Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Por José Meireles Graça
A Blogosfera, diz-se, está decadente. Já penduraram as botas muitos blogues que foram populares, e não poucas estrelas deste meio aterraram em governos e empresas, colunas de opinião pagas nos jornais e programas de televisão com sorte vária.
Não fui, por preguiça, conferir se é assim: o número de visitas está registado, e pode-se comparar com épocas pretéritas.
Se for, nada garante que a tendência seja mais do que passageira. E seria muito mau se fosse inelutável porque não se perceberia a benefício de quê:
Da imprensa? Mas esta luta para sobreviver, não encontrou maneira de captar os leitores que lhe fugiram para a internet dos conteúdos grátis, mesmo que sumários, mas mais próximos dos acontecimentos, e pelo menos entre nós transformou-se quase toda numa caixa de ressonância da Geringonça e de quanta patetice bem-pensante anda no ar da opinião práfrentex, tudo servido por jornalistas que desistiram de investigar e reportar histórias e embrulham as notícias tendenciosas redigidas em português de trapos numa autodesignada magistratura de opinião.
Da televisão? Esta divide-se em canais que se guerreiam no tipo particular de lixo que atrai o maior número de espectadores e os programas de opinião, parentes pobres, são normalmente preenchidos por senadores cuja independência é inversamente proporcional aos seus interesses de carreira ou outros.
Das outras redes? Quais? O Facebook dos cotas, entupido de gente que imagina que tem alguma coisa a dizer? O Twitter, um esgoto a céu aberto de espirros opinativos? O WhatsApp do pirateio de conteúdos? O Instagram das fotografias de gatinhos, bikinis, viagens e pratos suspeitos de cozinha criativa, onde a ignorância culinária se casa com o desprezo da tradição?
Que se amanhem: até mais ver o melhor da opinião, salvo escassa meia dúzia de próceres com banca montada nos jornais, está ainda na blogosfera. E nesta, além da casa que me acolhe, mantém os pergaminhos serenos (e antigos: acho que já tem mais de uma dúzia de anos) o Corta-fitas.
Pois aquela gente qualidade tem, mas juízo nem por isso: este ano fui o convidado extra para o almoço de confraternização. E, lisonjeado, lá fui, e comecei por me deixar enganar pelo TomTom no endereço, indo parar, em vez do Estoril, a uma praceta com o nome indicado, mas em Sassoeiros. Um moço numa carrinha de entregas rapou do seu telemóvel xpto, conferiu na aplicação Waze, e explicou-me não apenas como chegar ao destino mas como tirar partido do tablet que me viu nas mãos. Se soubesse quem eu era, e do que penso e tenho dito sobre a geração mais bem formada de sempre, pergunto-me se teria sido tão generosamente simpático e prestável. Enfim, lá cheguei esbaforido, com três quartos de hora de atraso, e as minhas explicações foram aceites com equanimidade.
Fui recebido pelo dono da casa, que conheço há muito pessoalmente de andanças partidárias (somos militantes do mesmo partido), e pela família, que com simpatia e sem alarde me pôs à vontade. João Távora é um original: monárquico e católico devoto, defende as suas convicções políticas com inalterável urbanidade e assinalável modéstia e contenção, deplorando os ódios pessoais internos, e a guerrilha, que são o dia-a-dia dos partidos; e do seu catolicismo dá um exemplo de vida como pai de família exemplar e cidadão probo, sem sombra de proselitismo. A tudo soma a qualidade de um autor com um estilo pessoal e escorreito que nada deve a modas, e que só é intimista quando calha manifestar o seu desconforto com pessoas e coisas que ofendem o seu sentido apurado do certo e do justo.
Estava o Henrique Pereira dos Santos, com quem já tinha falado algumas vezes mas nunca pessoalmente, e que é, para certos efeitos, um dos meus raros maître à penser: sobre fogos, aprendi com ele que o combate que os poderes públicos lhes têm feito, e que diligentemente é trombeteado pela comunicação social, assenta em pressupostos cientificamente errados, por os mecanismos adequados para lidar com o problema serem, infelizmente, contra-intuitivos; e, sobre a Covid, que os mesmos erros se estão a repetir – o que parece óbvio, isto é, combater a infecção por todos os meios, tem causado mais problemas do que os que resolve. As complexidades de um assunto e outro não cabem num resumo em duas linhas, mas está aí, extante, todo um acervo de textos dele para, quem quiser, aprofundar esses assuntos.
Estava o José Mendonça da Cruz, o que me levou a dizer, ao ser apresentado, que era um grande alívio constatar que havia alguém ainda mais reaccionário do que eu (costuma há muito tempo dizer com desassombro o que pensa do país e do mundo, para meu deleite). Uma provável injustiça, para não lhe chamar deselegância, que o próprio encarou com a bonomia das pessoas superiores – que é.
E estavam o José Miguel Roque Martins, que comecei a ler há não muito tempo mas já figura obrigatoriamente no meu feed, e o Vasco Mina, que hoje escreve pouco, talvez para sossego dele – mas prejuízo nosso.
E o almoço em si, então, que tal? A bem dizer, teria dado por bem empregue o meu tempo mesmo que tivesse tido direito a uma ementa moderninha, de cozinha criativa, acompanhada de uma zurrapa vistosa. Nada disso: pratos de confecção canónica, dos quais repeti a favada, um tinto lisonjeiro a empurrar.
Suspeito, mas não confirmei, que a sombra tutelar da dona da casa deve ter pairado na lhaneza do acolhimento, na boa disposição dos comensais e na tarde ensolarada preenchida com conversa amena na varanda. Quando chegou o tempo da despedida, passava das seis da tarde, e parecia que tinha chegado há meia hora.
Obrigado, João, pelo convite. E aos outros pela paciência.
Primeiro foi Rui Rio, imediatamente crucificado quando considerou que informação e sapatos são ambas atividades económicas, que deveriam beneficiar dos mesmos apoios. Sem surpresa, a comunicação social caiu-lhe em cima, como se a sua importância e sobrevivência não devesse também depender do real interesse da população em pagar pelos seus serviços. Há sempre quem pense merecer estar acima das regras de mercado, já que presta serviços de especial relevância que não são reconhecidos pelo ingrato pouco preparado consumidor. E como referido por muitos defensores, há que proteger a pluralidade dos meios de informação.
Ontem o André Ventura terminou a sua longa ligação com a CMTV (grupo Cofina, na tabela = 1.691.006,87€).
Ontem ouvi a indignação de José Manuel Fernandes, pela repartição anunciada da distribuição destas ajudas especiais, que atribuíram ao Observador (cuja administração já rejeitara esta ajuda do Estado por falta de critérios de transparência) uma pequena fracção do que os seus pares receberam. Como lembrou, “quem se mete com o PS, leva”.
