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… e pergunta a maioria absoluta: «Foi para isto?!»

por José Mendonça da Cruz, em 30.03.24

Luís Montenegro recebeu dos portugueses um bom capital: uma vitória por escassa margem, e a ordem para negociar e mudar. Negociar para mudar, não, obviamente, com quem a maioria absoluta dos portugueses quis rejeitar, o Partido Socialista. Negociar para a mudança.

Luís Montenegro e a AD poderiam ter aprendido alguma coisa com António Costa, que em estritas questões de sobrevivência é genuinamente hábil. Costa não hesitou em aliar-se com partidos esses sim antidemocráticos, para governar e, de passagem, engolir os aliados.

Mas não aprenderam nada. E, hoje, Luís Montenegro e a AD decidiram negociar com o PS, e deitar o capital todo pela janela, para não mais o recuperar.

Fio-me muito em certas imagens, e o rosto acinzentado, luzidio, a atitude corporal nervosa de André Ventura ao saber da partição da presidência da Assembleia da República, dizem-me que não esperava aquilo. Esperava negociar e obter alguma coisa que pudesse empunhar. Negociar in extremis, é claro; negociar a falar grosso, é claro; negociar ao fim de umas quantas contradições, é claro; e, depois, ceder. No fim, relevaria até os disparates extemporâneos com que Melo e Rangel se entretiveram a cavar fossos em bicos dos pés. [Quem creia que Ventura estava irredutível, terá que pensar que sacrificou intencionalmente a vice-presidência da AR, um completo absurdo].

Mas a AD preferiu negociar com o PS. E, assim, numa demonstração de embaraço verdadeiramente lamentável, assim e de uma penada só atirou a fiabilidade pela janela fora. E, com este gesto canhestro, a AD cometeu várias coisas, todas elas lamentáveis.

A primeira coisa que cometeu foi subscrever a ideia antidemocrática do Livre e do Bloco de que as novas bancadas da Assembleia são compostas de uma maioria de esquerda e uma minoria de direita constituída pela AD. Há depois, segundo esta tese, uma inexistência, um fumo, um vazio: 50 deploráveis eleitos por mais de um milhão deles. Perante a opção de Montenegro e da AD a extrema-esquerda sorri e esfrega as mãos.

A segunda coisa que a AD cometeu foi hipotecar de vez toda a capacidade de governar. Desde hoje, a AD só poderá tomar as medidas que o PS a deixar tomar. O PS sorri e esfrega as mãos.

Segue-se, portanto, que a AD cometeu uma terceira coisa, um outro erro: o de condenar-se a eleições antecipadas.

A AD cometeu, por fim, a quarta e mais grave de todas as coisas: no momento em que deitava fora o capital que lhe fora confiado, riu-se de quem lho confiou. O que a faz correr o risco de, nas eleições antecipadas a que se condenou, devolver o centro ao PS, a maioria à esquerda toda, e o primeiro lugar da oposição ao Chega (quanto ao CDS, lá terá provavelmente que desatarraxar a placa outra vez). E o PS ri a bom rir, e esfrega as mãos.

E o eleitorado, que pensa? Não faço ideia, mas imagino. Imagino a esquerda a dizer: «São burros, nunca se entendem, estão de saída não tarda». Imagino a maioria absoluta do eleitorado a dizer: «Foi para isto?!»

Publicado no Observador


15 comentários

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De Jorge a 30.03.2024 às 09:59

Na mouche. 
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De O apartidário a 30.03.2024 às 10:15

"Imagino a maioria absoluta do eleitorado a dizer: «Foi para isto?"  ----------------------------   Muito provavelmente grande parte desse eleitorado até continua a pensar que sim.
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De Anónimo a 30.03.2024 às 11:13

O PSD  transmite a impressão de  ser fiel seguidor ( "aluno" ?.) da parasitagem  "comentadeira" televisiva...
Esperem-lhe pela pancada...
Juromenha
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De rui castro a 30.03.2024 às 11:32

o ps gosta do poder, mas não o sabe utilizar. cativações foram medo de 4ª bancarrota. deixaram as reivindicações para a AD.
não dou a mínima importância à retórica política.
por baixo da mesa cheira a bloco central na ementa.
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De anónimo a 30.03.2024 às 12:02


Ao escolher o apoio de um PS muito esquerda o L. Montenegro/PSD optou pelo politicamente correcto. O problema é que o terreno está completamente minado, nos orgãos intermediários de poder o PS está instalado e domina. 
Montenegro rápidamente vai constatar o seu destino, PM só em nome. 
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De O apartidário a 31.03.2024 às 18:30

