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Cheque Lar

por henrique pereira dos santos, em 30.03.23

A forma como tratamos as pessoas mais velhas, sobretudo a partir do momento em que deixam de ser totalmente autónomos, é um problema generalizado em todo o mundo e muito difícil de resolver, entre outras razões, porque é caro e os principais destinatários, os velhos e sobretudo os velhos que dependem de terceiros, têm muito pouca capacidade reivindicativa.

Ao contrário do que se passa na infância, em que os miúdos não têm capacidade reivindicativa, mas as famílias desempenham razoavelmente esse papel, na velhice nem essa capacidade reivindicativa por procuração é generalizada e eficaz.

Este artigo do Observador é bastante informativo, embora me pareça que algumas soluções são menos interessantes que o que poderíamos garantir com outro tipo de soluções.

Comecemos na base: o custo dos lares legais (já lá vamos aos ilegais), de acordo com o artigo, anda entre os 900 e 3000 euros (não verifiquei os dados, estou a raciocinar partindo de premissas que não verifiquei) e o valor da reforma média em Portugal não chega aos 550 euros.

A mera verificação destes grandes valores agregados demonstra a razão pela qual há tantos lares ilegais que, como diz o artigo, passam a vida a fechar e abrir: há um evidente desfasamento entre o valor necessário para tratar de um velho com dependências e o dinheiro que ele tem disponível (em termos médios, como de costume, os ricos têm um tipo de problemas, os pobres têm todo o tipo de problemas).

A opção do Estado tem sido baseada em parcerias publico privadas (eu sei que estou a usar o conceito imprecisamente) ou contratos de associação (eu sei que estou a usar o conceito de forma errada), isto é, há umas entidades privadas que recebem velhos e dinheiro do Estado (e de outras proveniências, incluindo dos utilizadores desses serviços) para tratar deles.

Complementarmente o Estado trata de fiscalizar estas entidades através de um dos sectores do Estado mais ineficientes, burocráticos e avessos ao escrutínio, a Segurança Social, sendo muito opacos os resultados dessa fiscalização (a sugestão, do artigo, de que todos os relatórios de inspecção a lares sejam públicos parece-me muito boa).

Por outro lado (um aspecto do artigo em que nunca tinha pensado mas à partida faz todo o sentido para mim), as visitas aos velhos são fortemente controladas e condicionadas pelas instituições que as recebem, o que limita fortemente quer a relação dos velhos com os que lhes são próximos, quer (e esse é o aspecto em que nunca tinha pensado) a possibilidade destas visitas funcionarem como um controlo social sobre o que se passa no lar e a forma como são tratadas as pessoas que lá vivem.

E aqui chego ao que queria dizer com este post: não valerá a pena discutir a possibilidade de o Estado deixar de financiar directamente as instituições que recebem as pessoas e passar a atribuir um cheque-lar (ponham as condições de recurso que quiserem, não faz sentido financiar quem tem recursos controláveis por si, o que é diferente da família ter recursos e nos pormos a discutir o dever moral da família tratar os seus velhos, eu acho que tem, mas, com a minha idade, estou a defender os meus interesses imediatos, talvez eu não esteja a ser objectivo), ao mesmo tempo que reforça os mecanismos de transparência sobre a gestão do lar (relatórios de fiscalização públicos, apreciação de utilizadores e família, etc.) e etc.?

E, já agora, que tal diminuir as exigências formais para a constituição de um lar e permitir que aumente a concorrência no sector, assente em regras simples e eficazes e na avaliação dos utilizadores?

Se a coisa corresse bem, até é bem possível que a remuneração e capacidade de atracção dos melhores aumentasse, resolvendo um problema generalizado dos lares, a pouca qualificação de grande parte do seu pessoal.


16 comentários

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De henrique pereira dos santos a 31.03.2023 às 08:23

Continua a querer promover a confusão entre um determinado tipo de propriedade privada (private equitity) como se fosse o único modelo de propriedade privada que existe (nem estou a discutir o estudo, apenas a sua promoção da confusão para obter ganhos numa discussão).
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De marina a 31.03.2023 às 10:38


mas o Henrique acha que no lar privado que fecharam agora , Montijo , penso ,  davam  misérias de refeições aos idosos e banhos de água fria por quê?
há tempos um caríssimo, com piscina e tudo,  tinha idosos a dormir em colchões no chão , que escondiam quando havia visitas por quê? 

porque acha que estão sobre medicados? para não darem trabalho. assim não é preciso tanto funcionário.
tal e como a ss não fiscaliza para não terem o trabalho de realojar os idosos.
os idosos ao Deus dará.

 se acha bem ter lucro de qualquer maneira com consumidores que não conseguem reclamar , muitos já têm demência , reflicta outra vez.
e pense também na oferta de lares e na pirâmide etária dos próximos 15 anos.
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De Elvimonte a 31.03.2023 às 18:14

Não pretendo promover qualquer tipo de confusão, antes pelo contrário. Volto a repetir:
"Empirical data ... suggest that profit motives in health care result in lower-quality care, often at higher cost to taxpayers."
Não obstante, "This is especially true with private equity ownership, whose priority is short-term financial return to shareholders."


Conclusões:
i) nem tudo o que é privado é bom - a negação do principal dogma neo-liberal;
ii) os fundos privados, com uma gestão centrada no lucro imediato, no caso dos cuidados de saúde são ainda piores - uma das formas daquilo a que Lazonick e outros designam por "extraction capitalism";
iii) nem sempre a designada boa gestão, traduzida no aumento da rentabilidade e do lucro, conduz a melhores resultados para as pessoas - a negação de outro dos dogmas neo-liberais.


Raciocínio lógico, nenhuma confusão, tudo claro. 


PS - Como corolário: continua a haver muitas pessoas a confudir extracção de riqueza com criação de riqueza, um erro demasido frequente.

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