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O mito do Natal instalou-se solidamente na opinião da burguesia que publica opiniões e não sente na pele os efeitos secundários dos confinamentos cegos.
Nem a ácida lucidez de Carlos M. Fernandes parece abrir brechas nas certezas inabaláveis em que assenta a actual campanha que pretende impedir qualquer desconfinamento antes do fim de Março.
Vamos então a factos, sabendo perfeitamente que uma boa parte dos militantes de causas, sejam elas quais forem, jamais deixarão que os factos influenciem as suas ideias.
Este é um retrato possível da evolução da epidemia, medida a partir do número de casos diários. Claro que comparar casos diários hoje com os da Primavera passada não faz sentido nenhum, porque nessa altura a testagem era mínima quando comparada com o que hoje se faz, e na verdade o que me interessa é mesmo o lado direito do gráfico, com o número de testes positivos no mundo a descer de forma muito sustentada desde 10 de Janeiro, mais coisa menos coisa.
"Influenza occurs all over the world, with an annual global attack rate estimated at 5–10% in adults and 20–30% in children. In temperate regions, influenza is a seasonal disease occurring typically in winter months: it affects the northern hemisphere from November to April and the southern hemisphere from April to September. In tropical areas there is no clear seasonal pattern and influenza circulation is year-round, typically with several peaks during rainy seasons."
O parágrafo que cito acima, da Organização Mundial de Saúde, não diz respeito à covid, mas à gripe, outra doença infecciosa respiratória, com quadros clínicos substancialmente diferentes, com afectação de grupos etários muito diferente (a gripe é incomparavelmente mais perigosa nos grupos etários mais baixos, a covid é mais perigosa no grupos etários mais altos, onde a gripe também faz os maiores estragos), com pressão sobre os recursos de saúde muito menos importante que a covid, etc..
Mas, volto a frisar, sendo também uma doença infecciosa respiratória.
Esta sazonalidade, que é mais que conhecido para a gripe, tem sido ignorada para a covid, com o argumento de que se trata de um vírus diferente e uma doença nova, como se fosse de esperar que vírus e doenças que têm muitas semelhanças em muitos aspectos, à cabeça das quais, serem doenças infecciosas respiratórias, estivessem sujeitas a forças de evolução completamente diferentes.
Em particular, é chocante que todas as explicações para a covid se centrem no contacto com as pessoas, ignorando tudo o resto, como se esse factor não estivesse presente na gripe, como evidentemente está, sem que anule a sazonalidade.
Embora os contactos não se alterem substancialmente ao longo do ano (excepto eventualmente no facto das pessoas no Inverno estarem mais em ambientes fechados e menos arejados), todos os sistemas de vigilância e controlo dos efeitos da gripe, nas zonas temperadas, se centram em períodos bem definidos, por exemplo, no hemisfério Norte, entre as semanas 40 de um ano e a semana 20 do seguinte. No resto do ano nem vale a pena.
Dentro deste período, são as semanas entre meados de Dezembro e o meio/ fim de Janeiro que, sistematicamente, ano após anos, com enventuais e raras excepções, concentram o pico dos efeitos negativos da gripe (hospitalizações e mortes).
Olhemos agora outra vez para os números da covid, de forma um bocadinho mais desagregada que no gráfico inicial.
Aqui uso as mortes por covid, para tornar mais comparáveis os dados deste Outono/ Inverno com a Primavera de 2020, e a sazonalidade que a OMS descreve acima para a gripe aparece aqui em todo o seu esplendor: sazonalidade marcada nas regiões temperadas, apesar de amenizada na América do Norte, onde se inclui o México e os estados mais povoados dos Estados Unidos, que são os estados do Sul, sub-tropicais (a Europa não tem correspondente porque nessas latitudes está o Mediterrâneo e, para Sul, já em África, o deserto), e fraca sazonalidade nas outras regiões do mundo (percebem agora a indigência intelectual de responder com o Brasil ou a África do Sul quando se refere a anomalia meteorológica de Portugal entre 24 de Dezembro e 20 de Janeiro?).
Note-se que as principais variações nos números agregados que estão no primeiro gráfico estão directamente relacionadas com as variações na Europa e América do Norte.
Este gráfico permite perceber porquê.
O gráfico é exactamente o de cima, apenas com os números de mortes por milhão de habitantes, em vez das mortes em números absolutos.
Nas zonas temperadas do hemisfério Norte, mais bem representadas pela Europa que pela América do Norte, que inclui os estados do Sul dos Estados Unidos e México, a sazonalidade covid não oferece qualquer dúvida e é essencialmente igual à sazonalidade da gripe.
Quando Manuel Carmo Gomes, e toda a trupe de activistas do confinamento, falam de uma quarta vaga semelhante ou maior que a de Janeiro em Portugal, ou dizem que temos de evitar os erros no Natal fechando as escolas e fechando as pessoas em casa até à Páscoa, inclusivé, para evitar uma situação como a de Janeiro, a conclusão é muito, muito clara: estão a substituir os factos pelas suas convicções, de resto fundadas na mais completa incompreensão do que está a acontecer com a evolução da epidemia.
O espalhanço completo nas previsões da epidemia que fizeram ao longo de Janeiro, se dúvidas houvesse, é a demonstração clara de que não perceberam o fenómeno que andam a modelar.
Não, não é por terem feito previsões com erros de 200% a menos de uma semana, é porque as explicações para as previsões feitas e para os desvios face à realidade são explicações erradas ou inexistentes.
Continuam a dizer asneiras sobre como vai evoluir a epidemia, quer aqui, em Portugal, quer no resto do mundo.
Não é por acaso que existe uma profunda clivagem de interpretação do fenómeno entre os epidemiologistas clássicos e o pessoal das modelações, é mesmo porque uns olham para a realidade, com as lentes do conhecimento consolidado por dezenas de anos de gestão de epidemias, e outros olham para os computadores com as lentes dos seus preconceitos.
E, com isso, alimentam a destruição económica e, mais que tudo, roubam ou dificultam seriamente a possibilidade de milhares de pobres se libertarem da pobreza através da educação.
Mas se realmente estão convencidos do que andam a dizer, e eu parto do princípio de que assim é, então tenham coragem de dizer que os confinamentos só são reais e justos quando a sociedade suporta os prejuízos de quem perde com eles e, por isso, para além do fecho de escolas e outras medidas que tais, proponham um imposto adicional de 10% sobre os rendimentos de quem não teve quebras de rendimento com o confinamento, como forma de os financiar de forma justa.
E, se não for pedir muito, prescindam já de 10% dos vossos rendimentos, mesmo que o Estado não se atreva a tomar essa medida de elementar justiça.
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