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Já devo ter feito algum post com este título, que eu gosto do Cesário Verde e várias vezes me tem sido útil o que escreveu: "Nós vamos para lá; somos provincianos,/ Desde o calor de maio aos frios de novembro!".
Vem isto a propósito do meu post anterior em que louvava o efeito civilizador da repressão.
Sem surpresa, aparecem as caixas de jornais dos países civilizados, como se os cestos dos peditórios das missas não circulassem em Portugal sem ser preciso um polícia para impedir as pessoas de ficarem com o dinheiro.
Lá vem a educação e a cultura dos povos, mesmo que se reconheça que fora do contexto em que esses povos são educados e civilizados existem milhares de exemplares de civilizados que se mostram trogloditas e trogloditas que se comportam como civilizados, quando transportados para os contextos sociais dos civilizados.
Porfírio Silva (sim, o do PS, que conheço pessoalmente, de quem gosto, o que não me impede de reconhecer nele um grande sectário) tem um livro muito interessante chamado "Podemos matar um sinal de trânsito?", que já várias vezes tenho citado.
E cito-o por causa de uma ideia especialmente bem formulada: as normas sociais, ao contrário dos corta-relvas, reforçam-se com o seu uso, e degradam-se com a falta de uso.
As normas, por definição, definem uma fronteira.
Se cruzar essa fronteira for irrelevante, a norma torna-se irrelevante.
A mim parece-me que é a repressão associada a esse cruzar da linha que a torna mais definida, não deixando de achar curioso que se confunda o aumento da repressão com aumento da polícia, quando a repressão é anterior à polícia e a polícia não é condição suficiente de repressão.
Dizer (para usar um exemplo que foi usado a propósito do assunto) que os alunos ingleses não copiam na universidade sem discutir se a sanção para ser apanhado é a mesma que em Portugal (aparentemente, não, em Portugal ser apanhado significa a mesma sanção que não estudar, isto é, ter a prova anulada, e em Inglaterra parece que pode ter efeitos na inscrição em qualquer universidade, diz Eugénia Galvão Teles), ou falar das caixinhas de jornais sem discutir se existem caixinhas de jornais em todo o lado ou só nas zonas mais movimentadas, ou se o custo relativo de uma hora de trabalho em relação ao preço de um jornal é a mesma nos diferente países (o que tem implicações nos custos da fraude e dos mecanismos para a evitar), não serve de muito.
Já discutir a obsessão dos nossos legisladores em querer garantir mecanismos prévios para evitar a fraude, em vez de confiar nas pessoas e ter mecanismos posteriores de sancionamento da fraude, quando ela é detectada, verdadeiramente eficazes, parece-me bem mais útil.
O facto é que reconhecer que nós somos muito mais parecidos com eles nos responsabiliza muito mais pelas nossas escolhas institucionais (como é que um povo que elege duas vezes Sócrates e ainda dá uma maioria absoluta a Costa se ri das votações dos brasileiros ou da eleição de Trump?) que simplesmente dizermos que "o país é um colosso, anda tudo grosso", como ouvi ontem à administrativa que se queixava do funcionamento dos serviços públicos, citando Ivone Silva.
"Ai que prazer, não cumprir um dever", etc..
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