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Mais além

por henrique pereira dos santos, em 21.02.24

"A Decisão faz também depender os desembolsos adicionais de uma conclusão positiva das avaliações de condicionalidade, que terão lugar ao longo dos três anos de duração do programa. Estas avaliações irão aferir do progresso alcançado em relação aos critérios de política da Decisão do Conselho e especificados no MEFP e neste MoU, bem como nas Recomendações do Conselho, no contexto do Procedimento dos Défices Excessivos. A primeira avaliação trimestral será levada a cabo no terceiro trimestre de 2011, e avaliará o cumprimento das medidas a implementar até ao final de Julho. As avaliações trimestrais seguintes irão avaliar o cumprimento das medidas a ser implementadas até ao final do trimestre anterior.

Se os objectivos não forem cumpridos ou for expectável o seu não cumprimento, serão adoptadas medidas adicionais".

"Objectivos: Reduzir o défice das Administrações Públicas para menos de 10.068 milhões de euros (equivalente a 5,9% do PIB baseado nas projecções actuais) em 2011, para 7.645 milhões de euros (4,5% do PIB) em 2012 e para 5.224 milhões de euros (3,0% do PIB) em 2013, através de medidas estruturais de elevada qualidade e minimizando o impacto da consolidação orçamental nos grupos vulneráveis; trazer o rácio dívida pública/PIB para uma trajectória descendente a partir de 2013; manter a consolidação orçamental a médio prazo até se obter uma posição de equilíbrio orçamental, nomeadamente através da contenção do crescimento da despesa; apoiar a competitividade através de um ajustamento da estrutura de impostos que seja neutral do ponto de vista orçamental".

"Devido a sucessivas medidas de austeridade, os défices foram sendo reduzidos. Mas com a economia a cair muito mais que o previsto e o desemprego a disparar, as receitas fiscais ressentiram-se e as metas dos défices tiveram de ser revistas sucessivamente. No final de 2013, o défice registado foi de 4,9% do PIB, longe dos 3% inicialmente previstos".

O PS (e a esquerda à sua esquerda), ao fim de oito anos de governo medíocre, continua a insistir na tese, que só uma imprensa acéfala e uma academia cobarde permite que passe sem grande escrutínio, de que o governo de Passos Coelho foi além da troica.

As três citações acima, que podem ser verificadas aqui, onde está o Memorando e uma série de comentários independentes, correspondem a primeira ao texto do memorando, a segunda a uma síntese de objectivos a atingir e a terceira a uma avaliação do grau de cumprimento desses objectivos.

A primeira nota é de ordem geral: se é verdade que o Memorando negociado pelo PS continha a identificação de uma séria de medidas mais ou menos imperativas e calendarizadas (os credores são menos crédulos que os eleitores portugueses e portanto não vão lá com proclamações gerais) também é verdade que essas medidas visavam atingir objectivos que o Memorando claramente assume como o referencial essencial "Se os objectivos não forem cumpridos ou for expectável o seu não cumprimento, serão adoptadas medidas adicionais", escreveu e assinou o PS para poder ter acesso a dinheiro sem o qual teria de suspender pagamentos de ordenados e pensões.

Concluindo este primeiro ponto, a afirmação repetida pelo PS (e pela esquerda à sua esquerda e a generalidade da imprensa, pedindo eu desculpa pelo pleonasmo) de que esta ou aquela medida não estava no memorando é uma afirmação completamente vazia, o próprio PS escreveu e assinou que, se os objectivos não estivessem a ser atingidos, era preciso encontrar novas medidas para os atingir.

O segundo ponto é o de que o governo de Passos Coelho ficou aquém da troica, o défice baixou mais lentamente que o previsto, em parte porque o ponto de partida foi aldrabado pelo PS (pode alguém ser quem não é?) mas sobretudo porque a economia se ressentiu muito mais que o previsto, quando as tais medidas de austeridade foram adoptadas (as que estavam no memorando, e as que foi preciso adoptar para garantir os objectivos que o PS escreveu e assinou).

Claro que se pode sempre dizer que outras medidas teriam sido melhores, mas a opção que o PS e Centeno adoptaram depois (inscrever uma coisa nos papéis e fazer outra, com a taxação indirecta e as cativações) não estava disponível porque de três em três meses estavam cá uns senhores a verificar a seriedade do que estava a ser feito, antes de libertar o dinheiro que o PS tinha gasto uns anos antes em fantasias e no momento fazia falta para pagar, entre outras coisas, ordenados e pensões.

Que o PS (e a esquerda à sua esquerda) repita até à exaustão esta aldrabice, dou de barato, acho que até ficaria surpreendido se o PS se portasse como um partido responsável, o que verdadeiramente me indigna nisto é a imprensa que sistematicamente deixa passar em claro o argumento estúpido de ir além da troica e uma academia cobarde que sabe perfeitamente que o argumento é inaceitável e prefere ficar calada.

O debate público em Portugal é medíocre, mas não vale a pena culpar os políticos por aldrabarem, somos nós que preferimos vendedores de banha da cobra (na política, nos jornais e na academia) a olharmos de frente para as dificuldades que temos de gerir para ter uma vida boa.


21 comentários

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De Elvimonte a 23.02.2024 às 02:17

É PPC quem o diz, ao vivo e a cores, não sou eu. Está a chamar mentiroso ao "Enxadinhas da Tecnoforma"? 


