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Todos os dias

por henrique pereira dos santos, em 21.08.19

Todos os dias, por volta das sete da manhã, duas horas antes da abertura, já há uma bicha de mais cinquenta metros (dezenas de pessoas) à porta da Conservatória dos Registos Centrais.

Todos os dias os pais sabem que a escola funciona, mas sabem bem que funciona abaixo dos limites mínimos, só não entrando em ruptura porque o brio de muitos funcionários, dirigentes e professores as fazem funcionar.

Todos os dias os doentes e as pessoas que os acompanham sabem bem que os hospitais e centros de saúde funcionam, e são bastante seguros em relação ao que é urgente e prioritário, mas sabem bem que só o brio dos seus funcionários, enfermeiros e médicos os mantém a funcionar assim e à custa das dificuldades no que não é urgente ou absolutamente prioritário.

Todos os dias são dias de desespero para quem queira resolver qualquer assunto minimamente diferente com a segurança social.

Todos os dias, com excepção de algumas bolsas politicamente mais sensiveis, a administração pública funciona muito abaixo dos limites mínimos de eficiência e serviço às pessoas comuns, faltando sobretudo aos mais fracos e desamparados, apesar do brio de muitos dos seus funcionários (há de tudo, como na botica, incluindo pessoas absolutamente incapazes e sem o menor sentido de serviço público, mas a liberdade e poder que têm para funcionar como funcionam é uma responsabildiade das suas chefias, que se louvam na falta de recursos para justificar a sua falta de espinha).

Sim, as pessoas têm hoje um bocado mais de dinheiro que o que tinham antes deste governo, mas às que mais falta faz um Estado mais eficaz, dificilmente essa pouca de dinheiro compensa o abandono a que o Estado votou a sua administração, cortando recursos onde era mais fácil cortar, sem que se desse conta imediata de que era isso que se estava a fazer e das implicações que isso tinha na degradação dos serviços públicos e na vida dos desamparados.

A legislatura foi isto:

Reduz-se o horário de trabalho para 35 horas, prometendo que isso não teria implicações nem despesa acrescida, para no fim estar a contratar mais gente para tentar tapar o buraco criado, sem que pelo meio a imprensa fosse clara a dizer que era evidentemente um embuste dizer que se poderia cortar 12,5% da força de trabalho na administração pública sem que isso se traduzisse em degradação de serviços ou aumento de custos.

Investe-se os impostos de todos para comprar acções da TAP, com o argumento de que era preciso o Estado ter uma posição estratégica, para acabar a retirar a TAP do perímetro dó défice porque o Estado não manda nada na empresa, sem a imprensa dizer explicitamente que era um embuste a compra dessas acções.

Revertem-se concessões de transportes públicos prometendo mais investimento e melhor serviço e acaba-se com tempos de espera maiores, mais equipamentos parados, maior sujidade e recurso aos fundos azuis cujo destino depende inteiramente do despacho de um ministro, como é o caso do Fundo Ambiental, para tentar tapar os buracos no investimento, desviando da sociedade e da economia os recursos que existem para uma transição energética suave, justa e sem deixar de fora os desamparados.

Fecham-se escolas preferidas pelas famílias e mais baratas por aluno, tendo como resultado menos satisfação com o serviço prestado, mais custos e maior desequilíbrio territorial, sem que a imprensa fale do embuste da argumentação usada.

Guerreiam-se os operadores privados de saúde (o BE continua a dizer que o dinheiro gasto a aliviar a pressão sobre os serviços estatais, a custo mais baixo para o Estado que a prestação directa de cuidados, é um fardo como o SNS, sem que haja jornalistas que perguntem pelas contas e discutam os números concretos com quem diz estas barbaridades), para se chegar uma uma lei de bases da saúde que nem é carne nem é peixe, sem que a generalidade do jornalismo se entretenha a explicar o embuste de desenterrar uma guerra de alecrim e manjerona para evitar falar da degradação quotidiana dos serviços.

A legislatura tem sido isto: a vida quotidiana das pessoas é o que é, o governo e seu apoiantes dizem o que dizem, e a imprensa assobia para o lado, preocupada com petições sobre museus locais, acessos a casas de banho, declarações irrelevantes de pessoas que não representam ninguém e contabilizações de quem ganha ou perde em cada um destes jogos florais que a imprensa se não organiza, pelo menos arbitra.

Todos os dias são bons dias para depressões.


1 comentário

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De Isabel a 21.08.2019 às 12:54

  • A propósito, deixo o link do relatório de um estudo realizado pelo Reuters instituto em 38 países, onde se vê na página 21 que Portugal é, depois da Finlândia, o país onde a população mais confiança tem nos media. A partir da pág 102 vem o relatório sobre Portugal. 
Depois de ler as conclusões do estudo, é difícil acreditar que a situação possa melhorar a curto ou mesmo médio prazo.


https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/sites/default/files/2019-06/DNR_2019_FINAL_0.pdf?base=952&campaignId=9057&segmentId=9432&shootId=9181 (https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/sites/default/files/2019-06/DNR_2019_FINAL_0.pdf?base=952&campaignId=9057&segmentId=9432&shootId=9181)


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