Nada de novo. É apenas mais socialismo marxista enxertado com caciquismo, a casta predominante em Portugal. Sou pessoalmente um optimista, mas ando triste, porque não convenço as minhas filhas a emigrar.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
É verdade que em Lisboa, o preço dos arrendamentos habitacionais estão proibitivos para a bolsa do comum dos mortais. Fernando Medina, certamente com boas intenções, inventa o programa "Renda Segura", que consiste no arrendamento pela Câmara Municipal de Lisboa de apartamentos para o seu posterior subarrendamento, a preços inferiores, a alguns felizardos, escolhidos por um qualquer método facilmente questionável.
Se o objectivo fosse simplesmente privilegiar alguns munícipes, como vai acontecer, seria objectivamente mais eficiente dar uma subvenção a essas pessoas, para que elas escolhessem a melhor forma de gastar esse dinheiro ( não necessariamente em habitação).
Se o objectivo for ser justo na escolha dos poucos contemplados por rendas abaixo do mercado, então não sei como vão fazer: todos os que forem excluídos têm também o estatuto de cidadãos.
Se o objectivo for o de resolver o problema da habitação, então ficamos longe, já que quanto muito vamos substituir alguns afortunados que vivem em Lisboa por outros, sendo provável que o aumento da procura de casas (pela CML) aumente o seu preço;
Se a transparência for um objectivo, a criação de benefícios fiscais aos senhorios que adiram ao esquema, apenas introduzirá dificuldades em avaliar esta política.
Se a eficiência for objectivo, então há a lamentar o gabinete de funcionários públicos que passará a ser necessário para intermediar o que antes acontecia de forma natural.
Resumindo, cria-se uma política que descrimina positiva e questionavelmente alguns sortudos, a quem não é dado a liberdade de escolherem como gastar dinheiro da forma que lhes dê mais bem estar, baralham-se os preços para ser impossível avaliar a iniciativa, cria-se a necessidade de um gabinete cheio de funcionários e, no final, os afortunados que podem viver em Lisboa vão ser basicamente no mesmo número: só mudam as pessoas , o custo final sobe, o problema para todos os outros aumenta: é obra.
A "Renda Segura" não é apenas um "programa", é também a essência das políticas socialistas. Que implicam mais custos para o mesmo resultado, a concentração de benefícios num grupo felizes contemplados e os custos distribuídos por todos. O paraíso socialista.
PS: Existem 20.000 casas para venda em Lisboa. A maior parte delas estaria para arrendamento se as políticas sociais de habitação desde os tempos de Salazar não punissem os senhorios.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
Estou farto de estar a criticar e, por isso, decidi escrever sobre alguma coisa boa, o que é muito mais agradável mas muito mais difícil de encontrar no meio desta crise.
Ontem a Suécia ultrapassou Portugal no número de infectados confirmados. Nunca escondi o minha preferência pela estratégia sueca. Em primeiro lugar, por ser tendencialmente mais sustentável do que a nossa. Em segundo lugar, porque o Estado não trata os Suecos como inconscientes, como aconteceu em Portugal.
O futuro irá confirmar quem consegue melhores resultados. Mas confesso que independentemente do que acontecer, dificilmente deixarei de pensar que eles foram os campeões europeus do Coronavírus. Entendo a estratégia , aprecio a serena coragem e deliro com o respeito ao cidadão.
Não resisto a juntar o gráfico de infecções diárias do worldometer da Suécia:
Ao contrario da generalidade dos Países, não se nota uma queda evidente das infeções ao longo do tempo, o que confirma as medidas mais leves e menos potentes de distanciamento social que a Suécia implementou. Suficientes, no entanto, para impedir um crescimento exponencial dos casos, como foi garantido por muitos autores.
Embora muito ligeira, descortina-se uma ligeiríssima queda das infeções, eventualmente explicada pela comunicada baixa de casos em Estocolmo, onde, supostamente, 25% da população já está infectada e por isso já existe um grau relativo de imunidade de grupo.
As mortes continuam a ser, para já, muito superiores aos outros países da Escandinávia, mas muito inferiores aos dos países mais fustigados pela letalidade. Em termos práticos, tudo está em aberto, mas já se nota uma diminuição expressiva das criticas á “louca roleta russa” ou “capítulo vergonhoso da história do pais” como já a vi ser citado. Um bom exemplo para continuarmos a acreditar ser possível a liberdade e o bom senso.
PS: Uma confinação menos severa, não foi determinada para atingir a imunidade de grupo e muito menos por interesses económicos. A consciência de que a pandemia será prolongada no tempo, tornou evidente a futilidade de medidas
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
A resposta à pandemia, mesmo que não corresponda a estratégia sustentável, congregou uma das maiores unanimidades de que tenho memoria. Em muito pouco tempo, alguém escreveu os novos mandamentos, em vigência pura, numa pedra qualquer:
Ontem de manhã, fui alertado para a possibilidade de os atuais mandamentos não serem suficientes.
Na sua rubrica no Observador “O bom, o mau e o vilão”, Miguel Pinheiro, elegeu Jerónimo de Souza como vilão. Em causa as suas declarações da vontade de realizar a festa do Avante, aceitando seguir as regras da DGS. Miguel Pinheiro até reconheceu que O PCP e o seu Líder, nessas circunstâncias, até poderiam realizar a festa. Mas que é vilania fazer o que se pode e não o que se deve. E o que se deve é ir sempre além das possíveis restrições em prol do combate ao Vírus. Neste caso, o virtuoso será não se realizar qualquer festa, o caminho mais direto para liquidar o vírus, que ninguém sabe se ainda vai andar por aí em Setembro.
A consequência é um novo mandamento: faz sempre mais do que te é pedido no combate ao coronavírus: a tua quarentena para todo o sempre será apreciada. Serei eu o único a pensar que Miguel Pinheiro foi muito infeliz com estas observações?
PS: A realização da festa do Avante a acontecer será mais uma triste prova da dualidade de critérios, cada vez mais flagrante, entre o que se aplica aos políticos e o que se aplica ao povo que, em circunstância nenhuma, pode realizar festas ou festivais.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
Multiplicam-se na comunicação social notícias que são o prelúdio da neo-antiglobalização. A diferença, agora, é que ao contrário do usual e erróneo argumento, de que o comércio internacional produz vencedores e vencidos, parte de uma premissa verdadeira, que será extrapolada e distorcida até permitir tirar conclusões erradas.
A pandemia (sempre ela), veio tornar evidente, nalguns sectores, a dependência internacional (do Ocidente) de fornecedores não amigos (a China). A questão começou a colocar-se quando a procura de máscaras e ventiladores, entre outros productos, aumentou subitamente e de repente não havia oferta suficiente para atender às necessidades. Ao mesmo tempo, muitos países (sobretudo no Ocidente) impediram as exportações e guardaram para seu uso esses produtos, que se tornaram escassos em face à crescente necessidade.