Logo aos 15 s: "Nós não podemos aumentar a receita aumentando mais os impostos" (PPC).
Aos 22 s: "A receita foi sempre a mesma, foi pôr as famílias e as empresas a pagar mais impostos" (PPC).
Aos 32 s: "Nós não devemos aumentar os impostos" (PPC).
Ao minuto e 15 s, em oportunística versão TINA: "E que representa sempre o mesmo esforço de tratar os portugueses à bruta e de lhes dizer: agora não há outra solução, nós temos um défice muito grande e portanto as pessoas vão ter de o pagar" (PPC).
Aos 2 minutos: "A política de privatizações em Portugal será criminosa nos próximos anos se visar apenas vender activos ao desbarato para arranjar dinheiro" (PPC).
Aos 3 min e 26 s: "A de não trazerem um novo aumento de impostos. Nem directo nem encapotado" (PPC)


Não vale a pena continuar com a transcrição. Está tudo no vídeo, mas duvido que a dissonância cognitiva lhe permita vê-lo com objectividade. É o que costuma acontecer aos fervorosos crentes na superioridade da sua tribo ideológica. Ou como diria Pascal: o coração tem razões que a razão desconhece.


Mas tudo isto, à luz da definição de política que apresentei antes, é apenas uma das consequências: para atraírem as manadas de votos os políticos têm de mentir, de dizer aquilo que elas gostam ou querem ouvir. E recordo aqui uma célebre tirada de alguém do marketing político dos EUA: dêem-me um candidato que farei dele presidente.


Olhando agora para horizontes mais vastos. Depois da revogação em 1999 do Glass-Steagall Act que vinha de 1933, no rescaldo da Grande Depressão, era óbvio para algumas pessoas que uma crise semelhante haveria de surgir.


Banking Act of 1933 (Glass-Steagall)
https://www.federalreservehistory.org › essays › glass-ste...

by J Maues · Cited by 35 — The bill was designed “to provide for the safer and more effective use of the assets of banks, to regulate interbank control, to prevent the undue diversion of ...


Nove anos depois aí estava ela, tendo-se iniciado precisamente com a falência de um banco, o Lehman Brothers, ao qual três das maiores agências de rating tinham dado notações de investimento imediatamente antes da  insolvência.  


Para a crise muito contribuíram as políticas de crédito expansionistas  da Reserva Federal dos EUA e do BCE, que alguns afirmam terem sido propositadas para a desencadear. Depois da austeridade, fruto da interpretação errada (e propositada, com alguns também afirmam) dos trabalhos de Rogoff, Reinhart e Alesina, seguiu-se o Quantitative Easing, cujo "pai" é Richard Werner e cuja leitura recomendo. Sem QE os PIGS teriam entrado em incumprimento há muito e duvido que ainda existisse Euro. O resto é paisagem e chicane político-ideológica.


Como as crises (também as pandemias e as guerras) são sempre excelentes oportunidades de negócio, alguns enriqueceram a transacionar credit default swaps (CDS), um produto financeiro derivado que pode ser usado de várias formas, entre elas a especulação. Quando o Banco de Inglaterra foi "colocado de joelhos" por um único "investidor" (George Soros) em 1992, é óbvio que para além dos poderes legislativo, executivo e judicial existe um poder financeiro, não escrutinável, que actua na sombra e de que ninguém fala, com potencial para colocar no lixo qualquer dívida soberana.
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De henrique pereira dos santos a 23.02.2024 às 07:40

Exactamente, dizer um ano antes do pedido de resgate que é preciso mudar de vida se queremos ter algum sucesso na gestão da crise financeira não é dizer que quando for para o governo é um mar de rosas.
Se Sócrates e o PS tivessem decidido, seriamente, olhar para o problema e respondido seriamente ao problema, ou não seria precisa intervenção externa, ou seria possível fazê-la em muito melhores condições.
Obrigado pelas transcrições que, mais uma vez, demonstram a mentira do que foi dito.
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De Elvimonte a 23.02.2024 às 17:30

1. Não tenha ilusões. Os políticos, todos eles, têm de mentir para atrair as manadas de votos. Relativamente a PPC, o vídeo constitui prova irrefutável.

2. Não tenha ilusões. Se olhar para o seguinte gráfico de evolução da dívida pública dos PIIGS em percentagem do PIB (retire a Irlanda e fica com os PIGS), constata que o caso português não foi único. Atribuir culpas a quem estava no governo na altura é portanto uma falácia.


https://en.macromicro.me/collections/546/euro-debt/6103/govt-gross-debt-gdp-percent-piigs



3. Não tenha ilusões. As dívidas soberanas, concretamente a nossa, estiveram sob ataque especulativo, tal como a libra inglesa esteve em 1991-1992, tendo resultado na sua saída do Sistema Monetário Internacional. Só não tenho gráficos de volume e cotação dos CDSs para lhe mostrar de momento.


4. Não tenha ilusões. Foi a introdução do Quantitative Easing que tem evitado os incumprimentos por parte dos PIGS. Se olhar novamente para o gráfico verifica que entre 2010 e 2023 as suas dívidas aumentaram.


5. Não tenha ilusões. Desde o advento da globalização o chamado mundo ocidental tem estado a empobrecer. E vai continuar até os fluxos líquidos de capitais deixarem de ser favoráveis ao mundo oriental. O mundo ocidental está desindustrializado, cada vez mais, e falido.

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