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O "caso" da transparência da Ana Moura tem uma dimensão estética, discussão essa na qual não tenho interesse em participar.
Mas tem também uma dimensão de discussão acerca dos limites da liberdade individual que, essa sim, me interessa.
Saber se é legítimo, e socialmente aceitável, envergar, num evento supostamente glamoroso, um vestido/ transparência que permite deslindar os seios é motivo de discussão. Para mim é claro que sim, usar uma transparência num momento glamoroso, ou fazer topless na praia, deveria ser entendido como algo normal, sendo que normal significa, neste contexto, algo parte da liberdade individual, que não deveria levantar ondas, nem discussões que ultrapassassem as do domínio da estética.
Regressando ontem de uma viagem vi que, por cá, não é bem assim e que o FB estava ao rubro com a indumentária de Ana Moura.
Uma discussão destas é uma discussão acerca de normas sociais. Em vários países muçulmanos, ainda que moderados, as normas sociais impedem que as mulheres andem de cabelo destapado. Já em culturas muçulmanas mais restritivas impede-se mesmo que a mulher mostre o rosto. Eu gosto de viver num país onde as normas sociais concedem a homens e mulheres um espaço de liberdade relativamente amplo.
Lamentavelmente, estamos a assistir no Ocidente a uma restrição progressiva das liberdades. Essa restrição é provocada por uma pinça que tem uma haste esquerda assim como uma haste direita. A esquerda propõe-nos uma cultura de cancelamento e higienista. Muita da direita, moralista e cheia de falsos pudores, também não preza especialmente a liberdade.
Curiosamente, as maiores críticas que ouvi à indumentária de Ana Moura partiram de mulheres. E, reforço, não me estou a referir a críticas com base estética, estou-me a referir a críticas em matérias "de costumes". Conforme a História já demonstrou muitas vezes, a ideia de que as pessoas querem ser "libertadas" é, em muitos casos, uma ficção. Há, quase sempre, um certo síndroma de Estocolmo que leva o prisioneiro a apaixonar-se por quem, ou por aquilo, que o aprisiona.
Isaltino Morais fazia umas almoçaradas de trabalho. É uma forma datada de trabalhar e de fazer política, é bom que evoluamos para práticas mais modernas e profissionais. No entanto, não me parece que se trate de um crime.
António Costa tinha o "melhor amigo" a "vender" os seus serviços de acesso directo ao PM. Tal é politicamente criticável, mas não me parece que tal implique que Costa tenha cometido qualquer crime.
Mesmo no caso das gêmeas, parece-me politicamente criticável toda a "agilização do processo" baseada em conhecimentos e favores pessoais, mas, ainda assim não vejo que se ganhe muito que o tratamento do caso saia do campo político para o judicial.
A tentação de uma excessiva judicialização da política, que aliás não acontece só em Portugal, não me parece ser um bom caminho. A turba ululante por certo aplaudirá, mas, repito, não me parece ser um bom caminho.
Não estou em condições de ter uma opinião acerca do desempenho de funções de Ana Jorge enquanto provedora da Santa Casa.
Mas tenho uma opinião de Ana Jorge enquanto Ministra da Saúde. Ana Jorge foi para Ministra da Saúde para acalmar, ou melhor anestesiar, um sector que o seu antecessor, Correia de Campos, pretendia reformar e modernizar,
Da mesma forma que, ainda nos governos Sócrates, Isabel Alçada foi para Ministra da Educação porque se desistiu de reformar esse sector como pretendia Maria de Lurdes Rodrigues.
Em Portugal valoriza-se as pessoas que não têm capacidade de tomar decisões, são essas, normalmente, as pessoas que têm boa imprensa. Quem não faz ondas e não enfrenta interesses instalados é muito amado por cá.
Ana Jorge conseguiu essa boa imprensa como ministra não fazendo nada, António Costa mantém-se popular após ter cometido a proeza de conseguir governar oito anos sem uma única reforma ou decisão de fundo.
Muito do nosso atraso relativo explica-se com este nosso atavismo.