Multiplicaram-se também notícias de paralisações de industrias causadas pela implosão das cadeias logísticas internacionais, ou seja, porque algures no planeta (na China) alguém não tinha produzido o que devia.
Verificada a extensão dos danos, começou-se a olhar para a enorme quantidade de outros bens em que existe dependência internacional. Ainda no outro dia li um artigo que alertava para o perigo da maior parte dos analgésicos consumidos nos EUA serem fabricados na China, tal como a maior parte de outros medicamentos baratos (os caros continuam a ser produzidos localmente).
Imediatamente a imaginação dos saudosistas de mercados protegidos começou a funcionar. Empresários e Sindicalistas, darão as mãos, no futuro próximo, em prol da criação de reservas de mercado. O sonho de uma vida sem concorrência é realmente sedutor. Em Portugal, já se especula que, a necessidade do Ocidente ser menos dependente de terceiros (da China), vai catapultar a sua mão-de-obra barata ou a sua privilegiada memória de como se fazem os produtos de baixa tecnologia, para um novo período de glória industrial subsidiada.
É verdade que a realidade importa bem menos do que percepções e convicções políticas. E, por isso, a ameaça à globalização é real, tal como já acontecia antes desta crise. Mas o que acontece, é muito diferente da narrativa com que vamos ser invadidos.
As faltas de material médico que ocorreram, iriam verificar-se qualquer que fosse o pais que os produzisse antes. Nenhuma industria está preparada para dobrar a produção de um dia para a noite, quanto mais multiplica-la por 5, 10 ou 100, em função de uma procura imediata e inesperada.
Espantosa foi a velocidade com que mascaras e ventiladores apareceram, não se sabe muito bem de onde. O mercado livre é mesmo extraordinário!
Não tenho conhecimento de existirem faltas e roturas de outro tipo de bens e serviços não ligados à pandemia. Os tais comprimidos baratos e outros artefactos mais ou menos imprescindíveis, continuaram a ser disponibilizados pela China. Como de resto aconteceu de forma geral com tudo o que continuou a poder ser comprado, em lojas que continuaram abertas ao público.
As industrias que pararam fizeram-no, mais por falta de procura dos seus produtos do que por rotura das cadeias de distribuição. Que obviamente também ocorreram, como poderiam ter ocorrido mesmo que toda a cadeia de produção estivesse instalada no mesmo país.
A possibilidade de haver problemas quando haja uma interdependência global é muito maior, já que há que somar dificuldades que podem ocorrer em todo o globo. Mas problemas com sérias implicações no comércio internacional não têm acontecido. Pandemias graves, na história dos últimos séculos, são menos de uma a cada cem anos. Não parecem elas ser, por isso, um critério relevante para decisões estruturais contrarias á globalização.
É evidente que a extraordinariamente complexa rede de relações num mundo globalizado, causa interdependências. É evidente que considerações geoestratégicas criam a necessidade de salvaguardas que em muito transcendem a lógica económica. A caríssima política agrícola comum, é um exemplo poderoso. Mas não é menos verdade que reservas estratégicas que compensem um período de quebra de cadeias logísticas, sempre foram consideradas suficientes para salvaguardar dependências. Até porque estas são sempre em dois sentidos: todos dependem de todos, com o comércio internacional.
A única lógica que poderá justificar uma atenção particular a esta questão, é a do cavaleiro do apocalipse que falta. Já temos Peste, Morte e Fome… pelo que só falta mesmo a Guerra. Um factor que se torna menos plausível e próximo exactamente por causa das interdependências que a globalização nos promove. Até lá, há sempre tempo para empobrecermos ainda mais e fabricarmos de forma mais cara o que outros fazem mais barato. Honestamente, espero que os que anseiam pela nova vaga industrial para substituir administrativamente a dependência do oriente fiquem desapontados. Já temos problemas suficientes para a eles somarmos o fim dos benefícios do comércio internacional.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
Multiplicam-se os artigos a lembrar que a maior parte das medidas restritivas em vigor no Estado de Calamidade são inconstitucionais. António Costa, reagiu ao início desse movimento dizendo que “eu também sou jurista e sei a capacidade enorme que os juristas têm de inventar problemas”.
Não fica bem a um primeiro-ministro desvalorizar a mais do que eventual falta de cumprimento de preceitos constitucionais, que muito boa gente tem denunciado. Sendo um homem pragmático, ele tem razão: não há razões para se preocupar neste momento com a eventual ilegalidade de qualquer decisão. Vivemos no Estado de Medo, muito mais poderoso que o Estado de Emergência ou do Estado de Sítio. No Estado do Medo, as pessoas fazem tudo o que lhes é pedido se lhes for sugerido que é para sua sobrevivência. Quase ninguém quer saber dos seus direitos e garantias constitucionais. Mesmo que as estatísticas conhecidas não sejam propriamente assustadoras, particularmente para os menores de 60 anos. E que o SNS apenas tenha sido testado a 25% da sua capacidade, no pico do surto.
Se António Costa não fosse um democrata, estaria, também eu, transido de medo. Não do coronavírus, mas da instituição de um regime autocrático que prometa erradicá-lo.
Conheço o caso de crianças que têm medo de ir brincar para o quintal. Pessoas que não saem ou recebem ninguém, nem à porta das suas casas. As urgências estão às moscas. Vítimas de ataques cardíacos, de AVCs e outras mazelas graves, preferem morrer em casa do que ir ao hospital e correrem o risco de serem infectados. Os cuidados de saúde de prevenção e tratamento são sistematicamente adiados. Não conheço ninguém que tenha morrido de Covid19, mas conheço quem não tenha sido adequadamente tratado tendo sido apressadamente recambiado para casa, onde morreu, provavelmente porque não tinha a doença do momento.
O cidadão comum, transforma-se numa extensão das forças policiais. Vigiando, condenando a até denunciando, com veemência, qualquer potencial prevaricação da restante população. Nas longas filas para fazer compras, os olhares são ameaçadores, para evitar que alguém tenha a ousadia de se aproximar. Os “outros”, que não estejam ao nosso serviço, passaram a ser inimigos.
Enquanto o medo irracional não for substituído pela preocupação informada, será muito difícil tirar as pessoas de casa, a não ser que se lhes acabe o dinheiro. Questões de legalidade não podem atrasar ou atrapalhar o curso da tragédia. É o Estado do Medo, que mais ordena.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
Tinha prometido a mim mesmo, num ato de bom senso, não dar o meu ponto de vista sobre a solução da pandemia. Não resisto, no entanto, a fazê-lo.
