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Sobre a TAP

por henrique pereira dos santos, em 04.09.24

Não deixo de ficar comovido, e achar mesmo enternecedor, a quantidade de boas pessoas cuja credibilidade vai ao ponto de acreditar que toda a gente que diz asneiras sobre a privatização da TAP desconhece os factos que descrevo, transcrevendo ipsis verbis o que escreveu Carlos Guimarães Pinto (antecedida, a transcrição, de outro facto: Miguel Pinto Luz chega ao processo de privatização em 30 de Outubro de 2015, quando toma posse o governo que formaliza o que já tinha sido decidido em Junho desse ano, sem a sua intervenção):

"Não, a TAP não foi “comprada com o seu próprio dinheiro”.

Algo que se percebe facilmente porque:
1) A TAP não tinha dinheiro nem para as suas despesas correntes quanto mais para financiar a sua própria compra.
2) O montante que se diz ser da própria TAP não ecistia antes do processo de compra e nunca existiria se não tivesse havido processo de compra
3) Esse montante não foi usado para pagar o preço de compra da TAP, mas para injetar diretamente na TAP para a TAP poder responder aos seus compromissos.

De onde é que surgiu esta narrativa então? De forma simplificada (mas longa):

1. Em 2015 a TAP estava com grandes dificuldades financeiras. O seu valor era próximo de zero (provavelmente negativo) e no processo de privatização não apareceram muitos compradores.

2. O principal fornecedor a quem a TAP tinha dificuldades em pagar era a Airbus a quem tinha feito uma grande encomenda de aviões 10 anos antes.

3. Em 2015, foi feito o acordo de venda de 61% TAP a David Neeleman pelo valor de 10 milhões de euros, tendo David Neeleman assumido o compromisso de injetar mais 217 milhões de euros na TAP para que a TAP pudesse continuar a pagar salários e aos fornecedores. Ou seja, a TAP foi vendida por 10 milhões de euros.

4. Os 217 milhões de euros (o montante de que se fala) foi uma injeção feita na própria TAP porque, lá está, a TAP não tinha dinheiro.

5. Onde é que David Neeleman foi buscar 217 milhões de euros para injetar na TAP?
Ele levou o seu projeto para a TAP à AIRBUS que tinha, obviamente, interesse que um cliente como a TAP continuasse a funcionar. A AIRBUS acreditou no projeto e aceitou trocar a encomenda de grandes aviões que tinha na altura por uma encomendas de aviões mais pequenos (parte da estratégia de Neeleman) e ainda disponibilizar imediatamente os tais 217 milhões de euros (“fundos AIRBUS”) para viabilizar financeiramente a TAP.

6. Estes “fundos AIRBUS” foram disponibilizados a David Neeleman para que ele pudesse injetá-los na TAP e não à TAP diretamente. Ou seja, nunca existiriam se não houvesse processo de compra.

6. O interesse da AIRBUS era, obviamente, que a TAP continuasse a funcionar e a pagar encomendas. A AIRBUS protegeu-se colocando como penalização caso a TAP não pagasse as encomendas no futuro os tais 217 milhões de euros (“fundos AIRBUS”).

7. David Neeleman comprou a TAP por 10 milhões e meteu os 217 milhões de “fundos AIRBUS” na TAP para que a TAP pudesse pagar a fornecedores e trabalhadores.

Ou seja, os 217 milhões de euros que dizem ser “dinheiro da própria TAP” era dinheiro que
- a TAP não tinha (daí precisar que o injetassem)
- não foi usado para comprar as ações da TAP
- entrou na TAP apenas porque Neeleman negociou com a AIRBUS essa entrada.

A única ponta de verdade nesta história é que a AIRBUS só aceitou ceder os 217 milhões de euros porque acreditou que com o projeto de Neeleman, a TAP iria ser capaz de pagar as encomendas. Ou seja, indiretamente, o dinheiro que a TAP iria gerar no futuro compensaria a tal injeção de 217 milhões de euros. É a isto que chamam "dinheiro da própria TAP": dinheiro que não existia, que não estava na TAP, mas que a AIRBUS acreditou que pudesse gerar no futuro com o projeto Neeleman."


9 comentários

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De Anónimo a 04.09.2024 às 09:42

Agradeço este seu esclarecimento. Texto muito elucidativo.
Outra coisa, que não é assunto, mas como sabemos, porque todos temos assistido, os Secretários de Estado não são conhecidos antes da tomada de posse dos Ministros. 
Todos nos lembramos que decorrem alguns dias até que se conheçam as nomeações dos Secretário de Estado e depois disso é que tomam posse também. 
Portanto, há dois momentos distintos e só então está formalmente e oficialmente, constituído o novo governo (embora ainda estejam a decorrer as nomeações das assessorias, chefes de gabinete etc). 
Ora, se o governo durou o que durou _ dizem por aí que 28 dias mas não confirmei _  então significa que o Secretário de Estado Miguel Pinto Luz terá estado apenas duas semanas, mais coisa menos coisa... isto é, mal teve tempo de se coçar (passe o plebeísmo).


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De Anónimo a 04.09.2024 às 11:45

...mas pronto! o que interessa é arranjar um culpado a todo o custo. 

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