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Não será bem assim

por henrique pereira dos santos, em 25.11.16

"Sim, nós jornalistas poderíamos ter investigado todas as consequências daquela mudança da lei. Era o que se teria feito num tempo em que os cidadãos em geral estavam dispostos a pagar pela informação. Este é um exemplo de como a falta de dinheiro e, por causa dele, a falta de tempo no jornalismo deixa que algumas notícias só cheguem à luz do dia pela voz de quem não é jornalista o que está longe de garantir a defesa dos cidadãos"

Esta parágrafo de Helena Garrido é muito interessante por ilustrar bem o corporativismo de grande parte do jornalismo.

Aparentemente, Helena Garrido entende que o facto dos jornalistas não terem feito o seu trabalho numa matéria sensível não é uma responsabilidade dos jornalistas, mas uma responsabilidade dos leitores que não querem pagar para ter melhor jornalismo.

E no entanto...

1) Se os recursos são escassos nas redacções (tal como são escassos nas cozinhas dos restaurantes, nas fábricas de sapatos ou na escolas e hospitais) é evidentemente uma responsabilidade dos jornalistas a escolha do que fazem com os recursos que existem;

2) Se  os jornalistas deixassem de procurar responsáveis externos para o facto dos leitores não quererem pagar o lixo que lhes querem enfiar pela goela, talvez percebessem que as relações de causa/ efeito estão invertidas neste parágrafo: é porque os jornalistas não fazem o seu trabalho que as pessoas não querem pagar por ele, não é porque o trabalho não é pago que é mau;

3) É também interessante que, depois de constatar que os jornalistas não fazem o seu trabalho, que no caso em concreto a apatia dos jornalistas foi substituída por alguém fora da corporação (enfim, vamos admitir que Marques Mendes está fora da corporação, para o que aqui interessa), se conclua que a participação de outras fontes de informação põe em perido a defesa dos interesses dos cidadãos;

4) Parece a lenta agonia dos editores da Enciclopédia Britânica procurando sistematicamente desvalorizar a wikipedia, defendendo-se com as garantias que a Enciclopedia Britânica dava aos seus leitores, no pressuposto de que um conjunto restrito e limitado de verdadeiros especialistas daria mais garantias que o escrutínio feito por uma multidão incontável de gente muito diversa, desde os mais ignorantes aos maiores especialistas;

5) Acresce que a corporação dos jornalistas raramente é constituída por pessoas especialmente preparadas para escrever sobre os assuntos que tratam. Os jornalistas são especialistas em generalidades, e será inevitavelmente assim, pelo que me pareceria mais avisado saudar, estar atento e procurar integrar o imenso manancial de informação dos que estão fora da corporação (incluindo na corporação o pequeno número dos que estão nas listas de contactos das redacções) que defender-se com a suposta garantia dada aos leitores. Como se diz no início, os leitores ligam tanto a essa garantia que não querem pagar o serviço prestado, portanto talvez seja melhor fazer como a indústria textil quando começou a perder clientes: investiu seriamente no aumento de valor para ir ao encontro dos clientes, em vez de se queixar de que os clientes não queriam pagar o que faziam.

Para o populismo, esta imprensa apática, corporativa, dependente de fontes privilegiadas, anónimas e muitas vezes interessadas, é um campo fértil a ser lavrado, com elevadas garantias de grandes colheitas futuras.


6 comentários

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De yupi a 25.11.2016 às 11:03

E no entanto a Wikipedia tem milhares de artigos de edições antigas da Britânica. Por alguma coisa será.
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De Anónimo a 25.11.2016 às 11:45

A teoria de Helena Garrido claramente não funciona. No tempo em que os leitores estavam dispostos a pagar pela informação existiu alguma diferença do panorama que actualmente se vive na comunicação social ?? Nenhuma. A comunicação social sempre esteve e está instrumentalizada.
Uma outra teoria que de Helena Garrido exposta na mesma crónica e que também não funciona é a de que no caso da CGD se deverá atropelar o estado de direito, fazer isso teria a curto ou médio prazo um custo superior à demissão de Domingues. Fazer definhar o primado do direito em nome de clientelas que nem sequer estão claramente definidas quais teria custos para a sociedade muito piores do que aquele da demissão de Domingues.
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De Anónimo a 25.11.2016 às 14:53

1) Se os recursos são escassos nas redacções (tal como são escassos nas cozinhas dos restaurantes, nas fábricas de sapatos ou na escolas e hospitais) é evidentemente uma responsabilidade dos jornalistas a escolha do que fazem com os recursos que existem;



Só se comprará o está visível ao comprador.
Se o produto é mau e se compra, das 2 uma:
Ou não sabe que o produto está deteriorado, ou não tem dinheiro para mais.  
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De José Mendonça da Cruz a 25.11.2016 às 19:38

Brilhante post. Pena ter sido motivado por Helena Garrido, uma das poucas jornalistas sérias em actividade, que desta vez, porém, se distraiu.
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De henrique pereira dos santos a 25.11.2016 às 21:28

Completamente de acordo quanto à Helena Garrido, mas acho que foi mesmo o facto de até ela escrever este parágrafo que me fez fazer o post.
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De Anónimo a 26.11.2016 às 11:36

Já se arrependeu, com certeza. Mas se não se arrependeu até está a ser coerente com o que escreveu.

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