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Filipe Froes, consultor da Direcção Geral de Saúde e coordenador do Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos para assuntos relacionados com a covid terá dito ao Público "Apesar de os números serem favoráveis, temos de continuar a insistir na eliminação de toda a actividade viral e em ganhar as melhores condições para a retoma económica e social ... é preciso aproveitar a dinâmica positiva para erradicar a actividade do vírus".
Escrevo terá dito porque não acredito que alguém com um mínimo de conhecimento sobre o assunto diga isto.
Se dúvidas houvesse, vejamos uma notícia de hoje: "Na terça-feira, Ardern já tinha ordenado o restabelecimento do confinamento da maior cidade do país, Auckland, após o aparecimento de quatro casos do novo coronavírus ao fim de 102 dias sem registo de qualquer contágio local. Os quatro casos foram identificados na mesma casa, mas a origem é desconhecida. Auckland entra hoje no nível 3 das medidas de confinamento, o que significa que a população deverá ficar em casa e os bares e outros negócios terão de fechar portas. Os ajuntamentos estarão limitados a 10 pessoas. As escolas estarão fechadas por três dias. O resto do país entrará no nível 2 das medidas, no qual bibliotecas e espaços públicos podem manter-se abertos caso respeitem as medidas de contenção. A primeira-ministra neozelandesa admitiu a possibilidade de adiar as eleições, agendadas para 19 de setembro".
Resumindo, num país que é uma ilha no fim do mundo, em que todos os aeroportos e portos estão basicamente fechados desde Março, em que a epidemia surge no fim do Verão, portanto em condições ainda bem mais favoráveis que as do hemisfério Norte, que tem uma baixa densidade populacional, que teve uma taxa de ataque da epidemia especialmente baixa e em que foram adoptadas medidas extraordinárias, bastaram quatro casos testados positivos para voltar a fechar tudo, seguindo a lógica absurda de "erradicar a actividade do vírus", coisa que nunca foi possível sem vacinas e, mesmo com vacinas, só foi realmente reconhecida como erradicada a varíola, mais doença nenhuma.
A ideia que Filipe Froes pretende passar de que "erradicar a actividade do vírus" é bom para a actividade económica e que uma boa solução é resolver tudo o que diga respeito à epidemia antes de pensar no resto, tem o pequeno problema de não ser exactamente uma ideia, mas sim uma fraude.
E tanto é uma fraude do ponto de vista de saúde pública - erradicar a actividade de um vírus com as características deste é uma impossibilidade - como é uma fraude do ponto de vista da actividade económica e social - a sociedade e a economia têm instrumentos para lidar com a incerteza, por exemplo, quanto à confiança das pessoas para voltarem a viajar, mas não têm instrumentos para lidar com a arbitrariedade do Estado, que abre e fecha o que entende, quando entende, da forma que entende, sem sequer explicar os critérios que estão na base das decisões.
Eu sei que a resposta normal para as minhas discordâncias é que não é possível que esteja toda a gente errada e portanto se todos os governos acabam a convergir nas mesmas medidas, é porque provavelmente há alguma racionalidade nisso.
Em primeiro lugar nem sequer é verdade que toda a gente convirja para as mesmas medidas, para o que todos os governos convergem é para a redução do seu risco político, tudo o resto é diferente de sítio para sítio ou de tempo para tempo.
Por outro lado, quando se verifica que um médico do Instituto Ricardo Jorge envolvido na produção da informação oficial sobre a epidemia, é também o presidente da associação dos médicos de saúde pública, que fala frequentemente nessa qualidade e também pertence ao gabinete de crise da Ordem dos Médicos (para além do PSD), percebe-se melhor como é fácil haver convergência de opiniões na gestão da epidemia.
Infelizmente, é uma convergência com base numa ideia cuja utilidade está por demonstrar, mas cujos efeitos económicos e sociais estão muito bem documentados e que na verdade tem vindo a afirmar-se numa rampa deslizante progressivamente mais radical quanto à necessidade de "erradicar a actividade do vírus" e mais cega quanto à necessidade de erradicar a falta de senso em todo este assunto.
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