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Histórias mal contadas (1)

por henrique pereira dos santos, em 02.10.23

Que existem problemas na habitação, não há menor dúvida.

Que as coisas sejam como as pintam é que já tenho mais dúvidas.

Comecemos por Ana Sá Lopes, penso que dos melhores exemplos do jornalismo que trocou os factos pelas emoções.

“Não há nenhuma conversa entre pessoas normais que não seja sobre a impossibilidade de arranjar uma casa a um preço que os salários nacionais possam pagar”.

Penso que por “pessoas normais” Ana Sá Lopes entenda “pessoas como eu”.

Isso, naturalmente, exclui os que precisam de encontrar um lar ou outra solução que possam pagar para resolver o problema dos pais ou avós.

Ou as grávidas que não entendem bem a que urgência se dirigir, se alguma coisa anormal as assustar.

Ou os que precisam de fazer uma PET o mais cedo possível.

Ou os pais dos alunos que não sabem bem com o que podem contar das escolas.

Ou as pessoas que desesperam por uma decisão do tribunal.

Mas mesmo que estejamos apenas a falar de habitação, talvez seja útil saber que em 61,6% dos alojamentos ocupados pelo proprietário não existem encargos com a habitação.

O valor médio da renda mensal, em Portugal, em 2021 (quando foram feitos os censos) era de 334 euros.

A evolução da construção de casas pode ser vista neste gráfico, a que convém juntar a informação de que Portugal, entre 2011 e 2021, perdeu cerca de 200 mil habitantes.

evol constr.jpg

Em 2021, 63.6% dos alojamentos de residência habitual estavam sub-lotados, o que parece apontar para problemas associados ao preço, enquanto indicador para melhoria da eficiência na alocação de recursos: aparentemente, em Portugal, a maioria dos agregados familiares não tem estímulos suficientes para ocupar casas mais pequenas, quando o espaço de que dispõem é excessivo para o uso que dele fazem.

Dos 4 142 581 alojamentos familiares clássicos de residência habitual, 2 900 093 (cerca de 70%) são ocupados pelo proprietário (nos restantes 30% ainda há mais 200 mil ascendentes ou descendentes do proprietário a usar a casa como residência habitual), o que, associado ao indicador do parágrafo anterior, parece apontar para um problema de rigidez que impede os proprietários de venderem uma casa grande de mais para comprar outra mais pequena, provavelmente com aumento de recursos disponíveis.

Dos quase três milhões de alojamentos usados pelo proprietário como residência habitual, menos de 40% (1 112 875) tinham encargos com a sua aquisição, o que imediatamente deixa de fora das angústias das subidas de renda ou de juros quase metade da população do país. Se a este indicador somarmos o facto de que apenas um terço dos que estão a pagar a sua casa habitam nela há menos de dez anos, rapidamente percebemos como se vai estreitando o número dos que ficaram com o coração nas mãos com a recente subida dos juros.

Dos alojamentos arrendados, os escalões de renda estão no gráfico seguinte, sendo notável que, em 2021, ainda 16% dos arrendamentos fossem inferiores a 100 euros por mês.

rendas.jpg

Resumindo, se os senhores jornalistas se interessassem mais por factos que por emoções, provavelmente conseguíamos discutir soluções mais racionais para a crise da habitação que matar os ricos.


13 comentários

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De lucklucky a 02.10.2023 às 18:33

Não são emoções é politica pura e dura. 
O jornalismo não existe para informar. Existe para preparar o terreno politico.
Os jornalistas são ainda quem legitima  ou não a violência politica e já o estão a a fazer se for a favor da esquerda não s+ó protegendo e até incentivando os "activistas". Para começar designando-os de "activistas".


Enquanto isso o Presidente "anti crispação" está caladinho. Faço notar que a esquerda esteve-se sempre nas tintas se há ou não crispação.
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De passante a 02.10.2023 às 22:45

É isto, pode fechar.


Não há "exemplos do jornalismo que trocou os factos pelas emoções.", sempre foi uma selecção criteriosa dos factos, com mais ou menos aldrabice. Hoje em dia, os melhores artistas nem aldrabam nada - é como os ilusionistas, é tudo feito ali à frente do iludido.



"You furnish the pictures, I'll furnish the war", como disse aquele tipo que ajudou  a acabar com o último reduto europeu nas Américas.

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De César a 02.10.2023 às 19:23

A mesma Sra deputada da nação que desculpou a agressão que os seus pares do Chega foram alvo, é a mesma que em 2017, agarradinha aos socialistas, fez aprovar a lei do adicional ao IMI, mais conhecida com lei do imposto Mortágua.
Os esquerdo-patológicos, pequenos criminosos que andaram a partir montras e a agredir pessoas, deviam e aos berros de preferência, exigir responsabilidades não aos "ricos", ás imobiliárias, aos senhorios, ao capitalismo mas sim a estes senhores e senhoras socialistas e da extrema-esquerda que andaram a destruir o mercado de habitação e arrendamento como ideologia criminosa.
Se a desonestidade intelectual matasse...
E ainda há gente que segue estes hipócritas.
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De O apartidário a 02.10.2023 às 21:06

"E ainda há gente que segue estes hipócritas" -----------  E gente bastante ilustrada com canudos tirados nas faculdades neomarxistas. 
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De Anonimo a 02.10.2023 às 21:25

