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Para quem não tenha dado por isso, arderam 800 hectares, em fogos de mais de 30 hectares, em Novembro. Em Dezembro/ Janeiro, mais 1700 hectares. Ou seja, tendo em atenção o desfasamento conhecido entre estas medidas de satélite e a realidade, Paulo Fernandes estima que, grosseiramente, se poderá falar de cerca de três mil hectares ardidos desde 1 de Novembro até hoje.
E continuará a arder enquanto se mantiverem estas condições meteorológicas, excelentes para fogos de Inverno. Ainda recentemente, em Espanha, estava a arder, há quase uma semana, numa zona em que as temperaturas estavam seis graus abaixo de zero.
Como comentava o Laboratório de Fogos Florestais da UTAD, confirma-se que as baixas humidades podem anular o efeito das baixas temperaturas na propensão para arder, não sendo a inversa verdadeira: por mais alta que seja a temperatura, não arde grande coisa com humidades altas.
Como um destes fogos foi às portas de Vila Real, logo alguém filmou e deu origem a umas notícias de jornal e comentários inflamados nas redes sociais, por parte de quem acha um drama arderem 300, 400 ou 500 hectares de mato nas actuais circunstâncias.
Tentei explicar que a notícia destes fogos era excelente, a única parte negativa é a mania de se porem bombeiros a apagar estes fogos, em vez de simplesmente os acompanhar e conduzir, para eliminar a probabilidade, aliás baixa, de haver perdas económicas (nestas circunstâncias não há grande probabilidade de haver perdas sociais e não há perdas ambientais).
Rapidamente me estavam a chamar nomes, a ironizar sobre o que eu sabia sobre o assunto, a fazer ataques de carácter, etc..
E, inevitavelmente, a falar de eucaliptos (a arder no cimo de Montemuro e do Alvão, áreas de pastagens pobres sem aptidão para eucaliptos e os pobres de espírito a repetir mantras sobre eucaliptos e fogos, como quem reza a Santa Bárbara de cada vez que troveja).
Eu já fui um feroz opositor da plantação e da expansão do eucalipto, mas fui lendo, fui falando com quem estuda o assunto e fui verificando que grande parte do que eu julgava saber sobre o assunto não se confirmava em lado nenhum. Continuo a não gostar de eucaliptos, mas escrevo livros que gosto que sejam lidos em papel.
Mais que isso, comecei a notar que os mais destacados militantes anti-eucalipto nunca tinham trabalhado sobre o assunto, tinham áreas de conhecimento, no máximo, próximas, mas mesmo quando eram investigadores o facto é que nunca tinham investigado nada sobre o assunto. Podiam ser, por exemplo, eminentes especialistas de solos, explicavam que sabiam muito de solos (quem diz solos pode dizer alterações climáticas, lobos, paisagem, enfim, o que se queira), usavam as suas credenciais académicas como argumento de autoridade mas, por acaso, nunca tinham mesmo estudado o assunto e os dados empíricos que usavam raramente eram abrangentes, normalmente eram sobre um pequeno factor (por exemplo, os óleos presentes nos tecidos dos eucaliptos são muito inflamáveis) para fazer generalizações e tirar conclusões totalmente abusivas. E a quantidade de asneiras por parágrafo atingia números exorbitantes sem que isso afectasse minimimente a credibilidade desses vendedores de banha da cobra.
Nada disto seria muito importante se a larga maioria dos que de facto estudam o assunto não fosse ostracizada no debate público.
Quer nos fogos, quer nos eucaliptos (mas poderia ser com o glifosato) há uma regra simples: para se ser ouvido é preciso dizer-se o que é permitido, argumentar que todos os que dizem o contrário estão vendidos aos interesses e que o mundo acaba já amanhã se não se parar a destruição a que se assiste e todos podemos ver facilmente.
Por acaso até sou presidente de uma associação de conservação da natureza, até faço trabalho concreto em matéria de conservação, até escrevo contra o mau uso de dinheiros públicos no apoio à produção (incluindo de eucalipto) em vez do pagamento dos serviços de ecossistema, mas nada do que eu faça tem a menor importância a partir do momento em que me recuso a entrar na histeria, não fundamentada, quando não mesmo errada, sobre os fogos, sobre a produção de eucalipto, sobre o glifosato e outros símbolos de pureza a que é preciso prestar vassalagem se se quiser ser considerado um bom ambientalista.
O que me parece perigoso nisto tudo não é a pequena minoria radical, muito vocal, que vocifera contra toda a heterodoxia, isso é da natureza das coisas e os sectários tendem a ser polícias do pensamento dos outros. E quanto menos importância têm, mais cultivam a pureza da linha justa e mais sectários são (o verdadeiro caso de estudo na matéria são os trotskistas clássicos).
O que é perigoso, e não se verificava de forma tão evidente há uns anos atrás, é o silêncio da grande maioria dos sabem, que pode ser voluntário (como eu os percebo, realmente há mais para fazer na vida que aturar parvos radicais e radicais parvos que não têm qualquer pejo em reduzir toda a argumentação a acusações de corrupção) mas é também, e muito, um bloqueio real que os jornalistas fazem a quem não pensar da forma certa.
E no fim queixam-se todos dos populismos que vamos alimentando com a condescendência social para com os ignorantes atrevidos a quem damos o direito de definir o que está certo e errado, não porque não saibamos que estão errados, mas porque não queremos lidar com a sua evidente agressividade e intolerância e não queremos acabar a ser acusados de corruptos, de estar ao serviço dos interesses, de ser pagos pelos malandros a quem só interessa o lucro.
Por mim, tolerância zero para o obscurantismo que me prentender impôr um pensamento único seja em que matéria for: o direito à asneira é sagrado e eu não tenho a menor intenção de abdicar desse direito só porque há uns tontos a quem as acusações saem mais facilmente que os argumentos.
Ide ver se está a chover.
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