O meu lado otimista lembra a possibilidade de o vírus simplesmente desaparecer das nossas vidas num futuro próximo. Penso, também, que temos que ser justos e reconhecer que tivemos sorte. Bem vistas as coisas, o vírus podia ser muito mais letal do que, aparentemente, é. Imagine-se uma taxa de mortalidade próxima de um Ébola!
O meu pesadelo é o cenário em que a epidemia e as medidas de confinamento, mais ou menos restritivas, se prolongam por meses a fio. É um pesadelo irreal, tanto mais não seja, porque as finanças públicas simplesmente não aguentariam o embate de uma economia amordaçada. A realidade é que quem não tem dinheiro, não tem vícios, nem que sejam virtuosos, como a saúde pública. Mas não sendo possível prolongar a agonia económica durante anos, é possível assumi-la durante preciosos meses.
Entretanto, politicamente, elegemos a prevenção de infecções como o objectivo inquestionável. O que é um erro. As infecções, em si mesmas, não têm qualquer importância - as vítimas mortais sim.
O confinamento, quando surgiu, foi uma resposta prudente á nossa ignorância e uma medida destinada a impedir o desastre que vimos em Itália, em que o serviço de saúde pura e simplesmente entrou em colapso, e muitas pessoas morreram por falta de tratamentos básicos. Hoje, é anunciado como o instrumento que nos impede de ficar infectados, supostamente o objectivo primordial de todas as políticas!
Apesar da nossa ainda grande ignorância, já podemos ter como certo que o vírus é sobretudo perigoso para classes muito restritas da população: os grupos de risco. Para a maioria da população, basicamente quem não seja portador de morbilidades e seja menor de 60 anos, aparenta ser relativamente benigno.
Já passaram mais de 45 dias e a experiência do SNS melhorou muito e os equipamentos disponíveis para ajudar á recuperação foram reforçados. Em breve teremos estimativas mais corretas para o número de infectados e, por isso, saberemos com mais precisão a taxa de mortalidade e a taxa de infectados que carecem de hospitalização ou de cuidados intensivos, ambas por grupos etários. Estima-se que sejam muito menores do que aquelas que são obtidas por divisão aritmética dos dados de infeções comprovadas.
No meu pesadelo, a vacina e um medicamento milagroso, como previsto pela generalidade dos especialistas, não irá aparecer tão cedo. E, como tal, só quando existir imunidade de grupo - quando todos os que tiverem que ser infectados o forem - é que acaba o coronavírus.
Com confinamentos agressivos e permanentes, o único objectivo que se atinge é uma morte lenta dos que têm que morrer. A troco de um sacrifício económico e psicológico dantesco para o resto da população - nem o pai morre, nem a gente almoça.
A solução parece simples: até ao limite da capacidade do SNS, infetar tantas pessoas e tão rapidamente quanto possível dos grupos que não são de risco, por forma a acelerar o processo de imunidade de grupo. Atingindo-se a normalidade e o fim do confinamento, para todos, com rapidez. Registando-se um número semelhante de mortes da solução estendida no tempo, mas concentrada no período de infecção. Idealmente, simultaneamente, os grupos de risco permaneceriam confinados, diminuindo-se a letalidade real do vírus, muito baixa fora dos grupos de risco.
Esta proposta, esta estratégia, não tem nada de original. Muitos foram em Portugal e pelo Mundo, os defensores deste tipo de abordagens pragmáticas. Parece, no entanto, que subsiste um enorme pudor em abandonar o discurso da saúde a qualquer preço. E o confinamento permanece como o grande instrumento ao serviço da saúde.
Mesmo o atual movimento de desconfinamento não se percebe, se não for justificado pela lógica apresentada: todos sabem que menos confinamento não vai produzir menos infecções. A falta de clareza nos propósitos arrasta as medidas que vamos vendo, em que nem se acelera o processo de infecção/imunidade, nem se restabelece o funcionamento da economia. Ainda não vi nenhuma senhora meio grávida. Com a economia é quase a mesma coisa: ou está a funcionar em pleno ou não. Caso, por grande sorte nossa, durante o processo, o vírus se extinga, melhor. Caso se descubra que a taxa de mortalidade é suportável, melhor. No entretanto não perdemos tempo em salvar a nossa saúde psicológica, nem desperdiçamos enormes recursos económicos.
Custará assim tanto assumir que nem existem meios para salvar todas as vidas, como acontece desde sempre, e que a morte não é necessariamente evitável, mesmo com os maiores e melhores esforços de qualquer sociedade?!
Será assim tão grave pôr em causa uma resposta, o confinamento, que só apareceu por pânico induzido pelo desconhecimento e por causa da incapacidade de resposta dos SNS?! E que todos os que se manifestam contra a sacrossanta inevitabilidade do confinamento, como, neste blog, Henrique Pereira dos Santos e o omnipresente André Dias, só não sejam literalmente apedrejados, graças ás medidas de confinamento social em vigor.
Será que o concurso de gradualismo e cautelas, serve verdadeiramente os interesses da população?! Será que alimentar receios injustificados da população não é uma menorização injustificada dos cidadãos a todos os títulos inaceitável?!
No outro dia li que o fim deste episódio trágico só será conseguido com investigação científica. Eu acredito que a verdadeira e mais humana solução para a pandemia serão a serenidade e o bom senso.
PS: Como já defendi, respeito o direito dos cidadãos dos grupos de risco, nomeadamente os mais velhos, a prescindirem dos benefícios do confinamento. Sendo maiores, racionais e preferindo aceitar os riscos de uma vida livre, não percebo que a sociedade tenha direito de os impedir. Apenas poderão ser avisados que, nesse caso, não terão prioridade nos tratamentos.
Também defendo que quem se queira confinar, depois do levantamento do confinamento pelas autoridades, o possa fazer. Desde que não seja subsidiado pelo Estado.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas pelos nossos convidados são da sua exclusiva responsabilidade.
As coisas já há muito que não vão bem na Comunidade Europeia. O mau estar é tão evidente que a linguagem diplomática normal já foi abandonada em favor de afirmações duras. São já muitos os que não disfarçam ser a própria sobrevivência do projeto Europeu o que está em causa.
O Euro revelou-se uma catástrofe. E não há boa vontade que permita o solidário “cheque em branco” que é reclamado. Agora só há dois caminhos: um, é o de uma maior integração política, em que, precedendo a solidariedade, todos os países abdicam de soberania real, coisa que parece não agradar a rigorosamente ninguém. O outro é resolver o problema do Euro, cuja solução mais fácil, por incrível que pareça, passaria obrigatoriamente por “expulsar” a Alemanha e a Holanda.
