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Negações

por henrique pereira dos santos, em 21.10.22

Um destes dias, estava eu (bem irritado, nunca mais aprendo a tratar suavemente as maiores alarvidades) a perorar na rádio Observador e disse que morria hoje muito menos gente de desastres naturais que há 50 ou cem anos (verificar os números aqui).

Poder-se-ia interpretar este meu dizer como sendo a negação do que dizem os cientistas (e são uma esmagadora maioria) sobre alterações climáticas que trarão mais fenómenos meteorológicos extremos.

Mas essa seria uma interpretação profundamente errada: não sabendo eu de clima o suficiente para ter opinião própria, naturalmente sigo a opinião esmagadora maioria das pessoas que sabem do assunto e, até ter razões para pensar que estão errados, não me ponho a inventar.

Onde eu me afasto de muitos desses cientistas é numa matéria que não é científica: uma boa parte destes cientistas raciocinam numa base malthusiana, isto é, olham para as tendências de hoje e projectam-nas para o futuro, assumindo que o mundo do futuro é igual ao de hoje.

É um erro clássico do movimento ambientalista.

Na verdade, hoje morre muito menos gente em desastres naturais, mesmo que haja mais desastres naturais, porque há modificações muito importantes em três aspectos: 1) na produção de informação; 2) na tecnologia (o principal erro apontado a Malthus, que não previu, nem podia prever, o impacto dos motores a vapor e de explosão); 3) no enquadramento institucional (para ser moderninho, deveria escrever "na governança" mas em português, este sufixo ança é aumentantivo, como em festança, e eu não gostaria de ter uma governança, mas um governinho melhor).

Concretizando.

1) O facto das nossas previsões meteorológicas serem muito melhores, ou seja, serem feitas com maior antecedência e mais seguras, permite o desenvolvimento de sistemas de alerta que salvam milhares de pessoas. Só isso pode representar milhares de vidas em furacões, cheias, tsunamis, etc., mesmo que em secas (a maioria de mortes de desastres naturais resultam de inundações ou secas) seja menos evidente. Ou seja, mais e melhor informação dá resultados diferentes com as mesmas circunstâncias naturais;

2) Hoje temos muito mais tecnologia que nos permite defender melhor dos elementos naturais, seja nas infraestruturas, seja nas casas, seja na contenção do risco de deslizamentos, etc., etc., etc.. Ou seja, mais e melhor tecnologia dá resultados muito diferentes, com as mesmas circunstâncias naturais;

3) Por último, quer no planeamento, quer nos modelos de decisão, quer nos sistemas de socorro, quer na cooperação internacional (especialmente importante no caso das secas, porque permite levar alimentos, e por vezes água, a zonas em que de outra maneira as pessoas morreriam) há diferenças muito grandes em relação ao passado. Ou seja, mais e melhor cooperação e processo de decisão dá resultados muito diferentes, com as mesmas circunstâncias naturais.

A grande discussão sobre como lidar com as alterações climáticas, com a perda de biodiversidade, com a destruição do solo, com a poluição global, etc., não se prende com o que podemos fazer para diminuir as tendências em que em cada momento consideramos negativas (nesse domínio também se faz muito, claro, uma lata de coca-cola usava qualquer coisa como 40gr de alumínio primário há uns anos e hoje usa 12, uma boa parte do qual, reciclado), mas com a melhor forma de nos organizarmos para responder ao que é inerente ao futuro: incerteza, incerteza e incerteza.

E a resposta assentará no que tem dado provas: mais informação, melhor tecnologia e organização social mais eficiente.

É por isso que não entendo quem dá importância a Greta Thundberg: não trouxe nada de relevante do ponto de vista da informação, é contra grande parte do desenvolvimento tecnológico e o que propõe, do ponto de vista da organização social, é um desastre.

