Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Eu percebo que tenhamos uma Igreja habituada a viver entrincheirada, receosa de propor caminhos, justificada pelos seus inimigos internos e externos. No Ocidente, têm sido décadas de encolhimento perante um poder arrebatador do Grande Leviatan que tudo vem secando à volta, até a fecundidade das suas gentes. Repare-se que nas últimas décadas todas as guerras do catolicismo vêm sendo perdidas: dessacralizou-se o casamento que passou a ser tudo e o seu contrário perante a lei. Assim se enfraqueceu a Família natural construtora do bem-sucedido Ocidente e que era terreno fértil para a evangelização, para a passagem dos valores cristãos. Com o advento do hiperindividualismo, em paralelo com o consequente Inverno Demográfico, legitimou-se o aborto e a morte assistida. A religião foi remetida ao foro privado para não ferir susceptibilidades, o ditame da moralidade, do bem e do mal, também – tudo é relativo, a Verdade, que é o que o cristianismo tem a propor, esconde-se envergonhada.
É este também o retrato da Igreja portuguesa, acossada e amedrontada, que, durante uma semana, neste canto da Europa laica e materialista, se atreverá a ser o foco de todas as atenções. Coube-lhe liderar esta gigantesca operação logística de receber centenas de milhares de Jovens de todo o mundo, a oferecerem-se à conversão. Cabe-lhe, por consequência, difundir uma forte mensagem, não só para todos os milhares de resistentes peregrinos que ainda procuram um sentido de vida maior que o seu umbigo, mas para todos aqueles hesitantes que não se atrevem a passar do Páteo dos Gentios.
Há dias, a propósito de tudo isto e dessa oportunidade de conversão que a Jornada Mundial da Juventude proporciona, num almoço entre amigos, um deles, perguntava qual a mais importante mensagem de Jesus que verdadeiramente interessará aos jovens nestes tempos de acelerada descristianização e niilismo. Como pode a Igreja Católica afirmar-se na ruidosa cidade da abundância do século XXI?
Entre várias propostas lançadas na mesa pelos convivas, da mensagem de Vida Eterna, à revolucionária revelação da Misericórdia (Amai-vos uns aos outros…) eu defendi a da Liberdade. Receio que numa sociedade onde impera o bem-estar e se reclama o prazer como um direito, o anúncio da Vida Eterna não tenha grande sucesso. Já o Novo Mandamento do “Amai-vos como irmãos”, que chegou a ser um traço reconhecido nas primeiras comunidades cristãs (“vede como eles se amam!”), temo que tenha sido banalizado pela confusão gerada à volta do conceito de Amor, hoje tido como algo ligado ao prazer erótico e psicológico, assim difundido pela minha geração nos anos sessenta. Um dia as comunidades recuperarão o seu verdadeiro sentido, o da Compaixão – mas não vai ser no meu tempo.
Ora, quanto a mim, a principal mensagem que o Cristianismo tem para oferecer, que obviamente se interliga com as anteriores, é a da Liberdade, mas com maiúscula. Porque julgo que, num tempo como o actual, com tantas formas de alienação a escravizar as almas crédulas, apoucando-lhes as existências, a Liberdade, no sentido de consciência livre e responsável, é a grande outorga de Jesus Cristo que convém salientar. Se, como afirma Bob Dylan estamos condenados a ser servos (Gotta Serve Somebody - Slow Train Coming, 1979), que sirvamos o Senhor Jesus que nos desimpede os caminhos e principalmente a alma.
Para alcançar essa alforria não é necessário seguir-se à risca o exemplo de São Francisco de Borja, Duque de Gandia, que, perante a profunda dor e desapontamento com a morte da bonita e instruída Rainha Isabel de Portugal (filha de D. Manuel I e mulher de Carlos V de Espanha), que tanto admirava, afirmou: “não mais servirei senhor que pereça”. A partir de então devotou a sua vida por inteiro aos assuntos do seu Deus.
Com Jesus Cristo aprendemos onde colocamos o coração a criar valor, a reconhecer as paixões que nos podem escravizar e diminuir, ou a única que que faz de nós verdadeiros e autónomos filhos de Deus. Que a cada um conhece como único, “Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Portanto, não temais: valeis muito mais do que todos os passarinhos” (Lucas 12:7). Ou ainda, “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para as vossas almas. (Mateus 11:29-30).”
É esta descoberta de Liberdade como caminho que me convenço ser a mais importante mensagem a outorgar aos jovens do nosso tempo. A Liberdade de quem, participando no Mundo, não o carrega às costas, nem às suas normas e atracções se deixa subjugar. De beleza, de carreira, de haveres, de amores, de ansiedades, de orgulhos, dos medos, da expectativa dos outros, enfim, de dependências grandes e mesquinhas. É esta Liberdade que está ao alcance de todos e que urge transmitir aos nossos jovens. Irão certamente gostar de saber que o seu Senhor (no sentido medieval do termo) não é deste Mundo, e que isso lhes permite olhar as coisas do Mundo com outros olhos – fazer escolhas de felicidade. Serem protagonistas das suas próprias vidas.
