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Lembram-se de Passos Coelho?

por henrique pereira dos santos, em 15.03.23

Durante anos, Passos Coelho poderia dizer ou fazer o que quisesse que era sempre trucidado nos jornais e na opinião publicada, seja atribuindo-lhe frases que nunca se provaram que foram ditas (como a célebre história do Diabo), seja comentando o facto de ir ao um espectáculo depois de tomar uma decisão difícil e com implicações na vida das pessoas como a da TSU (compare-se com o pianinho, pianinho com que foi tratada a questão das férias de Costa na altura do incêndio de Pedrogão), etc., etc., etc..

A mais vulgar das técnicas era dizer que comunicava mal, e demonstrava-se deturpando o que dizia (seja a história da emigração, seja a história do piegas, etc.).

Passos Coelho, apesar disso tudo ganhou as eleições de 2015, depois de aplicar um duríssimo programa de reequilíbrio financeiro, negociado pelo PS, com um enorme sucesso, mas mesmo assim conseguiram atribuir-lhe as culpas por as reuniões com o PS para a formação de um governo não darem em nada (quando era evidente que o PS não estava interessado em que dessem alguma coisa, porque estava a tratar de formalizar a geringonça).

A história da discussão dos abusos sexuais de menores na igreja segue o mesmo padrão: os membros da comissão independente podem dizer o que quiserem, que estão sempre certos e o relatório não é passível de crítica, a hierarquia da igreja pode dizer o que quiser que dir-se-á sempre que comunica mal, que toma decisões incompreensíveis e que não está a fazer nada para alterar coisa nenhuma. E, coisa que alguns consideram gravíssimo, não fala a uma só voz (a diversidade só é virtude nalgumas coisas, pelos vistos).

Um bom exemplo é a acusação recente, feita por Laborinho Lúcio, de que a hierarquia da igreja criou um facto com a lista de (escrever o que der jeito em cada momento) que foi entregue por essa comissão aos bispos, com o objectivo de evitar a discussão do relatório da comissão.

De acordo com Laborinho Lúcio:

"Esta lista não era para ter só os nomes de pessoas que estão no ativo? Inicialmente, foi essa a nossa perspetiva. É interessante verificar e começar por dizer isto: esta lista de alegados abusadores foi sempre referida, nomeadamente nas conferências de imprensa que fomos fazendo ao longo do ano, como sendo uma lista que nós enviaríamos, nomeadamente à CEP, que foi onde ela acabou depois por criar algumas dificuldades. Inicialmente, a nossa ideia era essa. Mas, no dia em que a entregámos, no dia 3 de março, à Conferência Episcopal, tivemos o cuidado de dizer que não era uma lista de alegados abusadores no ativo, mas era uma lista de alegados abusadores. E que, portanto, iria integrar também aqueles que já teriam falecido. E a razão é muito simples, e foi justamente essa razão que nos levou a alargar a lista para lá daqueles que estavam efetivamente no ativo. É que o facto de esses alegados abusadores já terem desaparecido conduz, evidentemente, à impossibilidade de os perseguir criminalmente ou disciplinarmente, mas não retira a possibilidade de procurar atingir a responsabilidade que a Igreja tenha em matéria de indemnização às vítimas, por exemplo."

" nós não podíamos tirar da lista aqueles que já tivessem desaparecido por morte, porque isso anularia a possibilidade de fazer as averiguações necessárias para definir os atos que eventualmente tivessem praticado e, a partir disso, poder indemnizar as vítimas".

"O caso específico de alguns que, entretanto, não são identificados ou de outros que até já tivessem tido processos, desses não tínhamos necessariamente essa informação para nós. E, como não tínhamos, não podíamos estar a adivinhar quem é que estava nessa posição. ".

"Sim, é maior do que se previa, embora nós não tivéssemos a previsão exata quantificada. Mas é maior, uma vez que nós tínhamos previsto enviar apenas aqueles que estavam no ativo e, depois, enviámos independentemente de estarem no ativo ou não."

"Os factos que constavam eram, pelo menos, a identificação da pessoa, os abusos sexuais que tinha praticado, o lugar onde eles tinham acontecido e o ano em que eles tinham ocorrido. Pelo menos estes factos estavam transmitidos e foram conhecidos de todos os senhores bispos ou dos representantes que eles próprios indicaram."

"Isto não significa que todos os testemunhos são verdadeiros, como é evidente, mas significa que há uma enorme, uma imensa probabilidade de verdade em todos eles. Isto, ligado à indicação daqueles factos que referi — e depois há a disponibilidade que a comissão tem de poder indicar mais um ou outro facto, desde que não ponha em causa o segredo quanto à identidade da vítima, porque isso é um compromisso nosso desde o início. Portanto, neste momento, em todos os lugares podia haver a adoção de medidas preventivas."

