Saltar para: Post [1], Comentar [2], Pesquisa e Arquivos [3]




Tretas aritméticas

por henrique pereira dos santos, em 19.01.21

Houve um atraso na minha partida para Pasárgada motivado por um comentário a um post anterior:

"Verificou-se desde dia 24 dezembro, de forma consistente, uma situação de frio generalizado com valores da temperatura máxima e mínima do ar inferiores ao valor da normal climatológica 1971-2000. Nas últimas três semanas apenas no dia 28 de dezembro, o valor médio da temperatura mínima foi próximo do normal.
O dia 9 de janeiro 2021 foi o dia mais frio neste período, com 2.98°C de média da temperatura média do ar, sendo que os valores da temperatura máxima do ar, nas estações de Guarda, Aldeia do Souto, Lousã e Portel foram os mais baixos registados nos últimos 20 anos. De referir ainda que nos dias 5, 6 e 8, os valores médios de temperatura média do ar foram inferiores a 4°C. No dia 11 foi registado o 4º valor mais baixo da média da temperatura mínima do ar do território.
...
Embora se tenha registado a ocorrência da onda de frio relativamente localizada, o carácter prolongado deste episódio (cerca de 3 semanas), a persistência de vários dias consecutivos com temperaturas negativas (>10 dias consecutivos em 1/3 das estações), em particular no interior, e a abrangência territorial constituem aspetos importantes nos previsíveis impactos que terá tido na população."

Isto é o Instituto Português do Mar e da Atmosfera a falar da anomalia meteorológica das últimas três semanas.

rt.jpg

Isto é o Instituto Ricardo Jorge a calcular aqui o R(t) nacional e a relacioná-lo com o que acha relevante na sua evolução.

139731797_3957161510970422_5994086091122407135_o.j

Isto é a equipa de Manuel Carmos Gomes a projectar mortalidades à lá Buescu, ou seja, projectando tendências sem compreender a natureza do fenómeno que estão a analisar.

O que está aqui não é nenhuma modelação matemática, tal como as previsões de Manuel Carmo Gomes sobre números de casos que lhe servem para a campanha para o encerramento das escolas que mantém desde sempre também não resultam de modelação matemática, são apenas tretas aritméticas, brincadeiras com números sem ligação com as realidades que os números pretendem traduzir.

É por isso frequente haver atribuições de variação de número de casos ao início das aulas, por exemplo, mas raramente ouvi qualquer coisa a explicar como as férias de Natal dos alunos impactaram a evolução da epidemia.

Lá em cima, o Instituto Ricardo Jorge destaca a véspera de Natal, mas não faz qualquer referência ao facto do dia 24 de Dezembro ser o início de uma anomalia meteorológica que toda a literatura sobre doenças infecciosas respiratórias permite supôr que tem alguma relação com a brusca subida do R(t).

Aliás, o Instituto Ricardo Jorge nem sequer acha estranho que sendo o Natal um fenómeno nacional, ele se traduza num aumento do R(t) substancialmente maior na região de Lisboa e Vale do Tejo (A média do R(t) para os dias 30-12-2020 a 03-01-2021 foi de 1,21, estando o seu verdadeiro valor compreendido entre 1,2 e 1,22 com 95% de confiança) que no Norte (A média do R(t) para os dias 30-12-2020 a 03-01-2021 foi de 1,15, estando o seu verdadeiro valor compreendido entre 1,14 e 1,16 com 95% de confiança).

Na interpretação da evolução de uma doença infecciosa respiratória ignorar as condições meteorológicas que a literatura reconhece inequivocamente influenciarem a sua evolução (quer por afectarem a actividade viral, quer por afectarem a resposta do hospedeiro ao ataque do vírus, quer por afectar a forma como as pessoas se comportam) é simplesmente má ciência (admitindo que é ciência) e a complexificação matemática do tratamento dos dados sem ter em atenção esse aspecto não é mais que uma espécie de sudoku da epidemia: um entretenimento com números, sem qualquer relação entre a abstracção dos números e as entidades físicas reais associadas à evolução da epidemia.

Já vou tarde para Pasárgada, até mais ver.


1 comentário

Sem imagem de perfil

De Anónimo a 19.01.2021 às 14:42

Tem toda a razão! Em 2018 um dia de Janeiro teve 500 mortos por frio!
Agora é tudo Covid! Todas as infeções respiratórias são covid!!! Toda a vida em Janeiro e Fevereiro foi o mês de mortes por gripe! E nos hospitais um caos! Talvez agora ainda seja pior mas com este governo desgovernado outra coisa não seria de esperar...