É inegável que Ventura teve um grande resultado, no entanto duvido que tenha tido o resultado que desejava.
Cerca de 18% é muito voto, mas pode não significar grande coisa. Aliás, em 1985, o PRD de Hermínio Martinho, também com um discurso anti-corrupção, atingiu um resultado semelhante, para passados menos de dois anos, se ver reduzido a menos de 5%.
Para o resultado ser perfeito para Ventura faltou algo que chegou a andar por perto, uma vitória do PS. Uma vitória do PS teria garantido ao Chega dois aspectos cruciais:
- Por um lado tal teria garantido a desagregação do PSD. O PSD é um partido de poder, muitos anos afastado deste fazem-no "perder cola" e esboroar. Tal já começava a ser visível no consulado de Rio, esta vitória de Montenegro conseguiu travar, in extremis, um processo que já ameaçava irreversibilidade. A erosão, ou implosão, do PSD permitiria ao Chega ocupar o seu lugar.
- Por outro lado, uma vitória do PS, trazendo consigo o mesmo bando de incompetentes, (basta atentar para a lista de candidatos a deputados que o partido apresentou) garantiria o aprofundamento da mediocridade. Enquanto partido de protesto, para o Chega "quanto pior, melhor". O partido só teria que esperar mais uns dois anitos para que as coisas se degradassem mais um pouco e assim ter o caldo perfeito para que a sua mensagem salvífica fosse plenamente acolhida.
Acresce ainda que uma oposição ao PS seria, para o Chega, fácil de fazer. Bastar-lhe-ia opor-se a tudo e procurar cavalgar todos os movimentos de contestação. A oposição a um governo PSD não poderá ser assim feita. Se os votantes do Chega têm "ódio" ao PS, muitos deles mantêm "mixed feelings" em relação ao PSD. Uma política de bota-abaixo poderá ser penalizadora.
Se seria praticamente seguro que uma vitória do PS representaria a continuação da escalada do partido de Ventura para o cume, não ocorrendo esta, as coisas estão menos previsíveis, e mais complicadas para Ventura.
E ainda bem.
Um dos derrotados da noite é a comunicação social. Não só porque não tiveram sucesso na sua campanha evangelizadora anti-Ventura, mas também, e sobretudo, porque falharam naquilo que é a sua missão central, informar.
A comunicação social preocupou-se muitíssimo em diabolizar Ventura e nada fez para nos explicar as causas que permitem que ele emerja como fenómeno. Por exemplo, para mim não é preciso perder muito tempo para perceber que a proposta de Ventura, de que serão os cidadãos da Comunidade Europeia a pagar as nossas reformas, é absolutamente demagógica e inviável.
Mas eu, que gosto de procurar compreender os fenómenos sociais, estaria na disposição de investir algum do meu tempo para perceber porque é que os algarvios estão tão revoltados que dão a primazia do seu voto a um partido de protesto.
Será que é porque não vêm o poder central a apontar soluções para a falta de água? Será porque sentem a impunidade daqueles que "roubam a alfarroba"? Será que se revoltam contra aqueles que perseguiram a actividade de alojamento local, como se de algo criminoso se tratasse? Será porque há desinvestimento na região? Será porque veem com desconfiança a chegada de povos indostânicos? Será porque o sentimento de insegurança está a aumentar? Será que é um bocadinho de todas as causas anteriores?
Para todas essas questões, eu não tenho resposta. Eu, que não vivo no Algarve, gostaria de ter sabido o que se passa por lá, o que sentiam as gentes de lá, e a comunicação social não me deu essa informação. A pretexto de que falar em vários desses temas seria "promover o Ventura" a comunicação social lançou um manto de silêncio cúmplice sobre muita informação que é relevante.
Tal como já aconteceu noutros países da Europa, ao apenas escolher as temáticas e as perspectivas que vão ao encontro da sua narrativa, a comunicação social cometeu um duplo pecado. Por um lado, falhou na sua missão central, que é informar, e por outro, contrariando aquilo que seriam as suas intenções, acabou por alimentar extremismos, pois deixou reservados para estes temáticas que são relevantes, e tema de preocupação, para as "pessoas normais".