A turbulenta eleição do Presidente da Assembleia da República confirmou a tese do perspicaz Rui Tavares. Efetivamente, os três blocos são uma realidade, porém, a sua constituição e visão ideológica diverge substancialmente daquela que o porta-voz do Livre sugere. O modelo, a matriz, a grelha de interpretação do mundo político ocidental, alicerçado na clássica dicotomia entre esquerda e direita, desmoronou. A tradicional divisão assente na organização económica cedeu lugar a um novo paradigma cujo âmago é a identidade. A gritante clivagem que se manifesta é entre globalistas e nacional-populistas, dado que é a identidade nacional a única com força para se opor à avalanche da “governança” global. 

Confrontada com o impasse, a corrente do liberal globalismo em Portugal optou por uma solução pouco inovadora: consensualizou-se dividir o mandato em períodos de dois anos, atribuindo os primeiros dois a Aguiar-Branco e, posteriormente, outros dois a Francisco Assis. Esta é uma prática estabelecida ao longo dos anos no Parlamento da União Europeia (UE), um dos mais infames centros do liberal globalismo, resultante do consenso entre os grupos políticos que o Partido Socialista (PS) e o PSD integram, respetivamente o Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) e o Partido Popular Europeu (PPE). O leitor não se engane: a atual elite política dominante na UE é vincadamente anti-nacional. O Chega destaca-se, inequivocamente, como o único partido com representação parlamentar que se posiciona em oposição ao globalismo. De facto, a defesa de uma “Europa das nações” traduz essa postura num ambiente de marcada clivagem identitária.

Jorge Humberto Pinto no Observador (artigo Esquerda e direita já não existem) 


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De Monte claro a 30.03.2024 às 13:24


Foi o Chega que quebrou o acordo. Isto é tão evidente como Ventura ser um indivíduo narcisista que se está nas tintas para todos menos aqueles que o bajulam. Eu voto no teu, tu votas no meu, ganhamos os dois, nem esta combinação simples Ventura foi capaz de honrar. 
 
Por que raio 1 milhão de pessoas votou num partido que foi criado com o único propósito de servir de veículo aos impulsos egocêntricos de um tipo que se acha no direito de parar a instituição política mais importante do país apenas porque alguém disse algo que ele não gostou de ouvir é um mistério insondável. Durante 1 dia tivemos não a Assembleia da República Portuguesa, mas sim a Assembleia do Ventura. Se um dia chegar a um ministério, será o Ministério do Ventura, ou o Governo do Ventura, se chegar a primeiro ministro. Como todos os ditadores ou candidatos a tal, odeia o que diz amar, e nada o caracteriza melhor do que os epítetos que aos outros dirige. 


A fronteira não é entre esquerda e direita, pobres ou ricos, velhos ou novos, é entre quem tolera isto e quem não tolera. 


Montenegro parece não tolerar. Faz bem. Mesmo que derrotado no futuro pelas forças vivas, provou querer estar do lado certo da barricada. 
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De passante a 30.03.2024 às 13:47

Por mim, já duas semanas antes da votação dava como provável o "bloco central". Não estou particularmente admirado.
Já vi um fulano que acha que percebe de política dizer que o Chega  ficava esvaziado se tivesse ido para o governo. Portanto, por medo, o PSD terá perdido a oportunidade de destruir o Chega, e potencialmente suicidou-se a prazo.
A fazer cinquenta anos, o regime tem poucos entusiastas não pagos. A comissão de enterro tem andado muito discreta, devem estar a gastar a verba em senhas de presença e estudos jurídicos.
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De Albino Manuel a 30.03.2024 às 14:14

Por quanto aqui escreve não o vejo como apoiante da AD mas sim do Chega. É lá consigo. Se se enganou no voto é simples: para a próxima vota no Chega. O que eu duvido é que não o tenha feito agora. Até podem chegar aos 30%, número geralmente apontado como tecto do voto de protesto. Mais que isso duvido. É muito e é nada porque dá para condicionar mas não dá para governar. Daí o seu lamento. 
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De Anónimo a 30.03.2024 às 14:29

*****
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De aleitao a 30.03.2024 às 15:18


Claro como água destilada não há. Nunca vi gente tão burra a gerir o PSD.
A AD foi-se e o PSD a caminho da irrelevância, não aprenderam nada com o Rio. Primeiro um Montenegro infantil com o não é não e agora um outro Hugo qualquer coisa a dizer que o PS é amigo para salvar o próximo Orçamento!
Será que esta Malta não se enxerga?

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