A adoção do Euro não seguiu as mais básicas regras da criação de uma união monetária. O resultado é conhecido. Um conjunto de países, sobretudo do sul da Europa, entrou em desequilíbrio externo por perda de produtividade, aumentando o seu nível de endividamento. Simetricamente, a Alemanha e a Holanda, entraram em desequilíbrio externo, acumulando enormes superavit. A crise financeira de 2008 veio tornar clara a insustentabilidade do crescimento da dívida para os países que perderam produtividade. Sem acesso a políticas cambiais que repusessem a sua produtividade, sem contarem com a aceitação de inflação por parte da Alemanha e Holanda, a única forma de se ajustarem foi através de duras medidas de austeridade. Que não deixaram de causar nos outros países do Euro um crescimento anémico. A zona Euro passou a ser um pântano para todos os seus integrantes.
Para os países endividados sair do Euro não é uma opção. Ao sair, a sua nova moeda vai valer menos do que o Euro (seria esse o objectivo). A sua dívida, que foi contraída em euros explodirá e as taxas de juro que terá que enfrentar serão de molde a precipitar uma bancarrota. Um desastre.
Até agora, Itália, Espanha, Grécia e Portugal eram os grandes visados pelo interesse/impossibilidade de saírem do Euro. Depois do Coronavírus e dos seus deficits, a França irá juntar-se a este grupo. Uma enorme maioria da população da zona euro e mais de 50% da população da comunidade Europeia fica numa situação extremamente desconfortável.
A saída dos Países credores do Euro (Alemanha, Holanda), não é, em si mesma, do seu interesse direto. Uma vez saindo, o Euro vai desvalorizar, e os empréstimos que fizeram passam a valer menos. Não é também seguro que estejam desconfortáveis com o desequilíbrio externo que têm enfrentado (uma moeda desvalorizada, que faz com que tenham um enorme superavit comercial). Se assim não fosse, porque não fomentaram uma inflação interna que diminuísse a sua vantagem competitiva em termos de produtividade? Aumentar salários acima da produtividade, não parece ser uma medida politicamente impopular...
Mais uma vez o que interessa a uns não interessa aos outros. A única diferença é que a crise do Coronavírus vem tornar evidente que é impossível continuar tudo como dantes. E que mais valerá todos perderem alguma coisa, do que se perderem os enormes benefícios da Comunidade Europeia.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
O mau comportamento da OMS na presente pandemia é inquestionável. É confrangedora a enumeração de erros e sobretudo omissões excessivamente comprometedoras de sua responsabilidade.
O Presidente Trump, numa jogada politiqueira, anunciou recentemente que os EUA, de longe os maiores contribuintes da OMS, iriam deixar de a patrocinar, pelo seu fraco desempenho na presente crise. Pretende com este anuncio, desviar as atenções das suas enormes responsabilidades no desastre da resposta à pandemia por parte dos EUA. É obviamente um ato de aproveitamento político típico de Trump: ignóbil e que provavelmente nem vai ter consequências praticas.
Não deixa no entanto de ter um aspecto positivo. No pós Guerra, foram muitas as organizações internacionais criadas com o melhor dos propósitos. As Nações Unidas, a Unesco , a FAO, a OMS, entre tantas outras, já representaram um capital de esperança extraordinário.
Infelizmente, com o passar dos anos, tornaram-se em enormes e dispendiosas estruturas burocráticas, funcionando em circuito fechado e cuja relevância prática é muito pequena quando comparada com os seus gigantescos orçamentos. A perspectiva de perpetuidade não estimula o necesssário e constante esforço de fazer mais e melhor.
Como dizem nos EUA, este anúncio poderá ser um “wake up call“ que desperte estas organizações para as suas missões. Ou o inicio do seu fim, abrindo caminho a novas e melhores organizações. Certo é que uma nova ordem internacional é necessária, e as instituições actuais não parecem ter motivação ou capacidade para tal.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
O meu respeito por epidemiologistas e demais especialistas está no chão. Para além de senso comum e um razoável domínio do óbvio, não oferecem nada. Como os futebolistas, apenas nos lembram que prognósticos só no fim do jogo.
A OMS não aconselhou o fecho de fronteiras no início da epidemia na China, possivelmente o único momento em que a Pandemia podia ter sido contida. A opacidade da sua informação sobre ensaios clínicos em curso encoraja os anúncios de curas milagrosas e não dá perspectivas reais quanto à possibilidade de soluções no medio prazo. Um desastre.
Tenho pena dos políticos no poder. Mesmo os que estão agora a fazer boa figura não conseguem saborear o momento, já sabem o que vem a seguir: quando a conta chegar, todos vão achar que a sua parte é excessiva. E os heróis de hoje passarão rapidamente ás bestas de amanhã.
Os Governos não têm a coragem de dizer que a saúde a qualquer custo ainda não é possível, não têm informação confiável e contam apenas com caminhos alternativos com custos colossais. Nada a que não devessem estar já habituados: decidir é sempre escolher entre opções alternativas e perder sempre alguma coisa por isso. Todos os anos morrem cidadãos por falta de cuidados médicos adequados por falta de investimento nos serviços de saúde. O que agora é substantivamente diferente são os maiores números de mortes e os enormes holofotes sobre uma infeção que pode vitimar qualquer cidadão. A atenção da população assustada está ao rubro e as (naturais) insuficiências e incapacidades do sistema de saúde e limitações orçamentais, em breve tornar-se-ão evidentes. Um problema.
Usando de optimismo, acredito que a inteligência e bom senso dos governantes seja posta ao serviço de todos, no reconhecimento que não há solução para esta trapalhada, em que os custos materiais, sociais e humanos para a sociedade e para quem decide, miraculosamente desapareçam.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
Depois de um primeiro e forte embate provocado pela emergência pandémica, já temos informação e tempo suficientes para análises mais serenas e informadas.
Em 26 de Março foi publicado este estudo muito oportuno, interessante, que vale a pena ler e que faz uma análise do que se passou nos Estados Unidos durante a epidemia de gripe Espanhola. As conclusões são claras: as medidas de confinamento, quanto mais rápidas e severas, melhores resultados produziram. Quer em termos sanitários (menos mortes), quer na recuperação económica que permitirão depois da epidemia.
Apesar de completamente convencido do valor deste estudo e da bondade das suas conclusões, assusta-me que estas conclusões sejam indevidamente generalizadas.
Existem muitas diferenças entre o que se passou em 1918 e a atual pandemia. A mais relevante é o facto de a gripe espanhola ser francamente menos discriminatória relativamente aos seus efeitos, não permitindo demarcar um grupo restrito de risco, como acontece atualmente com o Coronavírus.
Sabemos, hoje, que a quase totalidade das vítimas mortais do Covid 19 são os maiores de 70 anos e os portadores de um leque de doenças crónicas já identificadas.