Até pela crise em que se encontra, a comunicação social deveria fazer um esforço de reflexão. No entanto, não tenho qualquer esperança que o faça.
Tenho alguns amigos que disseram estar chocados com o "aproveitamento" que Ricardo Araújo Pereira fez do choro de Pedro Nuno Santos num programa de televisão. Não estou especialmente solidário com esse sentimento desses amigos, acho que o momento de humor foi legítimo, e passo a explicar porquê.
1) Pedro Nuno Santos decidiu, em ambiente pré-eleitoral, ir a um programa de televisão escancarar a sua intimidade. Ou seja, todas as imagens utilizadas resultaram de um "produto" oferecido pelo próprio, e não de nenhuma devassa de intimidade.
2) Quando uma pessoa utiliza a sua intimidade, mulher e filhos, para se promover perde alguma moral para criticar quem chama à colação esses elementos de forma menos laudatória. Eu sei que uma pessoa fazer strip-tease da sua intimidade é algo que está de acordo com o vento dominante, no entanto não é uma tendência que me mereça especial simpatia.
3) A minha geração, e a geração anterior à minha ainda mais, foi educada a reprimir emoções. Penso que tal, em muitos contextos, foi exagerado e castrador. Ainda assim, não aprecio o actual cenário, em que se passou da repressão das emoções para a exibição destas. No actual ecossistema pretendemos que as emoções substituam a racionalidade e qualquer conceito de "realidade objectiva", e isso não é bom.
4) Ainda na sequência do ponto anterior, na minha geração, na tal repressão de emoções, diziam-se coisas como "um homem não chora". É claro que não concordo com essa perspectiva, mas também não tenho simpatia pelo paradigma em que o autocontrole é uma característica completamente desvalorizada.
5) Claro que fazer humor implica, em muitos casos, como neste, descontextualizar e ridicularizar. No entanto, parece-me que vivemos numa sociedade suficientemente madura para que tal possa ser feito. O público é suficientemente preparado para entender os contextos, e para intuir que o espectro daquilo que pode ser utilizado num programa de humor é muito mais amplo do que aquilo que pode ser utilizado noutros contextos. Por exemplo, a utilização das lágrimas de Pedro Nuno parece-me aceitável nesse contexto de humor, mas parecer-me-ia dificilmente tolerável numa lógica de luta política. No que respeita ao humor estou muito mais próximo da abordagem britânica que considerava aceitável fazer um sketch com a Rainha a dançar can-can, do que a visão lusitana estado-novense de que "o respeitinho é muito bonito".
Um dos aspectos interessantes das sondagens é que a extrema-esquerda, ou esquerda radical se preferirem, tem intenções de voto relativamente baixas.
Haverá várias razões para explicar o fenómeno, a guinada à esquerda do PS de Costa e Pedro Nuno será uma delas. Já agora, acredito que, nos dois líderes, tal aconteceu por motivos diferentes. O encostar à esquerda é convicto por parte de Pedro Nuno, e com Costa foi meramente oportunista ou instrumental, pois para preservar a sua carreira política Costa ter-se-ia encostado a qualquer lado.
Mas terá sido a formação da geringonça que assinou a inexorável decadência da extrema-esquerda, que pode ser a quase sentença de morte do PCP, ora vejamos como.
Antes de mais, em termos históricos, o PS e o PCP eram inimigos figadais. A afirmação do PS fez-se combatendo o modelo comunista soviético, preconizado pelo PCP, e em defesa do modelo de democracia liberal, do tipo ocidental, em que nos inserimos. O sentimento dos comunistas para com os socialistas era semelhante ao que benfiquistas e portistas nutrem entre si. Esse pacto, visto por muitos como contranatura, quebrou um fortíssimo interdito mental.
Mas penso que não terá sido essa a razão principal, esta terá sido o contacto com a realidade. O que é que quero eu dizer com isso? Pois bem, a extrema-esquerda vende sobretudo ilusões de paraísos não atingidos. São amanhãs que cantam que, quando colocados em prática, inevitavelmente se transformam em pesadelos. O modelo comunista sempre deu errado, mas há a constante ilusão de que desta vez irá dar certo. É um pouco como meter a mão molhada na tomada, esperando que desta vez não dê choque.
