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Por vezes uma arma não é só uma arma

por Miguel A. Baptista, em 25.05.22

Fala-se muito da frequência de “massacres” nos EUA e tende-se a associar tal ao elevado número de armas disponíveis. Eu não nego, nem a elevada frequência desses “massacres”, nem a associação à profusão de armas existente. 

No entanto, penso que tal, por si só, não explica plenamente o fenómeno. Nos EUA mata-se bastante, quase cinco vezes mais que a taxa de homicídio intencional que existe por cá. No entanto, à escala mundial, esses dados que são maus não são péssimos. São melhores do que os de alguns países que não associamos à violência como Cabo Verde ou a Lituânia. E são muito melhores do que os dos países realmente violentos como a Venezuela, onde se mata dez vezes mais, ou El Salvador que mata vinte vezes mais. 

A quantidade de armas de fogo disponíveis será relevante, mas se pensarmos que no segundo pais com mais armas de fogo, a Suécia, se mata pouco, ao ritmo de Portugal, então coloca-se a dúvida de uma correlação directa. A Suíça também é um dos países com mais armas nas mãos de habitantes a a taxa de homicídios é inferior à nossa. 

Eu acredito que o problema nos EUA passe pela posse de armas, mas o transcenda, é uma verdadeira cultura das armas. Se um jovem ganha um prémio escolar não é impossível que a recompensa seja uma arma. Fora das zonas costeiras as armas serão um dos temas de conversa de eleição. A quantidade de clubes e de elementos de sociabilização eu passam pelo tiro é impressionante. As armas, em muitos casos, tornaram-se uma sublimação freudiana. E se em El Salvador os assassinatos serão em grande parte cometidos na óptica do crime organizado, os “massacres” os EUA ocorrem quase como que encenação quase religiosa de carácter que roça a transcendência. 

Será difícil eventualmente retirar grande parte das armas em circulação nos EUA, mas será ainda mais difícil retirar as armas do imaginário e culto americano. Isso passa de pais para filhos de forma quase atávica. 

O meu pai gostava de barcos, a minha mãe gostava de livros. Eu gosto de barcos e livros. Se lá por casa os gostos andassem à volta das armas, a minha vida poderia ser bem diferente. E não penso que melhor. 


10 comentários

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De Elvimonte a 27.05.2022 às 17:55

Alguns números para contextualizar. 


Major U.S. cities, gripped with crisis, now face spike in shootings ...
www.washingtonpost.com › national › 2020/07/06
06/07/2020 · Tragedies struck in urban centers thousands of miles apart, with 65 people shot over the weekend in New York and 87 in Chicago, and homicides ...


Murders Spiked in 2020 in Cities Across the United States
www.nytimes.com › 2021/09/27 › us › fbi-murders-...
28/09/2021 · Chicago had 771 homicides last year, compared with about 500 in 2019 and 939 in 1992, one of the city's most violent years. There were 351 ...


Homicides in major American cities increased in 2021, new study finds
www.cbsnews.com › news › homicides-2021-increas...
26/01/2022 · Homicides in major American cities ticked up in 2021, with a 5% increase from 2020 and a 44% increase over 2019, according to a new analysis 


Number of murder victims in the United States in 2020, by race/ethnicity and gender 
(https://www.statista.com/statistics/251877/murder-victims-in-the-us-by-race-ethnicity-and-gender/)
---------Total-------Male---Female--- Unknown
Total--- 17754   14146    3573
White--- 7029      5123   1904
Black--- 9913      8469   1440 
Other ---------------------------------------------------


Com uma percentagem cerca de 12% da população dos EUA, os negros/afro-americanos estão à frente no número de vítimas em termos relativos e só não o estão em termos absolutos quando se trata de mulheres. 


Vejamos agora o que se passa com a autoria dos homicídios. Aqui os números (do FBI) são de 2013 apenas porque não me aparecem os de 2020 na pesquisa.


Murder
Race, Ethnicity, and Sex of Victim by Race, Ethnicity, and Sex of Offender, 2013
(https://ucr.fbi.gov/crime-in-the-u.s/2013/crime-in-the-u.s.-2013/offenses-known-to-law-enforcement/expanded-homicide/expanded_homicide_data_table_6_murder_race_and_sex_of_vicitm_by_race_and_sex_of_offender_2013.xls) 


Victim---------------|  Offender
------------------------| White - Black - Other
White--- 3005      |2509    409
Black--- 2491      |189      2245
Other ------------------------------------


Nestes números de 2013 constata-se que os negros/afro-americanos constituem, relativamente aos tais 12% que representam, a maior fatia de autores de homicídios, que se matam sobretudo entre eles, o que também acontece com os brancos, e que matam mais brancos, não apenas em termos relativos, mas também em termos absolutos.


Para além de outros factores mencionados no post, há também uma forte marca racial nos crimes de homicídio cometidos nos EUA, uma realidade quase sempre escamoteada: no homicídio, a supramacia relativa, e por vezes absoluta, é negra.




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