Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




Do desastre de Valência

por João-Afonso Machado, em 03.11.24

CIDADELA.JPG

Há um livro de Joana Amaral Dias - de seu título, Dilúvio sem Deus - e subtitulado - As Grandes Cheias do Tejo de 1967. A tragédia escondida pela Ditadura e esquecida pela Democracia - com todo o rigor contando o que foi esse trágico episódio de que me lembro (porque estava em Lisboa então) muito vagamente.

Foi em finais de Novembro desse ano. Uma carga anormal de chuva, em suma, abateu-se sobre a região de Lisboa. Causando perturbações na cidade e, o mais grave, sobrelevando o caudal das ribeiras dos concelhos vizinhos. Onde a migração faminta de milhares criara os famosos "bairros de lata", aglomerados de casas clandestinas, feitas do que se podia arranjar, pedaços de isto e daquilo. Pois todas essas vulneráveis construções, e quem as habitava, foram levadas na torrente das águas e da lama.

Os números reais da hecatombe cifram-se além das 500 mortes. Os jornais anunciaram-nos em edições especiais. Mas em breve a Censura da II República os reduzia a pouco mais de uma centena. E a designação "bairros de lata" foi banida da Imprensa: havia apenas casas sinistradas. A Europa não podia tomar nota da realidade...

As forças oficiais intervieram no salvamento. Como é da praxe, muito mais reluziu a prestação de voluntários estrangeiros e da Cáritas, vale dizer da Igreja Católica. Assim o planeta continuou o seu ritmo de andamento em torno do sol...

Agora, já esta semana, igual diluvio se abateu sobre a Comunidade Autónoma de Valência. Com tal impetuosidade que - mesmo sem "bairros de lata" - já foram contabilizados 214 mortos e há centenas de desaparecidos, cuja probabilidade de sobrevivência é escassa. Algumas cidades ou povoados estão, simplesmente, incapazes de tudo, até de comer, sem a ajuda externa. Quase 60 anos depois da catástrofe em Lisboa...

Fala-se já em falhas humanas derivando sobretudo do desvio do rio Turia. E outras virão a lume. A violência da intempérie resulta, também, das alterações climatéricas. O facto é inóspito, dos vivos já ninguém recordará outro do mesmo calibre. Os próximos dias clarificarão causas e consequências deste "apocalipse".

Acorreram os voluntários aos lugares mais massacrados. Talvez em número excessivo e não organizados. Seja como for, as populações acolhem de braços abertos a sua solidariedade.

E os poderes públicos? 

Quanto a estes as queixas têm sido constantes. Deviam já lá estar mais militares, mais bombeiros. Mas o Governo não é ágil, dado que havemos ter sempre presente. E, falha maior no plano nacional, o Rei Felipe VI também não se despachou. Como Chefe da Nação deveria estar em Valência com a chuva ainda a cair. O resultado foi triste, os valencianos apuparam-no, lançaram lama sobre El-Rei.

Mas só sobre ele. O 1º Ministro, o Presidente da Comunidade Autónoma, vislumbrando a reacção popular, já se tinham posto a milhas.

Ficou o Rei encarando sozinho o protesto das populações...


30 comentários

Sem imagem de perfil

De lucklucky a 04.11.2024 às 14:30

 "A violência da intempérie resulta, também, das alterações climatéricas."


Continua o erro de serem influenciados pela pior profissão que existe.


https://en.wikipedia.org/wiki/Santa_Teresa_flood


The flood of Santa Teresa took place on 15 October 1879 due to an overflow of the Segura river and resulted in more than 1000 deaths and heavy material damage. It is the worst recorded flood in Murcia history.


"The rainfall that caused the flood was extremely heavy. It is estimated that at the head of the Guadalentín, 600 mm fell in just one hour.[1] This river reached a flow in Lorca of 1450 m³/s, overflowing and causing great damage throughout its basin. The flow of Mundo, Alhárabe, Argos, Quípar and Mula rivers also increased rapidly. Thus, an enormous flood arose that reached 1,890 m³/s in the capital of Murcia and is estimated to have exceeded 2,000 m³/s in Orihuela."


The flood devastated the Guadalentín Valley, and the entire alluvial plain of Segura, with considerable human and material losses. The catastrophe left more than a thousand dead: 761 in Murcia, 300 in Orihuela,[3] 13 in Lorca, two in Librilla and one in Cieza. 5,762 houses and y barrackes in Murcia and Lorca were destroyed and 22,469 animals died in the disaster.[2] It is widely described as the "most catastrophic flood ever recorded in Murcia".[4]
(...)
Sem imagem de perfil

De marina a 04.11.2024 às 16:53

e em valencia desde sempre que acontecem cheias. há  descrições desde pelo menos o século xi... com menos vitimas porque também havia menos gente e edificado. acontece que o bicho homem acha que pode modificar terrenos e construir onde lhe dá na gana e enche-los de gente.  não pode e agora vê-se.
e as águas vieram pelos barrancos . e o senhor sanchez andou a destruir represas e pântanos.
Sem imagem de perfil

De marina a 04.11.2024 às 16:58

olhe , é isto que está a acontecer pela europa... estamos entregues a burros.


