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Camilo foi muito maior do que o século XIX, não cabem rótulos, nem escolas, ou séquitos, a quem almejou maior liberdade. Sem mestre e sem discípulos foi um colosso das letras: poucos alcançaram tanto de forma tão arrojada e completa. Não entrando em paradoxos, encontramos particularidades com os contemporâneos. Se Eça almejou a corpulência perfeccionista de Flaubert, então Camilo superou a audácia laboriosa de Balzac ou a capacidade inventiva de Dumas. Mas ambos foram muito mais do que este mimetismo: Camilo e Eça dissociam-se e complementam-se ao mesmo tempo. Estilos e temperamentos diferentes, certamente.
Seria pois redutor colocar Eça como o escritor cosmopolita e Camilo como o autor provinciano. Eça o homem moderno e Camilo o homem do "Portugal antigo". Mas sem dúvida que representam sensibilidades e visões diferentes desse mesmo Portugal.
Assim como diferenciado se manteve da ilustre "Geração de 70". Não tão viajado como Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, nos livros encontrou a escapatória para entender a humanidade; nem empedernido foi de ânsias positivista como Oliveira Martins, Antero de Quental, Guerra Junqueiro ou Teófilo Braga. As modas eram para ele retalhos que mereciam ser martelados com a firmeza do verbo.
Ao contrário de Eça, estrangeirado a construir na distância geográfica o reportório literário do naturalismo, snob que almejava a França como ideal cultural, cujas famosas personagens e os conhecidos enredos foram observados muitas vezes telescopicamente (nem sempre mas nas obras cimeiras bem longe de Portugal); ao contrário do seu émulo literário, Camilo conviveu de perto com o povo, partilhando iguais mágoas e dissabores, sentindo a amargura que dilacerava as inteligências. Entre os seus conviveu e saboreou o mesmo aroma que preencheu milhares e milhares de páginas. No conflito existencial não perdeu a ânsia dos filósofos, onde a arte é o reduto para explorar os infernos insondáveis da alma humana.
Ao mesmo tempo romântico e naturalista, homem de aspirações metafísicas e preso à imanência terrena, revolucionário e contra-revolucionário, em todas as metamorfoses da vida encontrou espaço para ampliar a audácia literária. Cada personagem continha um pouco do seu próprio mistério. Narrativas que, não explorando tão cansativamente o mundo e a mente, nem perdendo o arrimo da acção na fórmula galicista de tudo reduzir ao racionalismo , Camilo desejou sobretudo contar uma boa história, mas elevada pela erudição e grande conhecimento da língua. Escrevia de rajada, pouco corrigindo, mas domando a letra com habilidade.
No final, Camilo terá sido muito mais completo, muito mais argucioso, muito mais profundo. Em todas as latitudes da arte conduziu o seu desaforo e desatino, a sua violência e candura, uma mesma força demolidora capaz de arrasar com os mais cândidos e tíbios vates que pululam nas Academias e nos salões. Literatos e lentes arrasou Camilo com audácia. A pena afiada perpassou os variados géneros literários, romance, conto, novela, poesia, teatro, crónica, crítica literária. Uma verdadeira galáxia literária, queixando-se o mesmo de ser um prisioneiro do trabalho. Martírio dos homens abençoados pelas musas.
Também bibliófilo, referia-se em carta ao amigo, o poeta Feliciano Castilho, aos seus "mil volumes sofríveis". Não fossem as dificuldades financeiras, as errâncias de um espírito indomável, e quem sabe que invejável biblioteca legaria. Alguns volumes foram ainda recuperados, cada página recheada de notas marginais onde não perde o lado mais cáustico.
Na biografia foi a conjugação do poeta e do aventureiro, com vicissitudes que igualavam os dramas que soube elaborar. Vida que chocou e invejou os contemporâneos. E no final de tudo, conduzido por essa mesma força robusta, decidiu o próprio fim. Camilo foi pois a força indomável das letras portuguesas.
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Claro. Tudo será cabal e integralmente esclarecido...
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