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Mortalidade, covid e jornalismo

por henrique pereira dos santos, em 17.05.22

Mais uma corrida, mais uma viagem.

Ontem o Instituto Nacional de Estatística publicou os dados provisórios sobre as causas de morte em 2020. (aconselho a leitura integral, não se fiquem pelo resumo, apesar dos resumos do INE serem, de maneira geral, bastante bons. Deveriam, aliás, ser estudados nas escolas de jornalismo).

Logo de manhã tinha visto que um jornal fazia a sua grande manchete com a afirmação de que a Covid era a segunda causa de morte em Portugal em 2020, e o Público fez também um destaque a dizer o mesmo, até porque esse é mesmo o destaque que o INE faz.

Só que na notícia sobre o assunto, do Público, aparece um gráfico em que a Covid aparece muito atrás dos maiores grupos de causas de morte.

Entre doenças isoladas, a Covid aparece em segundo, com um pouco mais de metade das mortes por AVC, mas se se agruparem as doenças do aparelho circulatório, as 7 125 mortes Covid (entendidas como "óbitos em que a causa básica de morte, ou seja, a doença que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram à morte") já parecem menos impressionantes face às 34 593 deste grupo. O mesmo acontece com as 28 393 mortes por cancros e mesmo as 11 266 mortes por doenças do aparelho respiratório (nas quais não se inclui a Covid).

Uma coisa é fazer uma parangona a dizer que a Covid é a segunda causa de morte no país, outra seria fazer uma parangona dizendo que a Covid foi responsável por 5,8% das mortes no país.

Note-se que 5,8% de mortes no país não é pouco e, mesmo que se optasse por ter em atenção a diminuição de mortes por doenças respiratórias que ocorreu, nomeadamente pneumonias, argumentando que parte das mortes Covid ocorreriam de qualquer maneira com outras doenças, como os dados parecem sugerir, não deixa de ser relevante uma doença responsável por 5,8% das mortes no país.

Estas hipóteses são especialmente relevantes se se tiver em atenção que a idade média da mortalidade Covid é semelhante à idade média global e por outras doenças, o que sugere que a Covid matou essencialmente pessoas que estavam fragilizadas ao ponto de qualquer perturbação poder desencadear "a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram à morte".

Pois bem, para os profetas das novas crenças, nada disso conta.

"Estes dados mostram que a covid-19 não era uma simples gripe e que as medidas [restritivas] fizeram sentido. ... A covid provocou um excesso de mortalidade e pode ainda ter tido um impacto no excesso de mortalidade por outras patologias ... Algumas pessoas com AVC, que precisavam de uma actuação imediata, terão acabado por não ir às urgências ... Entretanto, a vacinação "veio mudar completamente este paradigma, mas não podemos ainda deixar o vírus circular livremente".

Esta argumentação extraordinária assenta numa afirmação sem qualquer base nos dados em causa: "as medidas [restritivas] fizeram sentido".

A gestão da epidemia até pode ter sido a mais adequada possível, mas os dados do INE sobre causas de morte não o confirmam como, pelo contrário, até sugerem que talvez não tenha sido bem assim.

Em primeiro lugar, foi responsável por 5,8% da mortalidade, sendo 64% dessa mortalidade nos meses de Novembro e Dezembro, ou seja, com a forte sazonalidade tradicional da mortalidade do país e sem qualquer relação com as medidas tomadas ao longo do ano.

Em segundo lugar, a Covid parece vir a substituir mortalidade por outras causas, é o que os números sugerem.

Em terceiro lugar, uma pessoa que precisou de assistência e não a teve adequadamente , não é uma consequência da Covid, é uma consequência das medidas tomadas, tanto mais que existe hoje informação bastante sólida que demonstra que a pandemia não veio aumentar a prestação de serviços de saúde mas, pelo contrário, houve uma diminuição da prestação de cuidados de saúde nesse ano.

Em quarto lugar, a idade média da mortalidade covid é semelhante à da mortalidade geral (é, até, ligeiramente superior), o que sugere que a Covid não seria um problema de saúde pública que justificasse as medidas adoptadas, na forma como foram adoptadas.

