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Sempre que, teimosa e, com toda a probabilidade, inutilmente, insisto em me centrar nos problemas económicos da gestão das terras marginais (que são a maioria do país), dizem-me que toda a gente sabe isso, o que não se sabe é o que proponho.
Paciente e reiteradamente, volto à proposta de pagar cem euros por hectare a cada três anos a toda a gente que mantenha terrenos não agrícolas nem urbanos com menos de 50 centímetros de altura da vegetação herbácea e arbustiva.
" Não me parece ser grande medida; na minha zona ... grande parte dos terrenos tem 1000m2 o que dava 3,33€ por ano!"
O velho argumento de uma solução que não serve para tudo, não serve para nada.
Só que não é assim, a minha proposta não pretende mudar o mundo, só pretende remunerar melhor a gestão que já existe, porque ao remunerar melhor a gestão que existe, ela se torna mais atractiva para novos operadores ou para a expansão da actividade dos operadores existentes.
É nessa altura que vem o argumento oficial: "“A fragmentação da propriedade rústica constitui um constrangimento relevante para a gestão ativa dos territórios, para a sua resiliência e para a prevenção dos riscos territoriais mais significativos, designadamente, do risco de incêndio florestal, sendo por isso necessário reforçar os mecanismos jurídicos e fiscais que incentivem o redimensionamento e a concentração da propriedade rústica"".
Não inventei este parágrafo, está num despacho (nº 7722/ 2021 de 6 de Agosto dos Secretários de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, da Justiça, da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território e da Agricultura e do Desenvolvimento Rural) e é cristalino: na opinião oficial, é mexendo na estrutura da propriedade que se cria valor, não é criando valor que se altera a estrutura da propriedade.
Com base neste equívoco, juntam-se um monte de juristas, académicos e burocratas (sem nenhum sentido pejorativo para este termo, além de ser a minha profissão, há muitos anos que defendo que a burocracia é uma conquista da civilização que convém tratar com desvelo, sugerindo a quem tenha dúvidas sobre isso que vá viver uns tempos para a Somália para verificar a sua importância), e nenhum economista, que fazem propostas, algumas delas delirantes.
Por exemplo, falam da obrigatoriedade de uma gestão profissional temporária de heranças vagas, jacentes ou indivisas (não me macem com alguma imprecisão jurídica, é irrelevante), a ser paga pela herança, sem perceber que elas estão vagas, jacentes ou indivisas, na sua maioria, exactamente por não criarem valor que pague uma gestão profissional.
As propostas globalmente não são más, tem até algumas úteis (já era tempo do Estado diminuir ou eliminar os custos de transferência de propriedades rurais abaixo de, digamos, 20 mil euros, facilitando a troca e emparcelamento por particulares), o problema é que não se dirigem a resolver o problema base que consiste em inverter os termos da equação: se houver criação de valor potencial, os particulares encontrarão maneira de se entender para redefinir a estrutura de propriedade, quando for um constrangimento a essa criação de valor.
Se não houver criação de valor potencial (eu conheço o argumento, o de que maiores propriedades implicam ganhos de escala que permitem a exploração economicamente viável, só que isso só é válido em muito poucas situações, como no caso das melhores terras para a produção de eucalipto, situações essas que o Estado se tem encarregado de boicotar administrativamente), podem discutir as complexas e criativas soluções jurídicas que quiserem, que os dados do problema não se alteram e fica tudo sem gestão na mesma.
Argumentar que "É, por isso, importante criar-se um equilíbrio equitativo entre as obrigações para os proprietários de prédios rústicos e as obrigações existentes para os proprietários de prédios urbanos." como se não existissem oportunidades completamente diferentes na propriedade urbana e rural, fundamentando-se na "evidência do dever do proprietário no uso e fruição do prédio rústico", como se o proprietário rústico tivesse algum dever de ir à falência para manter uma gestão inviável, é um delírio, institucionalmente consagrado, mas um delírio.
E, no entanto, é nisto que estamos empenhados como sociedade, em gastar rios de dinheiro e os neurónios de gente muito qualificada nas suas áreas de trabalho, evitando aceitar-se que, sem economia, o direito e administração tornam-se ou inúteis ou prepotentes, quando insistem em querer impor uma gestão que, forçosamente, é consumidora de recursos que não resultam dessa gestão, isto é, é insustentável.
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