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Natal, o mais importante legado

por João Távora, em 24.12.22

Nativiade.jpg

Natividade na Maestà de Duccio, século XIII

O que é que se terá passado de tão espantoso há cerca de dois mil e vinte anos no Médio Oriente ali para os lados da Palestina, que nos continua a emocionar, que persistimos celebrar e chamar Natal? O nascimento de Jesus Cristo, que não foi apenas o princípio duma religião universal, mas, estou em crer, a inspiração para os maiores prodígios civilizacionais que se sucederam a seguir no Ocidente.

Hoje queria falar do Natal especialmente aos não crentes, àqueles que mesmo assim o celebram sob os mais variados rituais e pretextos. Aflige-me que, numa Europa cada vez mais laicizada, se vá perdendo a memória da razão inicial: o nascimento daquele menino que há mais de dois milénios interpela milhões de pessoas a n’Ele se reverem, amadas, livres e inteiras. A fortuna da privação, esplendor do humilde, a força do frágil, o poder da delicadeza, a gradeza do que se faz pequenino. Talvez porque nele somos convidados a participar na sacralidade daquela vida prometida, encorajados a usar a cabeça erguida, como bem-amados que afinal todos somos. Como Deus encarnado numa frágil Criança, que atraiu e fez pasmar os reis e pastores que se dispuseram a seguir a estrela à sua descoberta. Um verdadeiro prodígio que há dois mil anos continua a atrair a humanidade, mesmo que não o saiba. É na descoberta dessa singularidade que se vai edificar o Homem Novo, pelo livre-arbítrio potenciador duma dignidade imperiosa, até no assumir da sua fragilidade. É sob esse pilar que se edificou a civilização ocidental.

“Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz” disse Jesus já no final da sua caminhada terrena. As tréguas são o maior e democrático milagre que concede o Natal a todos os homens e mulheres de boa vontade, sejam crentes ou não crentes, como que um antídoto ao cinismo. Mas essa mensagem já estava no Presépio, no princípio duma nova era para a humanidade – que até fez mudar o calendário. Recado daquela primeira Sagrada Família que, longe da sua terra, na falta duma hospedaria, se fez ela própria casa, acolhimento e conforto.

Esta é uma mensagem irresistível a quem, apesar da vida dura e das cicatrizes acumuladas no coração, nele mantém uma pequena réstia brilho – é para esses que escrevo. É uma mensagem revolucionária aquela que nos traz o Menino Jesus: a do escravo finalmente liberto das prisões interiores e exteriores, senhor das suas escolhas e responsável pelas suas acções. É esta mensagem que está na base da civilização que recebi de legado – feita de pessoas capazes de se curarem e reconstruirem de dentro para fora.

O Natal é o prenúncio do Novo Mandamento: «Amarás o teu próximo como a ti mesmo». É pela adesão a esta revolução que o Natal interpela tanta gente – que mesmo sem saber, nesta quadra está a comemorar o Presépio de Belém. Quantos mais se conseguirem dar desprendidamente, mais todos recebem – é o desafiante paradoxo.  Ainda vai a tempo de montar um em sua casa. Afinal, o Presépio é o mais valioso património cultural do Ocidente.

Um Natal Feliz para os leitores do Corta-fitas

Artigo publicado originalmente no Observador


3 comentários

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De Jorge a 24.12.2022 às 14:16

Um Santo Natal e que continuemos a partilhar ideais e pensamentos no próximo ano.
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De zazie a 24.12.2022 às 20:41

Um Santo Natal. 
Gostei muito deste texto.
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De O apartidário a 25.12.2022 às 17:34

Natal em Belém(lisboa 21-12)

O verdadeiro Natal é em Belém. Foi também o primeiro, dado que ocorreu na quarta-feira. E o mais bonito, porque não sei de coisa tão comovente quanto um governo de criaturas mal ajambradas e risonhas que vai ao palácio presidencial saudar o prof. Marcelo e, de seguida, ouvi-lo. Naquele ambiente sagrado e puro não cabem as distracções pagãs que a modernidade infligiu às festividades, sobretudo o daninho bicho do consumismo. Pelo contrário: a ladainha do prof. Marcelo versou justamente a possibilidade, assaz próxima, de os portugueses não conseguirem consumir seja o que for. Mas já lá vamos.

O prof. Marcelo começou por lembrar ao governo que o governo é impecável e não tem culpa de nada, nada, nada do que acontece ao país. As eventuais desgraças que nos caem em cima, aliás discutíveis e toleráveis, são, evidentemente culpa da guerra. Como antes as desgraças eram culpa da Covid. E antes de Pedro Passos Coelho. E antes do Pitecantropo de Java. E em breve das alterações climáticas. De momento, porém, a culpa é da guerra, a malvada da guerra que andou anos a espalhar dinheiro para as pessoas ficarem em casa, que disseminou a corrupção nos cargos públicos, que rebentou com os serviços de saúde, que aumentou exponencialmente a dívida pública, que leva o fisco a devastar o rendimento alheio, que encolherá o poder de compra a níveis de 1980, que empurra os avisados para o estrangeiro e Portugal para os fundilhos da Europa alargada, incluindo da Roménia que, à semelhança das demais nações, é pouco afectada pela guerra e pela Covid e por Pedro Passos Coelho. Mais aqui http://noticias.myweb.vodafone.pt/A4BEV?pageId=9355&externalId=2709&insidePlaceHolder=true&placeHolderUrl=aHR0cDovL2Ntcy1mZS52b2RhZm9uZS5wdC9jbXMtZmUvY29udmVydC9Ob3RpY2lhcy9Ob3RpY2lhX0dlcmFsX0RldGFsaGVzLnhtbCw4ODg4MSw1NzM5OTIw

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