Ou já pensou o que é haver mesmo fome e nem água nem electricidade, e net para desabafos de queixinhas que é preciso ir à rua ao supermercado?


Ou ir ao supermercado e ser assaltado e agredido por aqueles que já roubavam com pouca razão e não tarda muito a têm a sério. 
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De Anónimo a 31.03.2020 às 14:58

É natural que os lares sejam infetados a partir do exterior. É natural que haja alguma infeção na população em geral. A PANDEMIA não vai desaparecer. O problema é que, de acordo com valores de Ro = 3 (taxa de 1 a infetar 3) adiantados (aceites como corretos) no principio da epidemia, como se explica que, "de um dia para o outro" apareçam de 50 a 100%" de alguns trabalhadores dos lares infetados?
Falta-me ainda compreender como andar de carro e manter distanciamento físico propaga o vírus. Este deve ter aversão por transportes públicos e por empresas, mas um apetite especial por pessoas que se cruzam em marginais com meia dúzia de gatos pingados, claramente todos infetados e que não ficam em casa apesar de terem sintomas.
Chama-se tapar o sol com a peneira…
Também não compreendo quando tivermos, sei lá, um total de 200.000 infetados, e 0 casos novos devido a medidas draconianas, como impedir a reinfecção dos outros 9.800.000 dali a uns dias/semanas. Fechar o país para sempre? Seremos uma ilha remota no meio do Pacífico?
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De Anónimo a 31.03.2020 às 14:59

Já agora, a China está a amenizar medidas porquê? A percentagem de infetados foi de 0,0% (arredondado)… logo a imunidade de grupo não existe… ou será que existe imunidade genética em parte da população? Ou será uma questão de idade/defesas?

E acho que, excepto Singapura claro, somos todos burros, ignorantes, ou melhor Zandingas, a adivinhar o que fazer.

Já agora, quais as probabilidades de contágio que o pessoal de Singapura aponta para as maneiras de contágio? X para tossir para cima, Y estar à distância Z de um contaminado, W por ir ao supermercado, K a probabilidade de contágio por transmissão indirecta (vulgo mão/superfície/mão/boca/pulmões). Era importante saber, pois conhecimento é poder…

Osvaldo Lucas

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De Anónimo a 30.03.2020 às 15:15

como no passado resta a selecção natural
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De Anónimo a 30.03.2020 às 16:00

Caro Senhor
Presumo que se trate de " fina ironia" essa de após ter concretizado a sua previsão, dizer que não vai fazer previsões; O zandinga, sem modelos, também prevê.


Mas Deus o oiça, e a sua Zandigada, que pelo menos é assumida, ao contrário da dupla da saúde, que faz lembrar os irmãos Marx, sem o Groucho ( o mudo e o apalermado), mas que tem sempre um modelo que disse/diz/dirá.


Cumprimentos


Vasco Silveira

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