É esse o feito da conversão, construída em comunidade de crentes. Com muita oração – a barulheira mundana dificulta a prática da Oração que com o seu poder a todos eleva, dignifica, aproximando-nos de Deus. É assim que adquirimos um sentido proporcional da importância das coisas do Mundo. Que nos conduz à Liberdade de nele agir. Não de caminhar sobre as águas, nem de voar pelos céus, mas percorrer esta vida de pés bem assentes no chão, com a cabeça erguida e o coração… consolado.
Que a JMJ inspire muitas conversões apaixonadas pela pertença à Igreja de Cristo, são os meus votos.
Publicado originalmente no Observador
A propósito da nomeação de Américo Aguiar a Cardeal e duma frase infeliz por si proferida numa entrevista recente faz-me muita impressão a quantidade de cristãos que nas redes sociais se sentem legitimados a fazer julgamentos sumários e tomar partido em assuntos delicados e complexos da (sua?) Igreja, com uma arrogância de pasmar.
Foi por isso que me lembrei do meu pai que foi de tal modo contra o Concílio Vaticano II que só perto do fim da vida voltou a ir à Missa. Mas curiosamente, à parte dum ou outro reprimido sussurro à frouxidão dum ou doutro Bispo (a história repete-se…), nunca o ouvi nem dele li qualquer opinião sobre o assunto, que guardava só para si por respeito à Santa Madre Igreja. E talvez, suponho eu, para não armadilhar o crescimento dos filhos nessa pertença que nunca renegou.
Mas o curioso é que hoje qualquer bicho caruncho, cheio de certezas, tem uma opinião histriónica sobre as opções da Hierarquia e do Vaticano, que da sua trincheira desfralda aos 4 ventos nas redes sociais, cada vez mais uma tasca mal frequentada.
Viva a liberdade de opinião mas cuidado não tropecem nela.
Estranho (ou talvez não) é verificar a animosidade de uma certa elite intelectual que se arroga defensora das liberdades e da igualdade em teoria, mas que fica profundamente acossada com a sua prática no concreto. Será certamente uma maçada para ela ver Lisboa invadida por jovens em festa, vindos de todos os cantos do mundo, de diferentes línguas, raças e nações, a encher Lisboa por amor de Jesus Cristo e à Sua Mensagem, apenas com uma linguagem comum: a generosidade de que sejam capazes, a sua Fé, energia e poder de reivindicação que lhe é intrínseca. Julgo que esse rancor se explica pelo temor e incompreensão daqueles que nunca experimentaram a Liberdade profunda que nos devolve uma Fé sincera e cultivada. Afinal é com os joelhos no chão e os olhos no céu que nos redimimos e libertamos, e isso, hoje como há 2000 anos, é uma verdade chocante aos olhos do mundo.
Como é bom de ver, mas não conveniente aprofundar, é nessa prática cristã, que testemunhamos o desabar das fronteiras nacionais num benigno multiculturalismo realizado, porque fundado sobre a rocha dos mais basilares valores fundamentais da humanidade: «Amarás a teu próximo como a ti mesmo. Maior do que estes não há mandamento algum». Esta é a chave desse mistério, o legado de Jesus Cristo. No princípio os cristãos distinguiam-se pela alegria e amor que irradiavam, “olhai como eles se amam”, um desafio que ainda hoje enfrentamos. E quem conheça a vida da Igreja nas nossas cidades, sabe muito bem como é normal celebrarmos uma Eucaristia presidida por um sacerdote africano de pele retinta e ajoelharmo-nos lado a lado com um individuo ou família de diferente condição económica, da mais exótica etnia ou cor de pele, sem que isso esmoreça o fervor da oração comunitária.
Ao fim de 2000 anos temos de nos perguntar se haverá caminho alternativo para a humanidade que não a mensagem de amor cristão emanado de Jesus Cristo. Porque será que esta proposta de harmonia não vos serve? Porque será que os dois milhões de jovens de tantas e distintas pátrias e continentes reunidos no Panamá em torno do Papa Francisco causam tanto incómodo à intelectualidade bem pensante europeia? Porque estas reuniões constituem a desconstrução da Luta de Classes e do Marxismo Cultural que nos querem impingir aqueles que há séculos prometem acabar com a Igreja de Pedro?
Como aconteceu nos diferentes grandes eventos católicos sucedidos em Portugal desde a visita de Paulo VI, sempre que foi dado protagonismo devido à juventude generosa e entusiástica, estes acontecimentos resultaram no reforço do catolicismo, mas principalmente foram ocasião para muitas mentes inquietas (e que perigo é a inquietação para o status quo), de gente inconformada com a precariedade das respostas do tempo, se converterem ao desafio que Jesus Cristo a todos propõe.
No fundo a grande ameaça que constituem as Jornadas Mundiais da Juventude em Lisboa em 2022 é o reforço dessa identidade cristã neste extremo da Europa, fervorosamente laicista, tecnocrática, economicista e anódina, que preconiza tornar a nossa gente meros consumidores divididos em segmentos de mercado. Um continente em que a caridade (leia-se Amor) se quer desligada das pessoas, regido por um algoritmo legal, sem alma, sem identidade, sem pertença... sem consequência.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
aviso aos comunistas trotessequistas do BE: o jude...
O HPS é uma analista e peras, para além das altera...
Há um erro óbvio no cartaz; Montenegro não deveria...
O conselheiro anacleto ( premonição queirosiana r...
E se um desconhecido lhe oferecesse flores?