Pois bem, situando-se o raciocínio comunista como algo fora da realidade, terá sido com alguma decepção que se assistiu à participação do partido na realidade, no caso no governo da geringonça. Os comunistas terão sido obrigados a concluir que a sua participação no governo não altera grande coisa, que não existe nenhum "toque mágico" comunista. A participação comunista só teria sido justificada se tivesse ocorrido um "salto quântico", e este não aconteceu, era óbvio que só em mentes fantasiosas é que poderia ocorrer.
Com o seu mundo a desabar, muitos partiram em busca de novas ilusões, que, curiosamente, vários vão acalentar do outro lado do espectro político.
A campanha da estante do Ikea merece-me duas reflexões:
1) Serviu para lembrar que, contrariamente à narrativa que os socialistas puseram a circular e que muitos interiorizaram, Costa não se demitiu por um parágrafo, que aliás tinha que lá estar. Costa demitiu-se porque aquele que introduziu nos negócios do Estado, de forma informal e inaceitável, com o título de seu "melhor amigo" utilizava tal estatuto para vender serviços de tráfico de influências e pelo facto de ter sido apanhado na residência oficial do PM uma grande quantidade de dinheiro que seria pertença do seu chefe de gabinete, cujo currículo parecia cadastro.
Sempre disse que é impressionante como, por cá, as narrativas socialistas substituem os factos. A mais mirabolante narrativa socialista foi que a austeridade foi culpa do Passos Coelho e não da actuação de um governo socialista, cleptocrata, absolutamente irresponsável, que fez o país bater no muro.
2) Quem fez a campanha foi uma grande multinacional sueca. A empresa avaliou que poderia conseguir notoriedade e "viralidade" com o anúncio e aprovou-o. Embora eu penso que não haja qualquer intenção política no anúncio, a empresa decidiu aprová-lo porque ela, empresa, não depende em nada do Estado ou do poder socialista. E, na minha perspectiva, uma empresa aprovar os anúncios que bem lhe apetecer, sem temores reverenciais é algo de bom. Infelizmente não estou a ver nenhuma grande empresa portuguesa a fazê-lo. Quase todas são demasiadamente reféns de intrincadas relações de interdependência. E as dependências, como nós sabemos, são inimigas da liberdade. Como gosto de liberdade, eu gostaria de uma sociedade que cultivasse menos as dependências.
Os principais protagonistas da cena política na Alemanha Ocidental, no pós-guerra, foram Konrad Adenauer e Kurt Schumacher. Adenauer liderava os democratas-cristãos (CDU) e Schumacher liderava a oposição social-democrata (SPD).
A Alemanha tinha assinado uma rendição incondicional, estava em cacos e ocupada pelas potências vitoriosas (no lado ocidental existiam zonas controladas por americanos, ingleses e franceses).
Enquanto país ocupado, a Alemanha tinha pouquíssima autonomia. Konrad Adenauer foi, pouco a pouco, conquistando a confiança dos ocupantes, ganhou autonomia e conseguiu que as indústrias do Ruhr não fossem desmanteladas. A postura de Adenauer foi sempre de luta pelos interesses da Alemanha, mas dentro de alguma humildade tão necessária num país cuja arrogância tantos danos tinha provocado. A posição cooperante de Adenauer permitiu que a Alemanha se reerguesse e voltasse a tornar-se uma potência europeia.
Durante este período, a posição de Schumacher foi bastante diversa, ele defendia uma posição muito mais reivindicativa, exigente e de afrontamento dos aliados. Com o distanciamento histórico é possível prever que o triunfo dessa posição não teria trazido nada de bom para a Alemanha. Após a primeira e segunda guerra mundiais, ou guerra dos trinta anos como lhe chama Kissinger, a tolerância das potências vitoriosas para com a Alemanha seria muito pouca. Face à postura de alguma arrogância de Schumacher, e à necessidade de colocar algum realismo no debate, Adenauer, terá dito uma vez algo do género, "mas nós perdemos a guerra, não se recordam?".