Compreendem-se as medidas de confinamento gerais e severas como as que estão a ser usadas, quando não existia o conhecimento de qual a extensão e comportamento da epidemia. Parece ser pouco razoável não fazer evoluir as medidas em função da nova informação.
O que se deveria pretender combater são os malefícios da infecção, não a infecção. O objectivo é prevenir mortes, não doentes assintomáticos ou que recuperam sem mazelas importantes. Valerá a pena arrancar todos os dentes a alguém que só tem um dente infectado? Não seria mais adequado, de forma cirúrgica, garantir a proteção ao grupo realmente vulnerável e que já foi delimitado? Direcionando todos os meios necessários para garantir o seu conforto e segurança?
Para quem considere ser insuportável uma discriminação entre cidadãos, lembro que quem discriminou o grupo vulnerável não foi a sociedade, foi o vírus.
Certo é que até à vacina ou tratamento, vamos ter Covid19 e as medidas de confinamento gerais são insustentáveis a longo prazo. Abordagens alternativas precisam-se. Esta poderá ser uma delas.
A fome, subnutrição e desespero também matam. E sacrifícios desnecessários são absurdos.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
A vacina contra o Covid 19 está a mais de um ano de ser uma realidade. O desenvolvimento de um novo medicamento, não deverá acontecer tão cedo.
A grande esperança para podermos contar com um medicamento que alivie a gravidade da epidemia, serão drogas já existentes e que se mostrem eficazes no combate a uma doença para a qual não foram desenhadas.
A OMS lançou há uns dias um programa a que chamou Solidariedade, em que participantes em todo o mundo integrarão um gigantesco conjunto de ensaios clínicos.
São apenas 4 os medicamentos que são considerados, como verdadeiramente promissores.
REMDISIVIR
Um medicamento falhado para o seu alvo original (Ebola), apresenta como referencias estudos laboratoriais e em animais de 2017, que comprovou a sua valia nos coronavírus que provocam a SAERS e MERS. Existem dois relatos de cura em doentes dados como terminais. Estão já em curso 6 testes clínicos, sendo que um deles ( doentes graves) deverá apresentar conclusões no dia 3 de Abril.
CLOROQUINA E HIDROXICLORAQUINA
Incluindo neste programa sobretudo pela publicidade que recebeu por parte de Trump gerando a necessidade de esclarecer a sua real valia. Tem um elevado nível de toxicidade e para além de um estudo com aparentes bons resultados, numa amostra muito reduzida que mereceu criticas dos especialistas, já foi considerado pouco ou nada eficiente noutro pequeno estudo realizado.
RITONAVIR/LOPINAVIR
Um medicamento desenvolvido para combater a HIV, foi testado com sucesso para a MERS em Saguis, embora tenha produzido resultados ambíguos em seres humanos, quer com MERS quer com SARS. O primeiro ensaio clinico contra o Covid 19, realizado num grupo de 199 pacientes reportado em 15 de Março, não validou o seu valor, mas os médicos alertam que a alta gravidade da condição dos pacientes não descarta a possibilidade da sua eficácia em estádios menos grave da doença.
Rironavir/lopinavir e interferon-beta
Uma variante do tratamento anterior que está a ser testada na Arabia Saudita para infectados com MERS.
Quase outros 100 medicamentos, como o Avigan/favipiravir ou Kevsara, estão, também, em ensaios clínicos fora do programa da OMS.
A falta de pistas verdadeiramente promissoras (com eventual exceção do REMDISIVIR) leva ainda a olhar para o passado e repristinar técnicas medicas caídas em desuso com as vacinas, como a transfusão de sangue de pacientes que tenham anticorpos formados em doentes infectados. Não será uma solução universal, mas poderá ser potencialmente útil em casos pontuais.
Certo é que, até Maio deveremos saber se podemos (ou não) contar com ajuda medicamentosa no combate e controlo da epidemia no curto prazo.
Depois das tentativas mais auspiciosas, encontrar um medicamento que já exista e seja eficaz, tornar-se-á cada vez menos provável.
Restará sempre o milagre do sempre imprevisível génio humano (leia-se iniciativa privada).
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
Numa epidemia todos são potenciais vitimas. A disponibilidade associada a suportar os custos associados ao seu combate, é por isso alta. Os custos de um combate perfeito serão eventualmente insuportáveis mesmo para as mais ricas economias ocidentais.
O Imperial College do Reino Unido, revelou as suas previsões para três cenários da epidemia no Reino Unido. Nada fazer, implicaria cerca de 500.000 vitimas mortais. Ações moderadas de redução de contactos e salvaguarda dos mais idosos, resultariam em 260.000 mortes. Um confinamento severo de quase toda a população, até à existência de uma vacina, previsivelmente á distancia de 1 ano, reduziria o numero de vitimas a “meras” 20.000 vitimas.
Qualquer estudo previsional em realidades novas e complexas, por mais informado e competente que seja, comporta potencialmente erros tremendos. Mas dá nos balizas para pensar.
Os cenários a considerar são a escolha de um combate moderado e o total. Nada fazer não é obviamente uma opção. A diferença entre os dois cenários que restam são de cerca de 250.000 vidas.
Em termos económicos, um ano de confinamento severo dificilmente custaria menos do que 15 % do produto anual, uma estimativa grosseira mas razoável. No caso do Reino Unido, aproximadamente 430 biliões de dólares. Por calculo aritmético simples, cada vida salva custaria 1,7 milhões de dólares. Existem recursos para suportar este valor, ou mesmo 1/3 deste valor?
Infelizmente parece que as balizas da realidade ainda se sobrepõe aos desejos legítimos das populações, nomeadamente de minimizar vitimas.
José Miguel Roque Martins
Convidado Especial*
* As opiniões manifestadas nos textos de convidados com a assinatura "Corta-fitas" só comprometem os seus autores.
Que país é este? Que povo é que somos? Que raio de momento histórico andamos a registar por estes tempos?
Um povo meio indiferente às tragédias dos fogos e às inúmeras trapalhadas interpretadas por um sem número de figuras tristes do Estado e que não grita bem alto “assim não”. Onde pelas sondagens recentes cerca de 60% se revê num pacote que inclui Chico-espertos, comunistas e uma agremiação desmiolada.
Onde o Chico-esperto-mor sobrevive num jogo equilibrista e sem rumo, e onde a distribuição de amendoins cuida de elevar o agachamento em lugar da fibra e do brio.
Onde se confundem conceitos básicos como a ilusão e esperança. E de como o primeiro ultrapassa com facilidade a razão.
Onde uma coligação negativa e que se diz positiva mais não é do que uma ressonância fiel das caixas de comentários na internet e que se regozijam com uma hipotética azia dos outros (desespero, digo eu).
