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Dizem que a abstenção aumentou nas europeias. Parece ser mito.
A população portuguesa cresce devagar, dizem as estatísticas, mas os cadernos eleitorais engrossaram. Entre 2005 e 2008, a população portuguesa passou de 10,5 para 10,6 milhões; mas o número de eleitores passou de 8,944 milhões em 2005 para 9,660 milhões em 2009. A causa deste fenómeno (para o qual o Tiago Moreira Ramalho já alertara no Corta-fitas) de os cadernos eleitorais serem pouco eficazes a retirar as cento e tal mil pessoas que morrem em cada ano e muito eficazes a integrar os novos votantes que fizeram entretanto 18 anos.
Isto produziu um aumento significativo da abstenção, que teria níveis banais sem esta inflação de eleitores. O facto é que o número de votantes em europeias até aumentou, de 3,4 milhões nas anteriores para 3,5 milhões de votos expressos nas que agora se realizaram.
Outro mito afirma que quem não votou não conta. Iremos ver que isto não é verdade.
Há muitos eleitores que ignoram europeias mas que votam nas legislativas. Quando é para eleger o parlamento, os números sobem para valores bem acima dos 5 milhões de votos. Em 2002, foram quase 5,5 milhões; em 2005, quando José Sócrates conseguiu a sua maioria absoluta, houve 5,7 milhões de votos, o que talvez não se repita.
Das europeias para as legislativas, haverá quase dois milhões de votos adicionais.
A luta por estes dois milhões de indecisos vai ditar quem ganha as próximas eleições. Com vantagem de 180 mil votos em relação ao PS, o PSD está na pole position. Nos votos que couberem ao bloco central e descontando as complexidades eleitorais (círculos e método de contagem) o PS precisa de uma distribuição de 6 para 4 para vencer. O PSD precisa de um empate nestes indecisos.
A esquerda reivindicou uma grande vitória e a direita ficou escandalizada com o “avanço da extrema-esquerda”, mas parece factual que as franjas aumentam e toda a gente esqueceu ou ignorou o avanço da direita.
E, comparando os resultados com os anteriores, vemos que, percentualmente, não houve uma grande alteração para o PSE, que ainda assim perdeu cerca de 6%, nem para o PPE, que manteve precisamente a mesma percentagem. Vemos um aumento significativo dos deputados que não estão filiados a nenhum grupo europeu - triplicaram. É assim, a malta o «neoliberalismo», do «capitalismo selvagem» vai ter de mudar de discurso porque este não serve para ganhar eleições. Por toda a Europa, o PPE ganharam de forma muito consistente.
Esta é a composição provisória do Parlamento Europeu. Provisória porque ainda faltam apurar alguns, poucos, votos. Vemos uma vitória inequívoca do PPE, que ganhou por toda a Europa. Vemos um PSE com menos 100 deputados que o PPE. Com esta composição do Parlamento Europeu a recondução de Durão Barroso é praticamente um facto consumado.
Nada como comparar com os resultados de 2004, para que se perceba a diferença. O PS cai quase 20%. Os resultados do PSD juntos com os do CDS crescem cerca de 7%. O BE mais que duplica os votos e passa a terceira força. Os pequenos partidos desemperram. É complicado falar de perdas de eurodeputados, porque há cinco anos atrás elegíamos 24 e agora apenas 22.
Fonte: Ministério da Justiça
O BE ainda não aparece com 3 eurodeputados porque, na realidade, ainda não os tem. Fico contente pelo MEP que, tendo surgido agora, conseguiu obter 1,5% dos votos, algo muito difícil quando a política em Portugal não se imagina sem os cinco partidos. Preocupa-me que tenha havido tanta gente a votar em partidos como o POUS - Santo Deus! - ou o PNR. Fico também contente pelo número de votos em branco. O voto em branco é também um acto de cidadania. O resto é o que já se sabe.
Fonte: Ministério da Justiça
A meio da noite eleitoral, marcada pela clara derrota do PS, a SIC surpreendeu os telespectadores com uma pirueta, procurando transformar este desaire em... vitória. Como? Fez uma projecção dos resultados das próximas legislativas em cima destas europeias de modo a concluir que o vencedor seria Sócrates.
Já tenho visto muita coisa absurda em televisão, mas esta passou todos os limites. Ainda por cima recorrendo a uma das empresas de sondagens que mais redondamente se enganou nesta campanha, acabando assim por defraudar os eleitores.
Eu recomendaria à SIC que se deixasse de sondagens nos tempos mais próximos. E não menosprezasse as europeias que ainda agora ocorreram na ânsia desenfreada de antecipar as legislativas que hão-de vir.
