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Talvez repensar

por henrique pereira dos santos, em 20.07.24

Jaime Nogueira Pinto tem hoje, no Observador, um artigo muito interessante, também sobre a revolução que estará a ocorrer no Partido Republicano, nos Estados Unidos.

"O processo é tão velho como o mundo: para se criar um clima de ódio em relação a um inimigo a eliminar é necessário retirar-lhe a humanidade, despojá-lo de afectos, pintá-lo como infra-humano ou supra-humano, como animal inferior ou demónio todo-poderoso, como alguém que não é “nós”. Isto pode fazer-se em relação a um indivíduo ou a um colectivo – os judeus, os cristãos, os muçulmanos, os asiáticos, os negros, os brancos; ou a outras categorias nacionais, tribais ou mesmo político-sociais, como os comunistas, os fascistas, os revolucionários, os reaccionários, os burgueses. ... “La Vertu, sans laquelle la Terreur est funeste; La Terreur, sans laquelle la Vertu est impuissante.”"

Li o artigo quando já estava a pensar escrever um post sobre a quase única coisa de que discordo a sério de Carlos Guimarães Pinto, o peso que atribui à corrupção no seu discurso.

Eu compreendo que, politicamente, é muito mais eficaz falar de corrupção que falar da simplificação de processos de decisão, que é onde acaba a desaguar o discurso racional sobre corrupção (a versão abrutalhada do discurso sobre corrupção acaba em discussões sobre penas, perseguições, justiça e essas coisas todas que, essencialmente, podem servir para assinalar a virtude superior de quem fala, mas são largamente inúteis para limitar a corrupção).

maislib.jpg

Este boneco produzido pelo Instituto + Liberdade é bem ilustrativo das dificuldades associadas ao combate à corrupção por via judicial (e mais dificuldades ainda existiriam se alguém resolvesse dar ouvidos aos fantasmas de António Barreto que, do alto da sua torre de marfim envolta em nevoeiro, acha que as escutas deveriam simplesmente ser proibidas para evitar eventuais abusos no seu uso).

Pretender acabar com a corrupção é o mesmo que pretender acabar com a pobreza, com a maldade, com o oportunismo, com o abuso, em resumo, está na linha da substituição dos maus pelos bons que historicamente justificam todas as arbitrariedades e perseguições de grandes grupos sociais.

A corrupção é uma resposta social a regras dominantes, tal como o roubo, o assassinato, e todos os outros crimes e, tal como o resto da criminalidade deve ser limitada por via judicial, com certeza, mas sobretudo por melhores regras, isto é, regras que são feitas para as pessoas concretas que existem, e não para criar melhores pessoas.

Criar pessoas melhores é uma tarefa das famílias e dos pequenos grupos sociais de proximidade, não é uma tarefa que caiba ao Estado, a esse já lhe chegam as tarefas de manter a violência em níveis aceitáveis, reequilibrando o poder discricionário dos mais fortes sobre os mais fracos, de tal forma que a generalidade das pessoas consiga considerar minimamente justa.

O que Jaime Nogueira Pinto sugere, neste artigo, é que as coisas estão a mudar em muito lado porque há demasiada gente a achar que a forma como o bem nos está a ser imposto está para lá do que é justo.

Talvez valha a pena olhar para este ponto de vista com alguma atenção.


16 comentários

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De Francisco Almeida a 21.07.2024 às 14:38

Discordar ou, pelo menos, desvalorizar simultaneamente Jaime Nogueira Pinto e Henrique Pereira dos Santos é, no mínimo, atrevimento E sei bem que a ignorância é atrevida. Contudo recorro a Aristóteles que, nas ciências utilitárias, escreveu três livros: Ética, Economia e Política. Não será sequer preciso ler Aristóteles nem reler lições de filosofia, para diagnosticar o que está em falta nas sociedades ocidentais em geral e em Portugal em particular. E, desculpem-me os citados autores, mas nada ou muito pouco tem a ver com a procuradoria-geral da República.
Na administração da justiça, a percepção de "demasiada gente" não é apenas que a "imposição do bem" está "para lá do que é justo". Diria que não é tanto a restrição de direitos e garantias mas mais o enorme desequilíbrio entre meios utilizados e resultados obtidos.
Algo de semelhante se passa "mutatis mutandis" nas administrações da saúde, escolar e dos transportes que só não têm a visibilidade que é dada à justiça, porque a comunicação social , sabe-se lá porquê, não está para aí virada. E, recentemente, o problema "explodiu" onde é mais sensível, a segurança. Finalmente tornou-se impossível escamotear o que vinha sendo ocultado, até em em relatórios oficiais, para já nas cidades do Porto e de Lisboa.
Desde sempre, pelo menos desde o contrato feudal que a história regista uma permanente tensão entre segurança e liberdade. Durante quanto tempo mais, será possível manter a actual situação em que as liberdades de minorias retiram a segurança às maiorias? E já ninguém, fora da bolha e até alguns dentro desta, acreditam que o sistema possa ser corrigido pela via judicial. Esta última, diferentemente do que parecem acreditar Jaime Nogueira Pinto e HPS, tende a tornar-se marginal.

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