Onde o descaramento perante o assalto à coisa pública não provoca tumultos e onde a discricionariedade dos dirigentes encontra abundante complacência nos demais. Antes fossem Raríssimas estas situações.
Onde a mentira e o ludíbrio têm livre-trânsito. Sim, não é o consumo privado que puxa pela economia (nem pode). São antes as exportações e o turismo, coisa que bem sabiam. Mas como para isso nada contribuíram trataram de inventar uma narrativa. A treta do consumo privado serve simultaneamente essa narrativa e de engodo útil para iludir o pagode.
Onde a hipocrisia perdeu a vergonha. O que antes era pecado finge-se agora que não se vê. Sim, onde antes muitos viam o ruir do Estado Social agora fingem-se surpresos com as cativações e com o consequente estrebuchar do próprio Estado Social.
Onde o desabafo é elevado à condição de argumento.
Onde o mérito é olhado de soslaio e onde quem mais berra e ameaça é referência.
Onde poucos teriam coragem e independência para dizerem Não a Ricardo Salgado. Não se duvide que com este governo não faltariam acrobacias para tudo acabar num Sim.
Onde não se debate seriamente ao nível político mais alto temas tão relevantes e abrangentes como o suicídio demográfico em curso ou a sustentabilidade da segurança social. Ao invés privilegiam-se temas exóticos e corrosivos que afectam somente pequenas franjas da sociedade.
Onde o deslumbramento pelo elogio quente e de ocasião do turista é suficiente para a satisfação do ego. E como que por oposição, onde a confrontação fria a crua com a realidade incomoda muito mais do que a medida comum.
Será que somos assim mesmo? Os portugueses conseguem oferecer coisas maravilhosas. A segurança, o desenrascanço, as amêijoas à bulhão pato, os pastéis de nata, o peixe grelhado, o vinho, etc, são tudo coisas extraordinárias. Mas como medida do valor de um povo convenhamos que estão longe de esgotar os mínimos. Onde está a fibra? E o brio? E a honra? Sem outras exigências e sem outro estar, sem aquele incómodo assente em sólidos princípios e não no berro de circunstância corremos sérios riscos de nos tornarmos naquilo que se calhar já somos: uma mole indiferente, macilenta, vendida, acrítica, agachada, reles, e incauta.
Perdidos no tempo que voa, no acontecimento que nos ultrapassa, na inveja que nos corrói, na mentira que nos trai, e na ilusão que nunca se concretiza, de que nos servem meia dúzia de cavalos que querem correr e forjar novos caminhos se só lhes atrelamos um sem número de carroças e ainda por cima lhes colocamos obstáculos pela frente?
Tolhidos por uma maioria desesperada que se move em torno de grupos de pressão sem qualquer réstia de pudor em exigir o que não se pode dar e sempre prontos a pendurarem-se, vou-me interrogando sobre quais as soluções para aquela minoria que quer jogar o jogo pelo jogo e viver dentro das possibilidades, sem ilusões mas com esperança, e que pensa que Portugal pode ser bem mais do que um bando de arrogantes inconscientes para quem a desfaçatez, o berro e o disparate são a medida de sucesso, e onde a razão mais não é do que um mero empecilho.
Pedro Bazaliza
Convidado Especial
Parto do pressuposto de que não é sua responsabilidade, que têm currículos extraordinários, que os Deuses conspiraram, que os elementos são do contra, que foi um azar tremendo, etc. Enfim, todos os pressupostos possíveis e imaginários que protejam uns tipos que andam por aí e que se dizem ministros e secretários de estado. E até estendo a benevolência ao ponto de me abster em reclamar responsabilidades políticas.
Mas há um ponto impossível de contornar. Perante a tragédia dos fogos do último fim-de-semana preferir frases como: “Para mim seria mais fácil, pessoalmente, ir-me embora e ter as férias que não tive, mas agora não é altura de demissões”, “Têm de ser as próprias comunidades a ser proactivas e não ficarmos todos à espera que apareçam os nossos bombeiros e aviões para nos resolver os problemas. Temos de nos autoproteger, isso é fundamental”, “O país tem de ter consciência que a situação que estamos a viver vai seguramente prolongar-se para os próximos anos. O pacote florestal vai produzir efeito ao longo de uma década. Se julgam que há alguma solução mágica estão completamente enganados”, “O governo não tem nenhuma varinha mágica”. Quem profere estas frases na circunstância que todos sabemos não pode assumir cargos de responsabilidade pública.
A comparação pode não ser perfeita, mas imagine-se um alcoólico em último grau com uma cirrose tremenda e que agoniza desesperadamente no leito da morte, ou um doente com cancro do pulmão que fumou anos a fio três maços de tabaco por dia e que nos últimos minutos de vida vão ouvindo de quem tem obrigação de lhe segurar a mão “se não tivesses fumado não estarias assim” e “não tivesses bebido tanto”. Acaso achar-se-ia que essas seriam pessoas com perfil para acompanhar essas almas nesses terríveis minutos finais? Por mais fantásticos que fossem os currículos e por maior razão que lhes assistisse, nunca, mas nunca seriam pessoas com perfil adequado para acompanhar aqueles que agonizam.
Não sou pela política do afecto que entendo ser contra procedente e bastante irritante. Mas também sou contra gozar com todas as pessoas e desrespeitar aqueles que acabaram de viver experiências desesperantes.
Pelo exposto, entendo que há que demitir os ministros e secretários de estado que tiverem ser demitidos. Quanto ao primeiro-ministro, que é da mesma cepa, que fique. Precisamos de saber em eleições o que valem os Portugueses de hoje.
Pedro Bazaliza
Convidado Especial
Portugal tem nos próximos tempos de pensar muito bem na resposta a dar a si próprio sobre o estilo de classe dirigente que pretende promover. Nas últimas décadas desenvolvemos e promovemos caracteres muito pouco recomendáveis ao mais alto nível do nosso mundo político, económico e financeiro, muitos dos quais, aliás, a contas com a justiça. São inúmeros os casos e sobejamente conhecidos. Pena que, precisamente no momento em que aprofundámos e nossa relação com a UE deixássemos que o nosso perfil se angolanizasse ao invés de se noroeguizar.
É bom que Portugal mantenha boas relações com as ex-colónias, sendo seguramente uma oportunidade ímpar para todos os países envolvidos as oportunidades que essas relações podem proporcionar. Mas não são bons os termos que nos impuseram, que nos nortearam, e que marcaram o ritmo com que as relações se desenvolveram. O dinheiro, associado a pérfida subjugação da alma às suas directivas, inverteu os termos das relações. O bom juízo e o bom exemplo aconselhariam que os princípios seguidos por parte da nossa classe dirigente se tivesse aproximado mais daqueles adoptados pelos países do norte da Europa e que essa aproximação por arrasto tivesse servido como uma oportunidade de Angola elevar o seu padrão. Tudo com a finalidade de não permitir que o erro e o vício se sobrepusesse à razão e à virtude no uso do dinheiro de modo a melhor servir ambos os povos. Infelizmente assim não foi.