E a responsabilidade não é dela, é normal que esse seja o contributo de uma adolescente, a responsabilidade é de quem acha que o radicalismo adolescente tem alguma hipótese de dar melhor resultado que "honesto estudo com longa experiência misturado", como recomendava Camões.


11 comentários

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De jo a 21.10.2022 às 15:47

"É por isso que não entendo quem dá importância a Greta Thundberg: não trouxe nada de relevante do ponto de vista da informação, é contra grande parte do desenvolvimento tecnológico e o que propõe, do ponto de vista da organização social, é um desastre"
Quando alguém fala a muito de uma rapariga que é irrelevante, geralmente anda aí amor.
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De passante a 21.10.2022 às 20:46

A validade técnica da Thunberg é similar à capacidade militar da Joana d'Arc - são como um argumento de retórica. Não precisa de ser lógicamente válido para ser convincente.

Os publicitários sabem isso. Não se ensinar retórica nas escolas é ter deliberadamente uma populaça intelectualmente indefesa.


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De jo a 22.10.2022 às 18:54

Ou a Greta não diz nada de interessante, e não se fala dela, ou diz algo que conta e fala-se disso.
Falar de alguém para dizer que é uma pessoa sem interesse é uma contradição.
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De Anónimo a 22.10.2022 às 18:21

Caríssimo "jo"
A rapariga é irrelevante?
Então os supostos representantes dos senhores do mundo não a aplaudiram 
de pé e com manifesto entusiasmo em New York?
E logo você a falar de "amores" dos outros, que mais nos irá acontecer?, 
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De Oscar Maximo a 21.10.2022 às 17:51

Malthus estava errado ? O que é que ele disse: a humanidade vai aumentar em número até que isso seja posto em cheque, ou voluntáriamente, ou por meio de grandes desastres. Pode ter errado em datas, devido a Haber e Bosch, mas estava essencialmente certo. Muitos fenómenos Malthusianos já aconteceram, a nivel local, minimizados pelas tragédias das migrações. Mas é sabido que quanto mais alto se sobe, maior é a queda. Por enquanto podemos agradecer aos grande oceanos, que absorvem, sem possibilidade de reversão, quantidades enormes de energia. E ainda a energias renováveis inventadas há 200 anos, como barragens.
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De henrique pereira dos santos a 21.10.2022 às 18:22

Se eu disser que vou morrer a amanhã e morrer daqui a vinte anos, de acordo com o seu argumento, eu sempre estive certo, só que um bocadinho atrasado.
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De Anónimo a 21.10.2022 às 22:22

Em cheque? Nao digam isso perto do Costa.
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De Tiro ao Alvo a 21.10.2022 às 18:39

Escrevi isto noutro lado, que aqui transcrevo como uma forma de lhe dar inteira razão, no que acima o Henrique escreveu:
"Não basta criticar essas criatulras imberbes. A mim, até me parece que lhes estamos a dar demasiada importância. Censurável é, isso sim, o palco que a comunicação social lhes dá. Nessa tecla é que devemos carregar o mais possível. As crianças, o que precisam é de crescer – quando forem grandes, a esmagadora maioria estará curada dessas maluquices."
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De Anónimo a 21.10.2022 às 22:25

A Greta tem a credibilidade social e a sensibilidade científica de um taxista do Martim Moniz.


Morrem menos pessoas vítima de desastres naturais como morrem menos de doenças e epidemias, essa coisa do avanço tecnológico tem algumas vantagens
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De Anónimo a 22.10.2022 às 18:33

Exactamente.
Especialmente se nos lembrarmos que a população mundial era em 1950 menos de um terço do que é hoje e em 1975 metade do que é hoje.
E 1975 foi há muito pouco tempo, esse é que é grande problema de que
decorrem quase todos os outros.
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De JPT a 22.10.2022 às 20:27

E falta acrescentar que há muito, mas mesmo muito mais pessoas do que havia há 50/100 anos, em especial nas zonas mais expostas a desastres naturais. 

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