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Os 7 na Oceania, post nepotista

por henrique pereira dos santos, em 24.07.23

A.S. Tive de ir assegurar-me de que a palavra nepotista existia mesmo no sentido em que está no título do post.

Uma das minhas filhas resolveu fazer uma campanha de crowdfunding que se chama "Os 7 na Oceania".

Antes de a lançar, perguntou-me a minha opinião sobre o assunto, sem a menor intenção de ligar nenhuma ao que eu dissesse, claro, mas mais como avaliação de mercado, acho eu.

Eu disse duas coisas: 1) 30 mil euros em crowdfunding, em Portugal, é sempre difícil, qualquer que seja a campanha (eu já fiz, por isso o meu comentário era um comentário de experiência feito); 2) Teria de explicar muito bem que valor potencial teria o projecto para terceiros.

No vídeo da campanha que está na ligação ali em cima, percebe-se bem o esforço, penso que legítimo, de fazer essa demonstração (não resulta dos meus comentários, quando falámos sobre isto já a minha filha devia ter tudo definido na cabeça, se bem a conheço).

O certo é que esta história me deixou a pensar no assunto (para além da possibilidade de resolver logo sete presentes de anos e de Natal, pelos menos para um ano, de uma assentada).

Em que é que uma viagem como a que a minha filha quer fazer pode ser útil a terceiros, ao ponto de acharem que vale a pena contribuir para que essa viagem exista?

Devo dizer que quando a campanha foi lançada, fiz um post irónico no Facebook sobre a capacidade que a minha filha tem de apresentar as coisas de forma a que não sejam só dela, mas também das pessoas à sua volta (seguramente, não foi de mim que herdou, nem foi comigo que aprendeu, a fazer isto, mas que é muito forte nisso desde pequenina, isso é um facto).

Primeiro foi uma ou outra pessoa que me disse: "Ideia fantástica, devia ter-me lembrado disto há muitos anos atrás, fico muito contente se ela conseguir fazer uma coisa que eu gostaria de ter feito".

Há portanto uma dimensão de venda de sonhos, e vender sonhos é uma actividade social digna e importante (no caso de Walt Disney acabou também por o tornar milionário, mas essa não é a questão social relevante).

Reparei num conjunto de comentários de doadores - a campanha está a correr bem, mas é cedo para avaliar - que iam numa direcção muito concreta: divirto-me muito convosco, portanto vou contribuir para a vossa viagem porque já sei que me vou divertir. Compreendo, cinco filhos com quatro anos e meio de diferença entre a mais velha e a mais nova, sem gémeos, com uns pais com umas ideias sobre educação bastante liberais e uma mãe que é uma grande pintora (não pinta nada em telas, acrescenta pontos nos contos), tem um potencial lúdico relevante. E isso é um valor social útil, se não garante o pão, ao menos o circo é muito provável.

No entanto, o que realmente pode ser mais útil é aquilo para que olhei com mais desconfiança: o impacto de uma interrupção de meses nas carreiras profissionais dos pais e na escola dos filhos.

Naturalmente estamos a falar de escolaridades ainda muito baixas, o problema seria muito pior mais tarde e, quando deixasse de ser problema, é duvidoso que os pais tivessem vontade e energia para finalmente fazer uma viagem longamente adiada e, mesmo que a fizessem, não seria, com certeza, com os filhos, que é um dos objectivos.

O valor social mais interessante disto que uma família se dispõe a fazer é a demonstração de que é possível, ou não, desviar-se do caminho e, ainda assim, chegar ao destino, provavelmente mais tarde, mas enriquecendo toda a gente.

Se as coisas correrem bem, se realmente se chegar ao fim mais rico, as empresas ficam a saber que, podendo ser um problema, não é um drama prescindir de pessoas qualificadas e relevantes para a empresa durante uns meses - é já o que acontece nas licenças de maternidade, e eu acho que ter filhos aumenta a capacidade social das pessoas, mesmo que prejudique o seu desempenho mais especializado -, as escolas ficam a saber que pode haver caminhos diferentes para educar e instruir as crianças, etc..

Nada disto é novo, existem milhares de experiências deste tipo que correm bem, e algumas que correm mal, e não é socialmente irrelevante termos chegado a sociedades em que o risco e a liberdade individual são entendidos como bens colectivos.

Se esta campanha de crowdfunding tiver êxito, é mais um passo no reconhecimento de que a liberdade de cada um resulta numa maior diversidade para todos, e que isso é bom, mesmo sendo, como é, arriscado.


10 comentários

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De João Távora a 24.07.2023 às 21:54

Magnifico. Parabéns!
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De balio a 25.07.2023 às 09:28

Se a sua filha reside nos EEUU, porque não faz o crowdfunding nesse país? Não seria muito mais fácil angariar lá os 30 mil dólares?
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De henrique pereira dos santos a 25.07.2023 às 09:40

A ideia de que é mais fácil captar recursos onde há mais recursos é uma ideia errada: onde há mais recursos, há também maior competição pelos recursos.
No caso de um crowdfunding, tipicamente 70% das doações provêm do círculo social dos promotores, razão pela qual, por exemplo, na Montis, optámos sempre por uma plataforma portuguesa em detrimento de plataformas internacionais com muito mais doadores potenciais, em abstracto, mas muito menos interesse em Portugal, no concreto.
Não faço ideia das razões da minha filha para ter optado por esta plataforma, mas como escreve e publica sobretudo em Português, e tem mais ligações a Portugal, suponho que terá achado preferível este canal.
Mas a campanha também está em Inglês e suponho que irá trabalhar o seu círculo social americano também, não sei.
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De balio a 25.07.2023 às 09:48


A ideia de que é mais fácil captar recursos onde há mais recursos é uma ideia errada


Fazer o crowdfunding nos EEUU seria uma boa ideia, penso eu, não propriamente por haver lá mais dinheiro, e sim porque os americanos estão muito mais habituados a dar dinheiro para as causas em que acreditam - ao contrário dos portugueses, que acreditam nas causas mas acham sempre que é o Estado quem as deve financiar.
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De pitosga a 25.07.2023 às 12:11


Segundo o seu saber como Pai, deixe-a. Ele também o deixará — segundo a bem pensância que ela pratica — num lar.
Tenho pena...
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De henrique pereira dos santos a 25.07.2023 às 15:04

Francamente, o que é que sabe do que pensa a minha que lhe permita ter opiniões sobre o que ela me fará no futuro?
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De Anónimo a 25.07.2023 às 16:02


o facto de me responder (sou muito velho e não andei a ver passar os comboios) e se for recordar, eu sempre escrevi (como Pilatos) que o estimava, que o admirava.
Abraço
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De Anónimo a 26.07.2023 às 13:39

Pedir não ofende ninguém. 
Para quem não tem vergonha todo o mundo é dele. 
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De Anónimo a 26.07.2023 às 22:57

Liberdade, risco, venda de sonhos, educação, crescimento - palavras chave apresentadas no texto como fundamento e sinal dos valores do nosso tempo.
Uma vez dei comigo a pensar que saltos mortais sem treino e sem rede só excecionalmente não é suicídio. Será que apresentar a experiência em causa (sem necessidade vital de sobrevivência) vai trazer mais valias  ao desenvolvimento destas crianças?
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De henrique pereira dos santos a 27.07.2023 às 08:28

Não percebi: o que têm saltos mortais sem treino com o assunto?

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