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Trapalhadas e trapalhões

por henrique pereira dos santos, em 31.03.23

Pensei em escrever um post sobre as trapalhadas que o governo inventou em matéria de alojamento local, depois lembrei-me que o mentor era António Costa, portanto, voz grossa e decisão inexistente será o padrão.

Para já empurrou o problema para cima das autarquias (é a forma mais eficiente de dizer que não recuou ao mesmo tempo que recua em toda a linha e, de caminho, com isto tudo, destroi a confiança dos agentes económicos no Estado) e continua sem explicar onde estão os dados e a informação que justificam um ataque descabelado contra um sector económico de sucesso e com um grande efeito multiplicador.

Estas trapalhadas, de que se alimenta António Costa, são possíveis porque somos uns grandes trapalhões na discussão de políticas públicas.

Uma senhora faz um artigo interessante e informativo sobre lares para velhos, um problema que está mais que identificado e de gestão muito difícil, entre outras razões por envolver muito dinheiro e muita gente sem capacidade de intervenção social e sem dinheiro (e que representam muito poucos votos, boa parte deles manipuláveis facilmente).

Sobre isso eu faço um post em que sugiro: 1) pagamento de um cheque lar directamente aos utilizadores, de maneira a permitir uma escolha mais alargada por parte dos utilizadores (o que aumenta a probabilidade de aparecerem novos lares, na medida em que o acesso ao financiamento depende mais da capacidade de responder aos utilizadores que do domínio de mecanismos de decisão pública); 2) Reforço da transparência na gestão dos lares (a proposta não é minha, mas da senhora que escreveu o artigo, limito-me a subscrevê-la), quer pela publicitação dos relatórios de fisclização, quer pela existência de um modelo de visitas aos utilizadores, por parte das pessoas que lhes são próximas, aumentando o escrutínio social sobre a gestão dos lares; 3) Simplificação das exigências para abertura e funcionamento dos lares, assente mais no escrutínio e fiscalização posterior que no cumprimento prévio de condições formais, consideradas essenciais por alguém que não os utilizadores e gestores.

Rapidamente, nos comentários, se esquece a realidade dos lares que existe, e pretende-se transformar a discussão num ataque à iniciativa privada, contrapondo uma defesa da intervenção directa do Estado.

Um apresenta um estudo que se limita a comparar diferentes modelos de propriedade privada, concluindo que os incentivos das "private equitity" geram um modelo menos eficiente que o de outros modelos privados, apresentando-o como um estudo que demonstra que os privados não servem para gerir serviços de saúde e conexos.

Outra fala em casos particulares de lares privados com maus resultados, esquecendo os inúmeros casos de lares públicos com maus resultados.

Claro que com um povo assim, que se entretém a discutir o sexo dos anjos, tendo pouco apreço pela informação factual e a realidade, qualquer espertalhão, como António Costa, consegue andar há semanas num ataque cerrado a um sector económico de sucesso e com um forte efeito multiplicador, com o argumento completamente delirante de que se o alojamento local desaparecer, por milagre, o preço das rendas baixa (Margarida Bentes Penedo tem a metáfora mais justa, António Costa anda a vender a ideia de que se proibirmos os Ferrari, o preço dos FIAT baixa).

Quando rebentar um problema mais ou menos generalizado nos lares (ou seja, quando as redacções dos jornais começarem a ir fazer reportagem para os lares de velhos, em vez de andar atrás das tendas que o governo semeia pelo país), António Costa vai repetir a dose, dizendo que a melhor solução para diminuir os preços dos lares e haver lugares para todos os velhos do país num lar de jeito será acabar com os hotéis: proibindo-os sem proibir, como no alojamento local (basta criar instabilidade suficiente com licenças para hotéis que são validadas todos os cinco anos) os seus donos irão reconverter os hotéis em lares por causa de benefícios fiscais de que iriam beneficiar, se tivessem os lucros que teriam como hotéis.


