Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A ética é um exercício diário, tem de ser cumprida no quotidiano. Só assim pode afirmar-se plenamente numa sociedade. Se uma pessoa não respeita o próximo, não cumpre as leis da convivência, não paga os seus impostos ou não obedece às regras do trânsito, não é ética. Num primeiro momento, pequenas infrações isoladas parecem não ter importância. Mas, ao longo do tempo, a moral da comunidade é afectada em todas as suas esferas. Chamo a isso o círculo ético. Uma acção interfere com outra e os valores morais vão perdendo força, vão-se diluindo. Para uma sociedade ser justa, o círculo ético é essencial.
Peter Singer
«Para o jornalista, tudo o que é provável é verdade». Trata-se dum axioma estupendo, como tudo o que Balzac inventa. Reflectindo nele, nós percebemos quantas falsidades se explicam e quantas arranhadelas na sensibilidade se resumem a fanfarronices e não a conhecimento dos factos. Em geral, o pequeno jornalista é um profeta da Imprensa no que toca a banalidades, e um imprudente no que se refere a coisas sérias. Quando Balzac refere que a crítica só serve para fazer viver o crítico, isto estende-se a muitas outras tendências do jornalista: o folhetinista, que é o que Camilo fazia nas gazetas do Porto (...). Eu própria não estou isenta duma soma de articulismos, de recursos à blague, de graças adaptáveis, de frequentação do lado mau da imaginação, de ridículos, de fastidiosos conselhos, de discursos convencionais, de condenações fáceis, de birras imbecis, de poesia de barbeiro, de elegâncias chatas, de canibalismo vulgar, de panfletismo «bom cidadão». Quando não sou nada disso, sou assunto para jornais, mas não sou jornalista.
Agustina Bessa-Luís
La musique souvent me prend comme une mer !
Vers ma pâle étoile,
Sous un plafond de brume ou dans un vaste éther,
Je mets à la voile ;
La poitrine en avant et les poumons gonflés
Comme de la toile,
J'escalade le dos des flots amoncelés
Que la nuit me voile ;
Je sens vibrer en moi toutes les passions
D'un vaisseau qui souffre ;
Le bon vent, la tempête et ses convulsions
Sur l'immense gouffre
Me bercent. D'autres fois, calme plat, grand miroir
De mon désespoir !
Charles Baudelaire
A crítica é menos eficaz do que o exemplo. É de considerar se a grande sugestão para usar da crítica nos nossos tempos e que põe em causa todos os valores consagrados, não é o resultado duma anemia profunda do acto de vontade de toda uma sociedade. Todos temos consciência de como o exemplo se tornou interdito, como o indivíduo, na sua excepção perturbadora, é causa de mal-estar. Dir-se-ia que a fraqueza, a breve virtude, a mediocridade, de interesses e de condições, têm prioridade sobre o modelo e a utopia. A par desta dimensão rasa do despotismo do demérito, levanta-se uma rajada de violência. É de crer que a violência é hoje a linguagem bastarda da desilusão e o reverso do exemplo; representa a frustração do exemplo.
Agustina Bessa-Luís
A parte nova da cidade é a favorita dos jovens modernos, que também frequentam o «Calhambeque» (à Av. de Roma), onde é preciso um passaporte para entrar, e o «Pop Clube», inaugurado em Agosto de 1966, mais tarde «Primorosa de Alvalade» (à Av. Estados Unidos da América). No topo da Avenida da Liberdade fica a «Galeria 48», onde actuam a brasileira Maysa, Simone de Oliveira, Carlos do Carmo e o Thilo's Combo, entre outros. Ao final da noite, os mais boémios misturam-se com a fauna do Parque Mayer no «Cantinho dos Artistas» e arriscam um caldo verde no mal-afamado «Cova do Galo», com boîte na cave (Parque Mayer), onde actua o dono, o pianista Eugénio Pepe. Em noites mais criativas dá-se um pulo até ao «Hot Clube» (Pr. da Alegria) para ouvir jazz. A cinco minutos fica o «Ritz Club» (R. da Glória), cabaré duvidoso, perto do bordel de Madame Blanche, já demasiado bas-fond para a maior parte da juventude ié-ié.
A 13 de Maio de 1967 abre na Lapa o «Relógio» (R. do Olival), boîte elitista do artista plástico Francisco Relógio e que em 1970 dará lugar ao famosíssimo «Stone's» de Manecas Mocelek. É justamente Mocelek que em Maio de 68 faz uma revolução na noite da alta-sociedade lisboeta ao tomar conta do «Ad Lib» (R. Barata Salgueiro) no sétimo e último andar de um prédio acabado de estrear. «Ad Lib», da expressão latina «ad libitum», que significa «à vontade» - mas apenas para os amigos ou amigos dos amigos do proprietário, João de Castro. Pedro Leitão, pintor retratista próximo do jet-set internacional, assina a decoração de estilo oriental: estátuas indianas (made in Portugal), cadeiras de encosto semicircular forradas a pele, paredes e chão encarnados. A colaboração já não é uma estreia para a dupla Leitão-Mocelek, que dois anos antes criara o espaço mais emblemático de Cascais, o «Van Gogo». (Joana Stichini Vilela e Nick Mrozowski, LX60)
(Bica)
[...]
não rodarás nas rotas como dantes,
quer murmures, escrevas, fales, cantes,
mas apesar de tudo ainda és nossa,
e crescemos em ti. nem imaginas
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, vãs aspirinas,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vidas novas repentinas.
enredada em vilezas, ódios, troça,
no teu próprio país te contaminas
e é dele essa miséria que te roça.
mas com o que te resta me iluminas.
