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"A eficiência tem limites, e não há modo de os definir. A partir de certa altura, e não há um "manual", é impossível aumentá-la. Claro que as margens de lucro podem ser aumentadas sem alterar eficiência do funcionamento e dos processos, pagando menos a fornecedores ou cobrando mais a clientes".
Este parágrafo, tirado de um comentário sobre o meu post anterior, é bem ilustrativo de um raciocínio não económico na discussão de prestações sociais, raciocínio esse que vale a pena discutir.
Para tornar mais fácil a discussão, escolhamos, para a ilustrar, outro bem essencial: o pão.
É certo que já houve bastas experiências que pretenderam manipular o mercado do pão com o objectivo de garantir que o pão chegava a todos, desde a soluções mais radicais de apropriação colectiva dos meios de produção, até a soluções menos radicais, como a célebre "lei da fome" de Elvino de Brito.
O que a experiência mostra é que o aumento da eficiência na produção de pão permite que hoje já pouca gente defenda a nacionalização da terra, o controlo das moagens pelo Estado, a criação de uma rede de padarias do Estado, a forte taxação das importação de cereais, etc. (tudo exemplos reais), como boas soluções para garantir o abastecimento de pão à população.
No essencial, neste momento, em Portugal, existe liberdade de produção de cereais, de importação de cereais, de fabrico de pão, de venda de pão, isto é, o mercado e o conjunto de operadores movidos pelo lucro conseguem fornecer pão à generalidade da população.
Como é inevitável, os que não conseguem ter rendimentos suficientes para comprar pão, nem têm acesso a apoios filantrópicos ou controlados pelo Estado para suprir essa dificuldade, ficam para trás.
Como o Estado tem políticas sociais (como o rendimento social de inserção) e como a sociedade desenvolve iniciativas filantrópicas (como os bancos alimentares), é reduzidíssimo o número de pessoas que em Portugal correm o risco de morrer à fome (admitindo que as há).
O principal instrumento de difusão de informação que permite aos operadores de mercado fazer opções é preço, um instrumento do mais eficaz que existe para esse fim, e a concorrência obriga cada operador a fazer o preço que melhor responde à procura que pode viabilizar o seu negócio, pelo que a possibilidade de pagar menos a fornecedores ou aumentar o preço tem limites muito estreitos.
O que diferencia cada operador, determinando a sua falência ou sucesso, é a sua capacidade de ser eficiente na produção de bens e serviços que servem a sua clientela potencial.
Existe alguma diferença entre o abastecimento alimentar e a prestação de cuidados na velhice?
Nem por isso.
Tradicionalmente era nas famílias que estava a garantia (relativa) de uma velhice sem sobressaltos, havendo uma obrigação dos filhos tratarem dos pais, obrigação essa que, mais que as normas sociais, era reforçada por um mecanismo económico nas mãos dos mais velhos: a gestão da herança.
O argumento de que os mais pobres tinham heranças miseráveis e, para este efeito, ineficazes, só parcialmente era verdadeiro porque quanto mais miserável, mais relevante era o pouco que se poderia esperar da herança.
Acontece que este mecanismo deixou de ter a importância que tinha (o que os filhos ganham pode ser muito mais que o que podem esperar da herança e a herança é menos relevante para que os filhos possam aspirar a não passar fome durante a sua vida) e que a esperança de vida aumentou, tal como a mobilidade, pelo que os velhos são, frequentemente, deixados para trás.
Num sistema exclusivamente privado, o que é de esperar é que os ricos resolvam este problema, pagando, os remediados resolvam o problema pagando menos e aguentando as piores condições que o seu dinheiro ainda pode pagar e os pobres, como de costume, ficam dependentes da caridade de terceiros ou estão tramados.
O Estado chamou a si a responsabilidade de minimizar os problemas dos velhos, pagando os cuidados de que necessitam às entidades especializadas em caridade.
Poderia fazer como no caso do pão: atribuía recursos que as pessoas gastam a comprar o pão que querem, onde querem, neste caso, a pagar os lares que quisessem, onde quisessem.
