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Paulo Tunhas, como é frequente, exercitando a sua liberdade: "Ódio à democracia: o poder é intrinsecamente ilegítimo sempre que não corresponde à imagem que desejamos que ele tenha (o que vale para os Estados Unidos vale ainda mais, talvez, para Israel, que suscita tal ódio em proporções épicas)."
Esta observação, bem como todo o artigo de que faz parte, corresponde bastante ao me parece que tem vindo a ser uma tendência das esquerdas modernas: negar a democracia, não na sua teoria e fundamentos, mas na prática.
Os problemas e as derrotas deixaram de ser para resolver nas eleições seguintes, os problemas e as derrotas devem ser resolvidas agora, contrapondo a legitimidade das ruas - que o mesmo é dizer, dos jornais - à legitimidade das urnas.
Não é, de maneira nenhuma, uma questão americana, apesar de ser muito visível a quantidade de impeachments e afins dos últimos anos, usados tantos pela direita (Clinton) como ainda mais frequentemente das esquerdas.
Frequentemente a contestação da legitimidade começa logo no dia seguinte ao das eleições, em vez da velha regra de que se as regras democráticas aplicáveis a todos, boas ou más, foram cumpridas, a legitimidade do governo está assegurada.
E quem não está de acordo, tem uma maneira simples de proceder: trabalhar para ganhar a eleição seguinte e bater os adversários nas eleições.
À medida que inimigos juramentados da democracia burguesa deixaram de ter margem para defender a superioridade da democracia popular sobre a democracia formal (para já não falar da defesa dos regimes não democráticos), passaram a contrabandear a ideia de que as regras não são justas, não são legítimas e, consequentemente, é legítimo actuar fora das regras para repôr a verdadeira democracia.
Sou absolutamente insuspeito de não gostar Neil Young - ainda não me conseguem apanhar na posição de definir o meu gosto artístico pelo alinhamento político dos artistas, a mim não me apanham a negar que José Afonso e José Mário Branco são músicos fantásticos só porque usaram os seus dons artísticos para defender coisas que hoje me parecem indefensáveis - e acho que fez dezenas de músicas melhores que esta (que não é nada má) que me parece um excelente exemplo para ilustrar a ideia de que, no fundo, as regras democráticas e a legitimidade do exercício do poder se medem mais pelo meu juízo moral sobre as políticas e os políticos que pelo cumprimento das regras aplicáveis a todos para permitir o acesso ao poder.
A mim não me preocupam especialmente Trump, Johnson, Le Pen, Bolsonaro (até ia acrescentar Ventura, mas convém não lhe exagerar a importância, para estar no mesmo patamar que Bolsonaro falta-lhe ganhar as eleições e para estar no mesmo patamar dos outros falta-lhe ainda muito mais), mas sim a assombrosa "transformação de qualquer pequena consciência individual em consciência legisladora do universo, dotada de imprescritíveis direitos a impor a sua vontade ao grosso da humanidade" e o apreço social de que gozam, em especial na imprensa, estas pequenas consciências individuais transformadas em imperativos éticos que todos temos de seguir, se não quisermos ser ostracizados.
Que tal deixarmo-nos de opiniões tremendistas sobre o exercício do poder nos países democráticos e concentrarmo-nos em apoiar regras básicas de dececência que permitam mudar os governos sem efusão de sangue, na boa parte do mundo em que tal não é, ainda, possível?
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