O que nos leva à ultima frase de Tato Borges: há alguma demonstração de que alguma vez tenhamos tido alguma influência na liberdade do vírus circular?

O facto é que os dados de mortalidade Covid sugerem que não: ou bem que conseguimos gerir a circulação do vírus, e fomos tão incompetentes que a Covid foi a segunda causa de morte; ou bem que (como é provável) não temos grande influência nisso e o melhor é deixarmo-nos dessa fantasia.

A começar por ter os jornalistas a pensar um bocadinho, em vez de telefonarem às pessoas que conhecem.


21 comentários

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De JPT a 19.05.2022 às 15:47

A ciência e a saúde pública são valores muitos relativos. O jornal onde o autor escreve e que eu (por enquanto) assino - que tem uma postura "taliban" em matéria de prevenção do coronavírus - conseguiu escrever meia-dúzia de artigos sobre o súbito surto de varíola dos macacos, no Reino Unido e na Península Ibérica, incluindo até uma extensa peça com "tudo o que precisa de saber" sobre o tema, sem escrever a palavra "homens homossexuais" (ou "gays"), isto quando a OMS e as autoridades de saúde britânicas (e as nossas) estão a assinalar a prevalência, entre os infectados, de "homens que têm sexo com homens" (cito) e a alertar a respectiva comunidade para o risco de transmissão por via sexual. Coitadinhas da ciência e da saúde pública quando se metem com o politicamente correcto!
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De Carlos Sousa a 19.05.2022 às 20:03

Dividir para reinar, o que interessa é mesmo baralhar a "malta".
Então mas as vacinas não foram feitas com o adenovírus do macaco? Porque é que não começam por aí as investigações?
Não sei até quando é que pretendem levar a farsa.
Não será melhor parar com as vacinas e investigar as suas sequelas com seriedade?
Foi preciso morrer um puto "engasgado" para pararem com a pressão da vacinação infantil.
O caso da hepatite fulminante é provocada por um vírus respiratório, mas mais uma vez não tem nada a ver com as vacinas. Não sabem o que é que provoca a hepatite mas sabem que não é das vacinas, boa.
Agora é a varíola dos macacos mas só pega nos homossexuais (?).
Será que os entendidos pensam que todos comem gelados com a testa?
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De Elvimonte a 21.05.2022 às 20:36

No futuro - agora já é assim, com algumas excepções - o jornalismo vai debitar a uma só voz o que vier a ser emanado da OMS, ao abrigo do novo Regulamento Internacional de Saúde proposto pela actual administração americana e outros países para fazer face a pandemias.


«"We need a pandemic treaty." That treaty is set to be adopted starting this weekend in Geneva at the World Health Assembly.»
« "W.H.O. Secretariat to play the leading, convening and coordinating role in operational aspects of emergency response to a pandemic." »
«The World Health Organization gets to define what a pandemic is, when a pandemic is in progress and how long a pandemic lasts.»


«...as originally written, they [the WHO] couldn't do anything without the permission of their member countries' governments. But thanks to the change that the Biden administration pushed, effectively there is no limit at all on W.H.O's power ...»
«Under this treaty, W.H.O. members must enforce orders from the W.H.O. »


«... the treaty demands, "national and global coordinated actions to address the misinformation, disinformation and stigmatization that undermine public health."» - é a censura em todo o seu esplendor, o autêntico Ministério da Verdade e se alguém tecer críticas, "pessoas vão morrer". 


Há muitos outros aspectos a causarem arrepios no documento preliminar e destaco mais este: "develop standards for producing a digital version of the International Certificate of vaccination and prophylaxis.",  "the digitalization of all health forms."


Nos EUA já há ameaças de impugnação, em Inglaterra corre uma petição, só falta a Global Young Leader PM Jacinda Ardern vir repetir "and if you don't comply (with the lockdowns) we'll shoot you". 


https://www.youtube.com/watch?v=3JTLTCeKGbc - If Gates and WHO control international pandemic policy, we’re in trouble


  

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