por Vasco Lobo Xavier, em 04.05.18
Se não considerasse José Sócrates personagem tão execrável quase que tinha pena do homem. Está o desgraçado sossegadamente em casa, espojado no sofá, quiçá de fato de treino avermelhado, provavelmente mirando as meias rotas e certamente sonhando com os tempos áureos em que as dificuldades financeiras se resolviam com um simples telefonema e uma fotocopiadora e as suas relações sociais chegavam às esposas de banqueiros…, e cai-lhe em cima um batalhão concertado de amigos socialistas aos berros: pimba!... Tau!... Toma!... Vai buscar!...
Ferra-lhe as canelas o Galamba, o tal que a inocente e crédula Câncio tanto tinha gabado e aconselhado o namorado a apoiar, enquanto discutiam a aquisição de casas de milhões e férias de milhares! Sai à liça o Carlos César, essa nulidade incomensurável cuja existência, por si só, deveria envergonhar qualquer país minimamente decente, e toca a desferir facada atrás de facada sobre o antigo estudante parisiense (“Tu quoque, Brutus?” – terá Sócrates pensado, em francês no original). O açoriano andou nisto dias a fio, até que um dia alguém o levou a sério ou percebeu o que ele andava a tentar dizer.
Com aquela organização maquiavélica em que o PS é exímio (nessa área e em comparação com os socialistas, os comunistas são uns menininhos de coro), aparece de seguida Medina a malhar-lhe também forte e feio. Porque isto das quotas é muito querido aos socialistas politicamente correctos, entra igualmente em cena Ana Cristina Mendes e põe-se a ferrar-lhe a jugular com toda violência, sem largar, a fazer sangue em barda, que espicha em todas as direcções. Augusto Santos Silva, com um animado e indisfarçável brilhozinho nos olhos, lança farpa sobre farpa sobre o desgraçado tombado.
Tudo isto devidamente concertado, tudo muito bem organizado, tudo por táctica política, tudo sem quaisquer escrúpulos, como só o PS sabe fazer e faz sempre tão bem. Nada tinha mudado relativamente ao Sócras, entretanto, e as imagens televisivas dos interrogatórios da semana passada ou a proximidade do congresso do PS não justificam nem a canalhice nem a inversão de comportamentos desta malta que se dizia tão amiga e esteve tão calada e quieta até agora. É só táctica e opção política.
E o desgraçado, de quem a mulher do amigo dizia que seria quem iria desgraçar o casal, estava por estes dias simplesmente na sua palhota, ao Parque das Nações, de comando na mão, embora a consciencializar-se de que já sem comando algum sobre as suas amotinadas tropas, sem guito, a viver pobre e preguiçosamente os seus ódios e taras a partir do rendimento proporcionado generosamente pelos contribuintes portugueses, sem imaginar que o mundo dos seus amigos lhe iria cair em cima. Tendo caído em si, cai também no erro de se demitir da agremiação socialista, o que vai abrir portas a que qualquer um lhe vá desferir a patada final enquanto é tempo (não tarda nada – todos nós precisamos de viver e alguns precisam do PS –, até o Paulo Campos, o Mário Lino ou o Silva Pereira opinarão com nojo sobre o homem e a sua "miserável" actuação).
Com o cinismo que se lhe conhece, António Costa mostra-se surpreendido com a demissão do seu antigo n.º 1.
Se não considerasse José Sócrates personagem tão execrável, quase que tinha pena do homem. Felizmente não tenho: ele tem o que merece.