Mas não, o Estado (ou melhor, neste caso, a sociedade) inventou um sistema em que paga aos intermediários, isto é, às entidades especializadas em caridade, para prestar os cuidados de que os velhos precisam.
O resultado é o que se conhece.
O Estado, sempre aflito de dinheiro, prefere gastar três mil milhões para ter uma companhia aérea a gastá-los a melhorar as condições de prestação de cuidados sociais.
Com isso, o dinheiro disponibilizado pelo Estado é pouco, e portanto as entidades especializadas em caridade vêem-se na contingência de reduzir a entrada de utilizadores e diminuírem a qualidade dos serviços prestados, de modo a encaixá-los no dinheiro disponibilizado pelo Estado (não me vou meter no sinuoso mundo do financiamento das famílias e dos utilizadores a estes lares).
Se houvesse dúvidas, o tempo da pandemia demonstrou bem a qualidade dos cuidados prestados, para além da sua escassez.
"Quanto à entrada de privados no mercado social, sejamos claros e honestos; só seria possível SE o Estado definisse preços (como o Estado faz noutros países em que certos sectores, como a saúde, são privados, mas regulados a 100%, malditos comunas), e isso iria contra a tal lógica do lucro liberalizado".
Confesso que já li várias vezes este parágrafo e não percebo bem qual é a questão, visto que me parece claro que o Estado deve definir os termos em que está disposto a gastar o dinheiro dos contribuintes no apoio à velhice.
A minha opinião é a de que o Estado deveria fazer aqui o mesmo que faz com o abastecimento alimentar, isto é, deixar andar os negócios e pagar aos que não têm rendimentos suficientes para arcar com o custo dos lares (ou de cuidados continuados).
O que não percebo é o que quer dizer "lucros liberalizados", porque o lucro (liberalizado ou não) é a mera diferença entre custos e receitas, matéria que depende da eficiência na prestação dos cuidados (quanto menos eficiente é a prestação de cuidados, maior é o custo) e do preço que o mercado permite cobrar (a definição do preço não é uma decisão livre de quem vende, é o ponto de encontro entre a vontade de quem vende e a vontade que quem compra).
"E tenho sérias dúvidas que os lares privados, que mesmo caros não têm falta de clientela, preferissem submeter-se a um preço fixo do que cobrar o que querem (e alterar situações contratuais de preço em conformidade)".
Talvez a explicação da diferença de pontos de vista entre o comentador e eu esteja nesta frase extraordinária.
Extraordinária porque, aparentemente, o que preocupa o comentador é o que fazem os donos dos lares e não a situação dos que precisam de lares.
O que interessa aqui é saber se com os privados é possível ter mais oferta e melhor oferta, e não se os donos dos lares preferem isto ou aquilo (uns preferirão umas coisas, outros preferirão outras).
O que o apoio do Estado faz é alargar o mercado, na medida em que confere a mais gente a capacidade de pagar os cuidados de que precisa. E com esse alargamento do mercado, vem maior diferenciação que, desde que assegurada maior concorrência, permite aos utilizadores mais escolha.
Independentemente de umas pessoas gostarem mais de amarelo e outras de azul, em grandes números, as pessoas tenderão a escolher a melhor qualidade e o preço mais baixo.
Se o Estado estabelece um preço para o pagamento do serviço, o resultado é toda a gente (tirando nichos de mercado muito diferenciados para quem pode pagar) se aproximar desse preço, passando a competir pela diferenciação dos cuidados (por exemplo, médicos mais competentes, funcionários mais simpáticos, maior gama de actividades complementares, melhor cozinha, melhores instalações, etc..), para captar mais clientes e, consequentemente, aumentar os lucros.
"Há que referir que duvido que haja assim tantos que "escolhem" lares privados, vão para lá porque não há opção".
Bingo!
É exactamente esta a questão, a melhoria da qualidade dos cuidados prestados aos velhos depende essencialmente da escolha à disposição dos utilizadores, e dos recursos que lhes permitem pagar essas escolhas.
Isso não tem nenhuma relação com a natureza da propriedade das paredes dos edifícios, pelo que é absurdo separar os prestadores de cuidados em função da sua natureza patrimonial: Estado, instituições especializadas em caridade ou gananciosos à procura de lucros.
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