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O artigo do João Miguel Tavares (que é uma pessoa com quem costumo concordar, isto é, de um campo ideológico de que me sinto próxima) começa logo com uma generalidade (que encerra um erro).
Ora os 5.160 milhões não são "mais". Porque destes, os 960 milhões de euros em CoCos já tinham sido em 2012, a conversão em capital não reforça os fundos próprios da CGD. Os 500 milhões da ParCaixa também eram um aumento de capital da CGD "encapotado" de antes, já lá estavam 50% e agora vão os outros 50%.
"Mais" mesmo será o aumento de capital de que não se conhece o número, apenas o tecto máximo de 2.700 milhões. As obrigações subordinadas são para colocar em investidores institucionais e não aumentam o capital core, que é o que é preciso aumentar em termos regulatórios, parece-me ser uma contrapartida exigida por Bruxelas para aprovar o aumento de capital na CGD considerando-o uma operação em condições de mercado, o que evita ir ao défice (mas não à dívida).
Portanto o capital (fundo próprios) só vai mesmo aumentar em 3,2 mil milhões no máximo. Digo no máximo, porque o valor exacto do aumento de capital em dinheiro depende da auditoria externa à carteira de crédito e outros activos.
Dito isto, passemos à resposta do João Miguel Tavares à carta que escreve no Público aos jornalistas de economia (mesmo sendo eu dos jornalistas que não beneficiou com a crise porque deu-se o azar de me calhar a Ongoing como accionista em 2008 com tudo o que isso implicou).
Pergunta o João Miguel Tavares, numa espécie de pergunta de retórica: Por que raio andaram tão distraídos ao longo dos últimos anos? Por que é que, antes do BES, do Banif e da Caixa, garantiam que o sistema financeiro continuava sólido como uma rocha, tirando o azar do BPN e do BPP, mais uns problemazitos no BCP? Há aqui uma história para vocês, jornalistas de economia, contarem, e que eu nunca vi contada. O parêntesis mais dramático do jornalismo económico nacional — aquele que dizia “a crise no GES (não no BES)” — estendeu-se a praticamente todos os bancos. Expliquem-nos, por favor: porque é que não soubemos antes? Por que é que vocês, que percebem disto à brava, não nos avisaram?
Porque João Miguel Tavares aquilo que consome o capital dos bancos hoje não era o que consumia antes de 2008. As regras contabilísticas foram mudando até chegar a Basileia III. Por exemplo, sabe que a razão porque a CGD, o BCP e o BPI precisaram de CoCo´s foi porque um dia a Autoridade Bancária Europeia decidiu que as obrigações soberanas em carteira (aquelas que um par de anos antes o sistema levou os bancos a reforçarem em força porque era o colateral que lhes permitia ter financiamento no BCE - o MMI fechou-se pós falência do Lehman Brothers) tinham de ser contabilizadas ao mark-to-market (valor de mercado)? Numa altura em que o risco das obrigações nacionais era elevado. Isso abriu um buraco no capital dos bancos, de um dia para o outro, sem que os bancos tivessem feito alguma coisa para isso. Sabe que a maioria dos gaps de capital são imposições regulatórias? A União Bancária é óptima porque divorcia o risco dos bancos do risco soberano, mas a um preço muito alto.
Obviamente que se um banco tem accionistas ricos esse problema é mitigado porque alguém põe o dinheiro, mas Portugal, graças ao PREC, deixou de ter capitalistas, logo deixou de ter capitais. Demora gerações a ter capital, ou então o país tem a sorte de ter commodities.
Há dez anos atrás não havia almofadas de capital para risco sistémico, almofadas de capital para carteiras de crédito em risco. Penso que até nem havia o rácio do Banco de Portugal de crédito em risco. O rácio era crédito em incumprimento há mais de 90 dias. Não havia ponderações a 100% da exposição a Angola. Não havia ponderadores de risco reforçado para créditos com colaterais em acções. Também é certo que não havia DTAs (activos por impostos diferidos) para ajudar.
Na altura as provisões eram as obrigatórias para crédito e as outras eram almofadas voluntárias que os bancos constituiam para semestres dificeis.
Sobre os casos específicos de que fala o João Miguel Tavares: sobre o BPN se alguém denunciou foi a imprensa, penso que o caso do artigo sobre o banco do Oliveira e Costa chegou mesmo a tribunal. Sobre o Banif o que se sabia era de denúncias sem documentos (quem se atravessa a escrever informações não demonstráveis?). E mesmo assim muita coisa foi escrita (veja-se o caso de Angola/Banif). O Banif Brasil foi várias vezes notícia.
Quanto ao BES/GES se me conseguir explicar como é que os jornalistas conseguiam descobrir os balanços secretos da ESI, uma SGPS sediada no Luxemburgo, onde o verdadeiro passivo estava num excel alegadamente feito pelo presidente do BES, se nem as autoridades do Luxemburgo descobriram.
Mas se for lá ver a imprensa da altura havia muita gente a falar do crédito para comprar acções e com acções como garantia. Eu até um livro escrevi sobre o assunto quando o BCP foi tomado de assalto pelo grupo dos aliados para travar OPAs incómodas. O João Miguel tem razão, na altura ninguém ligava nenhuma às notícias de economia por isso é que agora dizem estas coisas que o João diz. Quando diz "ainda sou do tempo em que as pessoas liam os jornais sem ligar patavina às páginas de economia". É caso para se dizer: Nota-se!
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