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Esta parágrafo de Helena Garrido é muito interessante por ilustrar bem o corporativismo de grande parte do jornalismo.
Aparentemente, Helena Garrido entende que o facto dos jornalistas não terem feito o seu trabalho numa matéria sensível não é uma responsabilidade dos jornalistas, mas uma responsabilidade dos leitores que não querem pagar para ter melhor jornalismo.
E no entanto...
1) Se os recursos são escassos nas redacções (tal como são escassos nas cozinhas dos restaurantes, nas fábricas de sapatos ou na escolas e hospitais) é evidentemente uma responsabilidade dos jornalistas a escolha do que fazem com os recursos que existem;
2) Se os jornalistas deixassem de procurar responsáveis externos para o facto dos leitores não quererem pagar o lixo que lhes querem enfiar pela goela, talvez percebessem que as relações de causa/ efeito estão invertidas neste parágrafo: é porque os jornalistas não fazem o seu trabalho que as pessoas não querem pagar por ele, não é porque o trabalho não é pago que é mau;
3) É também interessante que, depois de constatar que os jornalistas não fazem o seu trabalho, que no caso em concreto a apatia dos jornalistas foi substituída por alguém fora da corporação (enfim, vamos admitir que Marques Mendes está fora da corporação, para o que aqui interessa), se conclua que a participação de outras fontes de informação põe em perido a defesa dos interesses dos cidadãos;
4) Parece a lenta agonia dos editores da Enciclopédia Britânica procurando sistematicamente desvalorizar a wikipedia, defendendo-se com as garantias que a Enciclopedia Britânica dava aos seus leitores, no pressuposto de que um conjunto restrito e limitado de verdadeiros especialistas daria mais garantias que o escrutínio feito por uma multidão incontável de gente muito diversa, desde os mais ignorantes aos maiores especialistas;
5) Acresce que a corporação dos jornalistas raramente é constituída por pessoas especialmente preparadas para escrever sobre os assuntos que tratam. Os jornalistas são especialistas em generalidades, e será inevitavelmente assim, pelo que me pareceria mais avisado saudar, estar atento e procurar integrar o imenso manancial de informação dos que estão fora da corporação (incluindo na corporação o pequeno número dos que estão nas listas de contactos das redacções) que defender-se com a suposta garantia dada aos leitores. Como se diz no início, os leitores ligam tanto a essa garantia que não querem pagar o serviço prestado, portanto talvez seja melhor fazer como a indústria textil quando começou a perder clientes: investiu seriamente no aumento de valor para ir ao encontro dos clientes, em vez de se queixar de que os clientes não queriam pagar o que faziam.
Para o populismo, esta imprensa apática, corporativa, dependente de fontes privilegiadas, anónimas e muitas vezes interessadas, é um campo fértil a ser lavrado, com elevadas garantias de grandes colheitas futuras.
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