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No seu apontamento diário anti-Trump, a Sic «informou» hoje que Trump criticou «o único piloto negro da NASCAR», dizendo-lhe que deveria ter pedido desculpa (a Sic não explicou porquê), e que criticou também a NASCAR por ter banido a bandeira sulista, a Dixie, «da escravatura». Mais «noticiou» a Sic que a secretária para a Imprensa, Kayleigh McEnany, teve grande dificuldade em defender o presidente.
Seguidamente, a história como realmente se passou:
01. Sobre as dificuldades da adida de Imprensa. a Senhora Kayleigh McEnany não tem nem ainda teve qualquer dificuldade em defender o presidente americano; tem-se notabilizado, aliás, por responder de forma esclarecedora e terminal a questões e polémicas levantadas pelos primos ricos americanos da Sic, o NYT e a CNN. Sendo a Sic o que é, é natural, portanto, que a Sic sempre tenha omitido a existência ou o teor das diversas e definitivas intervenções da Sr.ª McEnany.
02. Sobre o único negro piloto da NASCAR. Darrell «Bubba» Wallace (nome mais sulista não há, e «Bubba» é a alcunha dada pela irmã quando ele nasceu) é um rapaz de 26 anos, bem-apessoado, articulado, simpático, natural de Mobile, no Alabama, que se tornou notado nas corridas de carrinhas de caixa, passou depois pela modalidade de acesso ao topo das competições NASCAR, a Xfinity-Series, e foi contratado por uma equipa da «divisão principal», a Richard Petty Motorsports, em finais de 2017. Talentoso, mas não muito, Bubba foi conseguindo classificações modestas, entre 10.º e 19.º, o que não lhe garantia um futuro na modalidade. Terá sido o seu publicista (suspeita-se, não há provas disso) que recomendou a Bubba que procurasse destacar-se de outra forma. E Bubba destacou-se premindo a tecla rácica. No dia 8 de Junho passado pediu à NASCAR que banisse a bandeira sulista, a Dixie, de todas as provas. A NASCAR já antes deixara de usar oficialmente a Dixie, mas muitos dos espectadores das provas corridas no Sul continuaram a empunhá-la; mas, dado o pedido de Bubba, dois dias depois, em 10 de Junho, a NASCAR decidiu banir rigorosamente a bandeira -- dos carros, da pista e das bancadas. Ao contrário do que se esperaria, a coisa passou sem grandes trompetas. Como passou a adesão de Bubba -- proclamada em diversas entrevistas e T-shirts -- ao movimento Black Lives Matter. Mas não houve escândalo nem horário nobre.
03. Sobre a NASCAR e a Dixie. As corridas da NASCAR, feitas com carros de série supermodificados, nasceram no Sul dos Estados Unidos no tempo da Lei Seca. Eram o prolongamento natural dos trabalhos mecânicos a que se entregavam os fabricantes e contrabandistas de bebidas alcoólicas para que as suas carrinhas e carros escapassem sempre aos da Polícia. Aos fins de semana, os proprietários dessas máquinas corriam em pistas de areia ovais improvisadas. A Dixie, a bandeira, está muito ligada a esses tempos, como símbolo de resistência à superioridade moral novaiorquina e às leis puritanas de Washington. Sendo a Sic o que é, a Sic não sabe nem foi saber, portanto, nada disto.
Dado, porém, o facto inegável de a bandeira ter alguma ligação aos esclavagistas é compreensível que a NASCAR a tenha banido, mesmo ao arrepio das preferências de grande parte da sua audiência; como é compreensível que muitos americanos gostem da sua Dixie por razões que nada têm a ver com a escravatura. Provavelmente gostarão dela muitos republicanos, membros do partido que defendeu e conseguiu a abolição da escravatura nos EUA, defendida pelos democratas, um facto histórico que deixaria a Sic agoniada (se soubesse História).
04. Sobre aquilo de que Bubba deveria ter pedido desculpa. Resolvidas sem grande publicidade -- hélas -- as questões da bandeira e do Black Lives, Bubba julgou vislumbrar pouco depois -- agora sim, agora em grande -- a chave da fama. Na importante prova de Talladega, um dos membros da sua equipa contactou os responsáveis da NASCAR para se queixar de que o seu piloto era vítima de um acto de ódio: alguém pendurara uma corda de enforcado na porta da sua garagem nas boxes. Bubba indignou-se, Bubba falou e protestou, Bubba foi primeira página, a NASCAR indignou-se, a NASCAR pediu repetidas desculpas, os pilotos todos solidarizaram-se com Bubba e puseram-lhe o carro na frente da grelha de partida (acabou em 14.º), e Bubba ganhou enorme notoriedade.
Mas a NASCAR não se ficou pela indignação, resolveu solicitar que o caso detestável e que lhe manchava a reputação fosse investigado, e punidos o autor ou autores. E o FBI veio e investigou. Vieram duas dezenas de agentes (suponho que caucasianos e afro-americanos, mesmo que nada tenham a ver com o Cáucaso ou África) que entrevistaram responsáveis da NASCAR, directores das equipas, mecânicos, pilotos, comissários, pessoal diverso. E o FBI chegou à conclusão de que não, não havia acto de ódio nenhum: a corda de enforcado estava naquela garagem há mais de um ano, e nem aquela garagem fora então atribuída à equipa de Bubba, nem havia maneira de saber a quem ela seria atribuída no ano seguinte (este ano). Mais concluiu o FBI que a corda de enforcado não era bem uma corda de enforcado, porque o laço não corria, e, aliás, era para ser assim mesmo, porque a corda servia de puxador para fechar a porta basculante da garagem, em vez de alguém ter que pular para pegar-lhe pela borda ou ir buscar um escadote. É claro que, sendo a Sic o que é, a Sic nem sabe, nem foi saber nada destas curiosidades engraçadíssimas; soube apenas que Trump pedira a alguém (para a Sic: «ao único negro») para pedir desculpa por um erro (para a Sic: «Para pedir desculpa»).
5. Sobre a não-desculpa de Bubba. Depois de ter agitado os meios políticos e automobilistas, depois de ter beneficiado da solidariedade expressa e pública de profissionais e colegas, depois de ter entusiasmado os tarados do politicamente correcto com uma história sem fundamento, que disse finalmente Bubba? Disse que mais valia ter ficado «embaraçado», quando se consideram as alternativas (um pouco como o lobo da fábula: se não sujaste a água agora, disseste mal de mim há um ano; se não eras nascido há um ano, então foi o teu avô). Sendo a Sic o que é saberia ela disto, ou sabendo, noticiou? Nunca noticiaria, por uma razão ou a outra.
Em resumo: devia ou não Bubba ter pedido desculpa pelo escândalo injustificado? Evidentemente que sim. E devia ou não a Sic pedir desculpa por mais esta peça de desinformação despudorada? Sendo a Sic o que é, evidentemente que não.
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