Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]
"Presume-se pois que, quando o Estado proibir finalmente as raspadinhas ou as tornar menos ubíquas, se vai levantar um coro virtuoso de protesto".
Na base desta frase, interpreto eu, está a ideia de que o Estado proibir uma coisa má é, intrinsecamente, um passo na direcção certa.
Vale a pena discutir o que se pode saber sobre esse pressuposto, e o exemplo das raspadinhas serve, como qualquer outro.
Em primeiro lugar, as raspadinhas são uma prerrogativa do Estado, uma sofisticação das rifas que sempre houve em qualquer lado.
Portanto o Estado proibir as raspadinhas não é nenhuma novidade: elas já são proibidas, o Estado é que desenhou, para si (é o Estado que explora o jogo e é o dono da Santa Casa da Misericórdia), uma excepção.
Tirando este pormenor, a questão que se põe é a de saber se sendo as raspadinhas uma chaga social que atinge sobretudo as classes sociais de menor rendimento, com efeitos sociais negativos para os próprios, embora com efeitos sociais positivos para os que beneficiam dos apoios da Santa Casa da Misericórdia, a proibição é a melhor solução para se obter o resultado que se pretende: defender as pessoas delas próprias.
Esta solução, proibir o que se considera errado - cobiçar a mulher do próximo, por exemplo - ou o que se considera perigoso para o bem estar de alguém - o consumo de drogas duras viciantes, por exemplo -, é uma solução com milhares de anos de aplicação e, por isso, existe abundante evidência sobre os efeitos sociais dessas proibições.
Quando a proibição corresponde a uma sentimento social generalizado - não matarás - ela não resolve o problema, na medida em que continua a haver assassinatos, mas dá origem a um conjunto de medidas que pretendem defender terceiros dos efeitos negativos dos assassinatos.
A proibição, nessas circunstâncias, é apenas uma condição administrativa que permite ao Estado aplicar o monopólio da violência legal contra os que executam actos proibidos.
Incluindo o estabelecimento de polícias, para prevenir assassinatos ou encontrar os suspeitos, sistemas judiciais que permitam avaliar em que medida a violação do interdito tem maior ou menor justificação ou gravidade, nuns países, proibição de uso de armas, noutros países, liberalização do uso de armas, as duas coisas com o mesmo objectivo de evitar inocentes sejam assassinados, campanhas mais ou menos formais, incluindo sistemas escolares que transmitam valores que condenem os assassinatos, mas que ensinem também atitudes de prudência para evitar acidentes de que resulte a morte de terceiros, etc..
E o Estado pode também desenvolver muitos outros mecanismos não coercivos, ou limitadamente coercivos, de apoio às vítimas de si próprias, quer trabalhando os fundamentos sociais que levam as pessoas a acreditar que ganhar o euromilhões é a única forma de se libertarem do fardo de pobreza que carregam, quer trabalhando os mecanismos de saúde mental que se relacionam com as inúmeras formas possíveis de adição e dependência.
O que manifestamente não resolve nada é a proibição do jogo, por si só, como mostram centenas de anos de jogo clandestino.
No dia em que o Estado resolver deixar de aplicar a si próprio a excepção da proibição do jogo, encontrando meios financeiros alternativos para financiar as suas acções sociais, eu não protestarei.
No dia em que o Estado resolver liberalizar o jogo, ao mesmo tempo que o regulamenta e reforça os mecanismos não coercivos, ou limitadamente coercivos, para apoiar as vítimas das adições, dependência ou vício, eu não protestarei.
Mas no dia em que o Estado, a pretexto de defender as pessoas que têm dificuldade em gerir as suas opções, resolver proibir as raspadinhas, pensando que ficou o assunto resolvido, nesse dia protestarei.
Sem virtude nenhuma, não é uma questão moral, para mim, é uma questão de eficácia das medidas para lidar com problemas complexos.
Onde tenho uma posição moral é em achar que o livre-arbítrio inclui a liberdade para me prejudicar a mim próprio, sem que isso dê ao Estado o direito a impedir-me de me prejudicar, na medida em que isso não prejudicar terceiros.
"Podemos dizer que estes jogos canalizam recursos de todo o país para os cofres de uma das muitas Santas Casas da Misericórdia, neste caso para a de Lisboa. É como se fosse um imposto pago pelos pobres de todo o país e que é gasto em Lisboa.
Claro que os responsáveis da SCML entrarão logo em defesa do seu ganha-pão e dirão que deste valor cerca de 1.000 milhões de euros (aprox. 1,6 milhões de SMN) são transferidos para os beneficiários sociais da SCML, entre os quais encontramos o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ministério da Saúde e Ministério da Educação, dando razão à ideia do imposto."
Já em tempos escrevi isto, e foi no tempo em que os cafés estavam proibidos de tirar cafés, mas podiam continuar a vender raspadinhas.
https://delitodeopiniao.blogs.sapo.p
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
Temos Diogo Lacerda Machado a dizer que não é assi...
Então alguém que publicamente corrija a AL.O prob...
Os guardas não podem ser, na minha modesta opinião...
Não, não é verdade
Um dos evadidos é algarvio (segundo consta) https:...