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Opções de gestão

por henrique pereira dos santos, em 21.08.25

milvoz.jpg

Estas fotografias são a base do comunicado da Milvoz sobre o facto da Bio-Reserva Integral do Vale da Aveleira ter ardido por estes dias.

A Milvoz é uma associação por quem tenho bastante simpatia, apoiei os seus primeiros crowdfunding para comprar terrenos, mas o sentimento de simpatia não é recíproco, penso eu, porque os dirigentes da Milvoz (em rigor, não diria que é associação unipessoal, mas assenta grandemente na preserverança e dedicação de Manuel Malva) se incomodam com as diferenças de opinião que existem entre eles e eu.

A lógica de gestão desta área, tanto quanto consigo perceber, em especial pelo seu nome, é uma lógica de não intervenção, reserva integral, mas assenta num pressuposto fundamental errado, o de que é possível excluir dos ecossistemas naturais um dos seus processos ecológicos mais relevantes, o fogo.

Na gestão de sistemas naturais, há três possibilidades racionais diferentes, mas a exclusão do fogo não é uma delas, a exclusão do fogo filia-se no pensamento mágico, não na racionalidade.

Uma das possibilidades racionais, e que faz sentido em alguns sistemas (por exemplo, em muitos zimbrais), aproxima-se da exclusão do fogo, requerendo uma gestão intensa da envolvente para diminuição do combustível disponível e uma atenção às projecções em caso de fogo intenso nas proximidades (dois, três quilómetros de raio, pelo menos). Nessa opção o que se pretende é mesmo excluir o fogo, pelo menos por largos períodos e limitar os seus efeitos, no caso de atingir essas áreas. Como disse, justifica-se para pequenas manchas de habitats que são mais susceptíveis ao fogo, mas é uma opção de risco e que não faz sentido na generalidade do território.

As duas opções racionais restantes (a Montis usa as duas) prendem-se com a gestão das características do fogo, isto é, frequência e intensidade.

A primeira consiste numa gestão contínua da quantidade e estrutura de combustíveis, de modo a que o fogo  que atinja a parcela o faça em condições de baixa intensidade, se possível, e de limitação dos seus efeitos, se não for possível evitar que o fogo percorra a área com intensidades moderadas a elevadas.

A segunda consiste em gerir contando com a inevitabilidade do fogo, nas condições que calhar, procurando sobretudo ir melhorando o capital natural (solo e banco de sementes, por exemplo) de maneira a que a recuperação pós-fogo seja melhor, mais rápida e mais alinhada com os objectivos pretendidos para a área.

Nas fotografias acima é evidente uma grande severidade do fogo em grande parte da área, alguma piro-diversidade relevante, que resultam essencialmente de um relevo muito vivo, que cria condições fisiográficas bastante diferentes que, na sua interacção com o vento e influência na humidade do solo, deixam algumas áreas por arder, ou com intensidades de fogo diferentes (veja-se na parte inferior  da fotografia como a combustão das folhas está longe de ser completa, indiciando baixa intensidade do fogo).

Avaliar mais que isto e dizer que este fogo representa perdas relevantes, neste momento, é precipitado, é preciso esperar pelo fim da próxima Primavera para perceber que indivíduos morreram ou não, e ver a resposta do banco de sementes e outros propágulos, só então se podendo falar verdadeiramente de avaliação dos efeitos deste fogo.

Se o objectivo é ter uma Reserva Integral, aceitar que o fogo faz parte do processo e que ciclicamente isto vai acontecer é meio caminho andado para baixar a angústia que imagens destas criam nos responsáveis pela gestão, nos sócios e doadores da associação, evitando o desânimo que faz baixar os braços a muita gente.

Pessoalmente, se eu tivesse responsabilidades de gestão, estar-me-ia nas tintas para o conceito formal de reserva integral e desenharia um programa de intervenções estruturado na resposta rápida ao risco de expansão de plantas invasoras e na retenção de solo através de técnicas de engenharia natural.

O que não me parece útil é protestar contra os efeitos de processos ecológicos fundamentais inerentes aos sistemas naturais.


3 comentários

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De JPT a 21.08.2025 às 11:28

Googlei e li que esse biólogo afirma que essa área "“tem, ou tinha uma vegetação representativa de séculos, tornando-se um bosque raro, uma vez que são cada vez menos aqueles que conseguem resistir”. Ele realmente entende que existe uma área de bosque ou matagal mediterrânico, encravada numa serra, que ao longo "de séculos" não teve um incêndio?

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