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Desde a semana passada (até uns dias antes), tem estado muito bom para queimar.
Por essa razão há muita gente a queimar nesta altura, quer sejam técnicos de fogo controlado, quer sejam pastores.
Em qualquer caso, desde que se vá acompanhando para evitar perdas pessoais ou de bens e cumprindo objectivos de gestão do território, não há nenhuma razão para apagar um fogo nesta altura.
Este parágrafo que pode parecer estranho a muita gente, é doutrina oficial em alguns países que, começando por ter políticas de supressão do fogo (apagar tudo o que ardia), foram evoluindo para políticas de fogo controlado, quando perceberam que as políticas de supressão de fogo davam maus resultados e, face aos custos e quantidade de gente qualificada necessária para a execução de fogo controlado em larga escala (Portugal começa agora a falar, oficialmente, em 50 mil hectares anuais de fogo controlado, quando até agora dificilmente chegava aos mil anuais), evoluíram ainda para a integração dos fogos não controlados que ocorrem em condições meteorológicas que aconselham a queima e que cumprem os objectivos de gestão do território.
No lado dos técnicos de gestão florestal, em especial os que lidam directamente com a gestão do fogo, a necessidade desta evolução é consensual e, inclusivamente, tem vindo a influenciar quer o discurso de uma parte do Estado, quer mesmo a prática, ao ponto de se ter estabelecido um plano nacional de fogo controlado e se terem lançado algumas medidas de apoio à pastorícia como instrumentos de gestão do fogo.
Mas, citando o Laboratório de Fogos Florestais da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, "Existe um Plano Nacional de Fogo Controlado que não é possível executar por falta de capacidade instalada. Por outro lado apagam-se fogos pastoris que evoluem em condições ótimas de prescrição, portanto sem impactos negativos, e que não constituem qualquer ameaça. Nestes (serra do Alvão) usaram-se meios aéreos, noutros casos de que temos conhecimento houve repressão directa da população".
Para além do gasto de recursos absurdo, incluindo com meios aéreos, a apagar fogos que nem sequer deveriam ser extintos, mas sim acompanhados para evitar perdas pessoais ou de bens, a GNR, não por responsabilidade dos agentes, com certeza, que não têm obrigação nenhuma de saber que nestes dias é muito bom que arda, tem vindo a perseguir os pastores (os principais utilizadores de fogo à escala da paisagem, para além dos técnicos de fogo controlado), em vez do que seria normal, que seria acompanhá-los, apoiá-los e, já agora, pagar-lhes o serviço de interesse colectivo que estão a fazer.
É inacreditável a quantidade de pessoas que pressionam a protecção civil para que sejam apagados fogos que deveriam ser incentivados como vacina eficaz contra os grandes fogos de Verão, e revela uma sociedade com uma relação difícil com o fogo.
Infelizmente, uma parte do Estado, que só sabe de meios projectados para o teatro de operações sendo incapaz de entender o papel do fogo nos ecossistemas, é grandemente responsável pela psicose colectiva que nos afecta e que nos impele a apagar tudo o que arde.
Não, não tem de ser assim, nestes dias o que seria bom, o que verdadeiramente eu gostaria de ver, era uma televisão, em canal aberto, a acompanhar pastores a fazer as suas queimas, como quem acompanha os ciclistas que sobem à Torre, porque é isso que esses homens (posso aqui escrever, essas mulheres, e conheço algumas pastoras que justificariam o acrescento, mas a verdade é que é uma profissão em que não há quotas de género e é esmagadoramente masculina) são, uns heróis que nos entregam de graça um serviço de interesse colectivo a que muito pouca gente reconhece o imenso valor que tem.
Este post é só para lhes dizer, mesmo que provavelmente nunca o leiam, que lhes agradeço profundamente o trabalho que estão a fazer e lamento que o Estado que também eu pago com os meus impostos os trate como criminosos que é preciso travar a qualquer custo.
Um dia isto muda, mesmo que hoje não se vislumbre, em qualquer partido, o mínimo de representação política do mundo rural que possa garantir alguma réstea de bom senso nas políticas que afectam os principais gestores do território não urbano.
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