Chegados a este ponto, e com a fatal matéria judicial acumulada que o tempo e os perfis desarranjados e de alma corrompida sempre tratam de criar, resta-nos agora de uma forma apertada e meia encostada à parede ter de decidir se vendemos de vez a alma ou se, pelo contrário, juntamo-la de novo ao corpo e caminhamos de cabeça levantada em melhor direcção.
O processo não será fácil e muito argumento pragmático e descarado anda por aí ao virar de cada esquina. De Angola surgem reacções escandalizadas com o desplante da nossa justiça relativamente a um seu ex-vice-presidente. De Portugal Paulo Portas, ainda em 2016, no seu congresso de despedida apelou aos órgãos de soberania para evitarem "a tendência para a judicialização da relação entre Portugal e Angola", considerando-a "um caminho sem retorno" e procurarem "em todas as frentes o compromisso".
Espantoso o estado a que chegámos. Para além de se querer vender a ideia de que por imperativos económicos Portugal se deve agachar ao ponto de parquear a sociedade de direito sempre que a Realpolitik assim o decretar, passou ainda meio despercebido o facto de um ex-líder partidário fazer apelos explícitos ao poder judicial num congresso partidário. Como se vê o ajustamento de Portugal transcende em muito um mero ajustamento financeiro. Aparte do ajustamento partidário que anda a provar ser quase impossível de fazer e que tanta falta faz para consolidarmos a nossa frágil democracia, sobra ainda o mais importante de todos: o ajustamento do carácter.
Pedro Bazaliza
Convidado Especial
Por um mecanismo que me ultrapassa em Portugal parece ser possível que um conjunto minoritário de desmiolados tenha poder de decisão sobre matérias cruciais com impacto negativo para décadas. As nacionalizações deram o pontapé de saída. À subsequente falta de capital substituiu-se o mesmo por dívida com as consequências que se conhecem. Tivemos também as ocupações de terras, outro belo exemplo de estroinice. Duas intervenções do FMI no último quartel do século passado, o que também é interessante. Já neste século tratámos de arranjar mais uma. Esta mais séria e profunda, não fosse a rapaziada desabituar-se de andar a bater com a cabeça na parede. E por estes dias andam por aí umas luminárias para quem as coisas por si só podem correr bem e que para cúmulo resolveram andar de mão dada com os dos amanhãs que cantam. Pergunto: tem de ser assim? Será que não dá para ser ajuizado?
Há por aí agora um novo insólito. Bem fresquinho. Como é sabido os desmiolados nunca se entenderam muito bem com o mercado e com a balança de pagamentos. A aberração da falta de um verdadeiro mercado de arrendamento levou ao apodrecimento das cidades. E a psique de nos acharmos mais do que somos tratou de preterir a produção pelo consumo e o dever pelo direito, pelo que maltratámos muito e por demasiado tempo a balança corrente. No processo os desmiolados lá estavam sempre a berrar e a inviabilizar qualquer solução. Até que finalmente, e como que por uma luz divina (ou quiçá necessidade extrema), todos se convenceram que afinal servir turistas é que era. Mas quando um conjunto celeste de circunstâncias se uniu e desatou a despejar turistas em Portugal com o consequente efeito positivo na balança de pagamentos e no melhoramento das cidades, os estridentes do costume e que nunca dão soluções começaram a berrar. Não nego a existência de problemas, mas será que a situação actual é obra do ocaso ou é antes o resultado da nossa incapacidade de lidar em tempo útil com a balança corrente e com o mercado de arrendamento?
Mas o maior insólito anda a decorrer desde há uns anos. Com uma taxa de natalidade absurdamente baixa e com uma alta drenagem de jovens para o exterior, o país em vez de gastar tempo com a natalidade e de como fixar as pessoas em Portugal entretém-se antes a gastar tempo em temas que desembocam em opções meio bizarras (conhecidas por aí como fracturantes).
Pedro Bazaliza
Convidado Especial
Existem muitas razões para atacar a gerigonça que nos desgoverna. O tempo, esse malfadado elemento que associado à realidade coloca tudo a nu, trata de evidenciar de uma forma mais nítida a natureza dos elementos que formam a massa mal acabada que pastoreia o que resta de Portugal. O ilusionista mor que por aí anda, agora apertado pelas circunstâncias que o vão ultrapassando e com aquelas que fatalmente vêm a caminho, adoptou o descaramento como retórica oficial. O fenómeno não será novo. Todos nós já teremos testemunhado que quando o aperto é muito e o argumento é pouco o disparate desbocado surge como o último recurso do ilusionista.
Acontece porém que, ao contrário dos outros ilusionistas que o antecederam este é mais manhoso e montou uma gerigonça que simultaneamente viabiliza a ilusão por troca de dislates e limita o ruído por troca de prebendas, promovendo assim a efectiva socialização do disparate e o eleva à condição de Verdade. Daí a estupefacção geral perante as contraditórias e tontas reacções oficiais a Tancos ou ao fogo de Pedrogão, ou a história de aumento da dívida que não passa pelo défice, ou as cativações “inesperadas”, ou a redução muito para além do razoável do investimento público. O convívio sereno dos constituintes da gerigonça perante tamanhos absurdos, que no caso dos incêndios chega ao ponto de impor a democrática e muito plural “lei da rolha”, anuncia que passando o disparate a ter via verde e ser muito menos escrutinado vamos viver eternamente em silly season por esta passar a ser o estado natural das coisas.
Permito-me concluir pois que bem poderemos estar perante um problema de saúde pública ao nível da psique. Um pouco à semelhança da vulgarização das dívidas como causa do vício das mesmas, de que a pergunta “Quando é que compras um carro novo?” ou o objectivo oficial de ter um défice público de 3% para uma economia voltada para o endividamento e consumo interno serão bons exemplos, a total vulgarização do disparate pode vir a ser um óptimo veículo para uma sociedade sem referências sólidas ao nível da razão e do argumento. E uma sociedade com escassa capacidade para lidar com a razão e o argumento tem muito menos possibilidades de ser uma sociedade de progresso e bem-estar. Este, mais do que uma nova intervenção externa, pode bem ser o pior legado desta geringonça.
Pedro Bazaliza
Convidado Especial
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
O post não diz, nem sequer sugere, que Moedas não ...
Sempre se soube que Moedas não servia, é apenas o ...
Ninguém proibiu a bola mas fecharam restauração
Podiam começar por resolver o problema de Cabo Del...
O incitamento à violência é (creio eu) crime. Se a...