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Mas se é no plano moral que querem a discussão, vamos a isso

por henrique pereira dos santos, em 28.05.20

Quando muito no início da epidemia fiz um comentário a dizer que não conseguia aceitar facilmente modelos matemáticos de evolução da epidemia que partiam do princípio de que as sociedades eram campos uniformes de pontos que se comportavam de forma igual (não foi esta a formulação, mas foi esta a ideia), uma das minhas irmãs limitou-se a responder que provavelmente eu não gostava dos modelos porque eles não davam os resultados que eu queria.

Depois disso muita água correu sob as pontes, Gabriela Gomes publicou umas coisas sobre o impacto de considerar a heterogeneidade nos tais modelos (que apontavam para níveis tão baixos de imunização como 15% como o necessário para parar o surto, se a heterogeneidade fosse grande, mas mesmo usando os valores menores dos intervalos que se verificavam para outras doenças, apontava para níveis muito mais baixos que os 60% a 70% dos tais modelos que me parecia evidente que não poderiam estar certos) e a discussão foi progredindo.

Agora isto, de onde retiro este parágrafo: "The majority of the plasma samples showed poor to modest neutralizing activity. And for 1 percent of donors it was remarkably high. "Like in other diseases, everyone responds differently," says Robbiani, research associate professor at Laboratory of Molecular Immunology. "Some people have poor response, some average. And then there is a fraction of people that are exceptional responders."".

O artigo é todo ele muito interessante, mas o que me interessa é o seguinte: o conhecimento estabelecido, desde o início, não era este, o de que as pessoas não são iguais e a resposta aos agentes patogénicos não é, nunca, igual de pessoa para pessoa?

Claro que era.

A única coisa que ainda me continua a espantar é a quantidade de especialistas na matéria que, sabendo isto desde há décadas, se refugiaram na ideia de que "pode não ser assim desta vez" para defender, como resposta a mais uma epidemia, uma experimentação social nunca testada e sem qualquer suporte teórico sólido, para além dos tais modelos matemáticos, com impactos certos de dimensão colossal nos mais pobres e desprotegidos.

Não, o rigor moral nunca esteve do lado dos que, sentindo-se pessoalmente ameaçados, moveram mundos e fundos para se protegerem, fosse a que preço fosse, o rigor moral esteve sempre do lado dos que, reconhecendo os riscos pessoais, sempre souberam que não era legítimo exigir o sacrifício dos mais frágeis "para que um só de vós resista à morte, que é de todos e virá".


4 comentários

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De Eremita a 29.05.2020 às 09:31

Não é correcto usar a variabilidade na capacidade para produzir anticorpos neutralizantes como exemplo de heterogeneidade. Para o que conta, os pacientes são muito mais parecidos do que diferentes, isto é, todos foram infectados e todos ficaram curados. A heterogeneidade que se tenta modelar é a da susceptibilidade à infecção (que pode resultar de diferenças no comportamento ou da existência de imunidade prévia ao vírus, por exemplo).


O resto é mais do mesmo. A heterogeneidade não foi tida em conta em alguns modelos iniciais porque é difícil de medir e no caso de uma doença nova é mais prudente admitir que não existe imunidade na população. E houve modelos muito influentes, como o do IHME (que influenciou Trump), que são baseados em dados empíricos, isto é, não precisam de imaginar como as pessoas se comportam ou reagem ao vírus.


Por fim, os modelos foram muito criticados dentro da comunidade científica. A fazer algum reparo seria ao modo acrítico como os governantes se basearam num ou outro modelo em particular. Mas tirando alguns outsiders, que se limitaram a mandar bocas (André Dias e afins) ou a fazer modelos que sabemos hoje estarem completamente errados (e.g., Gupta), basta olhar para os modelos que a OMS comparou para concluir que a COVID-19 foi considerada um problema sério pela comunidade científica e que a evolução dos números lhes deu razão. 


PS: Não vou entrar pela enésima vez na conversa de que a evolução dos números não foi influenciada pelas medidas não-farmacológicas por me parecer um debate absurdo.  E nada do que escrevi apoia a manutenção sem fim à vista de medidas de confinamento de mérito duvidoso, como o fecho de escolas. 

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