Este episódio veio-me à memória, agora, quando alguns, como Pedro Nuno Santos, acusam o PSD de ter promovido uma "privatização desastrosa" dos Correios, embora essa privatização estivesse prevista no memorando de entendimento negociado pelo PS com a Troika. O PS faliu o país, mas renega, de forma covarde, irresponsável e irrealista, todas as medidas, implementadas pelo Governo de Passos Coelho que derivam diretamente, e inevitavelmente, dessa falência.
Um pouco como Schumacher queria negar as consequências para a Alemanha de ter provocado, e perdido, a guerra, o PS pretende negar as consequências de ter levado o país à bancarrota. Um pouco como Adenauer fez, dá vontade de fazer a pergunta retórica aos socialistas que pretendem "sol na eira e chuva no nabal", "mas vocês levaram o país à falência, não se recordam?"
Recentemente tem-se falado bastante em festejar o 25 de Novembro. Eu, pessoalmente, até porque tenho uma veia comodista, não sou dado a grandes celebrações e eventos. Nunca fui a uma manifestação ou celebração desse tipo, pelo que, se me virem numa, talvez seja prudente que me encaminhem para casa pois é provável que ande perdido.
Como em muitas coisas da vida, acredito que este desejo de celebração novembrino é um par ação-reação.
A revolução do 25 de Abril não foi uma revolução de esquerda. Foi o culminar de um movimento, espoletado inicialmente por objectivos corporativos, e que os objectivos políticos estavam mais focalizados no fim da guerra colonial do que propriamente na mudança de regime. Curiosamente, o PCP, que era a principal, e quase única, força política com oposição activa ao Estado Novo, não teve qualquer participação no golpe revolucionário. Uma vez consumado o golpe militar, os capitães foram buscar para chefiar o processo revolucionário um militar sénior de direita, o General Spínola.
Não sendo "ab initio" um movimento de esquerda, o imaginário do 25 de Abril foi totalmente capturado pela esquerda. Desde há muito que há "donos do 25 de Abril" que atestam o pedigree abrileiro de pessoas e organizações. Por exemplo, para, na data, desfilar na Avenida da Liberdade é preciso uma autorização dos que se consideram donos da desta. Se ingénuos, como os da Iniciativa Liberal, se quiserem juntar ao grupo é certo que receberão praxes humilhadoras.
O 25 de Abril que teria, pois, à partida as condições perfeitas para ser a grande festa da liberdade deixou de as ter. Por apropriação ilegítima, o 25 de Abril passou a ser, fundamentalmente, a festa de como a esquerda radical vê a liberdade, sendo que esquerda radical e liberdade tendem a ser contradições em termos.
Escorraçados das celebrações abrileiras, há pessoas, no centro e na direita, que mantêm, aliás legitimamente, desejos celebrativos. São essas pessoas que fazem agora questão de celebrar o 25 de Novembro.
Escolheram justamente a data em que o modelo daqueles que se apropriaram ilegitimamente do 25 de Abril foi derrotado. Assim garantiam que não se iriam cruzar com aqueles que os tratavam como sarnosos ou infiéis. Ao pretenderem para si, em exclusivo, os pergaminhos abrileiros, os esquerdistas criaram a necessidade de uma celebração alternativa, nos quais aqueles que escorraçaram se pudessem rever.
É neste espírito que emerge, pois, o actual desejo celebrativo. Conforme disse no início, não me revejo particularmente nesse tipo de manifestações.
Mas compreendo que haja quem se reveja.
José Luís Carneiro admite, em caso de vitória do PSD, viabilizar um governo deste, impedindo assim que o PSD sinta a necessidade de procurar o apoio do Chega.
Aliás, essa era a tradição em Portugal até António Costa refazer as regras da prática democrática. Houve governos do PS, em minoria, viabilizados pelo PSD e reciprocamente. Tal é uma prática sã, que impede que os partidos vencedores fiquem reféns de partidos extremistas.