Os vinte e dois deputados ao Parlamento Europeu estão eleitos e é hora de se fazer algumas considerações. Primeira conclusão: não se acredite nunca mais em sondagens. As sondagens, que tinham uma marca de credibilidade até hoje, falharam redondamente e todos sabemos que as sondagens afectam directamente as intenções de voto. Não é por no dia de reflexão não se apresentar nenhuma que os efeitos das anteriores são apagados da memória dos eleitores. A segunda conclusão a retirar é que nasceu uma nova estrela na política: Paulo Rangel. Surgiu sem ser dos meandros partidários, dos favores e lambe-botismos, e conseguiu afirmar-se como um excelente político, um político à moda antiga. Esta vitória foi também, e não vale a pena tentar escapar a esse facto, uma vitória de Manuela Ferreira Leite. Calem-se os que apregoam, estupidamente, contra as estratégias comunicacionais e apresentações tardias de candidatos. Calem-se ou passem por novas vergonhas. Marques Mendes teria sido um bom candidato, mas não sei até que ponto Paulo Rangel não superou todas as expectativas do partido. Quanto ao Bloco de Esquerda, não considero que se tenha tratado realmente de um reforço sólido da sua importância. É meritório ter eleito três deputados. Tem os melhores deputados da «esquerda» portuguesa. No entanto, considero que se trata apenas de uma consequência óbvia do contexto: contexto de crise que tende a extremar o discurso e contexto de contestação em relação ao executivo. Noutros países não foi a extrema esquerda, mas sim a extrema direita a arrecadar mais votos. Na Holanda tiveram 16%. É um resultado normal, previsível, não deixando, ainda assim, de ser preocupante. Em relação a Vital Moreira, o grande derrotado da noite, há que dizer que levou uma chapada com a mais imaculada das luvas por parte do eleitorado que, felizmente, o castigou pela campanha vergonhosa. Voltei a ter alguma esperança na democracia portuguesa. Tentou, frustradamente, arcar com todas as responsabilidades, o que não seria difícil dado que é independente, no entanto, e como é habitual, a declaração de Vital esbarra com o que disse José Sócrates há uns tempos: "As eleições europeias servirão de caução às políticas do Governo no investimento público". O governo está fragilizado e não é difícil apontar um cenário com Manuela Ferreira Leite como primeira ministra, a primeira mulher a assumir o cargo através de eleição. Estas eleições, nas suas repercussões, revelaram-se mais portuguesas que europeias.
TVI/Intercampus
PSD: 30,4% - 32,4%
PS: 24,1% - 28,1%
BE: 9,8% - 12,8%
CDU: 9,7% - 12,7%
PP: 6,7% - 9,3%
SIC
PSD: 29,2% - 33,0%
PS: 27,7% - 31,5%
BE: 11,6% - 13,4%
CDU: 9,5% - 11,3%
PP: 7,5% - 9,3%
Católica/RTP
PSD: 29% - 34%
PS: 28% - 33%
BE: 9% - 12%
CDU: 9% - 12%
PP: 7% -10%
Não sei se já repararam. Vital Moreira praticamente não tem aparecido sem José Sócrates ao lado e Paulo Rangel praticamente não tem aparecido ao lado de Manuela Ferreira Leite. Está certo. São sinais inequívocos que se extraem da campanha: tanto o PS como o PSD querem mesmo ganhar estas eleições.
A questão turca
Henrique Raposo teve a amabilidade de responder em Clube das Repúblicas Mortas aos meus dois posts críticos das suas posições sobre a questão turca. Na resposta afirma, correctamente, que o AKP [o partido no poder na Turquia] “não é um movimento islamita, mas sim um partido islâmico”. A precisão era desnecessária, pois nunca escrevi que o AKP fosse islamita (ou seja, radical). No meu texto, referi-me a este partido como sendo de “conservadores islâmicos”. Escrevi ainda que a formação tem alas “ultra-conservadoras” que não acreditam na separação entre Estado e religião.
A meu ver, a resposta de Henrique Raposo não esclarece os pontos essenciais da minha crítica. Quando falo de costumes, o ponto de vista não é europeu, mas tento explicar a relutância da elite republicana em aceitar as ideias mais religiosas do AKP. Por isso, concordo com o autor quando ele escreve que “a UE não é sobre costumes, mas sobre instituições”. No entanto, mais uma vez, a precisão era inútil, pois nunca escrevi que a UE deva impor costumes a qualquer Estado membro.
A questão dos direitos humanos, pelo contrário, é uma condição de entrada na UE. Os candidatos têm de cumprir regras rigorosas, por exemplo, no tratamento das mulheres. Henrique Raposo escreve que o AKP pretende “dignificar a tradição muçulmana dentro da política moderna. E tem esse direito. Mesmo quando não se concorda com os tais costumes”. Esta opinião parece correcta, mas acrescento que o autor não pode esquecer as limitações que terá esse processo de “dignificação da tradição islâmica” no plano dos direitos humanos.
