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Uma lição de estratégia (pelo menos para mim)

por henrique pereira dos santos, em 20.02.24

Montenegro começou o seu mandato como manda-chuva do PSD com parte do partido desconfiado, a generalidade da imprensa a considerá-lo como uma mera lebre cujo futuro dependeria de uma pouco provável vitória esmagadora nas europeias, com o seu eleitorado potencial a deslizar sobretudo para o Chega, mas também para a IL e com o PS com um discurso fácil que pretendia apanhá-lo numa tenaz: ou se aliava ao Chega ou nunca seria governo.

Acresce que Montenegro, como aliás se viu ontem no debate com Pedro Nuno Santos, não é grande espingarda na tática (Antonio Costa, o jornalista, diz que no debate Montenegro ganhou nas políticas mas perdeu na política, uma análise que faz sentido) e tinha pela frente um génio da tática (António Costa, o político).

Pelo que percebi ontem, Montenegro fez uma opção estratégica arriscada, da qual não se desvia um milímetro, e que parece estar a dar fruto.

Montenegro parece ter decidido que, para governar, com hipótese de fazer alguma coisa, não podia contar com o Chega (eu diria que terá olhado para a situação instável nos Açores como o que lhe aconteceria se dependesse de Ventura, em quem manifestamente não confia) considerando que Ventura, como o PS, não é confiável, o que significa que qualquer acordo alcançado poderia ser revertido em qualquer altura.

Esta opção trouxe-lhe críticas de pessoas como Rui Ramos, João Miguel Tavares e, aparentemente, Passos Coelho, mas terá considerado que poderia viver com isso, menos confortavelmente do que gostaria, mas era gerível.

Precisaria de duas condições para ter sucesso: ter mais um voto que o PS e impedir a maioria absoluta da esquerda.

Nestas condições, quem tem um problema com o Chega (como os Açores demonstraram) é o PS e não o PSD, porque só é possível derrubar o governo com uma aliança entre a esquerda e o Chega.

Seguindo o conselho de Napoleão (nunca interromper o inimigo quando está a cometer um erro), deixou que o PS avolumasse o fantasma do Chega, em vez de o tratar como um partido como os outros.

Se isso aumenta o risco de uma votação expressiva do Chega, que limita as possibilidades de uma maioria absoluta do PSD+IL, também anula a relevância do Chega para a formação de governos ao obrigar o PS a votar com o Chega, desde que seja claro que Montenegro prefere a instabilidade das eleições à instabilidade da dependência do apoio do Chega, que ninguém sabe quanto tempo duraria.

Com esta opção criou uma espécie de furo lento para a esquerda, que se vai esvaziando: o PS não desce muito, mas à custa da progressiva transferência de votos dentro da esquerda, conseguindo uma das duas condições de governabilidade, impedir a maioria absoluta da esquerda.

Com isto conseguiu pôr Mariana Mortágua a fazer campanha pela AD quando disse a André Ventura que iria ficar isolado porque ninguém se iria sentar com o Chega, reforçando a credibilidade da afirmação de Montenegro de que com o Chega não faria acordos.

E ontem pôs Pedro Nuno Santos a dizer que vaibilizaria um governo de maioria relativa da AD.

Enquanto o PS e os jornalistas se entretinham com futilidades (é extraordinário que um jornalista escreva esta patetice, repetindo aliás o argumento infantil de Pedro Nuno Santos, como se o problema fosse saber se Sócrates é hoje militantante do PS, ou não, e não a falta de explicação do PS sobre o que mudou no partido que leve alguém a acreditar que o único problema era Sócrates "o social-democrata só conseguiu responder com “Sócrates”, que é chão que já deu uvas e que já não é sequer militante socialista".), Montenegro foi, lentamente, desenhando um programa de governo assente na substância e menos na espuma dos dias (e que até beneficia de ter uma IL a defender uma maior liberalização, deixando à AD as mãos livres para fazer uma campanha menos liberal, mais aceitável para largas partes do eleitorado, ao mesmo tempo que vai lembrando que terá de fazer uma coligação com a IL, que com certeza influenciará a prática do governo).

Com tudo isto Montenegro chega ao princípio da campanha eleitoral formal a lembrar que nos últimos anos não se inaugurou um único hospital público, mas se inauguraram 32 privados, como muito bem sabem as pessoas, sem ter de se preocupar a responder todos os dias como irá fazer um governo, questão perfeitamente resolvida: se tiver maioria relativa, faz um governo, se não tiver, a pergunta não faz sentido.

Por mim, tiro o chapéu a Montenegro, reconheço que me enganei na interpretação do que fui vendo e, sobretudo, fico com alguma esperança que depois de tantos anos a aturar um génio da tática sem a menor visão estratégica, tenhamos agora um governo com clareza estratégica, mesmo que faça muitas asneiras táticas.


11 comentários

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De balio a 20.02.2024 às 14:40


terá olhado para a situação instável nos Açores como o que lhe aconteceria se dependesse de Ventura



Mas nos Açores quem derrubou o governo foi tanto a Iniciativa Liberal como o Chega. Não foi somente este último. Porque é que Montenegro rejeita aliar-se ao Chega mas parece estar tomado de amores pela Iniciativa Liberal, se esta é, manifestamente (a avaliar pelo que se viu nos Açores), tão pouco fiável quanto o Chega?
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De Octávio dos Santos a 20.02.2024 às 19:40

«Nos Açores quem derrubou o governo foi tanto a Iniciativa Liberal como o Chega.»



