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Qualquer pessoa que procure razões razoáveis (passe o relativo pleonasmo) para ter filhos acaba num beco sem saída: quem tem filhos, tem cadilhos, que os não tem, cadilhos tem.
Isso não me impede de verificar que tendo vários filhos (não muitos, é certo), uma das vantagens é alargar o que consigo ver à minha volta, porque fazem o que entendem e isso obriga-me a fazer ou ver coisas que de outra forma me passariam ao lado.
Quando chegamos aos netos, uma das coisas que me acontecem é ir parar a sítios de férias a que nunca iria parar por minha iniciativa, e que vão sendo diferentes consoante as circunstâncias, que incluem as circunstâncias das pessoas que decidem da minha vida.
Este ano já estive em vários sítios e portanto acabo por ter uma amostra estatisticamente relevante para os meus padrões.
O que concluo é que, fazendo a olho uma análise de sustentabilidade dos diferentes sítios por onde estive, há uma correlação directa (a análise é a olho) entre sustentabilidade e preço, sendo claro que o sítio com melhores indicadores de sustentabilidade é dos mais caros, elitistas e exclusivos (para os meus padrões de cliente básico que ali está à pendura, note-se).
Mobilidade automóvel muito restrita - os carros não chegam às casas -, vegetação autóctone quase 100% (faltaria um programa de erradicação de invasoras, mesmo que não sejam um problema de primeira magnitude no sítio), uso de água nos espaços exteriores muitíssimo limitada, ausência de relvados e outros grandes consumidores de água e químicos, separação de lixos muito fácil, informação sobre biodiversidade q.b. (poderia ser melhor, será com certeza no dia em que se perceber que falar de habitats psamófilos não é comunicação, é ruído), taxa de ocupação do espaço face ao espaço natural (e por natural entenda-se mesmo natural, não uma substituição por um mostruário) bastante baixa, aparente bom isolamento térmico das casas e uso de energias renováveis, etc..
Em todos os sítios em que estive, parece-me evidente que há uma grande margem de progresso no sentido de ser possível prestar serviços semelhantes, com custos ambientais bastante mais baixos (com excepção do que referi acima, em que já é difícil reduzir padrões de consumo de espaço, energia, água e o resto, sem prejuízo do serviço que os clientes esperam ter), sendo tanto maior a margem de progresso, quanto mais democratizado e proletário (esqueçamos o exagero) é o sítio.
Só que fazê-lo implica conhecimento, gestão e capital, tudo coisas bastante caras, ou seja, implica afunilar o acesso social ao bem que as pessoas procuram.
Por exemplo, eu sei que boa parte das pessoas que defendem o uso de plantas autóctones em espaços exteriores argumentam que isso torna a manutenção mais barata, mas na verdade esquecem-se do investimento em conhecimento que é necessário. Por exemplo, saber que espécies usar, para obter os efeitos pretendidos e garantir a proveniência do material vegetal a usar, o que implica a colheita de semente local, a sua reprodução para posterior utilização, tudo operações caras. Para além da qualidade de projecto que garanta a qualidade global do espaço, a partir de circunstâncias que têm de combinar a expectativas dos utilizadores e o que realmente se consegue garantir - e da necessidade de desenhar soluções de projecto que sejam compatíveis com esses uso. Ou, outro exemplo, o desenho de caminhos que diminuam a probabilidade de pisoteio indesejado em formações vegetais que, por não serem intensamente regadas, fertilizadas e geridas quimicamente, não aguentam pisoteios intensos.
Embora a minha percepção da alimentação que é disponibilizada seja muito escassa - eu raramente gasto dinheiro em alimentação fora de casa - o que me pareceu é que mesmo nos sítios mais sofisticados, a sustentabilidade pára à porta da restauração.
Eu acho uns pezinhos de coentrada óptimos para um fim de praia, a acompanhar uma cerveja ou um copo de vinho (não me venham com purismos, pode ser vinho branco fresco, vai muito bem com um bocado de bom pão a que se junta os pezinhos dessossados), e há maneiras de os apresentar de forma a evitar os preconceitos associados ao chispe (coisa que aprendi com o António Alexandre, foi assim que mandei às urtigas os meus preconceitos sobre pézinhos e afins). Mas é muito mais fácil encontrar um bar de praia que sirva qualquer coisa de camarão produzido no outro lado do mundo (frequentemente, os clientes estão convencidos de que a frescura do peixe e do marisco se mede pela distância à praia) ou um hamburguer que nos garantem só ter alcatra (que desperdício de carne nobre, o bife raspado ou picado foi inventado exactamente porque é possível fazê-lo muito bom, com carne de terceira).
Resumindo, a sustentabilidade parece ser muito cara, sobretudo em três coisas em que Portugal tem alguma escassez: conhecimento (apesar de tudo, que menos me preocupa nesta matéria, há bastante, apesar de tudo), gestão (aqui sim, temos problemas muito sérios) e capital (que escuso de comentar).
E tem, provavelmente, um risco de clivagem social relevante.
Está escrito o meu contributo para os posts de férias em que Agosto é fértil.
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