Análises de habitação ou demografia em "Portugal " valem um chouriço, pois o problema da habitação está centrado em Lisboa e Porto. Onde está mais de metade dos 10 milhões,  a que se juntam estudantes deslocados, e os turistas, bem como pessoas que têm residência noutro ponto mas vivem lá. 
Sim, há um problema de acesso à habitação.  Claro que não é a meia dúzia de vistos gold que fazem a diferença,  e é fruto de anos de mas políticas a varios níveis. 
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De balio a 03.10.2023 às 09:12


o problema da habitação está centrado em Lisboa e Porto


Falso. Ele existe em grande parte do país. Até na aldeia do meu pai, na Beira Litoral, há um grande problema de habitação, devido à recente chegada de grande quantidade de imigrantes (sobretudo brasileiros) que vierem trabalhar nas fábricas da região. Praticamente todas as casas habitáveis estão ocupadas e as rendas estão a subir acentuadamente.
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De Sérgio Gonçalves a 02.10.2023 às 22:09

Henrique, 


Não percebi esta frase "Se a este indicador somarmos o facto de que apenas um terço dos que estão a pagar a sua casa habitam nela há menos de dez anos, rapidamente percebemos como se vai estreitando o número dos que ficaram com o coração nas mãos com a recente subida dos juros."


Posso estar enganado mas independentemente do numero de anos que se tem crédito à habitação, havendo uma mexida na taxa de juro irá afetar toda a gente. Não compreendo porque só se interessa pela terça parte que indica.


Há outro problema no acesso à habitação que é o facto de impedir jovens de sair de casa e iniciar a vida adulta. Aqui será mais difícil obter números mas talvez existam, não sei.


Concordo consigo quando diz que um problema que existe em Portugal é que temos muita gente a viver em casas grandes demais para as suas necessidades atuais. As casas são vistas quase como extensões do corpo e, por isso, inseparáveis.
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De lucklucky a 03.10.2023 às 02:46


"Concordo consigo quando diz que um problema que existe em Portugal é que temos muita gente a viver em casas grandes demais para as suas necessidades atuais. As casas são vistas quase como extensões do corpo e, por isso, inseparáveis."



É parte da lIberdade das pessoas viverem nas casas em que querem se as adquiriram ou estão legitimamente lá.  O tamanho da casa não é o primeiro factor no seu desejo de vender a não ser que estejamos a falar de uma diferença significativa.
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De henrique pereira dos santos a 03.10.2023 às 06:30

Há medida que o tempo passa, o capital em dívida é menor, logo, alterações nas taxas de juro vão tendo um impacto progressivamente menor.
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De Anonimo a 03.10.2023 às 09:23


Então as contas não podem ser feitas ao ano, mas sim ao montante em dívida.
Não esquecer que há muito empréstimo a 40 anos, os tais 10 anos nem a um quarto chegam.
Depois há outros factores a considerar, em certas alturas a taxa de esforço permitida era maior do que provavelmente seria recomendável, e certamente que os rendimentos não crescem assim tanto que possam ultrapassar esse problema.
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De balio a 03.10.2023 às 09:15


independentemente do numero de anos que se tem crédito à habitação, havendo uma mexida na taxa de juro irá afetar toda a gente


Afetar, afeta, mas afeta pouco.


Se uma pessoa tem um crédito à habitação há vinte anos, o montante em dívida já é pequeno (também porque os preços há vinte anos eram muito mais baixos) e a subida da taxa de juro não afeta muito.
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De balio a 03.10.2023 às 09:19


Como o post bem diz, o problema da habitação em Portugal é em grande parte o problema de termos casas muito grandes a ser ocupadas somente por uma ou duas pessoas.
Devido a grande parte das habitações serem casas próprias, e não arrendadas, as pessoas mantêm-se confortavelmente instaladas nas casas que lhes pertencem, mesmo quando estas já são manifestamente grandes de mais para elas (porque os filhos já se foram embora, etc).
É uma patologia que decorre diretamente da opção que já foi feita há muitos anos em Portugal, de privilegiar a posse de casas em detrimento do arrendamento a preços de mercado.
Os erros pagam-se.
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De balio a 03.10.2023 às 10:36


Em Portugal, tal como nos Estados Unidos, mas ao contrário de, por exemplo, a Alemanha, desde há decénios que se privilegia a compra de casa em detrimento do arrendamento.
A consequência é que Portugal é um dos países da OCDE em que maior percentagem de pessoas habita em casa própria, e menor percentagem habita em casa arrendada.
Isto conduz a uma série de patologias no mercado da habitação. Uma delas é que as pessoas continuam a morar nas casas que compraram, mesmo quando essas casas já são grandes de mais para quem nelas habita. Outra, é o excesso de casas de "segunda habitação", isto é, casas de férias.
Ou seja, há em Portugal um excesso de espaço construído em relação ao número de habitantes.
Em Portugal não há falta de habitação, o que há é muitas habitações desocupadas ou pouco ocupadas.
Por exemplo, na aldeia do meu pai há falta de casas para arrendar aos muitos imigrantes que querem lá habitar para trabalhar nas fábricas da região. Em compensação, há, por exemplo, o seguinte: (1) Eu, que tenho lá uma casa de férias, que está quase sempre vazia; (2) Um primo meu, que se divorciou e vive sozinho numa moradia com anexo que construiu para si e para a mulher e filho; (3) Outro primo meu, que vive só com a mulher numa moradia enorme onde já viveram também os três filhos do casal e mais uma idosa acamada.

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