"bem podia ter acontecido que os senhores bispos, junto dos alegados abusadores, os tivessem levado a aceitar com naturalidade que eles próprios pedissem o seu afastamento enquanto o processo estivesse a decorrer. Não porque isso signifique qualquer antecipação do juízo de culpa, não porque se esteja a dizer que aqui está comprovado que foram eles que praticaram estes atos, mas apenas porque eles próprios diriam: o que está em causa é gravíssimo em função daquilo que é o prestígio da própria Igreja, eu sou um membro da Igreja, se é uma denúncia relativamente a mim estejam à vontade para me afastar de funções enquanto estiver sujeito a esta suspeita. E vamos avançar rapidamente com os respetivos processos. Nem isto se fez, nem os próprios senhores bispos tomaram a iniciativa, na maioria dos casos, de avançar nesse sentido, o que está a criar, evidentemente um imenso ruído à volta disto e a permitir — e isso é o menos agradável — que se comecem a firmar posições antagónicas, que se opõem umas às outras e que não vão levar, claramente, a nenhuma solução."

"Nós organizámos a lista com os nomes justamente porque isso estava acertado com a própria Conferência Episcopal Portuguesa, que o que iríamos entregar eram alegados abusadores e entregaríamos no trabalho feito diretamente nas dioceses pelo Grupo de Investigação Histórica, a conexão factual entre aqueles nomes e esta lista. Evidentemente, quando na conferência de imprensa da CEP é dito “foi-nos entregue uma lista com nomes”, isto é verdade. Mas, enfim…"

"O que é importante é isto, e é isto que eu julgo que nós temos de destrinçar: uma coisa é deixar claro que a lista que foi entregue aos senhores bispos era uma lista acordada, que foi esclarecida quando foi entregue. Relativamente a essa lista, há um conjunto de factos com ela cruzados que permitem que, a partir dela, e a partir da credibilidade dos testemunhos, se possam adotar ações de natureza preventiva."

Poderia continuar a citar a longa entrevista, mas o essencial é claríssimo: a comissão indepentende tinha uma ideia inicial de fazer um tipo de lista - a de acusados no activo - e depois decidiu fazer outra, a de acusados.

Nada contra, mas entre uma coisa e outra, parece-me claro que isso obriga a um trabalho posterior sobre a lista, no sentido de caracterizar melhor as situações, e foi que os bispos disseram que iam fazer (eu não entendo por que razão, havendo pelo menos a informação sobre nome, tipo de abusos, local e ano, não foi entregue uma tabela com essa informação, em vez de uma lista, mas eu estou perfeitamente disponível para aceitar que a comissão fez o melhor que lhe era possível).

Como uma boa parte das pessoas estavam à espera da lista que tinha sido anunciada inicialmente, e como os membros da comissão deixaram crescer a ideia de que os bispos poderiam actuar imediatamente a partir de uma lista que na verdade não foi preparada para isso (a informação estará no relatório, diz a comissão, mas exige que a lista seja confrontada com o relatório, como é evidente), gerou-se um sururu sobre o arrastar de pés dos bispos (em menos de quinze dias boa parte das dioceses tomaram decisões e faltam algumas que acharam que precisavam de mais informação, como aliás Laborinho Lúcio reconhece na entrevista que é possível que assim seja "Relativamente a essa lista, há um conjunto de factos com ela cruzados que permitem que, a partir dela, e a partir da credibilidade dos testemunhos, se possam adotar ações de natureza preventiva").

Pretender que a ambiguidade de vários membros da comissão em relação a essa lista e ao que ela seria não existe e que os bispos quiseram inventar factos para evitar discutir o relatório é simplesmente complicar o que o é simples: em processos complexos é normal que haja hesitações, contradições, problemas e o que interessa é perceber como se faz o processo andar para onde será mais útil.

Só que isso pressupõe duas coisas: admitir que o trabalho da comissão não é perfeito e muito menos os membros da comissão que se pronunciam publicamente sobre o assunto, e que os bispos não são uma máfia que pretende rebentar com todo o processo, através de manobras florentinas.

Isso, admitir essa coisa simples de que a generalidade das pessoas estão de boa fé mas que o processo é complexo e com problemas inerentemente não lineares, não só parece ser uma posição ultra-minoritária, como é frequentemente qualificada como sendo uma defesa da igreja ou, pior, dos acusados de pedofilia, o que evidentemente impede qualquer debate civilizado sobre o assunto.

Resumindo, a racionalidade neste tipo de discussões é um bem escasso, que o diga Passos Coelho.

 


25 comentários

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De henrique pereira dos santos a 24.03.2023 às 10:15

A minha vida é a que eu quiser.
Quanto a argumentos, tem algum?
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De Augusto Faria a 24.03.2023 às 11:12

Os argumentos são os longos posts a defender pedófilos e os convites a um defensor de pedófilos para escrever no Corta-fitas.
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De henrique pereira dos santos a 24.03.2023 às 12:33

Obrigado por confirmar que não tem um único argumento a sustentar o que diz e que não consegue transcrever uma única frase de defesa de pedófilos.

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