Comentar:

Se preenchido, o e-mail é usado apenas para notificação de respostas.

Este blog tem comentários moderados.



Corta-fitas

Inaugurações, implosões, panegíricos e vitupérios.

Contacte-nos: bloguecortafitas(arroba)gmail.com



Notícias

A Batalha
D. Notícias
D. Económico
Expresso
iOnline
J. Negócios
TVI24
JornalEconómico
Global
Público
SIC-Notícias
TSF
Observador

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Comentários recentes

  • Hugo

    A confiança constrói-se. Já se percebeu com quem M...

  • Filipe Bastos

    Perante resposta tão fundamentada, faço minhas as ...

  • Filipe Bastos

    O capitalismo funciona na base da confiança entre ...

  • anónimo

    "...Ventura e António Costa são muito iguais, aos ...

  • lucklucky

    Deve ser por a confiança ser base do capitalismo q...


Links

Muito nossos

  •  
  • Outros blogs

  •  
  •  
  • Links úteis


    Arquivo

    1. 2024
    2. J
    3. F
    4. M
    5. A
    6. M
    7. J
    8. J
    9. A
    10. S
    11. O
    12. N
    13. D
    14. 2023
    15. J
    16. F
    17. M
    18. A
    19. M
    20. J
    21. J
    22. A
    23. S
    24. O
    25. N
    26. D
    27. 2022
    28. J
    29. F
    30. M
    31. A
    32. M
    33. J
    34. J
    35. A
    36. S
    37. O
    38. N
    39. D
    40. 2021
    41. J
    42. F
    43. M
    44. A
    45. M
    46. J
    47. J
    48. A
    49. S
    50. O
    51. N
    52. D
    53. 2020
    54. J
    55. F
    56. M
    57. A
    58. M
    59. J
    60. J
    61. A
    62. S
    63. O
    64. N
    65. D
    66. 2019
    67. J
    68. F
    69. M
    70. A
    71. M
    72. J
    73. J
    74. A
    75. S
    76. O
    77. N
    78. D
    79. 2018
    80. J
    81. F
    82. M
    83. A
    84. M
    85. J
    86. J
    87. A
    88. S
    89. O
    90. N
    91. D
    92. 2017
    93. J
    94. F
    95. M
    96. A
    97. M
    98. J
    99. J
    100. A
    101. S
    102. O
    103. N
    104. D
    105. 2016
    106. J
    107. F
    108. M
    109. A
    110. M
    111. J
    112. J
    113. A
    114. S
    115. O
    116. N
    117. D
    118. 2015
    119. J
    120. F
    121. M
    122. A
    123. M
    124. J
    125. J
    126. A
    127. S
    128. O
    129. N
    130. D
    131. 2014
    132. J
    133. F
    134. M
    135. A
    136. M
    137. J
    138. J
    139. A
    140. S
    141. O
    142. N
    143. D
    144. 2013
    145. J
    146. F
    147. M
    148. A
    149. M
    150. J
    151. J
    152. A
    153. S
    154. O
    155. N
    156. D
    157. 2012
    158. J
    159. F
    160. M
    161. A
    162. M
    163. J
    164. J
    165. A
    166. S
    167. O
    168. N
    169. D
    170. 2011
    171. J
    172. F
    173. M
    174. A
    175. M
    176. J
    177. J
    178. A
    179. S
    180. O
    181. N
    182. D
    183. 2010
    184. J
    185. F
    186. M
    187. A
    188. M
    189. J
    190. J
    191. A
    192. S
    193. O
    194. N
    195. D
    196. 2009
    197. J
    198. F
    199. M
    200. A
    201. M
    202. J
    203. J
    204. A
    205. S
    206. O
    207. N
    208. D
    209. 2008
    210. J
    211. F
    212. M
    213. A
    214. M
    215. J
    216. J
    217. A
    218. S
    219. O
    220. N
    221. D
    222. 2007
    223. J
    224. F
    225. M
    226. A
    227. M
    228. J
    229. J
    230. A
    231. S
    232. O
    233. N
    234. D
    235. 2006
    236. J
    237. F
    238. M
    239. A
    240. M
    241. J
    242. J
    243. A
    244. S
    245. O
    246. N
    247. D

    subscrever feeds