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Sim, está bem, mas...

por João-Afonso Machado, em 31.01.23

Nunca li o diploma que anda cá e lá entre a AR e o TC e nada tenho a comentar ou ajuizar sobre as pessoas que querem morrer - pela sua própria mão ou com a ajuda de outrém.

Já quanto a estes "outréns" serão eles, penso eu, médicos apenas, daqueles que eu não consigo entender: porque ainda que consentidamente (mesmo a pedido), estão a matar um ser humano, no exercício e por causa da sua profissão que consiste (creio) sobretudo em salvar vidas e garantir a a saúde e o bem-estar possiveis. Residirá aí uma primeira questão prática a que nunca ouvi aludir: ou muito me engano, ou a esmagadora maioria dos médicos invocará a objecção de consciência para se escusarem a intervir na "morte assistida" dos seus doentes terminais. Os restantes - uma minoria, na minha previsão, - ficará conhecida por tal, por essa faceta de carrasco amigo. Não advirá por este caminho uma nova distinção entre os profissionais da Saúde? E com que consequências?

A segunda questão prática que a moda da eutanásia levanta ainda consegue ser mais preocupante. Neste "mundo cão", quem defende os doentes (sobretudo os do foro psiquiátrico) de qualquer tipo de estímulo, mais ou menos rebuscado, a optarem pela morte voluntária como meio de pôr cobro ao seu sofrimento e (principalmente) às maçadas que causam a tantos?

Se esta questão não fosse pertinente, o incentivo ao suicídio não estaria previsto nem seria punível pelo Código Penal...



22 comentários

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De Anónimo a 31.01.2023 às 13:05

Neste "mundo cão", os países que aprovaram a eutanásia abriram a caixa de Pandora, pois também assistiram à inevitável "rampa deslizante", porque não houve regulamentação que evitasse o progressivo aumento das situações onde cabe toda a espécie de "dores insuportáveis" que são sempre subjectivas.
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De Alexandre N. a 31.01.2023 às 13:12

É um tema muito complicado, mas podiam deixar os actos propriamente ditos, nas mãos dos familiares ou de quem o visado consentisse e nunca nas mãos dos médicos.
Mas como já disse é um tema muito difícil e eu não consigo tomar partido por nenhuma das partes.
O que tenho a certeza é de que muita coisa falha nos cuidados de saúde.
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De O apartidário a 31.01.2023 às 14:05

Concordo, sem dúvida alguma. Com uma ressalva, será sempre um médico(ou equipa clinica) a diagnosticar se determinado doente está ou não em condições de pedir a dita eutanásia. 
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De Anónimo a 31.01.2023 às 14:36

" podiam deixar os actos propriamente ditos, nas mãos dos familiares".
Isso daria um jeitão a pessoas frias e sem escrúpulos, caso estivesse em jogo uma herança muito apetecível, não acha? Será para prevenir "eventuais" situações dessas que só se poderá entregar os tais actos exclusivamente aos médicos. 
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De Alexandre N. a 31.01.2023 às 20:27

Não sei se me fiz entender, o que quis dizer era que os familiares, vamos supor, "acionassem o botão da injeção letal" após ter sido tudo devidamente visto e autorizado pela autoridade de saúde, dispensando assim os médicos do papel de " carrasco", colocando assim o "peso" nas mãos dos familiares.


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De Martim Moniz a 31.01.2023 às 17:17

Parece claro que há dois momentos em questão, um é a decisão de facultar a eutanásia a alguém,outro é a consumação dessa decisão (presumo que seja a este que o comentador Alexandre se refere quando diz "os actos propriamente ditos" .Ora uma vez que se decida pela  dita eutanásia (e no caso da lei acabar por ser aprovada ou outra similar) a alguém será indiferente, para o  doente(não para a pessoa que pratica o acto,e aqui estou com o autor do post) que vai morrer seja quem for a praticar a consumação do acto. 
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De Bilder a 01.02.2023 às 12:24

"Ora uma vez que se decida,depois de aprovada uma lei,pela  dita eutanásia  a alguém será indiferente para o  doente que vai morrer seja quem for a praticar a consumação do acto. " --- aqui está o último parágrafo de meu coment acima,sem os apartes entre parêntesis, para que não haja confusões quanto ao sentido do texto.       -- Martim Moniz 
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De IO a 31.01.2023 às 17:54

Se é "normal" no SNS um doente esperar durante meses c por uidados cirurgicos e outrs...quanto tempo terá de esperar para que 2 ou 3 médicos declara a eutanásia "aprovada"!!!
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De Anónimo a 01.02.2023 às 10:18

«...dispensando assim os médicos do papel de " carrasco"», logo, esse papel de "carrasco" transitava para os familiares, certo? 