50 comentários

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De Elvimonte a 01.04.2023 às 01:06

"Rapidamente, nos comentários, se esquece a realidade dos lares que existe, e pretende-se transformar a discussão num ataque à iniciativa privada, contrapondo uma defesa da intervenção directa do Estado." (HPS)


Pelo menos da minha parte está completamente errado. Tão errado como quando propõe pagar aos proprietários de terrenos 100 euros por hectare para que aqueles os limpem, quando eu pago à volta de 100 euros por cada 1000 m2. A dar razão a quem diz que Portugal é Lisboa e o resto é paisagem. 


A evidência empírica não se compadece de posições dogmáticas e limita-se a reflectir a realidade. Se a realidade contradiz os dogmas, não é a realidade que está errada e isso não constitui um ataque à iniciativa privada ou ao que quer que seja. Esse tipo de presunções, por si só, é revelador do raciocínio inquinado e falacioso que lhe está na génese.


"Um [Elvimonte, eu próprio] apresenta um estudo que se limita a comparar diferentes modelos de propriedade privada, concluindo que os incentivos das "private equitity" geram um modelo menos eficiente que o de outros modelos privados, apresentando-o como um estudo que demonstra que os privados não servem para gerir serviços de saúde e conexos." (HPS)



Mais uma vez completamente errado. O estudo, publicado no Journal of American Medical Association (https://jamanetwork.com/journals/jama/article-abstract/2787558), diz claramente:
"Empirical data ... suggest that profit motives in health care result in lower-quality care, often at higher cost to taxpayers."

E em seguida afirma:
"This is especially true with private equity ownership, whose priority is short-term financial return to shareholders."
Estas afirmaçãoes não são da minha autoria, eu apenas me limito a citá-las.


Mas as conclusões seguintes, escritas anteriormente e até ao momento não negadas, mas porventura indigeríveis perante crenças dogmáticas, são de facto minhas:


i) nem tudo o que é privado é bom - a negação do principal dogma neo-liberal;
ii) os fundos privados, com uma gestão centrada no lucro imediato, no caso dos cuidados de saúde são ainda piores - uma das formas daquilo a que Lazonick e outros designam por "extraction capitalism";
iii) nem sempre a designada boa gestão, traduzida no aumento da rentabilidade e do lucro, conduz a melhores resultados para as pessoas - a negação de outro dos dogmas neo-liberais.


Apraz-me sempre constatar que, quando a mensagem não agrada, se cortem as pernas ao mensageiro, nem que seja virtualmente, envolvendo-o em "trapalhadas e trapalhões" que lhe são alheias.
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De henrique pereira dos santos a 01.04.2023 às 06:44

Deixe-me esclarecer um ponto.
Apesar da sua ligação apenas ir dar a um resumo do artigo, sendo o texto completo do estudo de acesso pago, eu tive o cuidado de ir procurar maneira de ter acesso ao estudo completo.
Por isso eu sei que o estudo não é nada daquilo que diz que é, é uma avaliação do efeito de um modelo de propriedade privada face a outros modelos de propriedade privada, que tira conclusões gerais a partir de análises estatísticas que, em momento algum, comparam a situação que existe em Portugal ou o que se passa nos lares de propriedade estatal.
Ou seja, aqui quem anda a defender dogmas não sou eu, o camarada é que se está nas tintas para o que se passa com a gestão colectiva da velhice, que é o tema do post, e está mais interessado em demonstrar que o Estado defende o bem comum contra o interesse privado, que é uma discussão que não me interessa nada.
O facto de pagar 10 mil euros por hectare para fazer controlo de combustíveis não diz nada sobre o acerto ou desacerto da minha proposta de pagamento de 100 euros por hectare, de três em três anos, a quem mantiver o mato abaixo de 50 centímetros, porque não diz nada sobre as suas circunstâncias e as circunstâncias de terceiros, para além de esquecer que o essencial da proposta não é o valor proposto (que passo o tempo todo a dizer que deve ir sendo ajustado em função dos seus efeitos).
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De Rodrigo Raposo a 02.04.2023 às 15:31

A fé mais poderosa que existe não é a Fé em Deus; em que se acredita sem provas. Mas a fé no Socialismo; em que se acredita com provas em contrário.
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De Elvimonte a 05.04.2023 às 01:21

Se tudo o que é privado é bom, algo com que discordo, se tudo o que estatal é mau, algo com que também discordo, se o Estado precisa de diminuir as despesas correntes, algo com que concordo, porque continua a comer à mesa do OE?
 