Parece-me que a maioria das pessoas que coloque o interesse nacional acima do interesse partidário será favorável a tal prática. Mas, no PS, esta intenção de José Luís Carneiro não é vista com bons olhos, vozes como as do inefável Eduardo Cabrita já vieram dizer que é "lamentável". E porquê o lamento? Porque há um PS, aliás maioritário, para o qual o interesse nacional é algo absolutamente secundário e subsidiário do interesse partidário.
Esta atitude foi especialmente visível em todo o consulado de Costa, não houve uma única medida de reforma ou interesse nacional, tudo foi estritamente pensado numa lógica partidária e de gestão de carreira política. O país foi sempre visto como algo secundário, algo que estava ali a mais. O país foi visto assim como uma espécie de empecilho.
Pedro Nuno Santos teve duas intervenções que o tornaram especialmente conhecido.
Numa ameaçou que não pagaria a dívida pública, pondo as pernas dos banqueiros a tremer. Colocaria o país numa situação pária, os aviões da TAP poderiam ser apreendidos quando tocassem solo estrangeiro, e o navio-escola Sagres seria também apreendido se se atrevesse a sulcar para fora de águas territoriais. A credibilidade do país ficaria na lama. Na segunda, e já enquanto ministro, aproveitou a ausência do PM no estrangeiro e, à revelia deste, anunciou a construção/ remodelação de três aeroportos (Montijo, Alcochete e Portela).
Se a primeira intervenção ainda pode ser associada a alguma imaturidade, a segunda deverá ser associada a algo próximo da loucura. Quem é que, na posse plena das suas faculdades, assumiria uma decisão desta sem a concordância, e o pleno respaldo, do PM? Em princípio ninguém, mas Pedro Nuno assumiu “Já chega, já chega! O país anda a anos a discutir aeroporto. Já é tempo de mais. Há uma decisão tomada e vamos avançar”, disse o timorato político. Num país "normal", depois de uma intervenção "imatura" e de outra "de loucura", o jovem Pedro Nuno seria um político absolutamente "queimado". Diriam, ele até é bom rapaz, mas é de uma irresponsabilidade total. Seria o timoneiro perfeito para acelerar o navio para que este possa ir medir forças com o iceberg.
Por cá, encaramos como absolutamente normal a hipótese de ele vir a ser o próximo líder do país. Imaginá-lo como PM, tendo Mortágua como sua vice, é algo que não nos choca. A opção por um modelo terceiro-mundista, não europeu, foi uma opção nossa. Aqueles que diziam "a culpa é da Merkel" convençam-se de uma coisa, a culpa não é, nem nunca foi, da Merkel. Fomos nós que, de forma consciente ou alienada, que optámos pelo terceiro-mundismo e pela mediocridade.
De acordo com a Forbes, segundo os dados publicados hoje, os cinco mais ricos de Portugal não são "pessoas", são "famílias". Tal não acontecerá em quase nenhum lugar do mundo.
Se formos à lista da Forbes internacional verificamos que os catorze lugares cimeiros estão ocupados por pessoas que "criaram" riqueza inovando. A lista é liderada por Elon Musk que todos sabemos o que fez em prol da mobilidade elétrica. Em Espanha sabemos o que fez Amancio Ortega, da Zara em prol da democratização da moda, e em França sabemos como Bernard Arnault criou o maior conglomerado de produtos de luxo.
Em Portugal, quem lidera a lista não se caracteriza por ter criado algo de especial, mas por ter herdado algo de especial. Obviamente eu não quero atacar, ou culpabilizar, quem herdou. Até porque muitos dos que herdaram terão tido o mérito de gerir bem a herança e, eventualmente, até a ter multiplicado.
O que eu digo é que Portugal é um ecossistema extremamente adverso à criação de riqueza. O facto de não haver por cá "big ideas" capazes de criar riqueza substancial deveria levar a interrogar-nos. O facto de não haver empresas novas a entrar em bolsa, ou o nosso índice bolsista já não se chamar PSI20, por não existirem por cá vinte empresas cotadas com liquidez e dimensão, deveria fazer acender um conjunto de luzes encarnadas.