Quem é capaz de pensar assim e expressá-lo em palavras com tanta naturalidade, não duvido de que passaria à "acção" com a mesma naturalidade (se for consequente com as suas afirmações). 
Mas para quem considera difícil formar um juízo sobre o tema, será precipitado verbalizar uma opinião sem ter antes pensado bem no assunto.  Porque... uma simples palavra com impacto pode provocar uma ligeira perturbação inicial mas, logo a seguir, desencadear o caos, com consequências impensáveis: o tal efeito do "bater de asas de uma borboleta". 


«Cuidado com seus pensamentos, pois eles tornam-se palavras.
Cuidado com as palavras, pois elas tornam-se ações.
Cuidado com as ações, pois elas tornam-se hábitos ...
Nós nos tornamos, naquilo que nós pensamos».


( Margaret Thatcher)
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De Anónimo a 31.01.2023 às 14:45

... com tudo , particularmente sensível à  "(,,,) segunda questão prática que a moda da eutanásia levanta ainda consegue ser mais preocupante. Neste "mundo cão", quem defende os doentes (sobretudo os do foro psiquátrico) de qualquer tipo de estímulo, mais ou menos rebuscado, a optarem pela morte voluntária como meio de pôr cobro ao seu sofrimento e (principalmente) às maçadas que causam a tantos?" - sublinhando a bold, acho que quase, tido, mas quem defende estes mais frágeis, de ser(em) 'manipulados' (e eutanasiados)? É nestes em quem mais tenho pensado (sobre)..


A última questão, parágrafo é mesmo mais do que oportuna recordar ! lembra! Como é? Em que ficamos no "Código Penal?".
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De Costa a 31.01.2023 às 17:28

Art. 135 do CPP. 
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De João-Afonso Machado a 31.01.2023 às 17:41

Amigo Costa: penso que se refere ao art. 135º do Código Penal e não ao mesmo do Código do Processo Penal (este último versa sobre o segredo profissional - que in casu só reforça o caracter escondido do acto de "morte assistida", ou seja, a vergonha do médico que assim procede).
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De Costa a 31.01.2023 às 17:52

Toda a razão, meu caro. O segundo "P" está a mais. Por puro acidente (e não trauma; ainda que "cadeira" de menos grata memória, essa de Processo Penal).
Grato pelo reparo.
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De Francisco Almeida a 01.02.2023 às 10:15

Toda a moral, toda a ética, todo o sistema jurídico necessita de uma base ancoradora, sobre a qual se constrói o edifício. Essa base na civilização ocidental é a vida. Discutiu-se e discute-se quando se inicia a vida - separação com vida do corpo da mãe no nosso sistema jurídico - mas é sobre esta que tudo se constrói, desde a liberdade aos direitos universais aos direitos materiais. E obviamente também à ética médica.
A eutanásia desloca o direito à vida pelo direito à qualidade de vida, por enquanto apenas à muito forte falta de qualidade. É, como foi já dito, uma caixa de Pandora.
Sabemos que o branco é o conjunto de todas as cores e que o negro, como conceito, é a ausência de côr, de luz para ser mais exacto. Por isso não é possível adjectivar ou abrir "nuances" para o negro. De igual forma a morte não é definível "de per si". A morte é a ausência de vida. Não tem existência própria e por isso nunca pode ser regulada.
O que pode ser regulado é a sua imposição. E deveria ser um fortíssimo alerta para as consciências o movimento lento mas sempre progressivo pela abolição da pena de morte.
A lei da eutanásia propõe a morte por motivos de bondade. Se a generalidade das pessoas tivesse uma cultura filosófica básica (é o que tenho, não mais) logo perceberia que a eutanásia é uma aplicação do princípio de que os fins justificam os meios. Isso deveria ser o bastante para acender luzes vermelhas. Mas de facto é apenas o mínimo.
Se é a bondade que dita a aplicação, abre-se toda uma panóplia de variáveis, de valores relativos sujeitos a diferentes apreciações pessoais. Tudo o que nunca deveria existir na Lei. O autor apontou duas, comentadores acrescentaram outras mas o essencial é isso mesmo. Não é possível um critério rigoroso nem sequer um critério empírico pois a variedade de pessoas, tradições familiares etc. aliado é impossibilidade de aplicar o método científico por não ser possível a experimentação, impede o rigor e a clareza.
Então o que vai acontecer? Isso já se pode prever.
O início será minimalista, o que deixará muitos insatisfeitos. Se a vida já não é indiscutível, alguém perguntará com belíssimas intenções, se um doente sem sofrimento mas sem possibilidade de recuperação, pode continuar a ocupar uma cama de cuidados intensivos, impedindo a sua ocupação por outro que possa recuperar. É um pequeníssimo exemplo mas podia encontrar outros e a conclusão é apenas uma. A "rampa deslizante" é inevitável.
Sendo diferentes as sensibilidades em relação a conceitos como bondade ou sofrimento (para não falar já de utilidade social que é o fim previsível a longo prazo) a regulamentação da lei ficará dependente de maiorias ocasionais. E cada "aperfeiçoamento" será mais um passo para o abismo.
Será excessivo? Não é. 
Analisando a "inevitabilidade da rampa deslizante" como conceito (a verdade é a adequação do conceito à realidade) sabemos o que aconteceu nos poucos países que aprovaram a eutanásia. Do mundo ocidental, Canadá, Holanda e Bélgica já têm alguns anos de experiência e em todos houve alargamento do conteúdo e nos três já houve casos chocantes como tem vindo na imprensa. E o mais chocante na Bélgica que foi o primeiro dos três a aplicar a lei. Diria que a "inevitabilidade da rampa deslizante" está provada cientificamente. A experiência real validou o conceito.
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De Susana V. a 01.02.2023 às 10:45

