por Duarte Calvão, em 09.01.22
É tempo da política e hoje é por aí que vou, considerando que Rui Rio esteve bem em todos os debates que vi até agora. Tenho, no entanto, a sensação de que estou sozinho no mundo, já que politicamente me abasteço quase exclusivamente de informação e opinião no jornal Observador, rádio Observador e canais televisivos. Que me lembre, fora Manuela Ferreira Leite, nestes meios não há um único comentador ou cronista que não aproveite o seu espaço para zurzir no candidato do PSD, o único cuja vitória pode tirar os socialistas do poder.
Até compreendo que fosse essa a atitude dos comentadores e analistas não socialistas quando havia hipótese do candidato do PSD ser outro, mas a questão ficou arrumada com as eleições internas em que Paulo Rangel foi derrotado. Porém, Rui Rio continua a ser criticado por tudo e por nada por estes comentadores, pelo que diz e pelo o que não diz, por não ser “claro” mesmo quando afirma a mesma coisa 350 vezes (da coligação com o Chega à prisão perpétua, passando pelo Bloco Central), por não conseguir impor os seus temas nos debates, mesmo quando é interrompido constantemente pelos moderadores com ríspidos “responda à minha pergunta” - tratamento a que, aliás, geralmente são poupados os candidatos de esquerda (sobretudo António Costa) - , por não ter ideias, por ter ideias, mas não as prioritárias, por não gostar de jornalistas (como se algum dirigente do PSD alguma vez tenha verdadeiramente gostado), por querer mandar ditatorialmente na Justiça (como se isso fosse possível numa democracia europeia) etc etc. O absurdo chega ao ponto de ouvir comentadores a sublinhar gravemente a importância de fazer reformas de fundo na Justiça, na Segurança Social, no sistema político e mais não sei aonde e em simultâneo criticarem Rio por as querer fazer.
Só consigo perceber esta má vontade contra Rui Rio, que muitas vezes roça o ódio cego, por duas razões. Uma, bem portuguesa, é a incapacidade de reconhecer que se errou quando durante anos se disse e escreveu que ele “não tinha hipóteses”, que queria apenas ser “vice-primeiro-ministro” de António Costa, que não sabia fazer oposição, que o PSD estava condenado a se tornar irrelevante e por aí fora. Deve custar admitir que afinal ele chega às eleições com grandes possibilidades, sem nunca abdicar do seu estilo tão criticado. A segunda, é dos que pensam que uma derrota de Rio trará à liderança do PSD alguma reencarnação de Sá Carneiro ou um Passos Coelho a desembarcar no Terreiro do Paço numa manhã de nevoeiro (não será por acaso que ele sensatamente parece querer distância destes sebastianistas “liberais”) ou um Carlos Moedas que mande à fava o mandato que acabou de conquistar ou, enfim, alguém que ninguém percebe quem é, mas que fará “tábua rasa” à direita e iniciará um ciclo glorioso de transformações na sociedade portuguesa, não deixando pedra sobre pedra, à boa maneira do que fascina a esquerda revolucionária e a extrema-direita.
Era bom que estes adeptos do quanto pior para Rui Rio melhor para os amanhãs que cantam, se lembrassem do que aconteceu quando se fez o mesmo com Manuela Ferreira Leite quando ela enfrentou José Sócrates em 2009. É verdade que se conseguiu que ela fosse derrotada e que depois viesse o desejado Passos Coelho. Só que, apesar de ter sido um bom primeiro-ministro, a verdade é que ele teve apenas oportunidade de apanhar os cacos deixados pela governação socialista de então. É isto que querem que se repita daqui a uns anos? Não se perdeu já tempo suficiente?