Ao contrário do que nos vendem, em termos de empreendedorismo, criação de riqueza e ambiente de negócios em geral, Portugal não é um ecossistema vibrante. Antes pelo contrário, por cá cultiva-se a mediocridade, a pequenez e a inveja.
E o que é preocupante é que não fazemos nada para nos corrigir, gostamos de ser assim.
Uma jovem, de uma organização telecomandada pelo Bloco de Esquerda, a pretexto das alterações climáticas, que aliás não têm nada a ver para o caso, ataca um ministro atirando-lhe tinta. Aliás, os ministros atacados já foram dois.
Os ministros não apresentam queixa e, aparentemente, nada de relevante acontece nem às atacantes, nem aos autores morais do ataque.
Quer isto dizer que um idoso, eventualmente próximo do Chega, com o pretexto do enorme aumento do IUC, que aliás até é bem real, se deve sentir livre para atacar ministros atirando-lhes tinta? Podem estar descansados que nada lhes acontecerá e que não será apresentada queixa?
É que num Estado de Direito Democrático os cidadãos são iguais perante a lei. Não há leis para apoiantes de partidos com os quais já nos coligámos e leis para os outros.
A forma casuística, e leviana, como estes casos são tratados é um enorme atentado ao Estado Democrático. As leis aplicam-se a todos, não é o PS que decide a quem se aplicam as leis.
Pelo ano da graça de 1453, enquanto as tropas de Maomé II, o Conquistador, cercavam Constantinopla, no seu interior os teólogos cristãos discutiam, literalmente, o sexo dos anjos.
Não me custa nada a imaginar a cena, seria como nos dias de hoje assistir a escaladas militares, com a possibilidade de uma guerra nuclear, e ver o mundo, em transe, a discutir o beijo de um árbitro, com a mobilização, para tal, de governos, sistemas judiciais e activistas um pouco por todo o Ocidente.
E pronto, passado mais de quinhentos anos, Constantinopla continua muçulmana, e Maomé II, que até foi magnânimo na vitória, permanece por lá sepultado na Mesquita do Conquistador, erigida no lugar da Igreja dos Santos Apóstolos, demolida para o efeito.
Imaginem que tinham uma boa disponibilidade económica, e uma quinta no Douro da qual gostavam. Já vos devem ter pedido que imaginassem coisas piores.
Como gostam da quinta, entregam, todos os anos, ao feitor, 85.300€ para que ele mantenha tudo impecável. É bastante dinheiro, mas como gostam da quinta é esse o valor que entenderam ser razoável para o efeito. Este ano o feitor até fez um bom trabalho na gestão da coisa, o ano foi bom para o vinho e para o azeite, e chegou ao final do ano sobrando-lhe 8.000€.
Será que é razoável dizer que a quinta do Douro dá lucro?
Pois bem, o que acontece com a CP é, mais ou menos, o que acontece com a quinta no Douro, mas com os valores multiplicados por mil. O Estado atribuiu uma indemnização compensatória de 85,3 milhões de euros à empresa e esta termina o ano com 8 milhões de euros de lucro.
Eu até penso que este modelo, da existência de um montante pré-definido de indemnização compensatória, é globalmente bom, e permite maior racionalidade de gestão. No entanto, ouvir pessoas como o ex-ministro Pedro Nuno Santos falar como se a CP fosse uma empresa muito lucrativa é profundamente enganador.
Faz agora 25 anos que a Expo abriu as portas. Enquanto evento efémero não me entusiasmou particularmente. No entanto, acho que foi uma boa forma de "fazer cidade".
Por essa altura Portugal viveu os seus últimos momentos de ilusão. Nessa altura ainda acreditávamos que, num espaço de uma geração, iriamos estar entre os países desenvolvidos da Europa. Miragens como sermos a Califórnia deste continente ainda eram possíveis.