Porque não se demite do ICN (presumo que seja daí que aufere um salário), quanto mais não seja porque o ICN, por ser estatal, não serve para nada tratando-se apenas de mais uma entidade bur(r)ocrática que absorve dos contribuintes líquidos os recursos que o Estado devia libertar para a criação de riqueza na economia real? 


Será que a dissonância cognitiva não o deixa ser coerente ou será apenas mais um caso de "rules for the and not for me"? 


Um daqueles casos que, no limite, conduzem ao conceito de "international rules based order", o qual permite aos EUA terem mais de 800 bases militares espalhadas pelo mundo, uma delas em Al Tanf, na Síria, sem que isso constitua uma ocupação ilegítima e uma violação da sua integridade territorial?


Um daqueles casos em que o Tribunal Internacional de Justiça reconhece como legítima a declaração unilateral de independência do Kosovo sem que para tal tenha havido um referendo, dando preferência ao princípio de auto-determinação em detrimento da soberania territorial da Sérvia, Kosovo independente esse onde hoje se situa Camp Bondsteel, mais uma base dos EUA e, não fosse ela o seu braço armado, uma sede da NATO?


Também me vai dizer, tal como alguns iluminados, que o Euro não é o antigo Marco Alemão, quando a sua conversão na Alemanha foi efectuada à taxa de 1:1?


Também me vai dizer, tal como a secretária de imprensa da Casa Branca, que "We are deeply concerned about the transition of Brazil and China to national currencies when conducting mutual settlements. This is a violation of the rights of our citizens who rely on a stable dollar exchange rate on the world market."? 


Rules for the and not for me? International rules based order? Há ainda por aí alguns neurónios?


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De henrique pereira dos santos a 05.04.2023 às 06:33

"Se tudo o que é privado é bom, ..., se tudo o que estatal é mau"
Nunca me viu defender esta estupidez, portanto, se quer argumentar, argumente em relação ao que eu digo ou escrevo, não invente argumentos que não só nunca usei, como acho estúpidos.
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De Elvimonte a 05.04.2023 às 01:22

Os ocupantes da trincheira ideológica defronte da sua costumam mimosear-me com o epíteto de fascista. Da sua trincheira ideológica recebo o epíteto de camarada. É sabido que quem na rixa não toma partido acaba por apanhar 
dos dois lados. Mesmo assim, enquanto a coerência me permitir, continuarei a expor as falácias de uns e de outros, quaisquer deles cegos de arrogância, convencimento e presunção.
 
No link do paper que refiro anteriormente, apesar do abstract já não se encontrar disponível, continua lá como nota ao editor:
"... Empirical data ... suggest that profit motives in health care result in lower-quality care, often at higher cost to taxpayers. This is especially true with private equity ownership, whose priority is short-term financial return to shareholders."

(Gráficos comparativos de despesa agregada em saúde per capita e esperança de vida entre países colocam  os EUA numa posição indefensável, muito embora seja tudo privado.)


O pior cego é aquele que não quer ver. E, pior do que isso, nem sequer tem a coerência para se demitir da instituição estatal que, por aquilo que afirma, pelo facto de ser estatal é apenas um sorvedouro dos parcos recursos dos contribuintes líquidos.
 


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De henrique pereira dos santos a 05.04.2023 às 06:34

Trato-o a si, e a qualquer pessoa, por camarada que é um tratamento entre iguais. Não vejo razão para considerar que não se lhe aplica por ser mais ou menos que eu.

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