https://www.publico.pt/2022/05/16/azul/noticia/remocao-barragens-europa-atingiu-recorde-2021-2006372?fbclid=IwY2xjawGV2_FleHRuA2FlbQIxMAABHcdXKpJLPBalroq93d8Heq7aafvbXe-I9sGIILjkjImAXo7bZtMdUQB4cA_aem_bPRL1TFC7w_Q6563hKRa8w
Sem imagem de perfil

De marina a 04.11.2024 às 17:14

e depois é ouvi-los a desconsiderar a catástrofe de 1957 ( que agora é maior por causas das alterações climáticas e bla bla ) quando  nestas inundações  a maior parte das pessoas morreu  em trânsito com o carro , em garagens a tentar salvar o carro e tal , coisa que não existia em 57. o meio urbano era completamente distinto.
Imagem de perfil

De O apartidário a 04.11.2024 às 18:25

Tal e qual como por cá acontece, se calhar já quase ninguém se lembra o que se deu em Algés e Alcantara há dois anos,esperemos pela próxima. 

Comentar post



Corta-fitas

Inaugurações, implosões, panegíricos e vitupérios.

Contacte-nos: bloguecortafitas(arroba)gmail.com



Notícias

A Batalha
D. Notícias
D. Económico
Expresso
iOnline
J. Negócios
TVI24
JornalEconómico
Global
Público
SIC-Notícias
TSF
Observador

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Comentários recentes

  • Anonimo

    O Rato Mickey responde directamente ao camarada Xi...

  • Anonimo

    (não, os bombeiros não têm nenhuma obrigação de d...

  • O apartidário

    E não é apenas existirem individualmente esses sup...

  • Anónimo

    «Gouveia e Melo foi um dos gajos que mandou os por...

  • Anónimo

    Subscrevo!


Links

Muito nossos

  •  
  • Outros blogs

  •  
  •  
  • Links úteis


    Arquivo

    1. 2025
    2. J
    3. F
    4. M
    5. A
    6. M
    7. J
    8. J
    9. A
    10. S
    11. O
    12. N
    13. D
    14. 2024
    15. J
    16. F
    17. M
    18. A
    19. M
    20. J
    21. J
    22. A
    23. S
    24. O
    25. N
    26. D
    27. 2023
    28. J
    29. F
    30. M
    31. A
    32. M
    33. J
    34. J
    35. A
    36. S
    37. O
    38. N
    39. D
    40. 2022
    41. J
    42. F
    43. M
    44. A
    45. M
    46. J
    47. J
    48. A
    49. S
    50. O
    51. N
    52. D
    53. 2021
    54. J
    55. F
    56. M
    57. A
    58. M
    59. J
    60. J
    61. A
    62. S
    63. O
    64. N
    65. D
    66. 2020
    67. J
    68. F
    69. M
    70. A
    71. M
    72. J
    73. J
    74. A
    75. S
    76. O
    77. N
    78. D
    79. 2019
    80. J
    81. F
    82. M
    83. A
    84. M
    85. J
    86. J
    87. A
    88. S
    89. O
    90. N
    91. D
    92. 2018
    93. J
    94. F
    95. M
    96. A
    97. M
    98. J
    99. J
    100. A
    101. S
    102. O
    103. N
    104. D
    105. 2017
    106. J
    107. F
    108. M
    109. A
    110. M
    111. J
    112. J
    113. A
    114. S
    115. O
    116. N
    117. D
    118. 2016
    119. J
    120. F
    121. M
    122. A
    123. M
    124. J
    125. J
    126. A
    127. S
    128. O
    129. N
    130. D
    131. 2015
    132. J
    133. F
    134. M
    135. A
    136. M
    137. J
    138. J
    139. A
    140. S
    141. O
    142. N
    143. D
    144. 2014
    145. J
    146. F
    147. M
    148. A
    149. M
    150. J
    151. J
    152. A
    153. S
    154. O
    155. N
    156. D
    157. 2013
    158. J
    159. F
    160. M
    161. A
    162. M
    163. J
    164. J
    165. A
    166. S
    167. O
    168. N
    169. D
    170. 2012
    171. J
    172. F
    173. M
    174. A
    175. M
    176. J
    177. J
    178. A
    179. S
    180. O
    181. N
    182. D
    183. 2011
    184. J
    185. F
    186. M
    187. A
    188. M
    189. J
    190. J
    191. A
    192. S
    193. O
    194. N
    195. D
    196. 2010
    197. J
    198. F
    199. M
    200. A
    201. M
    202. J
    203. J
    204. A
    205. S
    206. O
    207. N
    208. D
    209. 2009
    210. J
    211. F
    212. M
    213. A
    214. M
    215. J
    216. J
    217. A
    218. S
    219. O
    220. N
    221. D
    222. 2008
    223. J
    224. F
    225. M
    226. A
    227. M
    228. J
    229. J
    230. A
    231. S
    232. O
    233. N
    234. D
    235. 2007
    236. J
    237. F
    238. M
    239. A
    240. M
    241. J
    242. J
    243. A
    244. S
    245. O
    246. N
    247. D
    248. 2006
    249. J
    250. F
    251. M
    252. A
    253. M
    254. J
    255. J
    256. A
    257. S
    258. O
    259. N
    260. D