Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]
"Há um malfeitor chamado Nethanyau que considera que matar dezenas de milhares de mulheres e crianças é um mal menor para exterminar quem assassinou israelitas. Justiça? Nada disso!Na mortandade não quer jornalistas, nem poupa escolas ou hospitais ou sequer ajuda humanitária. É a lei da tábua rasa. E basta ser palestiniano para ser criminoso.
Agora, milhares de prédios destruídos , mais de 50.000 mortos, crianças traumatizadas para a vida, não é que Gaza é inviável? Ups, que surpresa! A culpa, claro, só pode ser do Hamas, eleito pelos palestinianos de Gaza. Hamas é uma força política, não me refiro às forças armadas, nem defendo o que fizeram e ainda estou para perceber como foi possível.
Levar Nethanyau ao Tribunal Internacional e os raptores dos israelitas? Que nada! O melhor mesmo é acabar com os palestinianos. Leva-los de vez para fora da sua terra e fazer negócio imobiliário. Viva Grande Israel que de anexação em anexação atinge a vitória final. E enquanto prepara o resort para a Trump Tower em Gaza vai infernizando a Cisjordânia…
Resoluções da ONU? Acordo de Camp David? Tudo deitado para o lixo por Israel. Como pode a Palestina e os árabes em geral ter esperança?".
Depois de muita insistência minha, lá apareceu a argumentação, seguindo a cartilha habitual descrita por Jorge de Sena: "este heroísmo, este horror, foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha há mais de um século e que por violenta e injusta ofendeu o coração de um pintor chamado Goya, que tinha um coração muito grande, cheio de fúria e de amor".
O que me interessa assinalar sobre este assunto, pleno de gente de coração muito grande, cheio de fúria e de amor, que se ofende com qualquer coisa entre mil acontecida em Gaza, por violenta e injusta, é que o quotidiano dos dois milhões de reféns que o Hamas mantém em Gaza, não entram nessa argumentação.
A vida concreta destes dois milhões de reféns que o Hamas mantém e tenciona manter em Gaza não diz nada a estes corações muito grandes, cheios de fúria e amor.
A ideia que às mães de Gaza não se aplica o que Sting escreveu sobre as mães russas, no tempo da guerra fria, é uma ideia largamente expandida, por mais estúpida que seja, como é: "There is no monopoly on common sense/ On either side of the political fence/ We share the same biology, regardless of ideology/ Believe me when I say to you/ I hope the Russians love their children too".
O erro histórico das potências coloniais e da comunidade internacional confundindo os grupos detentores de armas com o seu povo levando, por isso, à entrega do poder absoluto a esses grupos, pensando que o devolviam aos povos colonizados, é um erro que temos dificuldade em corrigir, e continuamos a insistir nele, por exemplo, no Médio Oriente, onde a ONU tem mais resoluções contra o único país em que o poder muda sem ser pela força das armas que contra todos os outros em que o poder assenta no poder das armas, isto é, não é removível sem ser pela força.
E as vítimas, como sempre, são os mais pobres e frágeis, no caso, os dois milhões de reféns que o Hamas mantém em Gaza, a quem não reconhecemos a dignidade mínima para exigir que, os que quiserem, devem ter o direito de ir tratar da sua vida e dos seus filhos noutro lado qualquer.
Dois milhões esses que estão totalmente ausentes das preocupações de grande parte desses grandes corações cheios de fúria e amor, como se demonstra pela citação inicial.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.