98 é um marco, mas as raízes do problema já vinham de trás. Cavaco deu um importante impulso desenvolvimentista ao país, mas nos dois últimos anos de mandato já era visível que o modelo estava esgotado. Estava esgotado o modelo, e estavam esgotados os protagonistas. Cavaco acabou rodeado de "yes men". Depois veio Guterres com o propósito de anestesiar um país já de si amorfo. A bandeira do "diálogo" foi uma óptima desculpa para suspender o reformismo e promover uma cultura de pântano na qual tão bem nos damos.
O facto de nos últimos vinte cinco anos sermos dos piores países no que a crescimento económico diz respeito, sim os piores somos nós a Grécia e a Itália, entristece-me, mas não é o que me entristece mais. O que mais me entristece é a forma como passámos a aceitar a mediocridade. Da mesma forma que a China, do século XIX foi invadida pelo entorpecente ópio, nós fomos invadidos pela letargia socialista, em que o partido do Governo faz uma campanha a gabar-se que mais de um milhão de famílias acede a medidas de apoio ao cabaz alimentar. Sim, o que me entristece foi como perdemos qualquer ambição ou brio.
É bom que os governantes tenham uma boa vida pessoal, de forma que esta os ajude a terem uma boa saúde mental.
Mas a ida de António Costa ao concerto dos Coldplay, enquanto a nossa vida democrática passa por momentos difíceis, não é disso que se trata. António Costa, que anda na política desde os catorze anos, não é inocente. Ele sabe que ao estar num estádio com cinquenta mil pessoas e com as televisões a captar imagens, tal seria amplamente noticiado, não se trataria de nenhum momento íntimo.
Ao assumir tal acto, Costa pretendia transmitir uma mensagem. E essa mensagem é "eu estou-me nas tintas para a opinião publica, para a vigilância democrática, para o Presidente e para vocês em geral". Desde a maioria absoluta Costa tem, de forma sistemática e sem grandes ambiguidades, adoptado essa atitude. Adoptou-a quando nomeou o recém derrotado Medina ministro das Finanças, quando elevou Galamba, a mais socrática das personagens, a ministro, quando disse na entrevista à Visão o arrogante "habituem-se" ou quando enfrentou e humilhou publicamente o Presidente da República. Um pouco como Trump, quando dizia "Podia dar um tiro em alguém na 5.ª Avenida e não perdia votos", Costa está inebriado consigo próprio e acredita que, tal com uma vaca que voa, consegue pairar acima da realidade.
É pena termos a nossa democracia capturada por um personagem tão medíocre. É pena sermos capitaneados por alguém tão superiormente alienado.
José Sócrates abandonou o PS, no entanto o socratismo ficou por lá, e bem enraizado. Depois de ter levado o país ao charco descobriu-se que Sócrates era o cabeça de um polvo do tipo mafioso, e um indivíduo absolutamente amoral (tese de mestrado comprada, livros levados ao top por compras próprias, mentira compulsiva da qual o caso "Eusébio" será a mais caricatural...)
Num país exigente era normal que as pessoas que fizeram a sua carreira política à boleia de Sócrates fossem politicamente penalizadas. Também seria expectável que o Partido Socialista sentisse necessidade de, num processo de autorregulação, abandonar socratinos métodos e estilos como a arrogância do dono da quinta.
Pois bem, nada disso aconteceu. As mais socratinas personagens como Edite Estrela, Vieira da Silva, Augusto Santos Silva, Pedro Silva Pereira ou o inenarrável Galamba sobreviveram politicamente e trilharam o seu caminho no ambiente costista.
O processo de defenestração de António José Seguro foi, aliás, muito motivado pela necessidade de manter no PS a prevalência da "Sócrates Connection". A campanha interna de António Costa foi até, em parte, financiada por José Sócrates e por Carlos Santos Silva, o amigo rico da casa de Paris.
Quando Galamba, o homem que Fernanda Câncio levou até Sócrates, aquele que o avisou qua a PJ andava atrás dele, aquele que se comportava nas redes sociais como um puto malcriado, chegou a ministro, ficou bem claro que a amoralidade costista era incompatível com qualquer padrão de decência.
Era visível que os porcos tinham retomado o controle da quinta. Eventualmente com outro nome, ainda é o socratismo, e os seus valores, que nos dominam.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
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