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Por pura coincidência, em poucos dias, dois amigos diferentes falaram-me do desperdício alimentar como um dos graves problemas ambientais que temos de gerir, em especial por causa das emissões de gases que lhe está associada.
Eu acho que é um problema social relevante, ambiental mas não só, e tenho escrito aqui e ali sobre o assunto.
Só que é um problema muito difícil de ir resolvendo.
Por um lado depende essencialmente das opções dentro de cada família, já que a maior parte do desperdício alimentar ocorre em casa, por outro é um sector produtivo com muitos produtos de vida curta e conservação difícil e, por fim, há componentes difíceis de aproveitar, como os caroços, cascas, espinhas, ossos e por aí adiante. Ou melhor, nos países desenvolvidos, isto é, com sistemas eficientes de produção, armazenamento, transporte e comercialização, a maior parte do desperdício é na casa dos consumidores, nos países menos desenvolvidos a coisa não é bem assim e uma boa parte, provavelmente a maior parte, do desperdício ocorre entre a produção e a comercialização.
Lembrei-me deste assunto e destes meus amigos hoje de manhã, quando estava numa conferência em que se ouvia muito dizer que a ciência isto, a ciência aquilo, como se a ciência fosse uma coisa monolítica e oracular.
Como um destes amigos até me mandou três artigos científicos sobre o assunto, ou melhor, dois artigos científicos e o capítulo do relatório do IPCC sobre segurança alimentar, acho que consigo demonstrar que por uma coisa ser escrita por cientistas, estar num artigo científico revisto por pares e publicado numa revista científica, não quer dizer que seja ciência.
"The results obtained show quantitatively that reductions in food losses in developed regions decrease the number of undernourished people in developing regions by up to 63 million, leading to decreases in the harvested area, water utilization, and greenhouse gas emissions associated with food production".
Por que razão digo eu que isto não é ciência, se é escrito por cientistas, num artigo científico, revisto por pares e publicado numa revista científica?
Porque os problemas da distribuição alimentar são problemas de sociedade, isto é, sociais, políticos e económicos, e dizer que o que não se desperdiça na Suécia alimenta alguém na Somália é simplesmente absurdo.
Dito de outra maneira, se compro duas alfaces, deixando apodrecer uma no frigorífico, e depois altero o meu comportamento evitando o desperdício da segunda alface, isso não significa que a alface poupada passe a estar disponível na Eritreia.
Para que isso acontecesse, seria preciso que o sistema de produção de alimentos incorporasse a minha poupança, reconfigurasse a produção, transporte, armazenamento e comercialização para reduzir a entrega de alimentos na Suécia ou em Portugal, para aumentar a entrega na Somália e Eritreia, a preços comportáveis para os somalis e eritreus, partindo do pressuposto, não demonstrado, que no processo se tinha passado a produzir, armazenar, transportar e comercializar alimentos em que os consumidores somalis e eritreus estavam interessados.
Há muitas razões, e boas razões, para não desperdiçar alimentos - acho até que é uma das boas razões para que as escolas tenham uma disciplina curricular de cozinha - mas tenho as maiores dúvidas de que a maneira mais eficiente de o fazer não seja deixar de subsidiar toda e qualquer produção de alimentos, deixar os preços subir e estar atento ao apoio social necessário aos que ficassem para trás.
Pretender que é aumentando a consciência da urgência climática que alguém vai deixar de se esquecer de umas peras até que estejam imprestáveis, e que na verdade custaram muito pouco a quem as comprou, é esperar da humanidade aquilo que ela não pode dar.
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Muito bem!
Consultando o portal base.gov percebe-se que o Sr....
«As costas da Mina e a da Guiné foram desde o sécu...
Siga prà marinha.Muito bem.
Muito bem, nada a apontar