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Campanha eleitoral

por henrique pereira dos santos, em 18.01.22

"Ponto interessante no programa da IL, não prevê deduções para pessoas com deficiência ou dependentes com deficiência, ao contrário do que já existe actualmente. Só prevê uma isenção de 200€ por filho. Daí muitas famílias, com menores rendimentos, ficarem a perder com esta proposta, como disse (e foram criticados por isso) a Mariana Mortágua e o Francisco Louçã. E o que confirma é o programa e o simulador de IRS da IL.

Vivo bem com as fantasias da esquerda radical, mas esta falta de empatia de alguns à direita nem tanto.

By Tiago Ornelas Vieira"

Primeiro os factos.

"1. Implementação de uma taxa única de IRS de 15%
2. Esta taxa aplicar-se-á por igual a todos os rendimentos e para todos os contribuintes
3. Isenção de IRS para rendimentos de trabalho, até ao montante do mínimo de existência (14 x 1,5 x Indexante de Apoios Sociais, sendo o IAS anualmente revisto pelo governo), o que significaria, atualmente, uma isenção dos rendimentos correspondentes a uma remuneração mensal de cerca de €664
4. Isenção adicional de 200€ mensais por filho dependente e por progenitor (400€ em caso de famílias monoparentais)
5. Eliminação de todas as deduções e benefícios fiscais em sede de IRS, com exceção das mencionadas no ponto anterior
6. Para atenuar o impacto orçamental imediato, e ainda assim beneficiar do efeito da simplificação, propõe-se transitoriamente um sistema de duas taxas: 15% para rendimentos até 30.000€ e 28% no remanescente
7. O imposto sobre rendimento seria passível de ser retido na fonte de forma exata, eliminando a necessidade da maioria dos contribuintes preencher declaração de IRS".

Esta é a proposta da Iniciativa Liberal e, tal como dito no post que transcrevi, prevê a eliminação de todas as deduções com excepção das que dizem respeito ao número de filhos, ou seja, prevê a eliminação das deduções por deficiência (declaração de interesses, a minha família é beneficiária dessas deduções actualmente).

Agora vamos à discussão das interpretações.

"Daí muitas famílias, com menores rendimentos, ficarem a perder com esta proposta" é uma frase claramente excessiva na medida em que as famílias de menores rendimentos não pagam IRS (ou pagam valores marginais, nos quais a dedução em causa acaba por representar um valor muito baixo).

Portanto, e em primeiro lugar, a haver prejuízo com esta eliminação de deduções, ele não é das famílias de menores rendimentos, mas das famílias de rendimentos médios e altos.

Ainda assim, parece uma proposta com "falta de empatia".

Posso admitir que o sítio para resolver os problemas de baixos rendimentos não é a política fiscal, mas a pujança da economia, e o sítio para resolver os problemas sociais que os mercados livremente não resolvem, são as prestações sociais, não a fiscalidade.

Nesse sentido, faz mais sentido definir prestações sociais de apoio às pessoas com deficiência (ou qualquer outro tipo de desvantagem social), prestações cujo valor dependa da natureza dessa deficiência e seja independente do rendimento, se se optar por não haver condições de recurso, ou com uma dependência do rendimento apenas relacionada com uma condição de recursos, como eu tendo a achar que é melhor (embora não seja muito taxativo neste ponto). Note-se que isto é válido para a única excepção admitida no programa da Iniciativa Liberal: para quem recebe, talvez um abono de família fosse mais interessante que uma dedução nos impostos, sobretudo para quem tem mais baixos rendimentos.

Uma campanha eleitoral serve, também, para sermos confrontados com diferentes pontos de vista e procurarmos as melhores soluções (que, provavelmente, não são as soluções programáticas que cada um apresenta, mas o resultado da negociação dessas diferentes soluções de partida).

Outro exemplo, Susana Peralta critica esta proposta da IL, acabando um artigo com este parágrafo.

“O nosso sistema fiscal está longe de ser perfeito. Em 2019, tínhamos 542 benefícios fiscais mal documentados e não consta que a maior parte tenha sido cancelada. Estes benefícios distorcem a progressividade do sistema. Temos exceções para certos rendimento ou certos contribuintes, que pagam taxas mais baixas. Desconhecemos o impacto de todas estas regras, porque não há estudos sobre nada nem dados para os fazer. Se é para reformarmos os impostos, devíamos começar por aqui. Achatar a taxa, até ver, serve sobretudo para meter dinheiro no bolso dos mais ricos.”