Falso. Na votação, em Novembro passado, do plano e orçamento dos Açores para 2024, a Iniciativa Liberal votou contra e o Chega absteve-se.


https://cnnportugal.iol.pt/acores/governo-dos-acores/orcamento-dos-acores-para-2024-chumbado-com-votos-contra-da-il-ps-e-be-e-abstencoes-do-chega-e-pan/20231123/655f8008d34e65afa2f7e5cc 
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De balio a 21.02.2024 às 09:55


a Iniciativa Liberal votou contra e o Chega absteve-se


Então se foi a IL e não o Chega quem derrubou o governo açoriano, mais forte fica o meu argumento de que o PSD deveria ter menos confiança na IL do que no Chega para formar uma coligação.
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De balio a 20.02.2024 às 14:44


Precisaria de [...] ter mais um voto que o PS


Isso para mim não é claro. Suponhamos que a AD tem 3 deputados a menos que o PS, mas que, com 10 deputados da Iniciativa Liberal, fica com mais que o PS. Que acontece neste caso? E que acontece se o Bloco e o PCP tiverem deputados que contrabalancem os da IL?


Não é para mim claro que, numa circunstância dessas, qualquer um dos partidos vá ceder o lugar ao outro.
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De balio a 20.02.2024 às 14:49


Montenegro prefere a instabilidade das eleições à instabilidade da dependência do apoio do Chega


Para mim esta tática é ridícula e insustentável. O país não pode estar a repetir eleições de 6 em 6 meses só porque Montenegro se recusa a negociar com o Chega. Basta ver os problemas que se acumulam (como o dos polícias e o dos professores) e que uma administração pública, por mais eficaz que seja, não pode resolver. O país necessita de um governo e não pode estar à mercê dos caprichos de políticos que se recusam a negociar uns com os outros, preferindo ir mais a mais vezes para eleições antecipadas.
Nem o povo tolerará tal comportamento. O povo quer quem o governe.
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De cela.e.sela a 20.02.2024 às 15:22

verifico, sem admiração, a falta de 'honestidade intelectual' do ps, be,etc.
difícil saber se é por estratégia, tática ou defeito de fabrico.
a cruz devia ser posta do lado esquerdo nesta cacaria.
«vingança, prato que se come frio» 
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De Marques Aarão a 20.02.2024 às 16:35

Esse debate na prática foi a três, entre Nuno Santos, José Sócrates e António Costa. Montenegro estava lá mas só para os ver passar.
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De O apartidário a 20.02.2024 às 17:50

O presidente do Chega considerou hoje que o espaço da AD fica esvaziado após o PS ter indicado que, se perder as eleições, não apresentará nem viabilizará moções de rejeição a um governo liderado pelo PSD.
https://24.sapo.pt/atualidade/artigos/legislativas-ventura-diz-que-ps-viabilizar-governo-do-psd-esvazia-espaco-da-ad
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De RR a 20.02.2024 às 20:12

O PS tanta vez agitou o fantasma do CHEGA que lhe ficou colado. De tal forma que ficou sem tema (não foi só por isso, claro), não fala em mais nada a não ser no Chega. E tem, de facto, um problema em mãos, a começar nos Açores, onde  vai votar ao lado do Chega.. ou o Chega ao lado do PS. Não importa. Acabam por ser irmãos gémeos nesta campanha.
E o Partido está mesmo preocupado. Veja-se a reação dos seus próceres que andam por aí a enxamear tudo o que é caixa de comentários...
 
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De lucklucky a 20.02.2024 às 20:46

Parece-me uma fraca argumentação.


A ideia que o PSD  precisa da IL se o PS deixar passar o Governo PSD...


"porque só é possível derrubar o governo com uma aliança entre a esquerda e o Chega."
-Se a esquerda tiver mais deputados que o PSD e IL como é que só é possível tal opção? Para que é que a esquerda precisará do Chega?


"..o PS não desce muito, mas à custa da progressiva transferência de votos dentro da esquerda, conseguindo uma das duas condições de governabilidade, impedir a maioria absoluta da esquerda..."
-Não percebo como este parágrafo faz sentido.



"considerando que Ventura, como o PS, não é confiável,"

Onde Montenegro disse que o PS não é confiável? Montenegro não se negou a um acordo com o PS. Negou-se a um acordo com o Chega.


Montenegro recusa o Chega porque seria defenestrado pelo círculo dos media, quase todos de esquerda se o fizesse. A narrativa seria o Montenegro o extremista.
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De s o s a 20.02.2024 às 20:56

o autor persiste em equivocos, mas se isso lhe dá gozo !
Ninguem razoavel, fora da politiquice,  argumenta "clareza estrategica". Mas é a sua narrativa , tudo bem. 
...
Algures no texto  diz que, ou para o psd, o ps nao é confiável.  Como nao, se sao farinha do mesmo saco !!! E nem vou recordar-lhe que em governos anteriores PS, como com socrates e o costa, votou a generalidade das leis : o PSD.  Relembro: havia um acordo concreto e limitado do apoio parlamentar da geringonça, no concreto e logicamente a geringonça nao votou favorávelmente as propostas de direita do governo ps, votadas favoravelmente pelo psd. 
...


Se calhar já anteriormente o questionei : quem acha que fica (que nao vai votar nos outros partidos ) , que vai votar psd ?!
...

outra sua com graça : 

 temos entao um psd a fazer campanha á esquerda, mas depois governaria á direita, devido ao acordo com a IL, ja vimos isso com a desculpa da troika .

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