Excelente comentário que subscrevo na íntegra.
Acrescentaria apenas que o suicídio não é crime. E que apenas uma ínfima parte dos que podem pedir a eutanásia não se podem suicidar se desejarem fervorosamente a morte. 
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De João-Afonso Machado a 01.02.2023 às 11:54

Curiosamente, tudo passa ao lado do dado mais concreto que apontei no meu post: a objecção de consciência dos médicos, os únicos autorizados a praticar a "morte assistida". Ou seja, a lei sendo aprovada, vai esbarrar com recusas que a tornam quase inútil. Salvo num aspecto ilusório: a eutanásia é permitida, somos tão modernos como os ouros. Enfim, o costume.
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De O apartidário a 01.02.2023 às 14:00

Acompanho as suas interrogações e perplexidades. No entanto há outra questão paralela a essa (ou transversal se quiser),vão estar os hospitais (sabendo como é agora) capazes de dar resposta ao aumento previsto de idosos em fim de vida tendo em conta a falta de centros geriátricos e afins? 
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De João-Afonso Machado a 01.02.2023 às 14:15

A avaliar por estes malandros que estão no Governo, a resposta é não. Nunca os serviços públicos funcionaram tão mal.
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De Catarina a 01.02.2023 às 13:02

Exactamente. Subscrevo ponto por ponto. Não era capaz de tamanha clareza.
Cumprimentos,
Catarina Silva
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De Anónimo a 02.02.2023 às 10:43

" vão estar os hospitais (sabendo como é agora) capazes de dar resposta ao aumento previsto de idosos em fim de vida tendo em conta a falta de centros geriátricos e afins?"
Como diz o JAM, a resposta é claramente um Não.
 
Por conseguinte, o pior que pode vir a acontecer, será a eutanásia  não ser uma escolha plenamente Livre, mas condicionada por não haver outra saída, uma vez que o Estado simplesmente não oferece outras propostas ou soluções, i.e., não  proporciona  outros meios alternativos de assistência   necessários para aliviar o sofrimento a quem os solicitar . O facto de um doente não desejar a dor, nem sempre significa que deseje a morte. Mas se o Estado não dá essa garantia de escolha ao doente, i.e., se o Estado abdica das suas funções, então o doente está subordinado ao que  há ,  não tem escolha  e vê-se "empurrado" para a única solução que está subentendida, ou talvez sub-repticiamente "insinuada". (Bastante perverso... diga-se).
Mas chamam-lhe "morte digna"!!! 
Salvo se for uma decisão livre e consciente_   tudo o resto me parece  uma fraude cheia de má-fé e uma tremenda deslealdade em relação ao Contrato Social: bem podemos dizer que os socialistas estão a liquidar o Acordo estabelecido entre os Cidadãos e o Estado Social.
Que expectativas há diante deste Partido-do-Estado (não ocorre outro nome) que vai encerrando as suas funções mais elementares (Serviços de Saúde capazes de dar respostas)?

 É de supor que surgirão muitas  oportunidades de negócio para explorar este novo "filão" da morte _ a criatividade humana não tem limites...

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De Anónimo a 04.02.2023 às 15:40

Pois é! Neste país, a saúde está pela hora da morte.
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De pitosga a 01.02.2023 às 19:38


Para aliviar:
Há mais de 10 anos, antes de darem a injecção fatal, nos EUA desinfectavam a pele do condenado com álcool.
Cumps

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