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Há perto de quinze anos escrevi este post sobre Sócrates (que, então, estava no auge do seu poder).
Ontem escrevi um post que é essencialmente igual, sobre António Costa e Luís Montenegro.
Tanto num caso como noutro, explicitamente escrevia que discutir se alguém é corrupto ou não é assunto que deixo para a polícia resolver (independentemente da opinião que eu tenha sobre cada pessoa, se há coisa que aprendi é que as pessoas não têm escrito na testa que são aldrabões ou ladrões e que os melhores aldrabões são exactamente os mais simpáticos, razoáveis e sensatos, porque sabem que o êxito das suas aldrabices dependem da confiança que conseguem criar nos outros).
Num caso como noutro, o que me interessava era a forma como se tomam decisões ou se reaje às circunstâncias.
A razão pela qual sou especialmente sensível à forma como se tomam decisões (ao ponto de mudar o meu voto natural nas próximas eleições por causa da forma como foram feitas as listas da IL em Lisboa) prende-se com o meu pessimismo antropológico: acho que somos todos mais ou menos iguais, todos mais ou menos permeáveis aos estímulos externos, em todos a carne é fraca e a natureza humana é o que é (não sendo grande coisa, sob muitos aspectos, permite-lhe tocar e cantar a Paixão Segundo São Mateus, de Bach, o que é notável).
Haverá santos, com certeza, mas são poucos, difíceis de distinguir dos melhores aldrabões e, frequentemente, a sua santidade reside na forma heróica como reagem a circunstâncias de um determinado momento, podendo ter sido do piorio o resto da vida.
Daí que discutir a superioridade moral do António e do Manuel seja matéria que não me interessa por aí além, o que me interessa é a discussão sobre a forma e o contexto em que se tomam decisões.
Por exemplo, pretender que fazer buscas à casa oficial do primeiro-ministro, diligência que é impossível executar em segredo, e não dar qualquer informação concreta sobre o que motiva essas buscas defende melhor o bom nome do primeiro-ministro que fazê-las acompanhadas da informação pública mínima que permita às pessoas fazer juízos sobre o que está em causa, é uma ideia que, para mim, não faz o menor sentido.
Andar com telefonemas e outras diligências não publicamente controláveis para tomar decisões admnistrativas que beneficiam pessoas ou organizações, em vez de reuniões formais com registo do que se passa nessas reuniões, é uma prática errada para mim e indiciadora de uma cultura política que favorece a corrupção e o tráfico de influências.
Discutir este tipo de regras em abstracto parece-me muito mais útil que andar a discutir se Montenegro me inspira confiança ou não, ou se ponho as mãos no fogo por ele ou não (não ponho por mim, quanto mais por terceiros).
Se quando faço um post, estritamente sobre a diferença de reacção de Costa e Montenegro face à notícia de um inquérito judicial em curso, há tantas reacções primárias de quem tem opinião definitiva sobre a substância dos factos que seria dispensável haver polícia e tribunais, é mesmo porque não temos grande apreço por regras gerais aplicáveis a todos, isto é, que a qualidade das nossas instituições é um assunto que não interessa a muita gente.
Eu sei que não deveria ter dúvidas sobre isto, de tal maneira foi fácil a António Costa livrar-se da sua mais que antiga e próxima ligação a Sócrates, com o argumento infantil de que não deu por nada.
Eu, que nunca trabalhei tão próximo de Sócrates como António Costa, que nunca o apoiei em coisa nenhuma, e a quem bastaram umas semanas a vê-lo actuar como secretário de estado num ministério em que eu era sub-director geral, fiquei rapidamente vacinado em relação aos seus métodos e António Costa nunca deu por nada?
Um dia, quando Sócrates era o Ministro do Ambiente e estava em Aveiro, entra no carro e diz ao motorista: tenho uma reunião em Lisboa daqui a uma hora e meia e quero chegar a horas. Entretanto vou dormir mas aviso já que não o autorizo a conduzir em excesso de velocidade.
Histórias destas ouvi às paletes e definem muito bem Sócrates, colocando um seu subordinado entre a espada e a parede, levando-o a não cumprir a tarefa que lhe é dada (estar a horas) ou não cumprir as regras, mas encontrando uma forma de responsabilizar totalmente o motorista pelo incumprimento das regras, se houvesse um problema.
Para mim, isto tem importância porque é um evidente abuso de poder exercido sobre quem não se pode defender e define uma pessoa.
Para António Costa deve ser uma boa história e uma boa solução criativa para resolver um problema.
Por isso fiquei vacinado com os métodos de Sócrates ao fim de algumas semanas de convívio distante e António Costa (tal como todo o PS) não viu nada durante anos de colaboração próxima.
Os posts são sobre isto, sobre formas decentes e indecentes de tomar decisões e de reagir a contextos.
Responsabilizar o Ministério Público pelos efeitos de uma decisão própria é uma forma indecente de lidar com a notícia de um inquérito judicial que tem como efeito a erosão das instituições.
Realçar que o Ministério Público está a fazer o seu trabalho e se discute no fim quem tem razão é uma forma decente de lidar com a notícia de um inquérito judicial que tem como efeito o reforço das instituições.
Se Montenegro é corrupto, se houve tráfico de influências e essas coisas todas, não sei, não faço ideia e espero que a polícia e o Ministério Público façam competentemente o seu trabalho.
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