Em primeiro lugar Susana Peralta está a desvalorizar o facto de que a proposta da IL não se resume a uma taxa única (ou duas, transitoriamente), mas inclui exactamente a simplificação de que fala Susana Peralta, que inclui a tal dedução por deficiência, por exemplo, mas também as de gastos com a saúde, com educação e uma série de outras coisas estimáveis que acabam sempre por ser regressivas: deduções de impostos sobre rendimentos tendem a beneficiar quem paga mais impostos e a deixar de fora os que, por não terem rendimentos suficientes, nem sequer pagam impostos.

Depois termina com uma formulação que é técnicamente pouco rigorosa e para que vale a pena olhar.

"Achatar a taxa, até ver, serve sobretudo para meter dinheiro no bolso dos mais ricos."

Tirando os impostos negativos, que alguns liberais têm defendido (é uma ideia que acho interessante, mas não percebo o suficiente do assunto para ter grande opinião sobre isso), os impostos, por definição, não põem dinheiro no bolso de ninguém, apenas tiram.

Porque razão não é indiferente dizer que a taxa fixa põe dinheiro no bolso dos mais ricos em vez de dizer, mais rigorosamente, que deixam mais dinheiro no bolso dos mais ricos?

Porque seria moralmente inaceitável que os impostos servissem para pôr dinheiro nos bolsos de quem não precisa, ao passo que a discussão moral sobre se o dinheiro é socialmente mais útil no bolso dos mais ricos ou nos bolsos do Estado, é perfeitamente aceitável.

E é uma discussão sem uma resposta linear: se o dinheiro dos mais ricos for mal gasto, pode ser menos útil que nos bolsos de um Estado que o gastasse bem.

Mas se o dinheiro dos mais ricos fosse gasto para criar riqueza, poderia ser mais útil que nos bolsos de um Estado que o gastasse ineficientemente para alimentar clientelas.

Ou seja, a discussão deixa de ser sobre se o dinheiro deve estar no bolso das pessoas ou no bolso do Estado, para passar a ser uma discussão sobre os incentivos que podem levar as pessoas e o Estado a gastar melhor o dinheiro de que dispõem.

Pessoalmente gosto da proposta da IL, nos termos em que está formulada e com o racional que o seu extensíssimo programa explica, mas gosto especialmente porque a simplificação fiscal é um grande incentivo para um Estado mais eficiente.

E porque na verdade não tenho problema nenhum com o dinheiro que está nos bolsos nos mais ricos, o que me preocupa é o dinheiro que falta nos bolsos dos mais pobres, e os bolsos de uns e outros não são nenhum sistema de vasos comunicantes.

Eu não subscrevo a ideia de que as campanhas eleitorais não servem para nada, aliás basta entrar em qualquer café ou tasco nestas alturas para perceber que há imensa gente a discutir política, muito para lá da mera afirmação de sentidos de voto assim ou assado.


10 comentários

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De Anónimo a 19.01.2022 às 06:44

Além disso, Costa de quem não se pode dizer que a coerência seja o seu forte. pensaria como o outro "Paris vale bem uma missa!". Ou um alto cargo europeu...
(cont.)

"Tornou-se um hábito dizer que o cenário preferido de Costa (obviamente, sem maioria absoluta) seria uma coligação com o PAN e com o Livre. Mas isso só traz estabilidade governativa, não ajuda Costa para o seu futuro político. Uma coligação com a IL seria muito mais importante para o futuro de Costa. Se a aritmética eleitoral permitir, essa seria a solução preferida de Costa.

E a IL, vai resistir ao assédio de Costa? Para mim, não é absolutamente claro. Em primeiro lugar, recordando as leis permanentes da natureza humana, nunca é fácil resistir ao assédio e à atração do poder. Depois, a IL poderia evocar bons argumentos para justificar um apoio parlamentar a um governo socialista. É óbvio que Costa daria alguma coisa de importante à IL, por exemplo, o reforço das parcerias público-privadas na saúde, e/ou a privatização total da TAP, e/ou a descida do IRC, eventualmente até uma experiências piloto com o cheque educação. Para Costa, que nunca se destacou por uma coerência ideológica vincada, umas reformas liberais valem um alto cargo europeu. A IL poderia ainda apontar o exemplo dos liberais alemães, e dizer que um acordo com o PS impediria uma nova coligação com a extrema esquerda. O interesse do país é sempre um bom argumento." -  João Marques de Almeida

https://observador.pt/opiniao/e-se-costa-assediar-a-il/



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