Vasco Graça Moura, Lamento para a língua portuguesa
Diz-se que a China entrou no século XX ainda mergulhada no seu esquema e mentalidade feudais. Esta circunstância, a falta de uma Idade Moderna, «renascentista», humanista, iluminista, explicaria a aterradora desumanidade revelada nas mudanças políticas e sociais que depois empreendeu.
Mas nem tudo por ali entroncava na mesma linha de instinto.
Não sendo eu uma acabada feminista, sinto-me particularmente solidária com o espírito feminino, desde sempre incompreendido pelos protagonistas culturais maioritários de cada momento. Por isso me impressionaram tanto a discreta história de sofrimento e o legado escrito de Kai-hui, a segunda mulher de Mao, abandonada por este aos vinte e seis anos - com três crianças nos braços - e executada aos vinte e nove às mãos das forças governamentais, pelo crime de ser ex-mulher do «bandido» comunista:
“I was born extremely weak, and would faint when I started crying … At the time, I sympathised with animals … Every night going to bed, horrible shadows such as the killing of chickens, of pigs, people dying, churned up and down in my head. That was so painful! I can still remember that taste vividly. My brother, not only my brother but many other children, I just couldn’t understand them at all. How was it they could bring themselves to catch little mice, or dragonflies, and play with them, treating them entirely as creatures foreign to pain?
If it were not to spare my mother the pain—the pain of seeing me die—if it were not for this powerful hold, then I simply would not have lived on.
I really wanted to have a faith!…”
Sobre as suas convicções políticas, de início concordantes com as de Mao, escreve:
“Now my inclination has shifted into a new phase. I want to get some nourishment by seeking knowledge, to water and give sustenance to my dried-up life … Perhaps one day I will cry out: my ideas in the past were wrong!"
E termina com este grito desesperado:
"Ah! Kill, kill, kill! All I hear is this sound in my ears! Why are human beings so evil? Why so cruel? Why?! I cannot think on! I must have a faith! I must have a faith! Let me have a faith!!”
Se puserem numa balança, de um lado a utilidade real das ciências mais sublimes, das artes mais nobres, e do outro a utilidade das artes mecânicas, verão que os valores atingidos não foram estabelecidos segundo critérios que tivessem em conta os respectivos méritos, porque os homens empenhados em fazer-nos crer que somos mais felizes conseguiram sempre mais louvores do que aqueles que se esforçaram para que o fôssemos de facto. (Diderot, na Encyclopédie Méthodique)
Nada o muy poco sé de mis mayores
portugueses, los Borges: vaga gente
que prosigue en mi carne, oscuramente,
sus hábitos, rigores y temores.
Tenues como si nunca hubieran sido
y ajenos a los trámites del arte,
indescifrablemente forman parte
del tiempo, de la tierra y del olvido.
Mejor así. Cumplida la faena,
son Portugal, son la famosa gente
que forzó las murallas del Oriente
y se dio al mar y al otro mar de arena.
Son el rey que en el místico desierto
se perdió y el que jura que no ha muerto.
Jorge Luis Borges, Los Borges
Never give all the heart, for love
Will hardly seem worth thinking of
To passionate women if it seem
Certain, and they never dream
That it fades out from kiss to kiss;
For everything that's lovely is
But a brief, dreamy, kind delight.
O never give the heart outright,
For they, for all smooth lips can say,
Have given their hearts up to the play.
And who could play it well enough
If deaf and dumb and blind with love?
He that made this knows all the cost,
For he gave all his heart and lost.
W.B. Yeats
(Rossio)
Como é bem sabido, a Baixa é um território de aluvião, decorrente do sucessivo assoreamento da ribeira ou córrego que corria do actual Rossio em direcção ao estuário do Tejo. Este fio de água, por certo mais vivaz nas invernias, já estava bastante reduzido na sua amplitude à data da conquista de Lisboa, em 1147, como refere o cruzado R., na célebre carta a Osberno. No entanto, era ainda atravessado pelo menos por uma ponte que permitia a ligação entre as duas margens. Esta ponte, dita da Galonha, irá durar até ao definitivo encanamento da parte final do córrego, então já pouco mais do que um esgoto malcheiroso a céu aberto, que dará origem à parte terminal da então chamada Rua Nova d'El-Rei, ou, mais prosaicamente, Rua dos Ourives do Ouro, desde que os mestres deste ofício nela se instalaram. (José Sarmento de Matos e Jorge Ferreira Paulo, Um sítio na Baixa)
De tanto pensar na morte
Mais de cem vezes morri.
De tanto chamar a sorte
A sorte chamou-me a si.
Deu-me frutos duradoiros
A paz, a fortuna, o amor.
As musas vieram pôr
Na minha fronte os seus loiros...
Hoje o meu sonho procura
Com saudade a poesia
Dos tempos em que eu sofria...
— Que triste coisa a ventura!
Pedro Homem de Mello, Ironia
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
Concordo inteiramente. Outro cancro é a REN, hoje ...
O Anónimo das 10:05 é o tal a quem já nem as penas...
Artigo do Observador hoje 4 de Dezembro,André Azev...
A política identitária nas escolas foi um ponto de...
" meras diferenças de pontos de vista sobre a gest...