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O problema somos nós

por henrique pereira dos santos, em 09.03.18

"As alterações ocorridas, desde o seu início, na concessão podem ser identificadas através de três modelos contratuais distintos, que representam, na realidade, três sistemas diferenciados de repartição de riscos, de custos e de benefícios, entre o Estado e a Lusoponte, a saber: o modelo delineado no Contrato de concessão inicial; o modelo inerente ao Acordo (FRA 1); e o modelo subjacente ao FRA Global.

No actual modelo, ou seja, no subjacente ao FRA global de 2000, a evolução observada nos termos de afectação de riscos veio acentuar ainda mais o desequilíbrio do contrato de concessão, em favor da concessionária, ao permitir transferir para o Estado riscos que, normalmente, caberiam à concessionária.

O resultado final das sucessivas mutações sofridas pela arquitectura contratual da concessão acabou por se traduzir na celebração de um Acordo que não defendeu da melhor forma o interesse público, já que dele decorrem consequências financeiras mais elevadas para o erário público e, também, para os utentes das duas travessias sobre o Tejo, e uma situação objectivamente mais favorável para concessionária."

Esta é a principal conclusão da auditoria do Tribunal de Contas à concessão das pontes de Lisboa.

Para se perceber melhor, esta é uma das alterações de repartição de riscos alterada:

"Redução efectiva do risco geral do projecto pela anulação da obrigação da concessionária comparticipar nos encargos de manutenção da estrutura da Ponte 25 de Abril e do viaduto de acesso da margem norte do Tejo e pela garantia de uma componente fixa de cash-flow, sem risco de tráfego, a liquidar pelo concedente, entre 2001 e 2019, através do pagamento de rendas semestrais, no montante total de 61,372 milhões de contos.".

Ora o principal responsável por estas alterações, incluindo esta que especifiquei, é Jorge Coelho, e o governo que alterou as condições a favor da Lusoponte, essencialmente cedendo ao buzinão da ponte - uma decisão inqualificável do ponto de vista da coesão territorial, da gestão urbana, da sustentabilidade na mobilidade e da justiça social - foi o governo de António Guterres.

Não se pense que foi um caso único, Jorge Coelho, de forma sistemática, transferiu riscos dos concessionários para o Estado, renegociando concessões em posição de fragilidade: uma coisa é negociar uma concessão através de um concurso em que todos os concorrentes querem ganhar a concessão, outra coisa é negociar alterações a concessões quando já existe um contrato e só há um concessionário, que tem evidentemente a faca e o queijo na mão.

Jorge Coelho perseguia objectivos políticos de curto prazo, querendo obras mais rápidas para estarem prontas ou lançadas a tempo de eleições ou querendo motivar interessados em obras injustificáveis do ponto de vista da racionalidade económica, como algumas das auto-estradas que foram feitas (não deixa de ser uma deliciosa ironia que pelo menos um dos subscritores do processo judicial posto à troica seja um dos principais economistas envolvidos nas marteladas dadas aos números para justificar obras injustificáveis, sustentadas em empréstimos que só não deram pior resultado porque a troica nos pôs a mão por baixo, não sei se por sermos meninos, se por sermos borrachos).

Pois bem, sendo isto assim e estando perfeitamente documentado, o que mais se vê são referências à putativa promiscuidade entre Ferreira do Amaral e a Lusoponte, como justificação para o facto da manutenção da ponte ir agora sair do bolso dos contribuintes, mesmo na imprensa de referência e nos comentadores mais influentes, conseguindo Jorge Coelho (e Guterres) nunca ser responsabilizado pela captação do Estado a favor dos seus interesses políticos (dos outros não falo, a polícia que tome conta do assunto, se houver matéria para isso, do que aliás duvido, neste caso).

Uma sociedade que funciona assim, que em qualquer caso raramente aceita que os factos influenciem as suas opiniões, só pode dar os resultados que temos tido.

O que aliás é bem visível na quantidade de imbecis encartados e cheios de títulos académicos que acham que uma experiência de quatro anos como primeiro ministro, nas condições em que foram exercidas por Passos Coelho (e o mesmo é válido para Guterres, Sócrates, Costa), não qualifica ninguém para dar aulas num instituto de ciência política.

Aparentemente comportamo-nos como meninos mimados que se recusam a comer bróculos por não gostarem, achando que todas as decisões do mundo se tomam com base nesse critério, assumindo-nos como o centro de um mundo que pode prescindir da teimosia dos factos.



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