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«O mau romance é aquele que conta uma história»
Pomar e Lobo Antunes roçavam por vezes o inaudível, de quando em quando ignoravam mesmo o microfone. "É natural que as vozes se ouçam mal porque não é fácil para nós estar aqui. Estou a partilhar com pessoas que não conheço sobre uma pessoa que eu amava", esclareceu o escritor. Antes, já ele confessara sobre esse amor sentido pelo autor de Alexandra Alpha: "Não sei distinguir entre o amor e amizade." Ele e o amigo sempre de braço dado pelas ruas, não mencionando nunca os seus livros ("os livros são como o amor, faz-se mas não se fala") mas discutindo futebol, Cardoso Pires esclarecendo: "Não sou do Benfica, sou do Nené", e também "para ser amigo de um artista tenho de o admirar".
A amizade entre Cardoso Pires e Pomar nasceu nos bancos do Liceu Camões, que abandonavam para espreitar as raparigas à saída das aulas da António Arroio. Com Lobo Antunes, o primeiro encontro deu-se no aeroporto: "Ele disse-me: 'Ouvi dizer que te foram dizer que eu dizia mal de ti. Não é verdade.' Ficámos instantaneamente amigos de infância" e, depois, "nunca tivemos a sombra sequer de uma discussão."
Assim iam traçando, umas vezes mais a custo do que outras, o retrato do amigo: o Zé escrevendo na sua mesa triangular de uma varanda sobre a praia de Caparica, o Zé de uma generosidade imensa para com as pessoas de quem gostava, o Zé que, ao contrário de Lobo Antunes, detestava comida de avião e apreciava "chocos, ovas, coisas assim", o Zé que gostava de andar à pancada, "de uma coragem física imensa", o Zé extremamente solitário entre a multidão, lá dentro "um núcleo de trevas impartilhável".
Foi aliás a solidão que deu o mote para a outra lição recebida, a que se entremeava pelas memórias e tornou a tarde ainda mais singular, uma aprendizagem sobre a solitária tarefa oficinal da criação, seja ela um quadro ou um romance; desenhar, apagar e desenhar de novo; escrever, apagar e escrever de novo. O pintor e o escritor. Sempre sós, mas ali naquele momento juntos. Como antes, quando eram três. (Ler mais aqui)
Com coordenação da Filipa Melo, continua na FLAD o ciclo «Asas Sobre a América». Aqui fica o programa das próximas festas, a decorrer no Auditório da Fundação, Rua do Sacramento à Lapa, 21. (Fotografia de Saul Bellow retirada do New York Times)
SAUL BELLOW
por Rui Zink
25 de Setembro, às 18h30
EZRA POUND
por Manuel António Pina
20 de Novembro, às 18h30
RAYMOND CHANDLER
por Francisco José Viegas
11 de Dezembro, às 18h30
Regressemos, se tal é o teu desejo, à nossa varanda.
Mas o Verão terminou quando a abandonámos sem as mãos dadas nessa última vez. Não o sentes? Sopra uma brisa de quando em quando gelada…ou então…talvez seja apenas minha esta sensação de ir arrefecendo de dentro para fora como quem se enruga ao invés.
«A pessoa certa no tempo errado no lugar certo», estava aqui a pensar. Já me disseram que penso demasiado, como todos os cobardes. Foi alguém sem essa delicadeza terna que logo nos afaga desde o instante em que chegas.
Na varanda. Assim seja. Voltemos aí onde as horas encurtam enquanto as sombras alongam. Alguém segreda, outro alguém sorri e a brisa, só para mim de quando em quando gelada, te aquece os cabelos.
Ontem, na varanda que nos segurava, os teus olhos traziam um mar de beijos. Palavra sim, palavra não, beijavas-me. Não havia estrelas porque tu tinhas o brilho maior. Não me lembro da cor da tua blusa, nem da tua gravata. Provavelmente vi liso onde haviam riscas. Mas o céu estava bege. Perdi o sono. Perdi o tempo. Perdi os olhos. Perdi a boca. Porque tu, ao contrário do que pensas, mordeste-me. Os pombos feitos de papel e ali emoldurados foram testemunhas. As minhas palavras ainda estão adormecidas. Já sabes qual a cor dos meus olhos? São da cor dos beijos que me deste. O teu beijo é uma felicidade que arde.
