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"Deixai toda a Esperança, ó vós que entrais"

por henrique pereira dos santos, em 13.09.19

"Os ministros da Defesa e da Agricultura fizeram esta quinta-feira, em Alcanena, um balanço positivo do programa conjunto de vigilância preventiva de incêndios Faunos, salientando a “redução sistemática, ano após ano, do número de ignições” nas áreas protegidas."

Esta frase é muito interessante porque atribui a um programa muito recente de colaboração contratual entre diferentes organismos do Estado a diminuição de ignições que realmente se verifica há muitos anos (Portugal diminuiu o número de ignições em praticamente um terço, nos últimos anos).

Essa vigilância é paga, uma espécie de pescadinha de rabo na boca em que o Estado impõe aos contribuintes um tributo para um fim de interesse comum, fá-lo entrar numa caixinha de surpresas retóricas e, no fim, entrega o tributo às forças armadas sugerindo que as forças armadas têm uma nova missão, paga pelo seu orçamento, quando na verdade estão a prestar um serviço cobrado a outras entidades do Estado.

Até aqui, nada de novo, faz parte da demagogia normal na gestão pública e em democracias maduras seria fortemente escrutinada, embora em Portugal seja comprada pelo seu valor facial.

O problema está no que vem depois:

"Capoulas Santos salientou o contributo do programa, que coloca patrulhas no terreno e disponibiliza um meio aéreo não tripulado, para a redução do número de ignições nas áreas protegidas e para uma atuação “no primeiro momento, impedindo que o incêndio atinja proporções que depois é mais difícil controlar” e tornando mais eficaz o sistema de combate."

E é um problema porque é uma doutrina largamente consensual, da esquerda à direita, e tem largo curso nas redacções dos jornais, apesar das pessoas que estudam o assunto a acharem profundamente errada e contra-producente o que, na generalidade dos países com grandes problemas de fogo semelhantes aos nosso, tem provocado o seu abandono e a substituição por doutrinas que pretendem integrar o fogo na gestão da paisagem, em vez de o excluir.

Portugal continua alegremente convencido de que a gestão do fogo se faz chegando o mais rapidamente aos fogos para apagar os fogos nascentes, centrado no facto de isso resultar em 98% das ignições, e esquecendo-se que são os restantes 2% que são responsáveis por 90% da área ardida e pelas maiores perdas humanas, de infraestrutura e económicas.

Esta doutrina não está só errada, apesar de largamente popular, nomeadamente entre o dispositivo de combate ao fogo, esta doutrina está na base das tragédias cíclicas e, por isso, é verdadeitamente uma doutrina que mata gente.

Aparentemente, isso não comove muita gente.


5 comentários

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De Anónimo a 13.09.2019 às 15:46

integrar o fogo na gestão da paisagem, em vez de o excluir

Uma tal doutrina está muito bem no Oeste aericano, por exemplo, ou na Austrália, ou na maior parte dos outros países nos quais a enorme maior parte da "paisagem" pertence a um proprietário único, que é o Estado.

(A título de exemplo, no Japão mais de 90% da área é "paisagem", isto é, floresta, e pertence ao Estado.)

Para esse proprietário único, cuja função nem sequer é ganhar dinheiro com a "paisagem", ter um incêndio que queima parte da sua propriedade até pode ser benéfico.

Mas em Portugal, onde mais de 95% da "paisagem" pertence a privados, geralmente (exceto no Alentejo) em minifúndio, usar o fogo como instrumento de gestão da "paisagem" coloca a questão: Arde a paisagem de quem? E quem é o sortudo cuja "paisagem" é escolhida para não arder?

Eu, por exemplo, que tenho alguns hectares numa região onde os fogos são recorrentes, fico todo contente se as propriedades dos vizinhos arderem, porque então sei que as minhas ficarão protegidas; mas fico muito descontente se forem as minhas propriedades a arder!

Posto perante tais pontos de vista, o Estado português só pode adotar a posição de que todos os fogos têm que ser apagados. Seria inadmissível que o Estado aceitasse deixar arder a propriedade do João mas procurasse salvar a do José, ou vice-versa.
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De henrique pereira dos santos a 13.09.2019 às 19:47

Se acha que com essa política, que dura pelo menos desde 1975, os resultados têm sido muito bons, é apoiá-la.
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De Anónimo a 14.09.2019 às 12:22

A política do Henrique Pereira dos Santos, avençado da indústria da celulose, é que é a correcta... É a política de quem lucra com os incêndios, tendo a real lata de advogar que "há que deixar arder", para que os bolsos dos patrões se possam continuar a encher. Os incêndios só servem para que a porcaria do eucalipto continue a conquistar território à floresta autóctone, não é à toa que esta é a espécie arbórea que mais área ocupa na floresta portuguesa. Ganhe vergonha na cara, Henrique. 
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De henrique pereira dos santos a 15.09.2019 às 12:10

Vou explicar-lhe uma coisa simples: pessoas adultas, mesmo quando insultam outros, com ou sem razão, assinam o que escrevem.
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De Anónimo a 16.09.2019 às 15:49

Era o que faltava que , quem tem o seu blogue não pudesse expressar-se do modo que mais lhe apraz. 
Quem passa e não gosta ou não concorda, faz o que vulgarmente se costuma fazer- "passando e andando!"
Que irritantes prepotentes. Não devem mandar nada  lá em casa...tá visto.

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