Não quero fugir à questão essencial. O Henrique diz que fui “injusto com o AKP” e acho que tem razão. Este é um partido democrático, que venceu eleições e vê limitada a sua acção pela elite militar, judicial e intelectual. Essa classe domina parte do Estado e tem expressão eleitoral bem menor do que o partido “democrata-islâmico”, fórmula que o autor usa e com a qual concordo.
Mas no meu texto esforcei-me por explicar as razões da desconfiança dessa elite. Não incluí um motivo suplementar, que talvez tenha aqui importância: a questão das classes sociais. É evidente que as “famílias bem” de Istambul são republicanas e que o movimento islâmico tem a sua base social no campo e nos bairros pobres.
Quanto às subtilezas da distinção entre jacobinos franceses ou americanos, sinceramente, não vejo a relevância. Os países europeus têm séculos de separação entre religião e Estado; no mundo muçulmano, nenhum governante pode ignorar a religião. No exemplo que dei de nomeações de imãs percebe-se que esse cuidado visa afastar das mesquitas todos os religiosos que possam ter discursos radicais. Para os padrões europeus essa regra é inaceitável e a Turquia terá de abandonar a prática, se quiser entrar na UE. Acho que isto ilustra a tese dos meus textos: não há preto e branco neste conflito.
Finalmente, correndo o risco de aborrecer os leitores, uma nota sobre a imagem do “conselho de revolução”, que me parece pouco feliz. A interferência dos militares na política turca é uma constante que remonta ao general Kemal Ataturk (até remonta ao império otomano). Os militares não têm um órgão tutelar da República, mas a meu ver devem ser percebidos como uma espécie de partido político que entra em todas as coligações. Esta será a questão mais difícil da adesão turca.
O Resultado da Abstenção
A primeira sondagem para as eleições europeias em Portugal mostra uma terceira mancha bastante grande: o Bloco de Esquerda. Não é propriamente uma grande surpresa, tal como escrevi neste post, considero que o Bloco tem, à esquerda, a melhor lista. No entanto, julgo que este resultado não se deve apenas à qualidade da lista apresentada. Sim, o Bloco segurou o eleitorado e, provavelmente, captou alguns indecisos, mas ainda assim isso não seria suficiente. A principal razão que encontro para este resultado verdadeiramente extraordinário é a abstenção. Existe um abandono generalizado por parte dos portugueses das questões europeias. Não conhecemos a Europa e não fazemos questão de a conhecer. O resultado é que acabamos por assistir a uma abstenção que rondará, segundo uma outra sondagem, os 75%. Num quadro em que apenas 25% dos eleitores exercerão o direito de voto e em que um partido cria uma lista verdadeiramente capaz de agarrar o eleitorado, o resultado só pode ser este. Parabéns ao Bloco. Os meus pêsames, Portugal.
Direitos de autor: gráfico roubado ao João Lopes, grafismo roubado ao Pedro Correia.
A notícia do DN que ontem tanto irritou Pacheco Pereira é hoje retomada no Público. Que cita (e muito bem) as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa ao DN, atestando a sua relevância, e sublinha isto, que me parece óbvio: o nome do ex-presidente do PSD é o "mais consensual e desejado" para encabeçar os candidatos do partido ao Parlamento Europeu. Marcelo diz "não estar para aí virado". Acredito que sim: a tentação de Belém é muito mais forte. Mas nunca se sabe quando Cristo volta a descer à Terra. De resto, e ainda segundo o Público, «Marques Mendes é visto como "o candidato natural" mas pouco provável, Aguiar-Branco seria uma hipótese demasiado óbvia mas já afastada, enquanto António Borges não suscita entusiasmo.» Aliás o próprio Pacheco Pereira também já se chegou à frente, o que faz dele parte interessada em todo o processo, como aqui bem recorda o Paulo Gorjão.
É normal que um jornal noticie tudo isto nas suas edições impressas e nas suas edições em linha? É. Em qualquer parte do mundo. Tal como são cada vez mais banais as petições a favor deste ou daquele candidato, à margem dos estados-maiores dos partidos, como Joana Carvalho Dias, admiradora confessa de Manuela Ferreira Leite, admite aqui. Eu acrescento: a política cada vez mais viverá de movimentos destes, que explicam aliás em boa parte o sucesso eleitoral de Barack Obama em 2008.
Só vê campanhas negras em toda a parte quem passou toda uma vida a padecer de conspirativite aguda. Talvez por conspirar de mais.
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Da dor-de-corno e das suas insondáveis ramificaçõe...
Acho que também já fiz isso
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Desmantelar institutos e demais tralha estatal.
Portugal precisa de um DOGE