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Conformismo mais conformista não há

por Jose Miguel Roque Martins, em 29.05.20

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Nos últimos tempos, aqui, no Corta-fitas, temos falado da surpreendente passividade ou até desejo de que regras imperativas limitem as liberdades individuais. Uma característica portuguesa, que explica 48 anos de Estado Novo, sem protestos nem revoltas. Apesar da tentativa de retratar uma heroica e histórica resistência ao fascismo, na realidade os protestos não foram muito  eficazes, sem impacto real ou visível no rumo dos acontecimentos. Uma falta de eficacia semelhante a quem protesta actualmente. A  diferença nessa epoca, foi mesmo o preço elevado que os críticos pagaram pela sua revolta. Surpreendentes foram as grandes manifestação do primeiro de maio de 1974. Ficámos a saber que, afinal, eramos um país de antifascistas. Posiçoes contra a opinião e poder dominantes, em Portugal, é que nunca parecem vingar. 

A queda do Estado Novo também é um exemplo de conformismo. Confrontados por poucas forças, algumas sem munições, o regime preferiu conformar-se docemente com a sua queda, sem resistência digna do nome. E quem ousou mudar as coisas, fê-lo por interesses próprios. Os terríveis interesses próprios que, no final do dia, são  o que parece comandar a vida e suplantam as convicções ideológicas. 

Depois da revolução aconteceu algo de extraordinário. Parecia que todos eram comunistas e que o destino do País estava traçado. Para espanto de muitos, nas primeiras eleições, verificou-se que os Comunistas eram, afinal, uma pequena minoria e , em novembro de 1975, um golpe definitivo foi travado. Desta vez foi o PCP,  a conformar-se com a derrota e,  mais uma vez,  evitou-se um grande banho de sangue.

Um raro exemplo de resistencia popular,  desde o fim dos tempo conturbados da primeira república. O nosso conformismo tem o condão de nos poupar muito sangue. Mas tambem de nos  fazer perder muito bem estar,  liberdade e dignidade. 

Desde então, passaram mais 45 anos. Nós, o povo,  vamos aplaudindo os fracos progressos e aceitamos os tremendos falhanços.  Com fleuma britânica e a convicção que tudo foi pelo melhor. Afinal ainda estamos vivos, não morremos de fome,  somos uma democracia e há liberdade de expressão. Nada mau. O Povo está tranquilo e sereno, senão mesmo satisfeito.

Claro que o regime, com poucas exceções, apresenta resultados que vão do muito  mau ao medíocre. O que só será notado quando o regime cair e passar a ser conhecido   como a pesada herança de Abril.

Como nos conformamos, os políticos acham que têm tido um desempenho fantastico e que tudo está bem. Porquê mudar então? Porque não continuar com o mínimo de reformas possível, com o máximo de imobilismo, que tanto satisfaz o inegável instinto conservador dos Portugueses?

Porque se não o fizermos, provavelmente iremos a caminho da IV república, que, por pior que possa ser, promete durar pelo menos 50 anos! Não mudar, não é só manter a mediocridade. É arriscar um retrocesso total. O que todos os conservadores atentos já viram no passado. 

O conformismo não é  sempre mau. Mas é muito perigoso, quando mais conformismo mais conformista, que o nosso, não há. 

Ps: Apesar do conformismo, as raizes da contestação vão crescendo e alimentando partidos radicais como o Bloco de esquerda e o Chega. E o que parece impossivel, o fim da democracia, pode afinal vir a ser, de novo, uma realidade. 


9 comentários

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De JPT a 29.05.2020 às 10:00

Basta a torneira da UE fechar e o regime acaba no dia a seguir.
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De Iletrado a 29.05.2020 às 18:28

Caro Jose Miguel Roque Martins
Depois de ler esta crítica contra os portugueses, foi verificar quem teria escrito tal coisa. Olha, a acreditar no nome, é um português! Um português a criticar os outros portugueses de serem conformistas. E ele dá o melhor exemplo de conformismo: escreve em acordês. Um babaca marteleiro qualquer disse "a partir de hoje passam todos a escrever como eu quero!" e o português que critica os outros de conformismo conformou-se com esta ordem. Rico exemplo.
Boas pedaladas.
P.S.: O nome próprio é mesmo Jose ou isso é um erro aí do sistema?
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De Jose Miguel Roque Martins a 30.05.2020 às 08:16

Este post foi escrito como exercício de autocrítica( pessoal e colectiva) e de provocação. 
A irritação de estar a deixar de fumar e de só nos mobilizarmos atrás de partidos radicais, também ajudou. 
A provocação funcionou aparentemente menos bem. Honestamente contava com mais criticas. Para já apenas a sua, mais centrada no acordo ortográfico do que na essência: aqui fica a pergunta: não acha que somos demasiado brandos? Porquê? 
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De Anónimo a 30.05.2020 às 11:10

"(...) foi verificar"
E V. não segue o acordês nem o babaca marteleiro, ou seja, "escreve como quer".
Muitos cumprimentos
SF
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De Anónimo a 30.05.2020 às 15:59

"foi" é mesmo assim ou é um erro do sistema?
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De Anónimo a 30.05.2020 às 11:16

É apenas uma paz podre.
Vamos esperar e aguardar. Algo me diz que vêm aí tempos de mudança. Olá se vêm! E não tarda muito.
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De Ana Pereira a 31.05.2020 às 17:43