Ontem, na varanda que nos segurava, as tuas mãos traziam um mar de palavras. Traziam amor, traziam desejo, traziam grito.
Vamos hoje para a varanda?
A Porto Editora garante que recusou o livro de estreia da jornalista Sherry Jones apenas com base num critério de qualidade e, para o comprovar, reproduz em comunicado o excerto de um parecer em inglês, de autoria desconhecida. Quando a Random House decidiu não publicar o romance sobre a história em torno de Maomé e A'isha, fê-lo argumentando com «a segurança do autor, dos empregados da Random House, livreiros e quaisquer outros envolvidos na distribuição e venda do romance».
A escolha de publicar ou não um livro, seja por que motivo for, é obviamente e em última instância única e exclusivamente dos seus responsáveis. Mas se nos EUA assumiram o receio das repercussões e enfrentaram os bois pelos cornos, em Portugal escudam-se no valor literário da obra. Má escolha: Poucos acreditarão na mensagem (basta vermos os livros que lideram os tops) e a percepção inevitável será a de que a editora portuguesa mascara a verdadeira razão por detrás da decisão. «Mas eles estão a ser sinceros», irão contrapor alguns (e os próprios.) Até podem estar. Mas ser é ser percebido, como já dizia o filósofo.
O Eduardo Pitta teve a gentileza de me responder ao repto a propósito da Buchholz. Li o seu Intriga em Família, mas confesso que não me recordava desta passagem que reproduz..
«A Livraria Buchholz, lugar de referência do nosso (pequeno) universo cultural encontra-se em situação de pré-falência. Agradece-se a todos quantos a frequentaram que a voltem a visitar, de vez em quando. Comprar um livro que não se encontra em mais lado nenhum pode, eventualmente, ajudar a reerguê-la. Agradece-se que passem esta informação aos amigos e interessados».
Ao ler esta mensagem e ao contrário de ti, caríssimo João, apercebi-me de que não tenho uma única boa recordação da Buchholz. O ar de pedantismo intelectual daquelas senhoras sempre me enervou, desde a primeira vez em que lá entrei à procura do Quarteto de Alexandria e me foi respondido que comprasse a edição original, como se a tradução não fosse excelente ou quem lesse em português um cidadão de 2ª classe; O esperar meses a fio por um livro que a Amazon me entregaria em três dias (como aconteceu não há muito tempo com o Memories, Dreams, Reflexions de Jung) tirou-me do sério em várias ocasiões até desistir finalmente de ali fazer encomendas. E finalmente os preços, com aqueles câmbios livreiros tão bizarros quanto o preço de um barril de petróleo. Tudo isto afugentava-me a cada visita.
Tens contudo razão numa coisa: O «nosso universo cultural» de que fala a mensagem mudou, alargou e animou. Hoje, as FNACs, Byblos, Bertrands e Bulhosas, ou mesmo livrarias "alternativas" como a Ler Devagar e a Eterno Retorno em Braço de Prata, sabem que é imprescindível alimentar os seus livros com "vida": Espectáculos, apresentações, tertúlias...A Buchholz não o fez e deixou-se ficar, de pince-nez aristocraticamente colocado, recebendo os seus visitantes em pose de bibliotecária mal disposta. Agora, se for à falência, a culpa é só dela. Dos leitores como tu e eu não é com certeza.
Já agora, gostava de ouvir sobre isto o Eduardo, a Isabel, o José Mário, o Pedro e o Francisco. E mais quem queira é evidente e desde que me linkem. Estou a atravessar uma crise de protagonismo.
Partilho com o Pedro Picoito (e com o Paulo Cunha Porto, já agora) um dos meus «livros da vida». E foi alertado por ele que soube do centenário da edição original de O Homem Que Era Quinta-feira.
«The poor have sometimes objected to being governed badly; the rich have always objected to being governed at all», escreve-se aí. Cem anos depois, it still makes sense. Afinal, como também diz a páginas tantas Gabriel Syme: «Always be comic in a tragedy. What the deuce else can you do»?
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