Subscrevo muito do que escreveu. Pergunto: Que se pode esperar de um povo que não presta? Acima de tudo individualista, invejoso, ignorante, abrutalhado mas, matreiro e caprichoso. Incapaz de pensar e agir colectivamente. O conformismo nada mais é do que uma tremenda falta de visão em relação a alternativas de vida. O português inveja bons e maus exemplos, sendo maioritariamente comodista por natureza, prefere enganar ou roubar a trabalhar arduamente para conseguir outra vida. Quem pensa e age de forma diferente foge daqui... ou fugia. Agora nem isso é possível. Enfim, generalizei mas, gostaria de colocar ainda uma ressalva: De Leiria para cima há muito boa gente, trabalhadora, bairrista e que ainda é capaz de pensar e agir colectivamente. De Leiria para baixo somos todos marroquinos. Resto de bom domingo e boa semana.
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De Iletrado a 02.06.2020 às 13:07

Caro Jose Miguel Roque Martins
A resposta a essa pergunta valeria, seguramente, uma tese do ISCTE. :)
Eu creio que a formulação da pergunta surge devido a um erro de perspectiva de quem a faz. Como é que podemos afirmar que as pessoas são conformistas? É possível que a maioria das pessoas considere que o governo tem a obrigação de impôr medidas obrigatórias para bem de todos noz, medidas essas que a maioria jamais cumpriria ou acataria se não fossem obrigatórias. Por exemplo, o cinto de segurança, o capacete do motociclista, o colete coiso-reflector.
Neste sentido, como determinar, com segurança, se a obrigação de utilizar máscara não decorre de uma vontade da maioria da população? Eu, que não sou de apostas, apostaria em como a maioria da população passaria a utilizar máscara durante o coito, se tal passasse a ser obrigatório. Aliás, eu não duvido que haja quem faça isso... Pois que já vi pessoas a desinfectar o pão, a fruta, a carne, o peixe, o jornal, os sacos do lixo, as garrafas do tintol, as bilhas do gás, ... E quando passeia o cão, diz que desinfecta as patas ao bicho... Dá a ideia que os vírus são coisa recente.
Eu não consigo ver neste tipo de comportamento qualquer conformismo. Não, pois como é que noz conseguimos determinar com rigor qual a vontade da população? Este fim-de-semana decidi pedalar até à Costa de Caparica e levei a ginga à arreata no paredão. Uns transeuntes mui preocupados avisaram-me que eu devia utilizar máscara, pois eu sou um tipo que pertence a um grupo de risco. Verdadeiros samaritanos! Não sei se posso escrever samaritanas, porque só elas é que me interpelaram. Curioso que uma delas, verdadeiramente preocupada com o velho que levava uma ginga pela mão, me admoestou enquanto segurava um cigarro. Aceso.
Também não podemos ignorar que, parafraseando o Variações, todos noz temos um fascista dentro de noz. P. ex., o dono do restaurante que tem agora a oportunidade de ser polícia e obrigar o cliente a colocar uma máscara. Assim já pode chegar a casa e dizer, todo ufano: "O gajo tinha a máscara na nuca, mas eu ameacei-o com a polícia e obriguei-o a colocar a máscara como deve ser! O palerma!" (...)
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De Iletrado a 02.06.2020 às 13:10

(...) Pois, caro Jose Miguel Roque Martins, eu não consigo ver neste tipo de comportamento qualquer conformismo. Eu vejo nisto pura estupidez e palermice. E um bocadinho de maldade, também.
Como é evidente, esta minha diatribe pode ter surgido – e deve ter surgido – devido a um erro de perspectiva. Porque nesta análise já parto do arrogante pressuposto de que sou intelectualmente superior à maioria da população.
Demais, mesmo que noz os dois estejamos certos – é difícil, mas não impossível – como é que a população consegue manifestar o seu inconformismo? O governo, determinando por lei que tem de ser feito desta maneira, faz uso da "repressão policial, terrorismo oficial" para impôr a lei. E a população, o que pode fazer? Declara guerra à polícia? Eutanasia o Costa?
Eu creio que não há melhor prova de conformismo que a coisa graphica. Solitàriamente em frente ao teclado, tendo sòmente Deus Nosso Senhor como único travão ao que decidimos escrever, a maioria da população instruída, ou seja, com capacidade para ver o Mal e lhe resistir, pura e simplesmente não resiste. Em 1990 um babaca marteleiro propôs uma nova forma de escrever, afirmando sem pudor que o método dele era mui mais fácil. Alguém lhe ligou pevide? O governo de então assinou umas patacoadas irresponsáveis, mas pelo menos esse governo teve o bom-senso de não impôr tal patacoada aos escreventes. E o que fizeram os escreventes? Ignoraram tanta facilidade e continuaram a escrever como ficou determinado em 1945. Mas em 2008 o babaca marteleiro conseguiu infiltrar-se no poder e finalmente pôde proclamar: "a partir d'oje screvem todos com'eu quero!". E u que phizeram us screventes? Comphormaram-se! Aceittaram algu só purque passou a cer obbrigactóriu! E não duvidu que a mahioria adoptaria a forma de screver que pacei a adoptar neste paragraphu ce alguém com puder acim u detterminace.
Como é que podemos esperar que a população seja inconformista se os mais esclarecidos, à primeira oportunidade, são os primeiros a abanar a cauda?
Boas pedaladas.
P.S.: Ao Jose Miguel Roque Martins, as minhas desculpas por aquele foi. No pior pano caem sempre nódoas. É, no entanto, curioso como pouca gente respondeu à provocação dos conformistas, mas não deixaram escapar a argolada básica do foi. A carapuça é uma coisa lixada.

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